Campos dos Goytacazes, 29/06/2018
Crítica de cinema — Cineclube Goitacá mergulha em Fernão Capelo Gaivota
Fernão Capelo Gaivota — O cineclubismo tem sua origem na França na década de 20 do século XX. No Brasil, ele surge em 1929 com o Cineclube Chaplin Club no Rio de Janeiro. Se dedica à exibição de filmes, promove discussões e análises sobre o cinema entre seus participantes (amantes da Sétima Arte) e foi responsáveis pela formação cinematográfica de grandes cineastas, entre os quais se podem destacar Glauber Rocha, Cacá Diegues, Jean-Luc Godard e Wim Wenders .
Em Campos dos Goytacazes, o Cineclube Goitacá que conta com a participação de universitários, médicos, advogados, dentistas, jornalistas, professores, produtores culturais, artistas e outros cinéfilos, reúne-se às quartas-feiras a partir de 19h30, no confortável e intimista Espaço Oráculo — 5º andar do edifício Medical Center, espaço com 30 lugares. Em sua programação, que sempre inicia com a exibição de curta metragem e logo depois um convidado que indica, apresenta e comanda o debate após a exibição, já foram exibidos filmes premiados nacional e internacionalmente, documentários, animações e clássicos da história cinematográfica, não necessariamente filmes de sucesso unânime de público e de crítica. Aí que os debates e análises ficam mais acirrados e interessantes.
Na próxima quarta-feira (29/04) o longa-metragem exibido, com apresentação do Sr. Peter Lamers, holandês radicado na planície goitacá, será “Fernão Capelo Gaivota” (“Jonathan Livingston Seagull” — no original). Uma produção da Paramount Pictures de 1973, com roteiro, produção e direção de Hall Bartlett, fotografia de Jack Couffer, trilha sonora de Neil Diamond e montagem de Frank P. Keller e James Galloway.
Adaptação cinematográfica espiritualista, que marcou uma geração e transformou o romance homônimo de Richard Bach num best-seller que vendeu 40 milhões de cópias e viajou por 70 países do mundo. A história é centrada em uma gaivota, de nome Fernão, que um dia decide que voar não deve ser apenas uma forma para a ave se movimentar. A história desenrola-se sobre o fascínio de Fernão pelas acrobacias que pode modificar e como isso transtorna o grupo de gaivotas do seu clã. A gaivota, que não se contenta em voar apenas para comer, tem prazer em voar e esforça-se em aprender tudo sobre vôo. Por ser diferente do bando, é banido. Em momentos complexos do enredo, notamos a arte do fotógrafo traduzindo as impressões de Fernão Capelo em seus vôos ascendentes. Cenas como a que vemos um bando de gaivotas sobre o lixo, contrastam com as tomadas de Fernão em pleno vôo, em que se dissolvem no céu uma matiz viva de luzes e sombras, evidenciando o caráter elevado da condição de Fernão em relação aos seus companheiros.
As cenas aéreas (são maioria) captadas por Hall Bartlett e Jack Couffer para contar os experimentos acrobáticos de Fernão junto ao seu bando e sua jornada de ida e volta em busca da perfeição pós-banimento, foram feitas com helicóptero (na época não existia a tecnologia dos drones), com imagens magníficas de vôos rasantes das aves ao pôr e nascer do sol à beira de penhascos, arrebentações de ondas em rochas, áreas desérticas, florestas cobertas de neve e até no lixão, quando aparecem os únicos registros com humanos — os operadores de máquinas. Como resultado a produção foi indicada ao Oscar 1974 para melhor fotografia e melhor montagem.
Com a excelente trilha sonora, o lendário Neil Diamond, depois de quase um ano de muita dedicação com sua equipe, lançou o LP Jonathan “Livingston Seagull” (1973) que voou direto para o topo da Billboard, ficando em 2º lugar. O disco acabou por vender 2 milhões de cópias nos EUA e por quatro anos deteve o recorde da trilha sonora mais bem-sucedida da história, até ser atropelada por “Embalos de sábado à noite” (1977). No Globo de Ouro de 1974, Neil Diamond foi nomeado para o “Best Original Song” (“Lonely Looking Sky”) e levou o cobiçado prêmio de “Best Original Score”. E não só: em 2 de março, na noite dos Grammys, Neil também levou a melhor, deixando dois pesos pesados do rock — Paul McCartney (Com “007 Viva e Deixe Morrer”) e Bob Dylan (“Pat Garrett e Billy the Kid”) — comendo poeira.
