Crítica de cinema — Mais do mesmo

Quadros por segundo

 

Divergente insurgente

 

Mateusinho 2Adaptação ao cinema do segundo livro da trilogia “Divergente” (“Divergent”, 2011-2013), “A série Divergente: Insurgente” (“The Divergent series: Insurgent”, 2015) retorna ao mundo distópico e pós-apocalíptico criado pela romancista americana Veronica Roth e reinterpretado, aqui, pelo diretor alemão Robert Schwentke, de “Red: Aposentados e perigosos” (“Red”, 2010), e os roteiristas Brian Duffield, Akiva Goldsman e Mark Bomback, que nunca escreveram nada muito digno de nota.

O filme segue a história de onde o primeiro parou, após um ataque a um dos grupos que compõem a ordem social da Chicago futurista. O ato abala a paz alcançada depois de toda uma história de conflitos humanos com a divisão da sociedade em cinco facções, dedicadas a virtudes contrárias aos fatores que seus membros acreditam terem sido responsáveis pela ruína do passado e entendidas como fundamentais para evitar novas cisões: Abnegação, que ataca o egoísmo; Erudição, que se opõem à ignorância; Audácia, que condena a covardia; Amizade, que culpa a agressividade; e Franqueza, que desfaz da duplicidade.

Caçados pelo crime, a protagonista Tris Prior (Shailene Woodley), que guarda um segredo que pode lhe custar a vida, Four (Theo James), ambos da Audácia, e o irmão de Tris, Caleb Prior (Ansel Elgort), da Erudição, buscam se manter vivos enquanto traçam um plano para chegar a Jeanine Matthews (Kate Winslet), líder da Erudição, verdadeira responsável pelo atentado, e que manobra traidores de sua própria facção e da dos jovens para detê-los.

O conflito de gerações, a rebeldia e a intolerância com o diferente são os motes principais da trama, que trabalha poder e autoridade de forma rasa, com conflitos e perdas emocionais diluídos em ação banal. Embora beba em fontes preciosas como “1984” (“Nineteen Eighty-Four”, 1949), de George Orwell, e “Fahrenheit 451” (Idem, 1953), de Ray Bradbury, para desenhar suas pretensamente complexas formas de controle social, “A série Divergente: Insurgente” se desenvolve em uma realidade tão apática quanto as abundantes luzes fluorescentes que compõem os cenários de apelo mais futurista, como o quartel general da Erudição. De fato, a direção de arte replica cores e recursos já exauridos em filmes de ficção científica, apostando em veículos e prédios de design pouco inventivos, bem como em hologramas e telas transparentes para lá de manjadas.

Além disso, nas mãos de Schwentke, a história torna-se mera desculpa para um desfile de efeitos especiais, que amarram bons novos atores, como Woodley e Miles Teller, e veteranos Kate Winslet (subaproveitada em papel insosso) e Naomi Watts. O texto é, muitas vezes, fraquíssimo e expositivo em excesso, redundando ações que, justamente por estarem sendo mostradas, não precisam ser explicadas. O roteiro também foge de qualquer desenvolvimento psicológico mais profundo que os traumas de maternos de Tris e Quatro.

De bom, a confirmação de uma tendência evidenciada por “Jogos vorazes” (“The hunger games”), outra série que adapta livros infanto-juvenis: ao contrário do que sempre foi defendido pelos executivos de Hollywood, filmes protagonizados por mulheres podem, sim ser sucesso de público.

 

Mateusinho viu

 

Publicado hoje na Folha Dois

 

Confira o trailer do filme:

 

 

Após a delação, as provas — Barusco entrega registro da propina paga no Petrolão

 

Por Ricardo Brandt, Julia Affonso e Fausto Macedo

 

O ex-gerente de Engenharia da Petrobrás Pedro Barusco entregou à Operação Lava Jato os documentos que guardava de depósitos da offshore Constructora Internacional Del Sur, usada pela empreiteira Norberto Odebrecht para pagar propina no esquema de cartel e corrupção na estatal.

