Hoje, com o impacto da notícia da renúncia de Zico ao comando do futebol do Flamengo, a torcida fez protestos na sede do clube, na Gávea, enquanto o ex-craque foi ao Centro de Treinamento, se despedir dos jogadores. Interessante notar que o semblante de revolta dos torcedores, na foto acima, está estampado, sem exceção, em rostos de jovens que nunca viram Zico jogar. Em contrapartida, a desesperança nas faces de quem hoje joga no Fla, na foto abaixo, deixa claro o quanto deve ser difícil a missão de escapar da zona do rebaixamento…
Agora há pouco, quem também escreveu (aqui) sobre a saída de Zico, foi o jornalista e blogueiro Renato Maurício Prado. Concordo com ele em relação aos erros cometidos pelo ex-craque como dirigente, mas ainda assim, quando alguém do porte de Zico erra e sai, para figuras como Capitão Léo permanecerem dando as cartas na Gávea, começo a ter sérias dúvidas quanto às possibilidades de solução para o Flamengo, nesta ou em qualquer outra administração.
Zico: como dirigente não foi nem sobra do gênio que era como jogador
Na noite de ontem, já ouvira alguns rumores a respeito da saída de Zico mas, confesso, não lhes dei crédito. Não conseguia acreditar que ele entregaria os pontos com apenas quatro meses de trabalho e num momento tão crítico para o clube. Não me parecia atitude digna do “Galo” que tantas vezes vi liderar o Flamengo em seus momentos de maior glória. Hoje, pela manhã, entretanto, veio a confirmação. E, com ela, uma grande decepção.
Antes de mais nada, é importante ressaltar: o jogador Zico jamais perderá a minha admiração. Na verdade, vou além: nunca deixarei de ter por ele autêntica veneração. Era um monstro. Um cracaço, dentro e fora do campo. Seu talento e, acima de tudo, seu profissionalismo exemplar guiaram várias gerações rubro-negras e levaram o Fla a conquistar os maiores títulos de sua história. Por isso, haja o que houver, merecerá ser sempre um ídolo da maior torcida do país.
O dirigente, entretanto, não conseguiu ser nem sequer uma sombra do que fora como atleta. Se as intenções eram as melhores possíveis (e não tenho dúvidas de que eram), as ações, em sua maioria, se revelaram desastrosas. Repetindo, monocordicamente, o discurso de que o importante era apostar na estrutura (construção do CT, revitalização das categorias de base etc), Zico esqueceu do presente e o time que montou para o pós-Copa no campeonato brasileiro revelou-se um desastre tão grande que ameaça seriamente o clube de viver o maior vexame de sua história – o rebaixamento à Segunda Divisão, provação da qual, até então, o Flamengo é o único carioca a escapar.
Esse é o seu maior pecado. Não creio em nenhuma das malidicências que espalharam a respeito de seus filhos, agindo como empresários, na Gávea. A honestidade e a ética de Zico, para mim, seguem inatacáveis. Ele pode ter se mostrado incompetente como gestor, mas daí a acusá-lo de usar o clube em benefício próprio vai uma distância colossal.
O acordo com o CFZ, de fato discutível, por igular deveres e haveres de duas instituições tão díspares em tamanhos e valores, foi firmado por Bruno Coimbra, seu filho, e pela presidenta Patrícia Amorim, antes de sua contratação como dirigente executivo. E, é importante ressaltar, já era ardentemente defendido, na gestão anterior, por Márcio Braga e Delair Dumbrosck.
Se Zico teve culpa na história foi por não perceber que tal contrato poderia sugerir um perigoso e desaconselhável conflito de interesses. Por causa dele, talvez nem devesse ter aceitado o convite do Flamengo. Ou então, no dia de sua posse, deveria ter anunciado oficialmente o seu cancelamento. Mas não o fez – até porque a decisão de rescindi-lo, o próprio Zico admite, só aconteceu quando da venda do clube para o grupo MFD, de investidores (embora Patrícia Amorim tenha emitido nota oficial garantindo o contrário, há poucos dias).
O resumo desta triste ópera rubro-negra é que todos no clube erraram feio e acabaram desperdiçando uma grande oportunidade de usar Zico como um instrumento eficiente para recuperar a imagem do clube e reerguê-lo financeiramente. Já escrevi, aqui mesmo neste blog e na minha coluna do GLOBO, que o maior ídolo da história do clube não poderia ter sido exposto e usado da forma que foi.
Zico era para ter se tornado uma grande bandeira, um símbolo, um embaixador do novo Flamengo. Poderia até ditar as maiores diretrizes do futebol profissional, mas não deveria jamais ter se desgastado no dia a dia das contratações, do relacionamento com o elenco, da discussão de prêmios e salários atrasados etc.
O Galo tinha tudo para ser o grande catalisador de novas receitas externas, que possibilitariam o saneamento financeiro do clube e viabilizariam grandes contratações – e não ficar mendigando recursos ao departamento financeiro, para trazer um bando de pernas-de-pau.
Faltou profissionalismo e competência à Patrícia Amorim, para perceber o erro a tempo de corrigi-lo, cercando Zico de profissionais de primeira linha, que pudessem lhe dar o respaldo necessário para ser a figura de proa que se esperava.
E faltou também a Zico a sensibilidade para entender que abandonar o barco em meio à tormenta não é atitude digna de um grande comandante.
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Patrícia, Patrícia, se, de fato, o “Capitão Léo” virou fiel da balança para qualquer coisa na Gávea, todos aos botes…
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Razão tem o leitor Eduardo Silame:
“Eu era mais feliz quando o “capitão Léo” que mandava no Flamengo era o Júnior.”
Li no Blogsportes (aqui e aqui), dos jornalistas Igor Siqueira e do Mateus Mandy, a notícia da renúncia de Zico do comando de futebol do Flamengo, bem como sua carta de despedida, onde externou os motivos da decisão. Entre eles, sobretudo os ataques que passou a sofrer, usando seu filho Bruno como alvo, por parte do presidente do Conselho Fiscal do clube, Leonardo Ribeiro, vulgo Capitão Léo.
Criado nas divisões de base do Flamengo, Zico conquistou os campeonatos estaduais de 1972, 1974, 1978, 1979 (duas vezes), 1981 e 1986; brasileiros de 1980, 1982, 1983 e 1987; a Libertadores da América em 1981 e o Mundial Inter-Clubes, também em 1981. Com 568 gols, foi o maior artilheiro e jogador da história do clube. Grande craque brasileiro por mais de uma década, disputou com a Seleção Brasileira as Copas do Mundo de 1978, 1982 e 1986, sendo listado pela Fifa (cujo Hall da Fama integra) e pelas revistas France Football e World Soccer entre os 10 melhores jogadores que o mundo produziu no séc. 20. No futebol de areia, ainda como jogador, conquistou as Copas do Mundo e Copas América em 1995 e 1996. De volta aos gramados como técnico, conquistou a Copa da Ásia, em 2004, com a seleção do Japão; o Campeonato e a Supercopa da Turquia, em 2007, pelo Fenerbahçe; o Campeonato e a Copa do Uzbequistão, pelo Bunyodkor, em 2008; e a Supercopa e a Copa da Rússia, pelo CSKA Moscou, em 2009.
Já Capitão Léo começou a construir sua vida “esportiva” como líder da Torcida Jovem do Flamengo, considerada uma das mais violentas do Rio e pela qual, nos anos 90, teve acesso à política interna do clube. Através de contatos políticos, se tornou representante rubro-negro na Federação de Futebol do Rio, onde ganhou um cargo ainda na gestão de Eduardo Vianna, o Caixa D’Água, e ficou até 2007, na vice-presidência de Controle Interno. Em 1999, atuando pelo Conselho Fiscal do Fla, foi um dos principais responsáveis pela aprovação das contas do então presidente Edmundo dos Santos Silva, a quem ajudou também a se reeleger em 2000, até que este sofresse um processo de impeachment, em 2002, e fosse preso pela Polícia Federal, em 2003, por fraude na Receita Federal e no INSS. Fiel ao ex-líder, Capitão Léo passou recentemente dois dias na cadeia, mas por motivo diverso: agressão a torcedores do Fluminense e resistência à prisão, numa confusão após o empate de 3 a 3 no Engenhão.
Comparados os currículos de quem saiu e quem ficou, não é preciso entender muito de futebol ou leis para se constatar que tipo de gente está hoje no comando do clube de futebol mais popular do mundo. Pegando carona na “onda vermelha” prometida pelos eleitores de Dilma, ao melhor estilo da “Revolução Cultural” de Mao Tsé-Tung, para a eleição de domingo, enquanto rubro-negro tenho uma modesta sugestão aos colegas de torcida (de futebol, não política), para o clássico de amanhã, contra o Botafogo: abolir o vermelho e manter apenas o preto…. De luto!