A recepção da crítica, na época de seu lançamento (1973), não foi nada favorável e chegou a ser descrito por Roger Ebert como “a maior enganação pseudo-metafísica do ano”. Na época, a Time arrasou o filme e sua “teosofia vomitante”. Depois de desdenhar a sua “pieguice”, o resenhista do New York Magazine conclui que o filme “é o tipo de lixo que só uma gaivota pode gostar”. O filme continua a ser mencionado todo ano na lista dos piores já feitos. A maioria das críticas bate na mesma tecla: dar voz aos monólogos internos de Fernão é um caso de vergonha alheia, um dos piores da história. Dói na alma ouvir as gaivotas trocando aforismos “iluminados”.
Fernão Capelo Gaivota é realização visionária, uma fábula sobre evolução espiritual que fala com sensibilidade dos desejos e fracassos humanos. No ato de voar de Fernão, ricas metáforas para a condição dos homens que compartilham o mesmo sonho da busca interior pela plena realização.
Exibição e debate de quarta-feira no Cineclube Goitacá serão viajantes.
Publicado hoje na Folha Dois
Confira o trailer do filme:
Vozes d’África ecoam no Brasil e América Latina
“É natural que todos queiram saber se Dilma cai ou não cai. Infelizmente, inúmeras outras desgraças se anunciam nas nuvens. No tempo em que a esquerda se dizia marxista, pelo menos era possível discutir o mundo. A passagem ao bolivarianismo estreitou seus horizontes ao nível mental de tiranetes sul-americanos, tão bem descritos pelo próprio Marx. Ainda por cima, inventaram uma presidente que não gosta de política externa”.
Leia aqui a íntegra do artigo publicado hoje no Blog do Gabeira
Crítica de cinema — Sem condescendência de província
7Solidões — Se iniciativas como o Cineclube Goitacá, toda quarta no Oráculo, e o Cine Jornalismo, um sábado por mês na Associação da Imprensa Campista (AIC), têm funcionado como espaços de resistência, no sentido de estimular o debate sobre arte e cultura no município — ainda que, no segundo caso, se tenham passado outras seis edições anuais (confira retificação aqui) antes de finalmente surgir alguém com conhecimento de jornalismo e cinema o suficiente para finalmente exibir (ontem) o necessário “A montanha dos sete abutres” (1951), do mestre austríaco Billy Wilder —, o que dizer do fazer cinema em Campos?
Presidente da AIC, Vitor Menezes contou com apoio do Sindipetro do qual é assessor para dirigir um longa de documentário também necessário: “Forró em Cambaíba” (2013). Nele, o jornalista prevaleceu sobre o cineasta no equilíbrio entre a denúncia de utilização dos fornos da antiga usina para queima de corpos de presos políticos mortos, durante a Ditadura Militar (1964/85), e a autofagia homicida das ações do MST em seu acampamento na mesma usina, em pleno regime democrático. Mas se a realidade não permite mais ilusões em nenhum lado da nossa sociedade, como fica nela o cinema de ficção?
Numa cidade onde até a inauguração das novas salas Kinoplex, no Shopping 28, as salas do Cine Araújo, no Shopping Boulevard, só exibiam filmes estrangeiros em versão dublada, na pressuposição de que espectador de cinema em Campos é analfabeto, há a possibilidade de aqui se fazer cinema não só falado em português pelos lábios da tela, como ainda por cima com pretensão de arte? Na tradução por escrito, sem dublagem, do alemão do filósofo Friedrich Nietzsche à língua do escritor campista José Cândido de Carvalho, a resposta é dada logo na abertura de “7Solidões”, novo filme de Carlos Alberto Bisogno: “E aqueles que foram vistos dançando foram julgados insanos por aqueles que não podiam ouvir a música”.
Exibido ao público pela primeira vez em alto-mar, na plataforma Pampo PPM-1, no dia 18, já que seu diretor, produtor, roteirista, montador, fotógrafo e mixador é mais um que divide a função de cineasta com as atividades profissionais ligadas à extração de petróleo na Bacia de Campos, “7Solidões” terá sua estreia no continente em outro espaço de resistência na arte e na cultura do município, não só no cinema, como em teatro e música: o Serviço Social da Indústria (Sesi). Capitaneado pelo incansável Fernando Rossi, na próxima quarta, dia 29, a partir das 20h, o Teatro do Sesi exibirá o filme considerado por Bisogno seu primeiro longa, não pela duração inferior a 50 minutos, mas por sua estrutura, que realmente o distingue de “Efígie” (2009), “Vertigem” (2010), “A serpente e o corvo” (2011) e do promissor “Neve negra” (2011), curtas de ficção anteriores do diretor.
