Medindo o vento
Essa confusão na base aliada, que só fez recrudescer nas últimas duas semanas, vai continuar até que se tenha uma definição do quadro econômico. O que está agitando muito a base aliada é a formação de palanques e acordos estaduais para a eleição de 2014. Como a presidente Dilma antecipou muito essa campanha eleitoral, os problemas que só apareceriam ano que vem, começaram a aparecer agora, com a companhia desagradável de problemas econômicos: PIB que não cresce, inflação precisando de controle, déficit recorde da balança comercial.
Então todo mundo está querendo saber para que lado o vento soprará, os partidos para tomarem posição que possa lhes garantir a continuidade no poder, e a presidente Dilma para que possa contar com os apoios políticos de que precisa para a reeleição sem ter que fazer concessões, que não é do seu estilo.
A inflação já está afetando sua popularidade, não em caráter definitivo, mas mostrando que tem potencial para atrapalhar os planos, caso não seja controlada. Está todo mundo inquieto, querendo interpretar as nuvens da política. Se a oposição entrar em 2014 com chances de interromper a sequência do PT no poder, de nada adiantará ter uma base formal de 80% do Congresso que tudo irá pelos ares.
No fundo, no fundo, essa base aliada não é do governo, muito menos do PT. É de conveniência, inclusive o PMDB. E não será surpresa se o PMDB voltar a se dividir. A união do PMDB só aconteceu no momento em que parecia infindável a predominância petista no cenário político nacional. Se houver alguma indicação de que isso pode não acontecer, vários setores regionais importantes podem se desgarrar.
A sensação de que o modelo pode ter esgotado sua capacidade de atuação, decadente sem ter chegado ao apogeu, pode estimular traições. É impossível contar com uma lealdade da base aliada se o que une a maioria dos partidos ao governo não é uma questão ideológica, mas interesses específicos, imediatos ou de longo prazo, mas sempre interesses políticos que independem da lealdade para se realizar. Às vezes, dependem até mesmo de uma traiçãozinha básica.
A culpa desse relacionamento esquizofrênico é do próprio governo, que não perde a oportunidade para demonstrar seu desprezo por esses aliados de ocasião e, sobretudo, pela atuação do Congresso, que considera um mero instrumento de seus desejos, e não um Poder em igualdades de condições.
O ex-presidente Lula, embora tenha saído de sua única experiência congressual na Constituinte de 1988 convencido de que havia 350 picaretas entre os deputados, logo entendeu que além de cooptá-los através de favores diversos, teria também que fingir considerá-los honoráveis parceiros de jornada, dar-lhes espaço e apoio político para que atuassem sem serem incomodados.
Sua compreensão de como se dá esse jogo de toma-lá-dá-cá faz muita falta hoje em dia em que, provavelmente reproduzindo o sentimento da presidente, os articuladores políticos do governo dão aos parlamentares a importância que julgam que têm, isto é, nenhuma.
No momento em que é o presidente do Senado, Renan Calheiros quem dá lições institucionais à ministra Chefe do Gabinete Civil Gleisi Hoffman, fica estabelecido que as relações entre Palácio do Planalto e base parlamentar não andam às mil maravilhas. E é só de uma desculpa que políticos precisam para saltar do barco se for prudente, diante não de uma honra atingida, mas da perspectiva de perda de poder.
Nada funciona mais nesse mundo de relações tão superficiais do que a expectativa de poder ou, melhor dizendo, a expectativa de perda de poder.
Publicado aqui, no Blog do Merval.