Personagens de um crime imperfeito
Por Paula Vigneron(*)
Tarde de sábado, 19 de agosto de 2017. Em Campos, veículos de comunicação divulgam a tentativa de homicídio de uma jovem universitária. Durante um assalto, na pracinha do parque Rio Branco, em Guarus, Ana Paula Ramos, de 25 anos, foi baleada. Dois bandidos roubaram celular e dinheiro da vítima, que estava acompanhada por uma amiga, posteriormente identificada como cunhada. Eles estavam em uma bicicleta e fugiram do local do crime. Um deles foi localizado pela Polícia Militar e preso na mesma noite.
Manhã de terça-feira, 22 de agosto. Diversas pessoas entram e saem da delegacia de Guarus. Uns buscam informações; outros as fornecem. A morte, até então fruto de um assalto inesperado, tornou-se um crime encomendado. A mandante foi a cunhada. Alguns percorrem a área externa, em silêncio, observando a movimentação. O Hospital Ferreira Machado (HFM) publica uma nota para declarar a morte cerebral da universitária.
Na véspera, parentes e amigos se organizaram, na porta da unidade hospitalar, em uma corrente de oração por Ana Paula. À noite, familiares permaneceram em frente ao hospital para conseguirem notícias da vítima. Eles foram notificados sobre a morte cerebral. No momento do relato, policiais, que transitavam à paisana entre a multidão e nas proximidades, abordaram a suspeita de organizar a ação. Ela não reagiu e foi encaminhada à delegacia para prestar esclarecimentos. Outros dois suspeitos também foram presos por envolvimento na morte de Ana Paula: o que arrecadou materiais para simular o assalto; e o intermediário, que foi ponte entre a mandante e os demais comparsas.
Na delegacia, o irmão da vítima e marido da suspeita busca compreender o motivo da detenção e é surpreendido ao saber que a esposa estava sendo apresentada como mandante do homicídio. Após a notícia, sente mal-estar. Os policiais na unidade acompanham os desdobramentos e atuam, durante toda a madrugada, no caso. Pela manhã, prosseguem com o trabalho, auxiliados por biscoitos e doses de café. Dentro do local, os suspeitos continuam à espera dos próximos fatos.
Nas redes sociais, internautas lamentam pelo crime brutal que chocou os moradores de Campos. Uma moça planeja o homicídio da cunhada. Contrata outras pessoas. Paga R$ 2 mil no momento do encontro. Os outros R$ 500 seriam entregues após a realização do serviço. Inicialmente, o suposto assalto foi pensado para acontecer na praça de Custodópolis, mas, devido à grande movimentação, há mudança de planos. Segue para uma praça após convidar a vítima para visitar as obras de sua nova casa, na qual moraria com o marido, irmão da moça. Depois, escolheriam a sua roupa para o casamento de Ana Paula, marcado para outubro.
Antes, em uma tarde aparentemente comum para duas amigas de infância, tomariam um sorvete na pracinha. Seria esse o sinal para os bandidos, supostos assaltantes, abordarem as duas. Eles chegam ao local da emboscada. Pegam o celular e o dinheiro, parcela que faltava para completar a negociação, na simulação do assalto. Assiste aos tiros disparados em direção à vítima. Um atinge a cabeça, que resultaria, dois dias depois, na morte cerebral decorrente de trauma no crânio. Acompanha o dia a dia da família e da internação. Une-se às orações pela melhora da jovem.
À porta da delegacia, surgem questionamentos, certezas e revolta com o ato e a frieza com que se portou a jovem. Na manhã de quarta-feira, com respostas para dar à população, o delegado responsável pelo caso apresenta a mandante e os comparsas à imprensa, em uma coletiva. “Para nós, é necessário fazer uma apuração com maior acuidade para que saibamos a motivação real. Acreditamos numa passionalidade dessa motivação, mas ainda necessitamos de mais esclarecimentos. Quanto ao fato de ela ser a mandante, não temos dúvidas sobre isso”, declara.
De costas para os jornalistas, a idealizadora do homicídio permanece impassível. Caminha, posteriormente, entre eles. Mãos imóveis, com algemas, e olhos atentos aos movimentos ao redor. Observa. Encara os presentes, brevemente, e volta a si. Sem reações. É encaminhada ao Instituto Médico Legal para o exame de corpo de delito. A poucos quilômetros dali e horas antes de sua morte, Ana Paula respira com ajuda de aparelhos enquanto, no IML, a cunhada e amiga de infância distrai-se enrolando fios de cabelo nos dedos, aguardando o desfecho de seu crime imperfeito.
(*) Jornalista e escritora
Publicado hoje (27) na Folha da Manhã
E vocês, da imprensa, sem um mínimo de in
teresse para um “furo de reportagem”, ignoram e não perguntam a traidora o motivo para tal violência e tamanha insanidade contra a vitima.
ro de reportagem” não
Caro(a?) Edi,
Só alguém que nunca testemunhou o pior da humanidade vindo a furo numa delegacia, pode supor que a pergunta mais elementar do mundo não foi feita. E que a suspeita, que tem o direito constitucional de ficar em silêncio e não produzir prova contra si, responderia a um jornalista a pergunta feita antes, inúmeras vezes, por policiais.
Grato pela chance de ressaltar o óbvio!
Aluysio
Excelente texto, Paulínia!
Paulinha*
Perfeito! A pessoa que criticou, primeiro comentário, parece não conhecer muito bem os mecanismos que envolvem uma reportagem policial e os limites que ela contém.
Ando sem paciência para os que sempre querem criticar. Pior ainda, sem base para isso.
Texto impecável ,Paula!!! Parabéns!!
Muito obrigada pela leitura e pelo retorno, Maicon e Emar.
Obrigada, Vera!
Texto perfeito, frio e objetivo, relatando como deve ser. E, reforçando quem já disse, não cabe a jornalistas repetir perguntas que os policiais já fizeram. O óbvio tem limites.
Mais uma vez eu aguardo que divulgue qual a profissao e o local de trabalho, da mandante do assassinato da universitaria
Caro Cesar Peixoto,
A suspeita de mandante do assassinato trabalhava como bancária. Já para saber seu local de trabalho, melhor esperar sentado ou buscar em fonte que ignore a diferença entre interesse público e interesse do público.
Grato pela chance do esclarecimento!
Aluysio
Tomem na cara postes. (Trecho excluído pela moderação)
Cara(o?) Celia (ou Edi?), IP: 172.68.25.73,
Ao se chocar com o poste, a tendência é mesmo machucar a “cara”. É o que se pode dizer de quem fez o primeiro comentário infeliz como “Edi”, pelo IP 172.68.25.73. E, depois de repondido(a?) pelo blogueiro e dois outros comentaristas, chora suas mágoas em um novo comentário, no qual passa a assinar como “Celia”, mas não tem a inteligência de mudar o mesmo IP 172.68.25.73. Pela lógica, quem é desonesto na assinatura do próprio nome, não tem dificuldade para sê-lo no mais que escreve.
Enquanto isso, a crônica da Paula, ilustrada pela capa da Joseli e do Eliabe, vai ultrapassando o meio milhar de likes…
Grato pela dupla participação!
Aluysio
Parabéns, Aluysio Abreu Barbosa!! Sua Competência e Educação deram a resposta que esse primeiro comentário precisava.Parabéns a Paula Vigneron também.