Em seu mais recente trabalho, sempre marcado pela câmera contemplativa, muitas vezes lenta, tão distante de Hollywood quanto um dos seus grandes diretores contemporâneos, Terrence Malick, e dotado de um senso de fotografia brilhante, bebendo em fartos goles no gargalo do mestre brasileiro Walter Carvalho, toda a dança mostrada na tela tem como eixo um protagonista em três tempos. Na infância, interpretado por Gael Nunes (filho de Bisogno com sua assistente de fotografia e esposa, a jornalista Lívia Nunes); na juventude, por Rudá Sanchéz; e na velhice por Orávio de Campos Soares. Este, diretor consagrado há décadas no teatro campista se revela uma grata surpresa, em sua maturidade, como ator de cinema. Na narração em off do começo do filme, a voz de Orávio pergunta mais de uma vez: “Qual é a cor da nossa memória?”.
Nos tons esmaecidos da fotografia refinada, na busca de uma luz europeia sob sol tropical, a cor da pele dos três atores é do mesmo barro carreado pelo Paraíba do Sul que deságua e tinge o oceano Atlântico neste pedaço de litoral. Ao lado sul do rio, entre as ruínas de Atafona, o personagem anônimo de Rudá passeia com a amada, vivida por Maria Clara Oliveira. Em contrapartida, navegando contra o tempo da narrativa, à margem norte do Paraíba, o pequeno Gael tem o parque eólico de Gargaú como fundo da infância do protagonista junto aos pais, interpretados por Paolla Souza e Tonin Ferreira, em seu segundo bom trabalho no cinema sob mesma direção, mais uma vez contido no histrionismo, após estrelar “Neve negra”.
Mas se Orávio e Tonin aparecem bem, ambos estão em pontas extremas e opostas ao tempo que preenche no centro a maior parte do filme. E nem é preciso entender muito de cinema para perceber que não rolou química de casal entre Rudá e Maria Clara. Ainda na bela externa à beira mar de Atafona, na qual aparecem juntos pela primeira vez, os dois não conseguem sincronizar direito nem os rodopios de dança que tentam dar um no outro enquanto caminham pela areia.
Na mesma sequência, entre o mar e as ruínas das casas por ele destruídas, quando a câmera dá a sorte de enquadrar o casal junto ao acaso de um vira latas passando lento em sentido contrário, Maria Clara primeiro segura o vestido que corria o risco de levantar com o vento, para depois virar o rosto quando Rudá tenta beijá-la. Com pudores absolutamente descabidos numa atriz, em direção oposta à do cão e das cordas que sobem a Sinfonia nº 3 de Henryk Górecky, na música de fundo, ela mata o que poderia ser uma grande cena da sua personagem — e do filme.
Curiosamente, onde o casal vai demonstrar melhor entrosamento é nas cenas de sexo, com movimentos vigorosos dos corpos sob uma ducha fraca, dentro do banheiro do apartamento, enquanto vagueiam pelo corredor e sala três amigos: Bruno Alves, Carolina Muylaert e o violeiro Roberto Sávio. É então que se dá o melhor momento desse núcleo jovem, quando Bruno lê no livro “Ilusões perdidas”, de Honoré de Balzac, o solilóquio do “ser ou não ser”, de Shakespeare em “Hamlet”. Sentindo o que seu personagem lê, independente de onde, ele acentua o tom da voz à porta do banheiro fechada por dentro, enquanto ecoa seu lamento shakespeariano aos ofegantes e mudos Maria Clara e Rudá: “A agonia do amor não retribuído”.
Ao som de “Where did you sleep last night”, do Nirvana, é nessa agonia que se revela a traição passada, no quarto materno do agreste de São Francisco, numa perseguição de sina até o presente, nos corredores da UFF-Campos. Entre os dois tempos e margens do mesmo rio, o lamento de Hamlet encontra refrão na voz pungente e rascante de Kurt Cobain: “Minha garota, minha garota, não minta para mim/ Me diga onde você dormiu a noite passada”.
“A vida é um encontro de solidões”, diz Orávio, na última fala do filme. E muitas vezes os encontros, sobretudo se reencontros, só são possíveis com o perdão ao outro, ao passado, a nós mesmos. Se não livra ninguém da morte ao final, até lá esse perdoar pode ofertar redenção a toda uma vida. Nesse acerto de contas entre a mãe encarnada madura por Adriana Medeiros e o filho Rudá, alcançado pela dúvida do pai morto, se dá não só a ruptura com essa sina, como são paridas as cenas mais plásticas do filme, em pleno Cemitério do Caju, numa concepção gráfica impensada a um cinema que vive e respira em Campos.
Todavia, visivelmente preocupada com a articulação das palavras, Adriana não consegue conferir às sílabas, no cinema, a mesma naturalidade de uma das atrizes mais respeitadas no teatro de Campos. E essa dificuldade pode ser tanto da (ainda) pouca intimidade de atores de palco com a marcação completamente diferente da câmera, quanto da imposição talvez demasiada do roteirista, que igualmente (ainda) não brilha na construção de diálogos ou na direção de atores, como faz em fotografia e cenografia.
Adriana não teria culpa, por exemplo, se um roteiro preocupado demais com o pedantismo gramatical entre próclise e ênclise lhe impusesse: “Lembro-me que sua avó me dizia”. Para um filme de 2015, na boca de uma personagem do povo em tempo presente, o paralelepípedo soaria neolítico, sobretudo se lembrado que há 91 anos, desde 1924, o nosso modernista Oswald de Andrade já advertia em seu famoso poema “Pronominais”: “Dê-me um cigarro/ Diz a gramática/ Do professor e do aluno/ E do mulato sabido/ Mas o bom negro e o bom branco/ Da Nação Brasileira/ Dizem todos os dias/ Deixa disso camarada/ Me dá um cigarro”.
Entretanto, como se trata do mesmo diálogo onde Adriana também diz “Nunca irá faltar trabalho para ele”, no exato momento em que a câmera corta para o enquadramento de um lavrador conduzindo um arado puxado por boi, em meio ao canavial, tudo entalhado no mármore branco de uma lápide, encontrar com a solidão desse cinema deveria ser necessidade coletiva desta taba goitacá.
Pelo todo da obra, Mateusinho pensou em dar três estrelas, mesmas que daria em separado ao roteiro, mas que seriam cinco caso a análise fosse só à fotografia, ou duas, se o julgamento se ativesse ao conjunto das interpretações. Porém, sem nenhum dinheiro e apoio, num cinema feito de superação, sobretudo por parte do seu realizador, que talvez acumule a solidão de tantas funções por não ter a quem delegá-las, sem negar brilho estético à sua artesania, a avaliação final rejeita qualquer condescendência de província.
Publicado hoje na Folha Dois
Confira o trailer do filme:
Artigo do domingo — Empreguismo pôs Campos à beira da falência
Por Wilson Diniz e Ranulfo Vidigal (*)
Quando buscamos identificar as prioridades de uma administração municipal é importante avaliar o comportamento das receitas e a aplicação das políticas públicas, através dos gastos. Com base nos dados publicados relativos aos anos de 2013 e 2104 no Portal da Transparência e no Balanço Orçamentário do primeiro bimestre de 2015 o discurso e realidade parecem muito diferentes. O que mais ouvimos na cidade de Campos nos últimos meses é que a crise nacional e o preço do petróleo reduziram drasticamente a receita municipal — já em 2014 forçando o poder público a tomar recursos por empréstimo, para fazer face à esta nova realidade.
Sabemos todos que Campos dispõe de um orçamento fiscal volumoso, superando capitais brasileiras e cidades de porte médio como Niterói e tantas outras do interior paulista. É uma arrecadação que se coloca entre as 20 maiores, comparando-se com as 5.554 prefeituras do país.
Então vejamos alguns detalhes interessantes que põem por terra o argumento de “crise latente”, em 2014. A arrecadação total observada no ano eleitoral de 2014 (excetuando-se o empréstimo junto ao Banco do Brasil de R$ 250 milhões), foi recorde na história da capital do açúcar e dos royalties do petróleo, somando 2,506 bilhões de reais e crescendo nominalmente 4,2%.
