Chappie — Um robô projetado inicialmente para ser policial em Joanesbugo descobre ter uma alma. O seu criador modificou sua programação para que nasça tão cândido quanto um bebê, e para que aprenda acerca da vida da mesma forma que uma criança faz, embora muito mais rápido. Entretanto, o inocente robô perceberá que o mundo dos humanos é sórdido e cruel, e deverá se reprogramar se quiser sobreviver e proteger à sua “família”. Em paralelo, um cientista da mesma corporação onde Chappie foi construído tentará impor um outro modelo de robô-policial, e para isso deverá destruir o nosso herói de metal.
Se “Chappie”, o novo filme do sul africano Neil Blomkamp, fosse um filme dos estúdios Universal na década de 40, ele se chamaria “Pinocchio meets Robocop”. Mas se poderiam colocar nesse título os nomes dos andróides de “Blade Runner” e “AI — Inteligência Artificial”, ou os personagens de “O Incrível Robô” e “Frankenstein”. O que temos aqui é a velha história do monstro que não apenas se descobre mortal, mas também capaz de sentir emoções como amor, raiva e compaixão.
Hugh Jackman, o astro de X-Men, interpreta aquele cientista obcecado em sabotar o robô, no que talvez seja o seu primeiro papel como vilão. Sigourney Weaver aparece totalmente subaproveitada como a CEO da corporação que fabrica os andróides, e Dev Patel, o garoto de “Quem Quer ser um Milionário”, é o “Gepetto” de Chappie, ou seja, o seu criador.
Curiosamente, o ator que mais se destaca é aquele que não aparece em todo o filme: Sharlto Copley o compatriota de Blomkamp. Para dar vida ao andróide, os técnicos utilizaram os movimentos, os gestos e as falas de Copley, que foram gravados e posteriormente “copiados” em CGI (animação digital). O resultado é surpreendente: um robô feito de cabos e ferro que se expressa e se move com a plasticidade de um humano.
Blomkamp se utiliza de todas as inspirações cinematográficas anteriormente mencionadas e cria um pastiche deliberadamente absurdo e exagerado. Portanto, para curtir o filme, o espectador deverá entrar na mesma sintonia grotesca da história, e só assim poderá engolir um robô de aparência ameaçadora se comportar como um nenezinho, implorando por sua mãe adotiva quando assustado.
Na carreira do jovem diretor constam dois filmes. O primeiro foi “Distrito 9”, uma alegoria ao sistema de apartheid instaurado no seu país, onde a discriminação se focava num grupo de alienígenas literalmente caídos na Terra. O sucesso desse filme projetou Blomkamp para Hollywood, aonde viria a realizar a sua segunda fita: “Elysium”, com Matt Damon e Wagner Moura(!) — outra ficção científica que falava sobre sociedades separadas por um sistema de castas opressivo. O primeiro filme foi uma agradável e original surpresa; o segundo, uma mega produção sem alma.
Neste terceiro trabalho, os críticos acusaram Blomkcamp de se repetir mais uma vez, além de copiar descaradamente outros filmes. Entendo que parte do problema está na expectativa da platéia, que pode ser induzida ao erro de pensar que irá assistir um filme de ficção científica “sério”. “Chappie” certamente não o é, ou pelo menos, não deveria ser apreciado assim. Nesse sentido, há nele um destemor ao ridículo próprio do primeiro Robocop, do cínico diretor Paul Verhoeven. Será que isso conta como plágio, também?
Publicado hoje na Folha Dois
Confira o trailer do filme: