Compromisso com a Constituição
No dia seguinte ao primeiro turno, os candidatos a presidente Jair Bolsonaro (PSL) e Fernando Haddad (PT) tranquilizaram quem teme pelo país, independente do vencedor do segundo turno. Ao Jornal Nacional, ambos garantiram o compromisso com a Constituição Brasileira, que tentarão reformar apenas pelo recurso nela previsto das emendas. As dúvidas eram pertinentes, após o general Hamilton Mourão (PRTB), vice de Bolsonaro, declarar que uma nova Constituição poderia ser feita sem a participação de representantes eleitos. Sem contar o projeto de governo do PT, que previa uma nova Constituinte, só agora descartada por Haddad.
“Traidor da pátria”
Ainda vai demorar para que se compreenda o grito de “basta” do eleitor no domingo. À espera do seu último ato, esta eleição talvez signifique o fim do Brasil da Nova República, construído a duras penas após a ditadura militar (1964/85). Último líder daquele período ainda na ativa na política nacional, mesmo preso desde 7 de abril, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) parece sido superado por quem melhor soube encarnar o anti-Lula: Bolsonaro. Mas, acima dos personagens, o roteiro da Constituição precisa ser preservado. Como setenciou o ex-deputado Ulysses Guimarães ao promulgá-la há 30 anos: “traidor da Constituição é traidor da pátria”.
Facadas
O problema parece ser a queda das máscaras com a vitória esmagadora do antipetismo nas urnas. E o rosto deformado que isso revela. Em Salvador, na madrugada de segunda, o mestre capoeirista Romualdo Rosário da Costa, de 63 anos, foi morto com 12 facadas pelas costas. O motivo? Ele disse ao seu assassino, o barbeiro Paulo Sérgio Ferreira de Santana, que era contrário a Bolsonaro. À exceção do desfecho, como diferenciar o crime bárbaro da facada que o próprio Bolsonaro levou no abdômen, enquanto era carregado por seus militantes nas ruas de Juiz de Fora, desferida covardemente pelo ex-militante do Psol Adélio Bispo de Oliveira?
Bolsonaro e Witzel
O país caminha em limite tênue entre o contraditório, fundamental à democracia, e a violência. Na demanda de equilíbrio, não ajuda a declaração dada ontem por Bolsonaro, que voltou a chamar Haddad de “canalha”. Muito menos o ex-juiz federal Wilson Witzel (PSC), que ontem ameaçou dar voz de prisão a Eduardo Paes (DEM), seu adversário no segundo turno a governador do Rio, caso este utilize nos debates o que julga serem fake news. Bolsonaro teve a lupa nacional sobre si desde que se revelou presidenciável competitivo, há um ano. Witzel, que cresceu espantosamente nos últimos dias antes da urna, só agora está no foco.
Delegado resolve
Sobre a ameaça do ex-magistrado, que Paes considerou autoritarismo, a coluna ouviu ontem alguns juristas. Para o promotor estadual Victor Queiroz, a decisão caberia ao delegado de Polícia ao qual o caso fosse encaminhado: “O crime de injúria visando à propaganda eleitoral está previsto no artigo 326 do Código Eleitoral. Há também o crime de injúria genérico, previsto no artigo 140 do Código Penal. Tratam-se de delitos de menor potencial ofensivo. É o delegado de Polícia quem vai deliberar sobre a lavratura do termo circunstanciado ou do auto de prisão em flagrante, e não o agente policial ou o cidadão que optou por conduzir o autor do fato”.
Carteirada antidemocrática
Advogado do Grupo Folha, João Paulo Granja chamou a ameaça de Witzel de “carteirada”: “Em relação ao recente vídeo onde o candidato Wilson Witzel afirma que promoverá a prisão do também candidato Eduardo Paes, caso venha a ser injuriado no debate. Trata-se de grosseiro equívoco jurídico, provavelmente derivado do acirramento da disputa eleitoral para o governo do nosso Estado. Inexiste prisão em flagrante delito em crime de menor potencial ofensivo, como no caso. É certo, ademais, que Witzel não mais ocupa qualquer cargo público, conferindo cores mais fortes à antidemocrática e ilegal ‘carteirada’ prometida”.
