Um capricho do acaso fez com que o centésimo dia da administração Rafael Diniz caísse hoje, “meu dia” de escrever algo aqui sobre sua administração até agora. Depois de ter sido antecedido por tantas análises/opiniões bacanas/relevantes para uma avaliação/compreensão não só do período de governo, mas da própria cidade e alguns de seus anseios, me indago o que talvez me reste a acrescentar…
Em primeiro lugar, partilhei da esperança de renovação que se podia notar pela cidade desde antes da campanha. Havia uma sensação de que não dava mais para seguirmos com um certo e velho estilo de política e, pelo que senti e observei: quem personificou essa esperança de novidade foi o então candidato Rafael Diniz (embora houvesse outros jovens candidatos na disputa). Sua vitória em primeiro turno me surpreendeu: eu só a esperava no segundo. A fase de transição, porém, foi marcada por percalços e dificuldades em poder tomar ciência da real situação administrativa do município, de forma que, ao que me consta, seu governo só teve como se inteirar de fato das finanças e compromissos municipais depois que assumiu, agorinha… em 01 de janeiro – há exatos 100 dias.
Mesmo a melhor das luas de mel pode conter expectativas exageradas e frustrações eventuais (as últimas até, tantas vezes, em decorrência das primeiras). Acho que temos que equacionar as coisas na seguinte perspectiva: esperamos por muito tempo que a administração municipal tomasse um rumo que nós julgássemos apropriado. Isso nos deixou com altos níveis de ansiedade pelo atendimento de muitas demandas – ainda reprimidas. Esperamos que o governo Diniz as atenda, mas ficamos impacientes que ainda não pareça que tudo já começou a deslanchar. Sei que há necessidades urgentíssimas, que não podiam esperar nem um dia, quanto mais cem ou mais, mas… até que ponto estamos cobrando o impossível dado o “pouco” tempo até agora transcorrido? Por outro lado: você tem certeza que não dá pro governo acelerar um pouco o ritmo e demonstrar que já sabe o que pode e vai fazer – e de que forma? Espero que o governo Diniz compreenda a dor e a delícia de ser o que é e se aceite como tal.
Desconfio de governos de esquerda por vários motivos. Um deles é que eles geralmente escolhem um de dois extremos: ou optam por uma solução simplista e insuficiente, e nela insistem jurando que um dia a coisa vai, ou percebem que a coisa não é simples: aí nomeiam dezenas de comitês que fazem centenas de reuniões em que problematizam tudo e não resolvem nada. O PPS, partido de Rafael Diniz, é um dos raros partidos de esquerda que, pra mim, são capazes de escapar dessas armadilhas ideológicas quando querem. Mais do que uma cartilha a seguir, é preciso descobrir, sem âncoras no pensamento, de que forma melhor serão atingidos os objetivos ordenados pela administração em função do prometido na campanha e aprovado pela população nas urnas – sempre se lembrando que existe uma coisa chamada realidade e outra: responsabilidade. Os brasileiros sabem que, embora isso seja lógico, nem sempre é assim que os políticos fazem. Espero que o governo Diniz se marque pela diferença a favor.
Segundo o IBGE, o PIB de Campos era o sétimo maior do Brasil em 2013. Não sei como o município se posiciona hoje, mas dada a derrocada econômica do país como um todo – agradeçam à irresponsabilidade, à inépcia e à corrupção do governo federal, no geral, e às do governo estadual em particular –, talvez se mantenha na mesma proporção, visto que nossa cidade não afundou sozinha. Sabemos, contudo, que a arrecadação do município é fortemente influenciada pelos preços internacionais do petróleo – o que se reflete aqui no que a prefeitura é capaz de fazer com o rapasse dos royalties. Na época das vacas gordas, administrações passadas, de diferentes partidos, expandiram os gastos públicos tão insanamente que parecia terem descoberto a caverna de Ali Babá. Vai ver descobriram… Mas o tesouro era finito tanto quanto o mandato e o petróleo será daqui a algum tempo. Mesmo assim, ao invés de empenharem todos os seus esforços na construção de uma economia capaz de seguir crescendo e se desenvolvendo depois que o petróleo acabar (e mesmo desde antes disso acontecer, afinal: a idade da pedra não acabou por falta de pedra!), preferiram distribuir “benefícios” ao invés de fortalecer a economia local e criar empregos – esses, sim: os maiores de todos os programas sociais. Mesmo que se descubra (às vezes, a duras penas presentes e/ou futuras) que nem sempre é tão fácil ganhar eleições assim, na base do “me ajuda que eu te ajudo”, não deixa de ser uma tentação irresistível que, por uma vantagem amanhã, se sacrifique a semana que vem – essa tem sido a infame regra. Espero que o governo Diniz rompa com isso e se mostre capaz de fazer melhor.
