Em jogo tenso pelo preconceito, Inglaterra bate a Colômbia nos pênaltis

 

Harry Kane comemora o pênalti sofrido e convertido por ele, que abriu o placar (Foto: Victor R. Caivano – AP)

 

Mais cedo, a Suécia hoje se classificou por 1 a 0 e despachou a Suíça. E agora vai enfrentar a Inglaterra nas quartas. No jogo que encerrou a fase das oitavas de final, os ingleses derrotaram a Colômbia na disputa de pênaltis, após um emocionante empate de 1 a 1 em tempo normal, mantido na prorrogação. Mesmo sem seu maior craque, James Rodríguez, vetado por lesão muscular, a seleção sul-americana lutou com bravura num jogo bastante tenso. Não só por seu caráter eliminatório, como pela capa de ontem do jornal inglês The Sun.

Preconceito assumido pelo tabloide inglês The Sun, no trocadilho cretino da sua manchete

Ao anunciar a partida de hoje, ao lado da foto do artilheiro Harry Kane, o tabloide sensacionalista usou como manchete: “Como 3 leões enfrentam uma nação que deu ao mundo Shakira, um ótimo café e… ahn… outras coisas. Vai Kane!”. Em inglês, “Go Kane” é um trocadilho para simular “cocaine” (cocaína), droga que já mergulhou a Colômbia numa sangrenta guerra pelo controle da sua produção e tráfico internacional.

A provocação preconceituosa do jornal inglês gerou reações de indignação por todo o mundo. E claramente insuflou os ânimos dos jogadores colombianos. Na Arena Spartak, em Moscou, o primeiro tempo se marcou mais pelas entradas ríspidas e trocas de provocação do que por chances de gol. O placar só seria aberto aos 11’ da segunda etapa, após Harry Kane sofrer e converter um pênalti. Ele se isoulou ainda mais na artilharia da Copa, agora com seis gols.

No que parece ter virado hábito deste Mundial, a Colômbia só mudou o resultado nos descontos da partida. Aos 49’, o zagueiro colombiano Yerry Mina, ex-Palmeiras e atual Barcelona, confirmou sua vocação de goleador e usou a cabeça para empatar. Foi o terceiro gol dele na Copa. A Inglaterra claramente sentiu o golpe, passando sufoco na prorrogação também por falha do seu técnico Gareth Southgate. Ele demorou a fazer as substituições a que ainda tinha direito, depois de já ter mudado o time no segundo tempo para tentar segurar a vitória parcial.

Como os ingleses conseguiram manter o empate pelo menos na prorrogação, o jogo foi para a disputa de pênaltis. Kane voltou a converter. Como não desperdiçaram Falcão García, Cuadrado, Rashford e Muriel. O goleiro Ospina mergulhou no canto esquerdo para pegar a cobrança de Henderson. Mas Uribe acertou o travessão e não abriu vantagem aos colombianos, que viram Trippier empatar a disputa em 3 a 3. Na última rodada, o goleiro inglês Pickford defendeu o chute de Bacca. E Dier converteu, conquistando a vaga às quartas para a Inglaterra.

Com a derrota da Colômbia, além da Argentina, agora serão seis europeus (França, Rússia, Croácia, Bélgica, Suécia e Inglaterra) e dois sul-americanos (Uruguai e Brasil)  disputando quatro vagas às semifinais.

Fechadas as oitavas, foi a primeira vez que os ingleses venceram uma disputa de pênaltis em Copas do Mundo. Eles já haviam perdido na semifinal de 1990, para a Alemanha; nas oitavas de 1998, para a Argentina; e nas quartas de 2006, para Portugal. Ao espantar hoje essa bruxa do seu futebol, a Inglaterra poderia aproveitar para exorcizar também o preconceito cretino assumido por sua imprensa.

 

 

Igor Franco — Mansplaining & Manusplaining

 

 

A semana que viu a Seleção Brasileira avançar à segunda fase da Copa do Mundo após três partidas pouco convincentes teve ainda menos emoção no campo político. Numa atípica calmaria em Brasília, com o decadente governo Temer evitando os holofotes por novos vexames e o Congresso em ritmo (ainda mais) lento, o STF não decepcionou e ajudou a aprofundar a crise de confiança nas instituições brasileiras, ao determinar a soltura de José Dirceu (PT) e João Cláudio Genu (PP). Além disso, a já famosa Segunda Turma também trancou uma ação contra Fernando Capez (PSDB-SP) e anulou operação que mirou a senadora petista Gleisi Hoffman.

As redes sociais, porém, pareceram dar mais importância à repercussão da entrevista da pré-candidata comunista Manuela D’Ávila ao programa Roda Viva. No dia seguinte à exibição do mesmo, a reclamação dos simpatizantes da política a respeito de excessivas interrupções foi reverberada em diversos portais e não tardou para que uma nova palavra mágica da esquerda progressista mundial desembarcasse com força em terras tupiniquins: mansplaining, junção da palavra man (homem) com a palavra explaining (explicação). Para quem não entendeu, é o nome dado ao hábito de interrupção de uma mulher por um interlocutor que pensa saber mais que ela sobre determinado assunto.

Defensores da comunista divulgaram o número de 62 interrupções por seus entrevistadores. Segundo a Folha de São Paulo, Manuela D’Ávila foi interrompida 40 vezes durante a entrevista. Em comparação, o mesmo jornal apurou que Ciro Gomes havia sido interrompido 8 vezes, Guilherme Boulos 9 vezes e Marina Silva, também mulher, apenas 3 vezes.

Há evidência empírica antiga e recente de que a conduta de interromper mulheres ao longo de um discurso, é, realmente, uma prática disseminada e corriqueira. Porém, os mesmos estudos mostram que também as mulheres interrompem outras mulheres com mais frequência, desidratando a teoria de que se trata de um problema de machismo. A explicação para o fenômeno foi tentada por um artigo que correlaciona o vocabulário utilizado com mais frequência por mulheres, com palavras menos assertivas que as utilizadas por homens, como causa para a postura deselegante. Segundo os pesquisadores, ao denotar menos confiança através de palavras genéricas, as mulheres ficariam mais vulneráveis à interpelações e contraposições intempestivas. Tal característica foi recentemente lembrado numa entrevista concedida pelo psicólogo canadense Jordan B. Peterson à apresentadora Cathy Newman, em vídeo que viralizou na rede e fez de Peterson o inimigo número 1 das feministas canadenses, americanas e europeias. Aliás, dado o comportamento da entrevistadora no episódio, não poderia haver reclamação se um termo como womansplaining surgisse.

Noves fora as evidências científicas, não me parece contra-intuitivo pensar na disseminação dessa prática. Situações de tensão e conflito (seja numa reunião executiva, seja na deliberação de um grupo de políticos, por exemplo) são historicamente dominadas por homens. A presença de mulheres – que é altamente positiva e desejável – em tais ambientes tende a gerar estranheza e um comportamento defensivo por parte da força que se sente ameaçada.  A postura, além de deselegante e pretensiosa, também não é contra-intuitiva. Entretanto, nada disso ocorreu no programa Roda Viva, que tive a oportunidade de assistir ao vivo.

É importante registrar que a própria Manuela não apontou nada de anormal ao longo da edição. Ao longo de mais de uma hora de perguntas e respostas, as interrupções se davam na maioria das vezes dentro do contexto da discussão. Em muitas ocasiões, a candidata simplesmente tergiversava sobre os questionamentos, como quando questionada sobre o desastre humanitário recente na Venezuela. Manuela também se recusou a censurar Stálin e outros sanguinários líderes comunistas, trazendo uma justificativa infame ao comportamento genocida do soviético. Em outras ocasiões, a defesa apaixonada do ex-presidente presidiário, com afirmações do tipo “todos sabem que não há prova” causaram desconforto e imediato repúdio dos entrevistadores.

O mansplaining pode ser, de fato, algo real. Porém, o que mais faltou no Roda Vivo de segunda passada foi a Manusplaining: a necessidade de Manu explicar como conciliar a suposta defesa de uma esquerda moderna com a defesa apaixonada de ditadores e criminosos parceiros de ideologia.

 

Bélgica decepciona, mas vira sobre o Japão e agora pega o Brasil

 

Atacante japonês Genki Haraguchi marca o primeiro gol do Japão sobre a Bélgica, na zebra de pintas e olhos oblíquos que quase se desenhou na Copa da Rússia (Foto de Jorge Silva – Reuters)

 

Numa Copa em que vários favoritos já ficaram pelo caminho, hoje foi a vez de quem jogou o melhor futebol da fase de grupos (aqui) também decepcionar. Mas como em futebol o que vale é bola na rede, depois de levar dois gols do Japão, a Bélgica teve força para marcar outros três, o último aos 49’ do segundo tempo. E agora vai tentar se refazer do tremendo susto para enfrentar o Brasil, às 15h desta sexta (06).

No primeiro tempo, como o México havia feito mais cedo com o Brasil, o Japão surpreendeu ao impor sua marcação no campo de defesa do adversário, considerado franco favorito pela crônica esportiva do mundo. E a pressão revelou limitações na saída de bola e falhas na defesa que os belgas ainda não haviam mostrado na Copa da Rússia. Ainda assim, a seleção europeia criou várias chances, muitas não convertidas em gol pelo excesso de preciosismo de seus jogadores.

Depois do intervalo, quando todos pensavam que a Bélgica finalmente faria valer sua maior qualidade técnica, começou a se desenhar uma zebra de pintas e olhos oblíquos. Logo aos 2’, o meia Gaku Shibasaki armou um contra-ataque rápido e lançou Genki Haraguchi na esquerda. Revelando a falha na defesa belga no lado em que o Brasil costuma concentrar suas ações ofensivas, o atacante japonês bateu cruzado para abrir o placar.

A surpresa foi ainda maior quando, apenas quatro minutos depois, o meia Shinji Kagawa deu um lençol em seu marcador antes de servir a Takashi Inui. Ele acertou um belo chute para fazer 2 a 0. A Bélgica sentiu demais o golpe. A reação nasceu de um lance fortuito aos 24’, quando zagueiro belga Jan Vertonghen tentou cruzar de cabeça na área. A bola ganhou uma curva inesperada e o goleiro Eiji Kawashima aceitou o frango.

O empate viria cinco minutos depois, fruto das alterações do técnico espanhol da Bélgica, Roberto Martínez. Sem jogar nada, o hábil Dries Mertens havia dado lugar a Marouane Fellaini, de 1,94m, no meio de campo belga. Também de cabeça, ele completou o cruzamento de Eden Hazard para fazer 2 a 2.

Os dois gols em bolas altas não serviram de lição aos esforçados, mas baixos e ainda ingênuos japoneses. No último minuto dos descontos, eles tinham um escanteio e cruzaram uma bola alta na área belga. Com 1,99m, o goleiro Thibaut Courtois pegou sem problemas e armou com as mãos o contra-ataque.

Apesar da atuação decepcionante, o meia Kevin De Bruyne lançou o lateral Thomas Meunier pela extrema direita. Ele cruzou rasteiro da área, o centroavante Romelu Lukaku puxou a marcação, fez o corta luz e serviu a bola ao meia Nacer Chadli. Livre, ele classificou os belgas para enfrentar o Brasil.

Como a Croácia, que também ganhou com autoridade seus três primeiros jogos no Mundial, mas só passou às quartas na disputa de pênaltis (aqui) contra a Dinamarca, a Bélgica decepcionou diante do Japão. Na defesa, expôs uma linha pesada e lenta, que pode ser explorada pela rapidez de jogadores como Neymar, Philippe Coutinho, Willian e Gabriel Jesus (ou Firmino?).

Quanto ao decantado quarteto ofensivo belga, apenas Hazard e Lukaku jogaram hoje com a entrega que uma partida eliminatória de Copa do Mundo exige. Só não marcaram também seus gols por absoluta falta de sorte. Já o armador De Bruyne, estrela da Premier League, e o meia-direita Mertens mostraram uma gritante queda no nível do futebol que apresentaram na fase de grupos.

A Copa da Rússia já deixou seleções de peso para trás, como Alemanha, Argentina e Espanha. Ao mesmo tempo, evidenciou a croatas a belgas como camisas de maior tradição podem fazer falta na hora de confirmar em campo a condição de candidatos ao título.

Ainda assim, não se deve duvidar da capacidade técnica dos jogadores da Bélgica. Nem do que uma virada como a de hoje, mesmo contra o Japão, é capaz de produzir num time de futebol.

