Para Georgina, uma canção
Por Carlos Drummond de Andrade e Aluysio Abreu Barbosa
Conheci Gina Inojosa desde sempre. A partir da relação profissional entre repórter e fonte, nossos pais se tornaram grandes amigos pessoais, gerando o convívio entre as famílias.
Era um tempo da transição aquele final dos anos 70 do século passado. A agroindústria sucroalcooleira, pilar da economia goitacá desde o extermínio destes com a chegada dos portugueses, cederia vez à exploração de petróleo na Bacia de Campos.
A descoberta do primeiro campo petrolífero, de Garoupa, em 1977, seria noticiada num furo de reportagem pelo jornalista Aluysio Barbosa (1936/2012), meu pai. Primeiro no Jornal do Brasil, maior do Rio à época, do qual ele era correspondente. E daí, pela Associeted Press, ao mundo pré-internet de então.
Partiu das conversas entre Aluysio e o usineiro Evaldo Inojosa (1927/2007), pai de Gina e presidente do Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA, em cujo prédio, ao lado da Catedral, hoje funcionam a Justiça e o Ministério Público Federais), a necessidade de se reverter dividendos daquela nova e milionária atividade a Campos.
Nesse sentido, as conversas passariam a incluir o senador Nelson Carneiro (1910/96), que criou em 1985 a primeira lei dos royalties. Na compensação pela extração do petróleo, os recursos inicialmente bem menores seriam aplicados apenas em obras de infraestrutura. Mas o princípio seria corrompido com o aumento (e desperdício) substancial das verbas.
Desse convívio entre os interesses da cidade e da região, ainda que eu e Gina fôssemos então alheios a eles, nasceu a amizade que se aprofundou, sobretudo, no verão de 1986. Com apenas 14 anos, tinha feito um curso de mergulho com Tito e Assis, irmãos de Gina, todos adultos.
Eles e Dr. Evaldo me chamaram para conhecer a casa da família, em Ipioca, Maceió (AL). E nela, passamos quase todos os meses de janeiro e fevereiro dedicados à caça submarina, enquanto houvesse luz do sol.
Para um adolescente em seus ritos de passagem naturais, difícil mesmo hoje dimensionar o que foi cumprir parte deles na espreita e captura de peixes com tiros de arpão sob o mar, só com o ar do pulmão, na condição de igual inundada de silêncio e beleza em meio a adultos.
Nos intervalos em terra, lembro nitidamente de Pedro, hoje médico e à época pouco mais que um bebê, filho mais velho de Gina, dormindo à tarde sobre a barriga do pai, José Carlos Pereira Pinto, numa rede de varanda da bucólica praia nordestina, com o mar e os coqueiros ao fundo.
Isso foi antes de nascer a segunda filha de Gina, Ângela, hoje mulher feita, batizada em homenagem a avó materna, Dona Maria Ângela.
Desfeito o primeiro casamento e fechada a usina, Gina seguiu sua vida, educando os filhos e dando sequência à carreira independente de empresária, apesar da formação acadêmica como jornalista. Até que conheceu e se casou com o cirurgião plástico Emilson Ancelmé, de quem se tornou parceira em todos os sentidos.
Após as eleições de 2 de outubro, fui ao Rio para um breve período de descanso, onde soube da doença de Gina e liguei para ter maiores detalhes com seu irmão Assis. Chegado a Campos na madrugada do último sábado (15), dormi um pouco, antes de ir visitá-la no Hospital da Unimed.
Ao lado do filho Pedro, pude também constatar toda a dedicação devotada a Gina por Emilson, de causar admiração ao observador que sempre se considerou carinhoso na lida com suas próprias companheiras, ao longo da vida. E daquela mulher que sempre julguei bela e ativa, me despedi com um beijo na testa e outro na mão entrelaçada à minha.
Dos três irmãos, a mais próxima ao pai em físico e temperamento, me despeço novamente de Gina, com os versos “de asas e nuvens, em surdina” que lhe dedicou de próprio punho, mais um desenho, um outro poeta, amigo pessoal de Dr. Evaldo:
Publicado hoje (21) na Folha da Manhã
Aluysio,
Bonitas palavras em emotiva narrativa.
Da doença de Gina, a quem conheci apenas socialmente, soube por Tito, há cerca de duas semanas.
Na última 2ª-feira (17), num encontro com Assis, meu colega de escola, informações de quadro ainda mais grave.
No espaço de sua tocante homenagem, peço licença para externar minhas condolências à família.
(Guilherme).
Lindo Texto, linda homenagem…Parabéns!!!!
Simplesmente brilhante o seu texto, que para mim está mais para além de um mero texto e sim um depoimento sincero e carinhoso.
Parabéns, Aluysio.
Emocionante perceber que uma singela homenagem tendo como pano de fundo o tempo da infância, nos mostra que momentos assim acabam tendo maior representatividade do que qualquer lembrança com um pouco mais de glamour, e que por sinal não foram raros no ambiente dela; interessante a leitura que vc imprimiu fazendo uma breve leitura da vida de Gina..
Também tive a oportunidade (ao lado da minha esposa), e agradeço muito a Deus por isto, de estar com ela domingo no hospital, e sentir que apesar de toda fragilidade pelo avanço da doença, ela estava como boa Inojosa lutando pela vida, mas em Paz para uma despedida que se mostrava iminente..
Em meio a preocupação de Emilson, Assis e Pedro, com o resultado de um exame que acabara de chegar, pudemos Orar e receber as repostas dela através de abrir e fechar de olhos, aperto de mão e remexer de um corpo que parecia inerte, num entendimento que estava preparada para cumprir uma vontade soberana..
O esforço para enviar um beijo de agradecimento pela visita e os olhos marejados pelos momentos que vivemos, vão ficar para sempre..
Vai com Jesus e até a Vida Eterna!
Gina! Tanto tempo passou! Tomei um susto quando li que vc estava doente, boa passagem, querida, descanse em paz!