A conta de Barusco que recebeu valores da Odebrecht foi a aberta em nome da offshore Pexo Corporation, que ele registrou em 2008.

O delator afirmou aos investigadores da Lava Jato que conseguiu “identificar o recebimento de quase US$ 1 milhão depositados pela Odebrecht” nesta conta.

Pelo menos dez depósitos para a offshore de Barusco foram contabilizados ao longo de 2009 e cópias dos registros de depósitos entregues à Lava Jato.

A Constructora Del Sur, aberta no Panamá, fez pagamentos diretos ao ex-diretor de Serviços Renato Duque – braço no PT no esquema –, em 2009 em nome de uma conta que era controlada por ele. A descoberta foi feito no bloqueio da fortuna de 20 milhões de euros que ele mantinha no Principado de Mônaco.

Ex-gerente da Petrobrás Pedro Barusco guardou prova envolvendo a Odebrecht (Foto de Ueslei Marcelino- Reuters)
Ex-gerente da Petrobrás Pedro Barusco guardou prova envolvendo a Odebrecht (Foto de Ueslei Marcelino- Reuters)

 

Foram dois depósitos na conta de Duque aberta em nome da offshore Milzart Overseas Holdings Inc., do Panamá, totalizando US$ 875 mil. Os valores vieram de uma conta da Constructora Internacional Del Sur, no Credicorp Bank, em Genebra.

Em novo depoimento ontem à Justiça Federal, o doleiro Alberto Youssef, confessou que a Odebrecht também usou Construtora Internacional Del Sur para movimentar propina em sua lavanderia.

“Odebrecht e Braskem (sociedade entre a empreiteira e a Petrobrás) era comum fazer esses pagamentos (de propina) lá fora, ou ela me entregava em dinheiro vivo no escritório da São Gabriel”, afirmou o doleiro em audiência na Justiça Federal no Paraná nesta terça-feria 31.

“Uma vez recebi uma ordem, não me lembro se foi em uma das contas indicadas por Carlos Rocha (doleiro Carlos Alberto Souza Rocha, também alvo da Lava Jato) ou Leonardo (Meirelles, outro réu da operação), da Odebrecht que a remessa foi feita pela construtora Del Sur”, relatou. Segundo o Youssef, ele teria recebido pagamentos por meio dessa empresa “umas duas ou três vezes”.

Documento. A Lava Jato já sabe que Barusco era braço direito e espécie de contador da propina de Duque na Diretoria de Serviços. Por meio dela, o esquema arrecadava de 2% a 3% nos contratos da estatal. Parte ficava com os dois e parte ia para o PT.

 

Cópia de registro de depósitos de offshore Constructora Del Sur para conta de Barusco
Cópia de registro de depósitos de offshore Constructora Del Sur para conta de Barusco

 

Os documentos e depoimentos colhidos até agora na Lava Jato complicam a vida da Odebrecht e de seus executivos. Barusco e o ex-diretor de Abastecimento Paulo Roberto Costa apontaram os executivos do grupo Rogério Santos Araújo e Márcio Faria da Silva como os responsáveis pelos pagamentos no exterior.

Costa diz ter recebido US$ 23 milhões da empreiteira por meio de transferências para a Suíça. O doleiro Bernando Freiburghaus, que mora na Suíça, é peça-chave nessas investigações. Era ele quem operava parte dessas contas na Europa.

VEJA DOCUMENTOS DE DEPÓSITOS PARA PEDRO BARUSCO

VEJA DOCUMENTO DE DEPÓSITOS PARA CONTA DE RENATO DUQUE

 

Com a palavra, a Odebrecht

A Odebrecht reiteradamente tem repudiado com veemência as suspeitas lançadas sobre sua conduta. A empreiteira nega taxativamente ter pago propinas no esquema Petrobrás.

Em nota  divulgada anteriormente, quando seu nome foi citado, a Odebrecht destacou: ”A empresa não participa e nunca participou de nenhum tipo de cartel e reafirma que todos os contratos que mantém, há décadas, com a estatal, foram obtidos por meio de processos de seleção e concorrência que seguiram a legislação vigente”.

