Rogério Siqueira — As dimensões da Igualdade Racial

 

 

 

Campos dos Goytacazes, por toda sua história, deveria estar na vanguarda das políticas públicas de promoção da Igualdade Racial. Uma capitania, vila e cidade que influenciou a própria história econômica, social e cultural do Brasil, não poderia deixar de avançar nas discussões que visam integrar com plenitude o estrato social que se estabeleceu em Terra Brasilis por meio da privação sumária de liberdade.

Chegamos a 2017 com desafios que foram tema central do Movimento Negro em Campos há algumas décadas. Aqui, uma das cidades que mais recebeu escravos em toda história do Brasil, que por 400 anos sustentou este tipo de regime, vimos um caso escandaloso dentre tantos escândalos que permearam gestões anteriores.

Uma das maiores vitórias do Movimento Negro em Campos, sem dúvida, foi a obtenção de um espaço de poder para promoção de políticas públicas na seara da Igualdade Racial, que se dava através da Fundação Municipal Zumbi dos Palmares. Tal fato não foi, e não é uma vitória de Governo qualquer, mas da força e obstinação dos militantes da causa dos negros em toda sua amplitude e complexidade.  Longe de adentrar no solo pantanosos que é avaliar politicamente as gestões da Fundação Zumbi, o fato de termos um espaço para, minimamente discutir nossas demandas, foi um avanço.

Não fosse a política o espaço que não aceita coincidências, não precisaria aqui salientar que a Lei (8344) que extinguiu a então Fundação Zumbi dos Palmares no município, redigida pela então prefeita, data de 13 de Maio de 2013.

Já seria escandaloso o torpe desmonte do setor com a supressão de quase toda sua autonomia administrativa e a integralidade de seus recursos financeiros, não fosse o um detalhe que escapou (ou foi negligenciado) aos olhos de muitos: A Fundação Zumbi dos Palmares foi extinta na data histórica da assinatura da Lei Áurea em seu aniversário de 125 anos. Fica a provocação: quais os impactos da extinção de um setor que busca promover políticas públicas para emancipação plena do povo negro em toda amplitude de suas demandas na data de aniversário do fato histórico e inegável que foi a assinatura da Lei Áurea (que nos libertou mas não nos emancipou enquanto cidadãos em pleno gozo de suas cidadania)?

Noves fora os fatos anteriormente narrados, os ataques a este importante setor não pararam naquele fatídico 13 de maio. Em 2015 a então governo edita o decreto de nº 80 que, dentre outras coisas, enxerta na estrutura da FCJOL, a recém-criada superintendência de Igualdade Racial. Tornamo-nos assim um setor tão somente de assessoramento dentro da estrutura administrativa da cultura.

É como se os governantes à época expusessem à carne sua real visão acerca das políticas de promoção da igualdade racial, reduzindo a natureza complexa e as infindas demandas do setor ao perímetro de sua visão política, como se Igualdade Racial fosse aquilo que intelectualmente demonstraram ser os que propuseram tal coisa: obtusos. Ou aquilo que politicamente são: cínicos.

O desafio nesta gestão será garantir que o município assista aos grupos prioritários inseridos no bojo da Política Nacional de Promoção da Igualdade Racial, bem como  avançar nas discussões para que a Igualdade Racial seja vista como um setor de estratégia de governo, tendo a necessidade de permear toda a membrana governamental, a fim de incluir o negro e esclarecer àqueles que estão sob o jugo da ignorância.

Neste direção é nítido que o fato da Igualdade Racial estar entregue nas mãos de Lucia Talabi, professora e atriz, experiência de mais de 30 anos de sala de aula, já causa grande impacto. Lucia, até onde me consta, é a primeira mulher a assumir a pasta no município, o que por si só é um um grande avanço no modus operandi político. Para além disso construiu um equipe de saberes múltiplos no intento de fazer jus a sofisticação intelectual que a causa exige.

Lucia não tem vícios da política, é uma idealista de pés nos chão. Sonha, mas é pragmática quanto a execução. Não gosta da ideia de culto a imagem de político qualquer, embora a própria figura de Lucia seja caixa de ressonância de nossas lutas em diversos aspectos. Enxerga na educação a mola-mestra que irá impulsionar os verdadeiros anseios de transformação aos quais aspiramos por tanto tempo.

Dentre os desafios que se impõe a um gestor de uma pasta com tamanha complexidade, há o compromisso de trabalhar incansavelmente junto as diversas representações do movimento negro para formatar e aprovar o Plano Municipal para Promoção da Igualdade Racial (Plamupir). Um grande desafio, para uma grande mulher.

 

fb-share-icon0
Tweet 20
Pin Share20

Deixe um comentário