 

 

Com Neymar em dia de Neymar, Brasil despacha o México por 2 a 0

 

Neymar bate no peito na comemoração do primeiro gol do Brasil (Foto: Frank Augstein – AP)

 

Jogadores do Paris Saint-Germain, o francês Kylian Mbappé (aqui) e o uruguaio Edinson Cavani (aqui) já haviam brilhado no sábado (30), quando classificaram suas seleções às quartas de final da Copa da Rússia. Companheiro dos dois no clube parisiense, hoje foi o dia de Neymar fazer o mesmo na vitória de 2 a 0 do Brasil sobre o México. Eleito pela Fifa como melhor jogador em campo, ele marcou o primeiro gol, em jogada que criou e concluiu, aos 6’ do da etapa final. E puxou o contra-ataque no segundo, aos 43’, marcado pelo centroavante Firmino.

Antes do jogo, o técnico colombiano do México, Juan Carlos Osorio, havia dito que jogaria de igual para igual com o Brasil. E o treinador cumpriu o que prometeu. Logo após o apito inicial, a seleção mexicana avançou a marcação ao campo defensivo brasileiro, gerando bastante dificuldade, sobretudo na saída de bola. Pela esquerda, o atacante Vela deu muito trabalho ao lateral-direito Fagner. Mas ele e toda a defesa brasileira voltaram a demonstrar solidez.

Incentivada das arquibancadas de Samara por sua efusiva torcida, a pressão mexicana incomodava, mas não foi convertida em chances de gol. Com o Brasil acuado, coube a Neymar equilibrar as ações. Aos 24’, em jogada individual pela esquerda, ele driblou o lateral-direito Edson Alvarez e bateu para a defesa do goleiro Guillermo Ochoa. Foi a fagulha que acendeu o time e a torcida brasileira, com a bola passando a rondar a área mexicana. Aos 32’, foi a vez do atacante Gabriel Jesus também testar Ochoa.

Com o jogo equilibrado no primeiro tempo, no segundo foi Neymar que pesou a balança a favor do Brasil. Logo aos 5’, diante da área mexicana, ele cortou da esquerda para o meio, levando três marcadores, que colocou fora da jogada com um toque sutil de calcanhar a Willian. Outro destaque da partida, o jovem meia entrou pela esquerda e cruzou. A bola passou por Gabriel Jesus, mas não por Neymar: Brasil 1×0. Na comemoração do gol, o camisa 10 foi erguido nos ombros pelo meia Paulinho.

O México claramente sentiu o baque. Jogador que entrou no intervalo, no lugar do veterano volante Rafa Márquez, Miguel Layún entrou na lateral-direita com a função de marcar e provocar Neymar. Tite foi inteligente ao perceber a intenção e inverteu a posição entre seu camisa 10 e Gabriel Jesus: o primeiro passou a atuar mais pelo meio e o centroavante foi jogar na esquerda. Aos 14’, o técnico herdou um problema para o próximo jogo: o eficiente volante Casemiro levou seu segundo cartão amarelo na Copa e está fora das quartas de final.

Também mais livre com a inversão entre Neymar e Gabriel, Willian fez sua melhor exibição na Copa da Rússia. Aos 18’, em penetração pela direita, ele pedalou sobre a bola, driblou o zagueiro Carlos Salcedo e bateu para uma boa defesa de Ochoa. Aos 25’, num lance fora de campo, diante de Tite e do banco brasileiro, Layún pisou propositalmente no tornozelo de Neymar, que estava caído. Depois do jogo, o técnico Osorio chorou suas mágoas, falou em “palhaçada” e creditou o resultado do jogo à arbitragem, que não deu o cartão amarelo ao desleal jogador mexicano.

Aos 34’, para impedir o domínio de bola pelo meio de campo do México, Tite novamente voltou a intervir na partida. Ele substituiu Paulinho por Fernandinho, que reforçou a marcação no setor. Aos 40’, quem saiu de campo foi o meia Philippe Coutinho, para dar entrada ao atacante Firmino.

Quatro minutos depois, as duas mudanças de Tite foram início e fim do segundo gol brasileiro: Fernandinho lançou Neymar em contra-ataque. O camisa 10 penetrou pela esquerda e bateu a gol de biquinho de pé. Também com o pé, Ochoa desviou a bola para Firmino completar em incisão pela área: Brasil 2×0.

Conquistada a vaga do Brasil às quartas de final na próxima sexta (06), à espera do adversário a ser definido no confronto de daqui a pouco entre Bélgica e Japão, Neymar foi perguntado se essa seria a Copa de Neymar, depois que o argentino Lionel Messi e o português Cristiano Ronaldo foram eliminados nas oitavas. Ele respondeu: “Quero que essa seja a Copa do Brasil!”

Oxalá as respostas do craque brasileiro continuem a ser dadas dentro de campo. E na bola.

 

 

Em jogo para cardíacos, Croácia elimina a Dinamarca nos pênaltis

 

Na prorrogação, Modric criou a jogada que gerou o pênalti, mas despediçou sua cobrança, defendida por Schmeichel. Depois, na disputa de pênaltis, o craque croata bateu e converteu

 

Jogo para cardíacos. Nele, numa disputa de pênaltis sem precedentes nas Copas do Mundo, a Croácia eliminou a Dinamarca por 3 a 2. Brilharam os goleiros das duas seleções: o croata Danijel Subacic pegou nada menos do que três cobranças, enquanto o dinamarquês Kasper Schmeichel pegou duas. Mas ele já havia defendido outra, na prorrogação, perdido pelo cerebral meia Luka Modric, depois do lindo passe que gerou a jogada convertida em pênalti.

Diferente da cobrança de pênaltis, os gols vieram rápido no tempo normal. No primeiro minuto de jogo, o zagueiro dinamarquês Mathias Jorgensen abriu o placar, num lance confuso na área croata. A bola mascada chegou a bater no goleiro Subacic, que falhou antes de se tornar o herói da partida. O empate saiu três minutos depois, em outra jogada insuitada, quando o atacante Mario Mandzukic aproveitou uma bola que um defensor da Dinamarca chutou no outro.

No primeiro tempo, com boa atuação de Modric, a Croácia impôs sua maior técnica contra a bem organizada equipe dinamarquesa. Mas o craque croata, que brilhou na fase de grupos, não manteve o nível da sua atuação no segundo tempo, propiciando o domínio da Dinamarca. O placar, no entanto, permaneceu inalterado.

Raras vezes pôde se ver um time de futebol tão atrelado a um jogador quanto a Croácia a Modric. Embora não estivesse bem no jogo, demonstrando cansaço na prorrogação, ele fez um lançamento magistral para o atacante Ante Rebic, que driblou Schmeichel e foi derrubado por Jorgensen dentro da área. Mas Modric bateu fraco, no canto direito, e o goleiro dinamarquês pegou.

Das tribunas, Peter Schmeichel, goleiro que marcou época na seleção da Dinamarca e pai do atual titular da posição, vibrou bastante.

Embora a Croácia não tenha se deixado abater após o pênalti perdido por Modric, o placar final da prorrogação manteve o empate de 1 a 1. Na disputa de pênaltis, foi a vez de Subacic brilhar ainda mais que Schmeichel (o filho) e garantir para a Croácia a vaga nas quartas de final contra a Rússia.

Herdeiros da clássica escola de futebol da antiga Iugoslávia, os croatas não chegavam tão longe numa Copa desde 1998, na França, quando terminaram em 3º lugar. Astro da campanha e artilheiro daquele Mundial, com seis gols, o ex-atacante Davor Suker também esteve presente hoje ao estádio Níjni Novgorod. Canhoto habilidoso em seus tempos de jogador, poderia ensinar o caminho do gol aos seis jogadores que despediçaram pênaltis diante dos seus olhos.

 

 

Na disputa de pênaltis, favorita Espanha é eliminada pela Rússia

 

Jorge Koke cobre o rosto com a camisa da Espanha, depois de cobrar o pênalti para a defesa do goleiro russo Igor Akinfeev (Foto: Christian Hartmann – Reuters)

 

Caiu mais um favorito na Copa da Rússia. Na disputa de pênaltis, a dona da casa eliminou a Espanha. Herói do jogo, o goleiro Igor Akinfeev defendeu a terceira cobrança, do meia Jorge Koke, e a quinta, também desperdiçada pelo atacante Iago Aspas.

No tempo normal, o placar terminou 1 a 1. Aos 10’ do primeiro tempo, a Espanha abriu o placar com um gol contra do experiente zagueiro Sergey Ignashevich. Na disputa com Sergio Ramos, em lance de bola parada, ela tocou no calcanhar do russo, antes de morrer em suas redes.

Aos 39’ da etapa inicial, a Rússia chegaria ao empate num pênalti bobo do zagueiro espanhol Gerard Piqué. Ele subiu em sua área com o braço esquerdo erguido, interrompendo a trajetória da bola. Sem nada a ver com isso, o centroavante Artem Dzyuba cobrou com categoria, talvez como prenúncio do que viria depois.

Sempre questionada pelo excessivo toque de bola, mas sem capacidade de penetração, a Espanha hoje confirmou seus críticos. Sua seleção não conseguiu traduzir os impressionantes 79% de posse de bola, no tempo normal e prorrogação, em chances de gol.

Antes de virar o herói da partida na disputa de pênaltis, o goleiro russo Akinfeev só fez duas defesas mais difíceis: em seu canto direito, no segundo tempo, num chute de fora da área do meia Andrés Iniesta, que começou no banco. E, na segunda etapa da prorrogação, numa rara inflitração espanhola arrematada pelo atacante Rodrigo Moreno, pela direita da área. Brasileiro naturalizado, ele entrou bem no jogo, mas sem tempo para alterar seu resultado.

Criado no Barcelona do técnico Pepe Guardiola, antes de conquistar a Copa do Mundo de 2010, com a Espanha treinada por Vicente Del Bosque, o estilo de jogo conhecido como tiki-taka se baseia na troca incessante de passes. Foi também uma maneira de ampliar no gramado o sucesso espanhol nas quadras de futsal, esporte no qual passaram a rivalizar com o Brasil.

Como jogadores pequenos, mas extremamente habilidosos, como Iniesta, o argentino Lionel Messi e o já aposentado meia Xavi Hernández, o Barcelona criou uma maneira de jogar onde a posse de bola é usada para impor a técnica sobre a força física. Com o sucesso do clube catalão e da seleção da Espanha, o novo estilo revolucionou o futebol do mundo, na virada da primeira década do séc. XXI.

No entanto, no país que abrigou a maior revolução do século XX, hoje prevaleceu a Rússia. Ela não teve a menor vergonha de, mesmo dentro de Moscou, atuar quase o tempo inteiro com seus 11 jogadores atrás da linha da bola. Já a partir do segundo tempo, o time da casa jogou claramente para tentar levar a decisão à disputa de pênaltis.

Com a sorte, a incapacidade da Espanha de ser mais incisiva e a atuação determinante do goleiro Akinfeev, hoje deu certo. Mas, tradicionalmente, as retrancas não costumam ir além das quartas de final em Copas do Mundo. A Rússia já está lá. E agora espera a definição do seu adversário entre a Croácia e Dinamarca.

Dentro de casa, os russos já derrotaram a França de Napoleão e a Alemanha Hitler. Hoje foi a vez da Espanha de Isco e Iniesta.

 

 

Artigo do domingo — Messi, CR 7, Mbappé, Cavani e Neymar

 

Mbappé e Cavani

 

 

Nem Lionel Messi, nem Cristiano Ronaldo. Os grandes craques da Argentina e Portugal, que na última década se revezaram no prêmio de melhor jogador de mundo — cada um, cinco vezes —, se despediram ontem da Copa da Rússia. Mesmo com eles em campo, a verdade é que suas seleções foram eliminadas por times melhores: a talentosa França (aqui) e o aplicado Uruguai (aqui).

A primeira fase talvez tenha se marcado pela menor diferença real, traduzida em placar, entre as seleções consideradas grandes e pequenas nas últimas 20 Copas. Surpresas, como a eliminação precoce da atual campeã Alemanha, sempre aconteceram.

Para os brasileiros ainda recalcados com os 7 a 1 que os germânicos nos impuseram quatro anos atrás, em pleno Mineirão, nunca é demais lembrar que a França, em 2002, a Itália, em 2010, e a Espanha, em 2014, também caíram na primeira fase. E ostentavam o título das Copas anteriores. Todavia, um torcedor francês, italiano ou espanhol talvez tenha dificuldade para se lembrar da última vez que suas respectivas seleções foram humilhadas por 7 a 1 em qualquer Mundial. Tanto mais em um por eles sediado.

Em relação à fase de grupos da Rússia, como em todas as anteriores, desde que o atual modelo de disputa foi adotado na Copa de 1986, no México, os times considerados pequenos sempre jogaram retrancados contra os adversários de maior tradição. E, tradicionalmente, esses ferrolhos defensivos vão ficando para trás quando começa o Mundial de verdade. A partir das oitavas: empatou? Prorrogação e disputa de pênaltis. Perdeu? Volta pra casa!

Ainda sobraram alguns times com propostas mais passivas na Rússia. A começar por sua própria seleção, é difícil pensar que ela vá partir para dentro da Espanha, no jogo das 11h de hoje. Como um pouco depois, às 15h, a Dinamarca não deve propor o jogo contra a Croácia.

Podem até vencer, pois o futebol, como ressalva (aqui) o ex-craque Zico: “é o esporte coletivo em que o mais fraco tem mais chance contra o mais forte”. Mas dificilmente o farão propondo o jogo, como um lutador que ocupa o centro do ringue ou octógono. Ou, politicamente correto à parte, o par masculino na dança.

Ao lado de russos e dinamarqueses, ainda sobrevivem mexicanos, japoneses, suecos e suíços. Os dois últimos jogam entre si, às 11h da próxima terça (03). Um dia antes, o oscilante México enfrenta o Brasil nesta segunda (02), às 11h. Às 15h do mesmo dia, caberá o Japão à Bélgica, que apresentou (aqui) o futebol mais vistoso da fase de grupos. Apenas a Colômbia, pela cultura ofensiva do seu futebol, pode pretender ser o polo ativo no confronto com a Inglaterra.

Mas tudo isso são conjecturas. Passíveis de serem jogadas na terra de um campo de várzea pela imprevisibilidade do futebol. Afinal, qual outro esporte é tão democrático? Um nadador tem que ser alto, com ombros e costas largas, membros compridos e cintura fina. Um jogador de basquete ou vôlei tem que ser alto e forte. Um velocista precisa ser forte e explosivo. Um corredor de fundo tem que ser magro, de pernas longas e tronco curto. Para um lutador, as diferenças de tamanho e peso são segregadas em várias categorias distintas.

No futebol, um atacante pode ser genial, independente do tipo físico. Pode ser atarracado e ter 1,67m, como o brasileiro Romário. Pode parecer um atleta de basquete ou vôlei, como o sueco Zlatan Ibrahimovic — fora da Copa por seu temperamento desagregador, não por seu 1,95m. Mesmo para um meia que envergue a mítica camisa 10, também é possível marcar época sendo alto e longilíneo, como o francês Zinédine Zidane, ou baixinho e gordinho como o argentino Diego Maradona.

Em sua diversidade, o futebol é o mais humano dos esportes. Épico e trágico como nenhum outro, só nele o mesmo atleta, equipe e treinador podem passar do céu ao inferno na epopeia de 90 minutos. Com direito a prorrogação e pênaltis nas Copas do Mundo. Por isso talvez seja também o mais amado. Mais que as próprias Olimpíadas, que o abarcam. Mas não igualam.

Suscetível aos caprichos do destino, o maior torneio de futebol ontem mandou para casa seus dois maiores jogadores na última década. Mesmo gênios como Lionel Messi e Cristiano Ronaldo são vergados à realidade de um esporte coletivo. Com espaço individual ofertado pela imposição dos seus times, ontem foi o dia de brilharem o jovem meia francês Kylian Mbappé e o experiente atacante uruguaio Edinson Cavani.

Cada um marcou dois gols. Mas o destaque coube ao camisa 10 da França, segundo jogador com menos de 20 anos a marcar mais de uma vez em jogos eliminatórios de Copas do Mundo. O primeiro foi um tal de Pelé.

Fora da Copa, Messi continuará a ser o astro maior do Barcelona. Assim como CR 7, no Real Madrid. Ontem, porém, ambos foram ofuscados por dois jogadores do Paris Saint-Germain. Companheiro de Mbappé e Cavani no clube parisiense, Neymar entra em campo amanhã pelo Brasil. E provará se tudo não passou de mais uma coincidência dos deuses da bola. Ou não.

 

Publicado hoje (30) na Folha da Manhã