Carol Poesia — Não conseguia transar

 

(“Menage-a-trois”, grafite e tinta grafite sobre papel de Armin Mermann)
(“Menage-a-trois”, grafite e tinta grafite sobre papel de Armin Mermann)

 

 

 

 

Não conseguia transar

 

Amava, mas não conseguia.

Sentia vontade, imaginava, queria… Mas na “hora h” simplesmente desistia.

Não estava ali.

Começava, continuava e se distraía.

O marido chorava, grunhia, não entendia.

Ela o queria, mas queria mais a poesia.

 

Então num dia ardente,

Chegou do trabalho e foi esquentar a comida.

No celular, uma sequência de Ney Matogrosso ela ouvia.

De repente, uma música diferente, uma sequência nova,

uma quentura, uma taquicardia…

Teve que se afastar do fogo, alguma coisa a acometia!

Levou-se trêmula ao tapete da sala. Caiu no chão. Se contorcia!

Se contorcia a cada verso cantado! Se contorcia ao som da melodia!

E se lanhava e se queria!

Aquela música… Uma sinfonia!

Ficou de bruços e se espremia. O tapete. Espremia.

Escapavam-lhe as sandálias, os anéis, as pulseiras, a gargantilha.

Saía-lhe o vestido, o batom, o sutiã, a roupa íntima.

Respirava com dificuldade, tremia.

Não se cabia de tanto prazer.

 

A música, que ocupava a casa inteira,

a tomara de primeira e a comia.

 

A comida queimou no fogo.

O marido chegou. Não entendia…

Ela, ofegante, com dificuldade, se levantou.

Olharam-se como nunca. Estavam nus, pela primeira vez.

 

E, finalmente, aceitaram a poligamia.

Passaram a transar a três:

ele, ela e a poesia.

 

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Este post tem 2 comentários

  1. José Luis Vianna da Cruz

    Belíssima. Inspiradíssima. Parabéns!

  2. SÉRGIO PROVISANO

    Sim… sim, Carol Poesia, assim, ao ler de primeira vista, eu posso dizer que amei! Amor à primeira vista, logo ao ler, cada verso, assim de supetão… Me encantei, me apaixonei, pois à Poesia, como disse o Poeta, só se pode permitir “uma forma: concisão, precisão das fórmulas
    matemáticas…”, assim falou Maiakovski e esse Poema seu, me arrebatou, e eu reli, reli e relerei muito mais vezes…

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