 

Publicado aqui, no Blog do Fausto Macedo

 

 

Crítica de cinema — Obsessão previsível

Bagdá Café

 

O garoto da casa ao lado

 

Mateusinho 2O garoto da casa ao lado — Desde “Psicose” (1960), dirigido pelo mestre do suspense Alfred Hitchcock e estrelado por Anthony Perkins, um dos assuntos frequentemente abordados no cinema é a trajetória de psicopatas, cuja maior representação continua a ser Norman Bates. “Bates Motel” (2013), criada por Antonio Cipriano e baseada na obra de Hitchcock, “O silêncio dos inocentes” escrito por Thomas Harris e publicado em 1988, e dirigido por Jonathan Demme e lançado em 1992 – e “Paranoia” (2007), de D.J. Caruso, são algumas peças de ficção que se tornaram conhecidas pelas narrativas que apresentam relações doentias entre os protagonistas e as pessoas que os cercam.

Apesar do não ineditismo quanto ao enredo, o filme “O garoto da casa ao lado” oferece ao espectador mais uma oportunidade de apreciar o suspense característico que cerca os roteiros sobre psicopatas. Dirigido por Rob Cohen, o longa-metragem conta a história de Claire Peterson (Jeniffer Lopez), uma professora de Literatura Clássica que está separada do marido, Garrett (John Cobertt), e vive com o filho Kevin (Ian Nelson).

Em uma tarde, a mulher conhece o solícito, gentil e educado Noah Sandborn (Ryan Guzman). Sobrinho-neto de um homem impossibilitado de andar, o rapaz demonstra carinho e extremo cuidado com o idoso e com Kevin, comovendo Claire, que passa a olhá-lo com interesse. Tais características são prenúncios da verdadeira personalidade do jovem, que se mostra agressivo e pela protagonista após os dois se envolverem sexualmente em uma noite — cena marcada pelo erotismo apelativo.

Exatamente como esperado nos longas-metragens do gênero, o filme se desenrola a partir das ações doentias e obsessivas de Noah, que começa a perseguir Claire e a família. Apesar de ser alertada por Vicky Lansing (Kristin Chenoweth), vice-diretora da escola onde trabalha, a professora não percebeu o jeito doentio do novo vizinho. Ele se torna uma referência para Kevin e destrói o relacionamento do garoto com o pai.

O roteiro, de Barbara Curry, não apresenta novidades. É possível que o público, nos primeiros minutos do filme, trace o destino dos personagens principais sem grandes dificuldades. O suspense existente na história é possibilitado não pelo enredo, mas pelo trabalho de fotografia. As cenas, especialmente durante o clímax da narrativa, são escuras e, com o auxílio da trilha sonora em certos momentos, tornam o ambiente denso e angustiante. Os enquadramentos escolhidos para a gravação também favorecem a tensão, principalmente quando há opção pelo plano detalhe e primeiro plano, valorizando expressões e gestos dos atores.

As opções estéticas, no entanto, não escondem os buracos existentes no filme. Um aspecto mal explicado em “O garoto da casa ao lado” é o Sr. Sandborn, tio-avô de Noah. Adoentado, o personagem aparece nas primeiras cenas — impossibilitado de andar — e nas últimas — caminhando normalmente. Todo o percurso feito pelo idoso é apenas comentado em poucos diálogos. Com isso, ele é apresentando como figurante, que poderia ser descartado a qualquer momento, e não como o ponto-chave para o aparecimento do sobrinho-neto psicopata. Além disso, o desfecho da história é extremamente desinteressante e permanece aquém das possibilidades de inovações do enredo, que, após atingir o ápice, com cenas de ação e tensão –típicas do gênero –, deságua em um fim medíocre e insosso, deixando, no espectador, a sensação de frustração.

 

Mateusinho viu

 

Publicado hoje na Folha Dois

 

Confira o trailer do filme: