Argentino analisa o fracasso da Argentina de Messi

 

Entre os jogadores de futebol do meu tempo de vida, Lionel Messi está entre os quatro melhores. Junto dele, coloco apenas seu compatriota Diego Maradona, o brasileiro Zico e o francês Zinédine Zidane. Cristiano Ronaldo, em meu entender, está uma oitava abaixo, ao lado de outros grandes atacantes, como os brasileiros Romário, Ronaldo Fenômeno, Reinaldo e Careca, o holandês Marco Van Basten e o alemão Jürgen Klinsmann.

Ídolo no futebol, desde que me entendo por gente, sempre tive em Zico. E a história de vida de Messi é semelhante à do eterno camisa 10 rubro-negro. Nascidos com uma habilidade genial com a bola, mas em corpos pequenos e franzinos, ambos tiveram que ter um grande clube trabalhando desde crianças em seus desenvolvimentos físicos. O Flamengo, no caso de Zico, e o Barcelona, no de Messi.

Um craque, geralmente, é aquele que domina vários fundamentos do futebol. Mas costuma ter as suas especialidades. Acompanhando futebol há 38 anos, nunca vi alguém correr em toda velocidade, com a bola grudada aos pés, amarrada por um barbante imaginário, como Messi. Sua jogada mais característica talvez seja avançar pela direita e cortar ao centro driblando sempre à esquerda, até o arremate quase sempre fatal de perna canhota.

Do ponta-direita Mané Garrincha (1933/83) era correta a afirmação de que só driblava à direita. Tanto quanto a constatação de que, mesmo sabendo disso de antemão, os defensores adversários simplesmente não conseguiam marcá-lo. Na analogia em direção oposta, mesmo sabendo antes que Messi vai driblar à esquerda, a impotência desse conhecimento é a mesma.

Fiquei ontem dividido com o Argentina 0x3 Croácia (aqui). Feliz com a vitória de uma escola de futebol que aprendi a admirar desde a antiga Iugoslávia. E tanto mais pela atuação de gala do clássico meia Luka Modric, coroada com uma pintura de gol, o segundo da Croácia. Mas fiquei muito triste com a atuação apagada de Messi, que não conseguiu ser ponto fora da curva descendente no bando que a Argentina se mostrou como time na Copa da Rússia.

Entretanto, por mais que seja fã de Messi e talvez me identifique mais com o temperamento argentino do que com o brasileiro, não nasci naquele país que aprendi a gostar, tanto pelo vistoso “toco y me voy” do seu futebol, quanto pela prosa de Jorge Luis Borges e Julio Cortázar. Não por outro motivo, pedi a um argentino e colaborador deste  blog, o advogado Gustavo Alejandro Oviedo, que desse seu testemunho sobre a tragédia que embala sua seleção, como um tango de Carlos Gardel.

Confira abaixo:

 

Messi repetiu várias vezes contra a Croácia a expressão que mais o tem marcado na Copa da Rússia (Foto: Ivan Alvarado – Reuters)

 

O triunfo da ignorância

Por Gustavo Alejandro Oviedo

 

Não tem jeito: continuo torcendo pela seleção argentina, apesar de que ela vem me defraudando Copa após Copa, desde o ano 1993, quando venceu pela última vez um torneio internacional — a Copa América. Dizem que isso é ser um torcedor: um sujeito que apoia seu time, jogando bem ou mal, e que quer vê-lo ganhar ainda que imerecidamente. O torcedor — ou esse tipo de torcedor, ao menos — é o antifutebol.

A derrota de ontem frente a Croácia me doeu, portanto. Mas ainda mais me dói ver um time que, antes de começar o jogo, já anunciava seu fracasso, nos rostos dos jogadores na hora do hino. Parecia que estavam vindo de um velório, e indo para outro. No entanto, esse prenúncio do fracasso vinha de muito antes: da classificação lastimável; da derrota por 6 a 1 no amistoso contra Espanha; e especialmente do fato da seleção ter como técnico um sujeito como Sampaoli.

Num livro que lançou há poucos meses atrás, chamado “Mis Latidos” (Minhas Batidas, vejam a breguice) Sampaoli confessa: “Eu não planejo nada. Tudo aparece na minha cabeça quando tem que aparecer. Odeio o planejamento”. Mais adiante, ele revela que nunca gostou de estudar: “Eu não posso ler um livro; leio duas páginas e fico entediado. Escrevo três coisas numa folha e me canso”.  Sampaoli faz parte daquela Argentina que o mundo odeia, e com razão. É a arrogância e a ignorância combinadas. Pior: é o orgulho de não querer melhorar, em nome de uma suposta genialidade inata e apedêutica. Basicamente, é um peronista.

Com tais antecedentes, é claro que não tinha como me surpreender com o resultado. Ao contrário: o estava prevendo. O que não faz mais do que potenciar minha indignação.  A boa noticia é que a partir da eliminação da Argentina poderei voltar a curtir o Mundial. Apesar de ainda faltar um jogo, um meme que circula pela web é premonitório: ‘Nem tudo está perdido. Ainda temos que perder para Nigéria’.

De quem tenho pena mesmo é de Messi. Um jogador excepcional que se viu obrigado a cumprir a missão chauvinista de carregar nos ombros a felicidade de uma nação. Um encargo que evidentemente não tem condições de satisfazer sozinho, embora graças a ele tenham se conseguido o vice-campeonato do mundo de 2014 e os dois vice-campeonatos nas Copas América de 2015 e 2016. Mas já sabemos: o segundo é o primeiro dos derrotados.

Tenho para mim que Messi só é feliz no Barcelona, o clube que o adotou ainda muito novo, que bancou o seu tratamento de saúde, e onde provavelmente acabará se aposentando. Espero que isso demore a acontecer, e que até lá nos continue a surpreender com suas genialidades. E que renuncie de vez à seleção argentina. Não apenas pelo seu próprio bem, mas pelo de um país que tem que aprender de uma vez por todas que, como dizia Brecht, é infeliz quando precisa de um herói.

 

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