Com a promessa do Ministério Público Federal de Campos, de arguir a inconstitucionalidade da lei estadual 5.990/11, que projeta a suspensão gradual da queima de cana até 2024, a questão ainda não parece estar fechada. Enquanto ainda não se esgotam os recursos democráticos do Judiciário, interessante também não apagar a discussão do assunto.
Entre o artigo do presidente da Coagro, Frederico Paes, publicado na edição da Folha da última terça, dia 19, e o publicado hoje, na mesma página de Opinião do jornal, pela professora Odete Rocha, presidente local do PCdoB, o debate democrático continua aceso…
A título de comparação
Por Frederico Paes
Está em vigor desde o ano passado, resolução do estado do Paraná, que prevê a eliminação gradativa da despalha da cana-de-açúcar, através da queima controlada. De acordo com a nova resolução (n° 076/2010-SEMA), os plantadores de cana-de-açúcar daquele Estado, que utilizam a queima controlada como método para a despalha, serão obrigados a eliminar a prática, nas áreas mecanizáveis nos seguintes prazos e percentuais: até 31 de dezembro de 2015, deverá ser eliminada a queima da cana em 20% do total da área mecanizável do plantio; até 31 de dezembro de 2020, a queima da cana deverá ser eliminada em 60% do total da área mecanizável; e até 31 de dezembro de 2025, os produtores terão que eliminar 100% da queima em área mecanizável do plantio da cana-de-açúcar.
No Paraná, são consideradas áreas mecanizáveis lavouras acima de 150 hectares, com declividade igual ou inferior a 12%, além de solos com estruturas que permitam a adoção de técnicas usuais de mecanização da atividade de corte da cana. Já nas áreas não mecanizáveis — plantações em áreas de até 150 hectares — a utilização da queima controlada deverá ser eliminada até 31 de dezembro de 2030, desde que haja tecnologia viável.
Os plantadores apresentaram antes do início da safra, ao Instituto Ambiental do Paraná, uma planilha contendo o total dos imóveis rurais com áreas cultivadas, o percentual de áreas mecanizáveis e o percentual de áreas não mecanizáveis. Além disso, a resolução prevê que os plantadores terão de respeitar as Áreas de Preservação Permanente e os percentuais mínimos em áreas de Reserva Legal, dentro dos limites de cada imóvel rural das áreas mecanizáveis.
Nas questões ambientais, o estado do Paraná é considerado um dos mais avançados do país, tão quanto na produção agrícola. O prazo de carência para o fim definitivo da queimada é bem maior do que o da Lei aprovada pela Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro. São Paulo, o maior produtor, como já observamos anteriormente também tem um prazo maior. Desta forma, o Rio se prepara para ser um dos primeiros a encerrar definitivamente a despalha por queimada. Abordamos esse assunto, a título de comparação.
E até lá?
Por Odete Rocha
Nasci e amadureci na área urbana de Campos. Por isso sempre soube quando os canaviais estavam sendo queimados. Os reflexos eram, e ainda são, em pleno século XXI, notórios nos tapetes formados pela fuligem que invade os quintais das casas, entrando por janelas e portas, infernizando a vida da população que, em sua grande maioria, nada tem a ver com a prática que deveria ter sido abolida há muito tempo.
Quantas pessoas não se vêem obrigadas, durante toda a moagem, a manter suas casas fechadas para tentar ao menos minimizar os transtornos provocados por essa prática milenar que tanto mal causa ao meio ambiente?
Do ponto de vista da saúde, não é preciso ser nenhum especialista para constatar como a fuligem resultante das queimadas nos canaviais afeta as pessoas, que passam a apresentar problemas respiratórios de toda ordem. Quem quiser conferir essa realidade é só visitar os postos de saúde no período da safra canavieira. Isso sem falar até em vidas ceifadas em função da queima desordenada dos canaviais, além dos estragos no solo, que sofre desgastes que influenciam na queda da qualidade da lavoura.
A legislação nacional proíbe a prática das queimadas, embora os estados produtores de cana possam definir lei específica sobre o tema, como foi o caso da lei 5.990/2011 recentemente aprovada na Alerj, que prevê a eliminação gradativa da queima da cana até o ano de 2024.
Ora, se por um lado existe a alegação de que não haveria como acabar com a queima da cana de forma brusca, por outro há de se considerar os malefícios que a prática vem provocando ao longo de séculos.
Ninguém em sã consciência ignoraria o fato de que milhares de trabalhadores ficariam desempregados, caso houvesse interrupção dessa atividade de uma hora para outra, mas cabe lembrar que as partes interessadas no processo precisam achar uma saída que atenda a todos. Se o campo vai ter que ser mecanizado, é preciso que se abram alternativas às pessoas que terão que deixar essa atividade, porque a lei prevê que as queimadas sejam extintas em 2024. E até lá?