Cacoetes antigos e a Folha
Por Geraldo Machado(*)
O exemplar primeiro da Folha exibe em primeira página um incidente – tempos depois as pessoas veriam – revelador de uma das manias mais deploráveis e repugnantes : o chamado, em linguagem de corredores de fóruns, “mal de juizite”. Lá, naqueles tempos, tempos difíceis, tempo de ditadura braba, de censura mais ainda, de se medir o tal “sabe com quem está falando ou mexendo?”, a planície não ostentava esse nível de intolerâncias, de ódios, do obscurantismo que afeta a cada dia mais cada qual de nós…
Por isso a importância da manchete de primeira página, que dava conta de um incidente envolvendo a OAB e um juiz que aqui aportou, trazendo em sua bagagem algumas arbitrariedades próprias de sua personalidade deformada, e que aqui teria uma barreira, o que acabou “funcionado”… Deu-se que, num processo penal, foram denunciados três cidadãos, cujas prisões preventivas o dr. Promotor pedia desde logo, e – pasmem – o advogado que vinha sendo seu procurador desde a fase de inquérito!
Note-se : o MP. não pediu a prisão do advogado. Que, no entanto, acabou sendo decretada, pelo juizeco… O fato despertou interesses gerais, foi levado à entidade da categoria que, imediatamente tomou as providências. Por acaso, este cara que agora aqui — com muita honra, escreve — era o presidente da OAB e logo nomeou dois dos melhores criminalistas locais, Yvan Senra e Jonas Lopes (falecido e, na época, meu vice presidente), para as providências cabíveis, em forma de “habeas corpus” que acabou em instância superior, concedido, tornado nulo o decreto de prisão e trancada a ação penal em relação ao profissional.
O hoje quarentão jornal, parido dos sonhos do Barbosão e cuidado com obsessiva competência por Diva, captou o quanto de insólito aquele episódio encerrava e, ao noticiar em primeira página, em destaque, acabou sendo inestimável aliado na luta que se tornou emblemática contra toda a forma de arbítrio… Quando se sabe que (alguns) magistrados não se limitam a julgar e avançam no pantanoso terreno de “combate” a essa ou aquela modalidade de delitos, é reconfortante se saber que, desde tempos passados, a prática era condenada, porque condenável, a todos os títulos e modos.
E, por aqui… Não sou chegado ao formalismo comum. Mas sinto necessidade irrefreável de dar a César o que de César é. E, assim, rememorando a luta da Ordem, a repercussão do fato e as consequências que a sociedade acompanhou passo a passo por estes espaços — elegi o relato agora feito como modo de somar meu aplauso/testemunho ao jornal. Ter sido “notícia” e — acima de tudo — ter sido “irmão”, até o final, do idealizador, amigo querido de infância e de aventuras na noite campista…
(*) Advogado, colaborador da Folha e amigo de infância de Aluysio Cardoso Barbosa (1936/2012)
Publicado hoje (1o) na Folha da Manhã