Folha 40 anos — Alexandre Bastos

 

Jornalista Alexandre Bastos

Papel, caneta e coração

Por Alexandre Bastos(*)

 

Meu avô Antônio Bastos, que faleceu em abril de 1994, não deixou casas, terrenos, nem dinheiro. Aquele homem elegante, culto e muito educado, ensinava que existem tesouros que ninguém pode tirar de nós. “Um ladrão pode levar seu carro, seu relógio, mas jamais poderá levar a sua cultura, seu caráter e o que você aprendeu aqui”, dizia. Foi com essa filosofia que ele criou, ao lado da minha vó Elza, quatro mulheres incríveis. A mais velha, Ângela Bastos, tinha um faro jornalístico desde pequena. Curiosa, atenta e interessada pelos mais variados assuntos, fez história no jornalismo de Campos, ao produzir uma coluna social que ia além do óbvio.

Após uma passagem bem sucedida por São Paulo, ela recebeu o convite do mestre Aluysio Cardoso Barbosa e retornou ao município de Campos para atuar ao lado de grandes profissionais na Folha da Manhã, veículo que revolucionou o jornalismo impresso da região no final da década de 1970. A impressão que eu tinha, desde pequeno, era que a Folha se tornou uma espécie de irmã mais nova da minha tia.

Se estávamos em Atafona, comendo um peixe durante o verão, ela se levantava e dizia: “Não posso ficar porque a Folha me espera”. Se alguém, durante uma festa, contava algo interessante, ela corria para pegar o bloquinho e a caneta. “Vai render uma nota ótima para a Folha”.

Bem pequeno, lembro de uma visita que fiz ao jornal e pedi para conhecer a redação, naquela época ainda com máquinas de escrever e aquele barulho inconfundível. E naquele dia entendi porque ela não parecia muito contente nos finais de semana na praia. Afinal, a praia dela era ali. Os olhos brilhavam e caminhava pela redação conversando e dando palpites sobre todas os assuntos. Naquela época, tia Ângela já perguntava se eu não gostaria de ser jornalista. Sem pensar duas vezes, respondia: “Meu sonho é ser jogador de futebol”.

Mas o tempo passou e um velho ditado, repetido muitas vezes pela minha tia, passou a fazer sentido: “quem sai aos seus não degenera”. Em 2004, quando a Folha tinha 26 anos e eu 22, tive o meu primeiro artigo publicado no jornal. Um ano depois, fiz a minha estreia como repórter na Folha Nessa época, tive o privilégio de trabalhar ao lado da minha tia e percebi que a praia dela virou a minha.

E se não deu para virar jogador de futebol, fica fácil fazer uma analogia. Joguei na Folha ao lado de grandes craques, das mais variadas gerações, entre eles Aluysio Cardoso Barbosa, Aloysio Balbi e Aluysio Abreu Barbosa, meu grande incentivador. A Folha da Manhã, com tudo que me proporcionou, aprendizado e amizades, me fez entender que o velho Antônio Bastos estava certo quando dizia que os nossos tesouros mais importantes são intocáveis.

 

(*) Jornalista, ex-editor de Política da Folha da Manhã e chefe de gabinete da PMCG

 

Publicado hoje (07) na Folha da Manhã

 

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