É impossível agradar a todos – mesmo a todos que o elegeram: isso Rafael Diniz está careca de saber (embora não esteja – o careca aqui sou eu). Então, que não tenha medo de tomar as medidas que julgar necessárias para organizar os compromissos da cidade. Vão chiar? Claro que vão – mas vão de qualquer jeito, seja lá o que for feito ou não. Precisamos de tudo um tanto em todas as áreas, difícil até saber o que priorizar – mas quem concorre a um cargo executivo tem que saber e tem que agir. Apoio na Câmara é bom – mais que bom, fundamental. Por mais digamos… fluido que seja o posicionamento digamos… ideológico dos vereadores, o cacife eleitoral da surpreendente vitória em primeiro turno dá a Diniz uma força que os cem primeiros dias não tiraram – ainda e apesar de erros pontuais que ele tenha cometido aqui e ali. Espero que a Câmara seja pragmática e se lembre dos votos dados ao novo prefeito; que se recorde de porque esses votos foram dados a ele; e que Rafael Diniz não se acanhe de usar o carisma e o cacife que tem – permanecendo do lado certo da Força, é claro.
Pelo que observo, a cidade ainda transpira expectativa: viemos pra festa, mas cadê o garçom? Não sei até quando a expectativa dos grandes feitos suplantará a decepção de uma até agora insistente mesmice. Claro que as dificuldades herdadas são imensas, a cidade sabe disso. De minha parte, mais do que, no futuro, apontar o que foi feito, eu gostaria de poder apontar que vi diferença na maneira com que foi feito. Ainda além: eu gostaria de poder apontar que tudo foi feito de maneira diferente porque o prefeito compreende que nunca obterá resultados diferentes fazendo as mesmas coisas de sempre. Meu desejo é por uma visão diferente que seja moderna como a juventude de Rafael Diniz me inspira esperar. O velho assistencialismo da mão estendida e dos favores a retribuir tem que morrer nesta cidade – assim como no país inteiro. Ou ele morre ou mata a cidade: não há mais possibilidade de sequer se pensar em meio termo. Passagem a R$ 1,00 é ótimo, né? – mas de onde sai o dobro disso que a prefeitura tem que desembolsar por cada viagem de cada pessoa a cada instante? Acreditem: dinheiro não cai do céu. Juro! Espero que Diniz tenha claro em sua mente que pode passar à História do município como o prefeito que mudou paradigmas e abriu a cidade pra um futuro promissor por ser capaz de ver além do assistencialismo puro e irresponsavelmente simples (que agrada tanto a quem precisa esticar o orçamento cotidiano quanto a quem faz o diabo na ambição de se reeleger). A alternativa é ser mais do mesmo.
Finalizando: o lema de nossa cidade é de uma época em que era extremo e soava excepcional dizer que “Aqui, até as mulheres lutam pelo Direito” (“Ipsae matronae hic pro jure pugnant”) – numa provável alusão ao impacto causado por Benta Pereira armada lutando a cavalo, com mais de 70 anos de idade, contra a política dos viscondes de Asseca, nos idos de 1757 – praticamente 80 anos antes de Campos virar cidade. Ainda que distintos, os conceitos de Direito e Justiça são próximos, sendo comum que se confundam. Assim, espero que o governo Diniz busque ser justo e aja sempre do lado do Direito – nunca contra ele ou às suas margens. Espero também que ele saiba que fazer Justiça é mais que só ajudar a distribuir a colheita: é priorizar o replantio da lavoura. Os tempos não são fáceis, mas o apoio e a torcida são grandes. Cabe ao bom político saber canalizar tudo isso em Colaboração. Sempre vai ter quem torça contra, mas a maioria está disposta a colaborar – basta o rumo estar certo.
Boa sorte, Campos!