Versos do domingo — Gregório de Matos (II)

Reconhecidamente nosso maior poeta barroco e, na irrelevante opinião deste blogueiro, o maior talento já produzido pela poesia brasileira, Gregório de Matos Guerra (1636/95) mais uma vez aparece (aqui) para cadenciar o ritmo neste espaço em que a prosa, em respeito ao dia mais nobre de domingo, cede vez aos versos.

Para endossar a importância, a incrível atualidade e a surpreendente ousadia verbal do autor também conhecido em vida como “Boca do Inferno”, após ler abaixo um dos seus poemas mais conhecidos, tente você, leitor, sobretudo se campista, acatar a sugestão do título para definir também esta nossa cidade, assim como o poeta fez com a sua há 400 anos. E, neste raciocínio, aproveite e me responda: de quantos “ff” se compõe mesmo C-A-M-P-O-S-D-O-S-G-O-I-T-A-C-A-Z-E-S???… 

 

 

 

 

 Define sua cidade

 

De dois ff se compõe

esta cidade a meu ver:

um furtar, outro foder. 

 

Recopilou-se o direito,

e quem o recopilou

com dous ff o explicou

por estar feito, e bem feito:

por bem digesto, e colheito

só com dous ff o expõe,

e assim quem os olhos põe

no trato, que aqui se encerra,

há de dizer que esta terra

de dous ff se compõe.

 

Se de dous ff composta

está a nossa Bahia,

errada a ortografia,

a grande dano está posta:

eu quero fazer aposta

e quero um tostão perder,

que isso a há de perverter,

se o furtar e o foder bem

não são os ff que tem

esta cidade ao meu ver. 

 

Provo a conjetura já,

prontamente como um brinco:

Bahia tem letras cinco

que são B-A-H-I-A:

logo ninguém me dirá

que dous ff chega a ter,

pois nenhum contém sequer,

salvo se em boa verdade

são os ff da cidade

um furtar, outro foder.  

 

 

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Este post tem 2 comentários

  1. Luciana Portinho

    Exato, perfeito!

  2. sandra

    Mais-que-perfeito!

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