Zico e Romário, juntos, no domingo de Maracanã

 

Já escrevi que, embora genial, o artesão da bola Zico sempre foi só uma face do homem Arthur Antunes Coimbra. Pois, ontem, como se precisasse ainda dar provas disso, ele convidou Romário para o Jogo das Estrelas, que promove há dois anos no maior palco do mundo: o Maracanã. Antigo desafeto do eterno camisa 10 da Gávea, o camisa 11 mais famoso da Seleção Brasileira aceitou.

A briga entre os dois começou na preparação para a Copa de 94, nos EUA, quando a imprensa, assim como em 90, cogitou a volta do Galinho, então já aposentado como jogador, à Seleção Brasileira. Realista, Zico disse que não dava mais, embora admitindo ter a imaginação tentada sobre o que poderia fazer lançando do meio-de-campo para Bebeto e Romário no ataque. Por ciúme e soberba, o Baixinho disse que o Brasil tinha que esquecer a geração de 1982, de Zico, que perdeu a Copa da Espanha na qual encantou o mundo.

Quatro anos depois, com Zico escolhido para coordenador técnico da Seleção de Zagallo, na Copa de 98, na França, veio o corte de Romário, por contusão, que este jogou na conta do antigo desafeto. Não satisfeito, ao abrir um bar, tascou uma pintura do Galinho, na porta do banheiro masculino, segurando um rolo de papel higiênico. Assim como Zagallo, retratado sentado na privada, com as calças arreadas, Zico processou o Baixinho por danos morais e ambos levaram dele uma bela grana.

Já perto de se aposentar, Romário escalou sua seleção mundial de todos os tempos. Surpreendentemente, escalou Zico no seu meio-de-campo, ao lado de Pelé e Maradona. Ao ser indagado pela escolha, se rendeu: “Critiquei ele por não ter sido na Seleção aquilo que foi no Flamengo, mas, em clube, Zico foi o melhor jogador que já vi jogar”.

Eu, que vi ambos, posso dizer, sem medo de errar, que se trataram dos dois grande jogadores produzidos pelo futebol penta-campeão mundial, nas três últimas décadas. Zico nos anos 80, Romário nos 90, talvez acompanhados de Ronaldo Fenômeno, o maior nesta primeira década do novo milênio. Mas o Galinho estava uma oitava acima dos dois, pois sabia ser arco, além de flecha. Se não ganhou Copa como aqueles que o sucederam, repito o Fernando Calazans, príncipe da nossa crônica esportiva: “Azar o da Copa!”

Desconfio que tanto no convite do Galinho, como na aceitação do Baixinho, dois outros craques do passado tenham interferido. Edu, irmão de Zico, maior craque da história do América, e Bebeto, tido como sucessor de Zico no Flamengo e melhor parceiro de Romário dentro de campo, por quem foi chamado recentemente e aceitou ser técnico do mesmo América.

O que importa é que finalmente os dois estarão juntos, no mesmo time, num ataque que ainda terá o Imperador Adriano. Estarei lá, com meu filho, no Maraca em que assistimos juntos ao Hexa do Mengão e onde, dois anos antes, no primeiro Jogo das Estrelas, ele pôde ver, com seus próprios olhos, que não era lenda aquilo que ouviu ser contado pelo pai enquanto crescia: em penetração lenta pela esquerda da área, após um drible de corpo que deixou sentado no chão o cracaço da zaga Gamarra, o Galo colocou a bola mansamente no contrapé do goleiro, com toda a categoria que Deus um dia lhe deu e ainda não teve coragem de cassar daquelas velhas pernas.

Junto com meu filho, será muito bom cantar mais uma vez aquilo que, em sua despedida do futebol profissional, há 20 anos, naquele mesmo Maracanã, jurei nunca mais cantar para ninguém: “Hei! Hei! Hei! O Zico é o nosso Rei!”

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