7Solidões — As atividades que envolvem a economia criativa vão da gastronomia ao audiovisual, passando pela arquitetura, artes cênicas, design, moda e publicidade. Ou seja, todos os processos que envolvam criação, produção e distribuição de produtos e serviços que utilizem o conhecimento, a criatividade e o capital intelectual como principais recursos produtivos.
No Estado do Rio de Janeiro, a economia criativa representa 4,1% do PIB, acima da média nacional e o maior percentual entre os estados brasileiros. No caso específico do cinema, tema da nossa coluna, os filmes feitos por empresas do Rio representam cerca de 60% das estreias nacionais e 94% da renda e do público totais do cinema brasileiro. Cerca de 50% das produções audiovisuais estrangeiras no Brasil são feitas no Estado.
Enquanto isso, aqui no Norte Fluminense, em Campos dos Goytacazes, vivemos no deserto das políticas públicas de incentivo à capacitação (cursos e oficinas), produção (toda cadeia produtiva da indústria cinematográfica) e difusão (mostras e festivais) do audiovisual, em qualquer formato e plataforma. Entra governo sai governo, faz conferências e audiências, reúne o Conselho Municipal de Cultura e continuamos patinando como no minguado Fundo Municipal de Cultura.
No meio de um pequeno oásis, surge o diretor campista Carlos Alberto Bisogno — realizador dos curtas da Trilogia da Paixão: “Efígie” (2009), “Vertigem” (2010) e “Neve Negra” (2011) — atuando na produção, direção, roteiro, montagem, fotografia, mixagem e designer de som, lançando com uma enorme determinação lança o média-metragem (50 min) “7 Solidões” , ficção dramática que passa por 3 fases da trajetória de vida do personagem principal vivido por Gael Nunes (filho do diretor) na infância, Rudá Sanchéz na juventude e Orávio de Campos Soares na fase madura. Leva à reflexão sobre conflitos familiares, traumas, liberdade sexual, companheirismo e amor. Contando com a generosidade de atores e equipe técnica, Bisogno realiza um filme que não chega a ser denso com cenas bonitas de contemplação, descontração, sensualidade, sexualidade e conflitos valorizadas por uma trilha sonora de extremo bom gosto, formada por clássicos do rock e jazz de sua lista afetiva.
Entre os destaques, as cenas do menino (Gael) com as torres de energia eólica da praia de Santa Clara em São Francisco de Itabapoana ao fundo, as do lindo casal jovem (Rudá Sanchéz e Maria Clara Oliveira) nas ruínas da praia de Atafona, na ponte de ferro em Campos dos Goytacazes e a de sexo no banheiro que foi muito linda e inspiradora. Parabéns aos dois! Destaque também para a participação da atriz Adriana Medeiros em cena, como mãe do jovem (Rudá), no crepúsculo do Cemitério do Cajú e do diretor teatral, professor e presidente do Conselho Municipal de Cultura Orávio de Campos Soares, muito bem, com narração off, como o personagem maduro, contemplativo e falecido, na maior elegância com uma bata branca. Ótimas cenas também foram rodadas no Borboletário do Zôo em BH, no Inhotim em Brumadinho/MG e nos corredores do IFF – Campos dos Goytacazes. Torço para 7Solidões ganhar a estrada e participar de mostras paralelas dos festivais pelo Brasil, já que filmes com essa metragem raramente participam das competitivas.
No fazer cinema que o realizador consegue aperfeiçoar suas produções e espero que venham mais filmes de jovens e dos experientes cineastas campistas, espelhados no recente curta-metragem (14min) “Command Action”, produzido em Rio Claro (SP) a partir de uma rifa e selecionado para a Semana de Crítica do Festival de Cannes 2015 (13 a 24 maio).
Saudoso da década de 70 dos Festivais de Cinema Super-8 no Cine Dom Marcelo, produzido por Nicolau Louzada, parabenizo os envolvidos no 7 Solidões e transcrevo parte da fala de Bisogno em uma Audiência Pública na Câmara de Vereadores de Campos dos Goytacazes, para implantação do Pólo de Audiovisual em 2009:
“A produção cinematográfica movimenta a economia onde ela se realiza, pois se utiliza do comércio e de serviços: serviços alimentícios locais, hospedagens, papelarias, confecções de figurinos, cenários, mão de obra necessária na composição de uma equipe, como eletricistas, costureiras, especialistas em equipamentos de segurança, entre tantos outros. O cinema, imagem em movimento, vai muito além da sua superficial função de entretenimento, ele suscita pensamentos, propõe-nos modelos e comportamentos, condicionam de uma forma positiva ou negativa a nossa atitude e concepção do mundo. É deste fenômeno tão abrangente que tratamos. A nossa sociedade se baseia na transmissão de conhecimentos e valores e para aplicá-los na vida e, desta forma, passar a mensagem às gerações futuras. Este fenômeno social, político, artístico que é o cinema e o audiovisual não pode se negado a ninguém.”
Precisa desenhar, senhores gestores?
Publicado hoje na Folha Dois
Confira o trailer do filme:
Show. Amei o filme
Melhor ainda o debate pós. .