Em seu blog, ainda na noite de ontem, o jornalista Ricardo André Vasconcelos chegou a citar (aqui), mas não publicar a carta enviada também ontem pelo vice-presidente Michel Temer (PMDB) à presidente Dilma Rousseff (PT). Em esfera nacional, o primeiro a fazê-lo (aqui) foi o jornalista Jorge Bastos Moreno, alvo de inúmeros processos judiciais do presidente da Câmara Federal, deputado Eduardo Cunha (PMDB), que aceitou o pedido de impeachment de Dilma e a quem Moreno, não sem motivo, já apelidou no passado de “Coisa Ruim”.
Aberto com o emblemático provérbio latino “Verba volant, scripta manent” (“As palavras voam, os escritores permanecem”), leia abaixo aquilo que, com toda a volatilidade da política, promete ser permanente entre os dois maiores cargos e partidos da República:
São Paulo, 07 de Dezembro de 2.015.
Senhora Presidente,
“Verba volant, scripta manent”.
Por isso lhe escrevo. Muito a propósito do intenso noticiário destes últimos dias e de tudo que me chega aos ouvidos das conversas no Palácio. Esta é uma carta pessoal. É um desabafo que já deveria ter feito há muito tempo.
Desde logo lhe digo que não é preciso alardear publicamente a necessidade da minha lealdade. Tenho-a revelado ao longo destes cinco anos. Lealdade institucional pautada pelo art. 79 da Constituição Federal. Sei quais são as funções do Vice. À minha natural discrição conectei aquela derivada daquele dispositivo constitucional.
Entretanto, sempre tive ciência da absoluta desconfiança da senhora e do seu entorno em relação a mim e ao PMDB. Desconfiança incompatível com o que fizemos para manter o apoio pessoal e partidário ao seu governo. Basta ressaltar que na última convenção apenas 59,9% votaram pela aliança. E só o fizeram, ouso registrar, por que era eu o candidato à reeleição à Vice.
Tenho mantido a unidade do PMDB apoiando seu governo usando o prestígio político que tenho advindo da credibilidade e do respeito que granjeei no partido.
Isso tudo não gerou confiança em mim, Gera desconfiança e menosprezo do governo. Vamos aos fatos. Exemplifico alguns deles.
- Passei os quatro primeiros anos de governo como vice decorativo. A Senhora sabe disso. Perdi todo protagonismo político que tivera no passado e que poderia ter sido usado pelo governo. Só era chamado para resolver as votações do PMDB e as crises políticas.
- Jamais eu ou o PMDB fomos chamados para discutir formulações econômicas ou políticas do país; éramos meros acessórios,
secundários, subsidiários. - A senhora, no segundo mandato, à última hora, não renovou o Ministério da Aviação Civil onde o Moreira Franco fez belíssimo trabalho elogiado durante a Copa do Mundo. Sabia que ele era uma indicação minha. Quis, portanto, desvalorizar-me. Cheguei a
registrar este fato no dia seguinte, ao telefone. - No episódio Eliseu Padilha, mais recente, ele deixou o Ministério em razão de muitas “desfeitas”, culminando com o que o
governo fez a ele, Ministro, retirando sem nenhum aviso prévio, nome com perfil técnico que ele, Ministro da área, indicara para a ANAC. Alardeou-se a) que fora retaliação a mim; b) que ele saiu porque faz parte de uma suposta “conspiração”. - Quando a senhora fez um apelo para que eu assumisse a coordenação política, no momento em que o governo estava muito
desprestigiado, atendi e fizemos, eu e o Padilha, aprovar o ajuste fiscal. Tema difícil porque dizia respeito aos trabalhadores e aos empresários. Não titubeamos. Estava em jogo o país. Quando se aprovou o ajuste, nada mais do que fazíamos tinha sequencia no governo. Os acordos assumidos no Parlamento não foram cumpridos. Realizamos mais de 60 reuniões de lideres e bancadas ao longo do tempo solicitando apoio com a nossa credibilidade. Fomos obrigados a deixar aquela coordenação. - De qualquer forma, sou Presidente do PMDB e a senhora resolveu ignorar-me chamando o líder Picciani e seu pai para fazer um acordo sem nenhuma comunicação ao seu Vice e Presidente do Partido. Os dois ministros, sabe a senhora, foram nomeados por ele. E a senhora não teve a menor preocupação em eliminar do governo o Deputado Edinho Araújo, deputado de São Paulo e a mim ligado.