Na nossa interpretação, a crise de fato somente chegaria aos cofres do poder público, no primeiro bimestre de 2015, quando de acordo com os dados do balanço orçamentário publicado pela prefeitura no Diário Oficial neste mês de abril, a arrecadação caiu, em termos nominais, 24,1% (forte!). Embora em março último essa tendência tenha se mantido, a alta recente do dólar frente ao Real e a nova faixa de preços do barril de petróleo no exterior, nos níveis entre US$ 55 e US$ 65, pode minimizar parte da perda imaginada originalmente. O fato negativo é a crise de governança na Petrobras e a queda de produção da produção do pós-sal na Bacia de Campos.
Uma primeira observação que se coloca. Mesmo com a queda paulatina da cotação internacional do petróleo amplamente divulgada, ao longo do segundo semestre de 2014, o ritmo de gasto mensal (despesas pagas) até dezembro de 2014 foi intenso, de modo tal, que entre somou R$ 2,589 bilhões, crescendo 12,7% — o dobro da inflação de 6,4% no ano de 2014. Ou seja, três vezes mais do que o observado no comportamento da arrecadação. Vale destacar que, mesmo que com a queda expressiva da receita orçamentária (fruto da redução da indenização do petróleo) no primeiro bimestre de 2015, a despesa continuou intensa nos dois primeiros meses do ano atual — pois praticamente foi igual, na comparação com o primeiro bimestre de 2014. Ufa!
Diante destes números, veio a dúvida: teria sido o investimento em obras o motivo da expansão total dos gastos? A resposta a esta indagação, contudo, não vamos encontrar neste item — onde a despesa paga totalizou 393 milhões — e que em comparação com o ano de 2013 apresentou um crescimento nominal de apenas 1,4%. O gasto com obras manteve o comportamento relativo de anos anteriores e representou 15% do gasto total da Prefeitura. Vale ressaltar que o investimento é positivo, na medida em que o mesmo expande a capacidade instalada da infraestrutura da cidade — na forma de estradas, casas populares e demais equipamentos urbanos e rurais.
Diante desta constatação, chegamos preliminarmente à conclusão de que “o inchaço da máquina” explicaria a expansão exagerada/eleitoreira do gasto fiscal da Prefeitura de Campos. Primeiro, olhamos o gasto total com os contratos com empresas que promovem terceirização de mão de obra. Esses somaram, em 2014, R$ 720 milhões e, comparando-se com 2013, apresentaram um crescimento explosivo de 21% — ou seja, muito acima da despesa total (mais 12,7%) e muito acima da inflação 6,4%.
Apenas para ilustrar e mostrar nosso raciocínio, o gasto mensal com terceirização de pessoal em janeiro de 2013 somava R$ 19 milhões, enquanto em setembro de 2014 já somava R$ 60 milhões. Nesse contexto é pouco provável que a qualidade dos serviços públicos na nossa cidade tenha melhorado no mesmo ritmo explosivo das contratações, o que me faz supor e predominou apenas o “empreguismo”. Confirmando esse diagnóstico, o poder público recentemente demitiu quase 4 mil empregados terceirizados.
Outra conta analisada por nós refere-se ao pagamento mensal relativo aos servidores concursados da Prefeitura na sigla “Pessoal Civil”. Sabemos todos que muitos concursados foram admitidos no período recente — o que podemos considerar positivo, tanto para qualidade da maquina publica, quanto da futura memória das políticas públicas municipais.
Essa rubrica somou, em 2014, o montante de R$ 762 milhões e cresceu 27%, em relação a 2013. Vejamos uma comparação interessante: enquanto a terceirização, através de empresas privadas custaria, em 2014, 36% do gasto total, a conta relativa aos servidores estáveis custou apenas 29% do gasto total. Fica clara a opção do poder publico local pela contratação terceirizada. Somando os dois tipos temos 65% do gasto total.
Outra questão muito importante e grave. Se a Prefeitura não tivesse obtido o empréstimo junto ao Banco do Brasil (cujos encargos financeiros vão custar a sociedade quase R$ 50 milhões) não fosse concluído, a administração municipal atingiria um percentual entre o gasto com a folha salarial e a receita corrente líquida (definida pela Lei de Responsabilidade Fiscal em no máximo 54%) na faixa explosiva de 70% extrapolando o limite confortável definido pela legislação em vigor.
Nesse contexto, a crise fiscal revela graves contornos e sua resolução tende a gerar forte recessão em nossa economia local, com reflexos na geração de empregos no comércio, serviços e construção civil.
(*) Economistas e analistas políticos
Publicado hoje na Folha da Manhã
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