O que passa e o que fica
Por Aristides Soffiati(*)
Comecei a escrever para a imprensa em 1975. Através de Elmar Martins e, principalmente, de Diva Abreu, saiu, em A Notícia, meu primeiro artigo. Tratava do conflito entre árabes e judeus. Outros artigos meus foram aceitos por Hervé Salgado Rodrigues. Passei a colaborar com o jornal e alimentei grande estima por ele e por Diva. Meus artigos eram muito longos e um pouco rebuscados. Acho que ninguém os lia. Escrever para jornal exige exercício. Aos poucos, a gente vai acertando a mão.
Já declarei várias vezes que o primeiro artigo de um colaborador na Folha da Manhã foi meu. Exatamente no dia 8 de janeiro de 1978, ele foi publicado. Ainda em caráter experimental, o jornal não era editado diariamente. Na segunda edição, dois dias depois, foi publicada a continuação do artigo. Demorou até que eu aprendesse a escrever para leitores leigos. Alguns artigos tinham o caráter de crônica. Alguns deles me causaram processos judiciais. Talvez, essa seja a prova mais cabal da liberdade que Aluysio Cardoso Barbosa me dava no jornal que ele dirigia.
Um dos artigos que mais me agradaram relatava uma corrida na rua em que fui parado por três políticos que falaram horrores de Garotinho, enquanto eu o defendia, a ponto de parar na cadeia por uma luta corporal com um fanático admirador seu. Eu dizia tudo o que pensava de Garotinho como se fosse outra pessoa. Se não fosse Aluysio, o artigo não teria saído. Ele se criou no regime autoritário militar, mas prezava muito pela liberdade de imprensa, como bom jornalista que era.
Contudo, ele farejava perigo muito melhor do que eu. Ele sabia o que poderia me causar problemas e conversava comigo para que eu mesmo avaliasse os riscos. Quase sempre, ele deixava a decisão a meu cargo. Reconheço que passei dos limites certa vez e ele solicitou que eu parasse de escrever. Na verdade, eu não estava bem emocionalmente e me tornei indelicado.
Então, seu filho Aluysio Abreu Barbosa trabalhou para que eu voltasse ao jornal. Um ano depois, voltei a escrever e publicar. Foi um ano difícil, pois preciso escrever para me sentir bem. Posteriormente, Aluysio filho me convidou a escrever um artigo de 60 linhas aos domingos na Folha Dois, parte nobre do jornal em dia nobre. Passei a frequentar outros dias fazendo crítica de cinema e considerações sobre cultura.
Hoje, estou naquela idade em que os amigos começam a morrer. Aluysio pai e Fernandinho Gomes se foram. As gerações não entram e saem em bloco da vida. Entram e saem aos poucos. Minha geração não é diferente. Várias pessoas chegaram depois de mim. Várias saíram antes. Várias virão e sairão depois de mim. Mas o jornal fica.
(*) Historiador e primeiro colaborador da Folha da Manhã
Publicado hoje (07) na Folha da Manhã