- Democrata que sou, converso, sim, senhora Presidente, com a oposição. Sempre o fiz, pelos 24 anos que passei no Parlamento.
Aliás, a primeira medida provisória do ajuste foi aprovada graças aos 8 (oito) votos do DEM, 6 (seis) do PSB e 3 do PV, recordando que foi aprovado por apenas 22 votos. Sou criticado por isso, numa visão equivocada do nosso sistema. E não foi sem razão que em duas oportunidades ressaltei que deveríamos reunificar o país. O Palácio resolveu difundir e criticar. - Recordo, ainda, que a senhora, na posse, manteve reunião de duas horas com o Vice Presidente Joe Biden – com quem construí
boa amizade — sem convidar-me o que gerou em seus assessores a pergunta: o que é que houve que numa reunião com o Vice Presidente dos Estados Unidos, o do Brasil não se faz presente? Antes, no episódio da “espionagem” americana, quando as conversar começaram a ser retomadas, a senhora mandava o Ministro da Justiça, para conversar com o Vice Presidente dos Estados Unidos. Tudo isso tem significado absoluta falta de confiança; - Mais recentemente, conversa nossa (das duas maiores autoridades do país) foi divulgada e de maneira inverídica sem nenhuma
conexão com o teor da conversa. - Até o programa “Uma Ponte para o Futuro”, aplaudido pela sociedade, cujas propostas poderiam ser utilizadas para
recuperar a economia e resgatar a confiança foi tido como manobra desleal. - PMDB tem ciência de que o governo busca promover a sua divisão, o que já tentou no passado, sem sucesso. A senhora sabe que, como Presidente do PMDB, devo manter cauteloso silencio com o objetivo de procurar o que sempre fiz: a unidade partidária.
Passados estes momentos críticos, tenho certeza de que o País terá tranquilidade para crescer e consolidar as conquistas sociais. Finalmente, sei que a senhora não tem confiança em mim e no PMDB, hoje, e não terá amanhã.
Lamento, mas esta é a minha convicção.
Respeitosamente, \ L TEMER
A Sua Excelência a Senhora
Doutora DILMA ROUSSEFF
DO. Presidente da República do Brasil
Palácio do Planalto
Brasília, D.F.
Atualização às 12h57: Com o oportuno título “Até tu, Temer?”, o sempre atento jornalista e poeta Fernando Leite foi o primeiro a publicar aqui, na blogosfera local, a carta do vice-presidente Michel Temer à presidente Dilma Rousseff.
Há muito o Temer vem conspirando contra o governo e agora com essa carta revela a sua traição.
Se como vice não era prestigiado pelo palácio do planalto por que ainda mantinha ministros no governo ?
Aluysio, Temer, apelidado pelo então senador ACM, de “mordomo de filme de terror”, reedita a velha e boa carta nas horas graves da nossa sobressaltada República. Primeiro que ele, foi Getúlio, com muito mais vigor, drama e Poesia, na controvertida CARTA-TESTAMENTO.
Pessoa diz que são “ridículas, as cartas de amor” e, completa, que não seriam “cartas de amor se não fossem ridículas”.
Vinícus, profético, no neologismo AVIGRAMA, inaugura o e-mail romântico, levado pela cotovia, para matar saudades da PATRIAZINHA.
Carta é documento. Palavras ditas, o vento as leva. Nisso, Temer tem razão.
cordialmente,
Fernando.