Desvestir a toga
Advogado criminal, Felipe Drumond analisou a ameaça como representante da OAB-Campos: “A prisão em flagrante seria de difícil implementação por se tratar de crime de menor potencial ofensivo. A lei veda o auto de prisão em flagrante se o acusado se comprometer a comparecer à Justiça, mas autoriza que seja conduzido coercitivamente à delegacia. A menção, por Paes, de fatos classificados por Witzel como ofensivos não seria suficiente para prisão. Em debates políticos, é comum que eventos desonrosos sejam mencionados com a intenção de informar o eleitor”. Favorito como candidato, Witzel precisa desvestir a toga. E descalçar o salto.
Publicado hoje (10) na Folha da Manhã
O QUE ACONTECEU COM A DEMOCRACIA BRASILEIRA?
É um assombro que o candidato Wilson Witzel (PSC), que disputa o governo do Rio pelo PSC, tenha gravado um vídeo ameaçando de prisão seu oponente, Eduardo Paes (DEM), em pleno debate, caso, disse ele, o outro cometesse crime de injúria contra ele. Witzel acusa Paes de espalhar fake news contra ele. Prova? Nenhuma. Segundo o ex-juiz federal, só pode ser Paes… Diria que o raciocínio está mais ou menos adequado à metafísica destes tempos.
Trata-se de uma bravata, investindo na linha “super-homem, prendo, arrebento e aconteço”. Parece-me que o candidato abusa da sua condição de ex-juiz, como a dizer para o eleitorado: “Olhe aqui, eu sou muito poderoso, tá?” Não por acaso, Witzel grudou-se a Bosonaro, a quem já chama de “presidente” e, fica evidente, tenta ser a versão carioca do “capitão”.
A coisa é de um ridículo atroz. Este senhor tem de decidir se quer ser governador do Rio ou se pretende meter na cadeia quem discorda dele.
A três dias da eleição, o buliçoso juiz Marcelo Bretas, amigo de Witzel, divulgou um depoimento de Alexandre Pinto, um ex-secretário de Paes, que o acusou de conivência com corrupção na Prefeitura do Rio envolvendo a Odebrecht. Atenção! Este senhor, corrupto confesso, já havia prestado vários depoimentos sem nunca ter mencionado o nome de Paes. Os delatores da empreiteira jamais envolveram o ex-prefeito e atual candidato ao governo em falcatruas.
Sim, tenta-se atribuir a votação robusta de Witzel a correntes na Internet, sobretudo de WhatsApp, ligadas ao bolsonarismo. Certamente existiram. Mas é evidente que o juiz que se notabilizou pela tempestade de processos contra Sérgio Cabral criou um fato eleitoral, que acabou beneficiando seu amigo, ainda que essa não fosse a intenção. Nesses casos, o que interessa e o fato.
Com a crise econômica instalou-se um mal-estar amplo na população. A MÍDIA passou a instrumentalizar esse mal-estar através de suas manchetes e transmissões. Qualquer infração administrativa, tratada como crime pela MÍDIA , resultava em endosso total pelo Ministério Público Federal e pela ação de polícia.
À medida em que o mal-estar avançava, a MÍDIA ia atropelando todos os princípios constitucionais de presunção da inocência, de direitos individuais. E seus critérios de julgamento açulavam a massa e eram aceitos pelos Ministros do STF e pelos procuradores gerais, liberando a base de juízes e procuradores para praticar todo tipo de arbitrariedade.
A MÍDIA usou e abusou dessas prerrogativas. E Ministros do Supremo, como Luís Roberto Barroso, aproveitaram para cavalgar a onda e tirar do caminho esse empecilho ao empreendedorismo jurídico: a Constituição. Justamemente o pilar que impedia a casa do STF de cair.
Ministros, procuradores, jornalistas mostravam uma valentia indômita, de bater em um inimigo que sequer sabia se defender – as forças democráticas – e em um instituto que era a base do seu próprio poder – a Constituição.
Impuseram toda sorte de narrativas falsas, equiparando o inimigo “republicano” às milícias venezuelanas, ao terror na Nicarágua. Valentes até a medula, valentes de fancaria, valendo-se do seu poder para entrar em órbita, abandonando até os limites impostos pela Constituição.
Se o clamor das ruas lhes deu um poder divino, de poderem ser os arautos da rebelião das massas, porque Luiz Fux, Luis Barroso iriam se submeter a uma mera Constituição preparada por humanos?
E a Constituição foi se esboroando. A cada dia, placas de legitimidade iam sendo arrancadas, expondo o aço e tijolo de uma corte sem alma. E assim foi plantando ódio a todo momento.
Na Globo, Miriam Leitão sempre foi uma campeã desse contorcionismo.
Como no dia em que denunciou que seu perfil na Wikipedia havia sido manipulado por um computador da extensa rede de computadores do Palácio. Uma alteração de nada, lembrando que ela errou em previsões econômicas. Mesmo que fosse grave, era uma ação individual de um usuário.
Imediatamente ergueu-se um clamor nacional contra as milícias digitais de esqueda, e uma presidente, tonta até a medula, correu para pedir desculpas pelo ocorrido e abrir uma sindicância.
O segundo momento foi em uma manifestação em um avião, de sindicalistas contra a Globo. A manifestação foi filmada, divulgada por várias pessoas e em nenhum momento aparecia sequer o nome ou a figura de Miriam Leitão.
Dois dias depois (!) Leitão aparece em sua coluna, com a indignação dos justos, dizendo-se vítima dessas hordas petistas, afirmando, inclusive, que marmanjos passavam por sua poltrona e davam esbarrões propositais, QUE NENHUM OUTRO PASSAGEIRO VIU , nenhum outro passageiro se manifestou. Mais um tijolo na construção da narrativa das milícias castristas, chavistas,etc.
O Sistema ajudou a criar os fantasmas e, no meio da bruma, apareceu o lobo faminto. Instala-se o pânico no Sistema. E Miriam Leitão ousa um momento de grandeza, no Bom Dia Brasil, colocando a coragem e os princípios na frente do oportunismo, e reconhecendo o óbvio: com todos seus defeitos, o PT não é autoritário, enquanto Bolsonaro fez toda sua carreira em defesa da ditadura, da tortura e do preconceito. Enquanto que o PT nasceu e cresceu na democracia e jogou o jogo democrático.
Ampla repercussão! Só que, em vez de petistas indignados, mas jogando dentro das regras democráticas, contidos pelas normas do Sistema, Miriam se viu frente a frente com a malta bolsonariana e com a possibilidade concreta de se ter um Bolsonaro presidente.
Hoje, no Globo, Miriam joga a toalha: “Compromisso de Haddad e Bolsonaro com a democracia é alívio”. O que Bolsonaro fez? Uma mera declaração no Jornal Nacional.
Tempos atrás, a própria Miriam criticou o mercado por incorrer no “autoengano” de supor Bolsonaro um liberal, confiando apenas em meras declarações.
A reação de Miriam é uma antecipação do que será a reação de valentes Ministros do Supremo, da PGR, dos defensores da “refundação”, que ajudaram a jogar o país nesse atoleiro.
Tiveram excesso de coragem com os fracos – o que é sinônimo de covardia. E ausência absoluta de coragem com as ameaças reais.
Com o tempo, uma imprensa cínica, mercenária, demagógica e corrupta formará um público tão vil como ela mesma – Joseph Pulitzer.
Bolsonaro/Witzel: resultado de longos anos de despolitização da população.
A imprensa está no alvo. Aliás, ela já está na mira de delinquentes das redes sociais. A liberdade de expressão não precisa de instrumentos formais de censura. Basta que se torne irrespirável o ambiente da diversidade e da pluralidade: não entrem na fila da guilhotina, defendendo instrumentos de exceção. Eles se voltarão contra você. É uma questão de tempo.
Cara Jurema,
Seu texto longo demanda resposta curta: pela ausência de autocrítica e subserviência canina a Lula, a esquerda brasileira pariu Bolsonaro como fenômeno nacional. Que, segundo todas as projeções, agora terá que ser embalado pelo resto do Brasil. “Golpista” para os lulopetistas e “comunista”, para os bolsominions, a mídia talvez seja o reflexo mais exato da bipolaridade do país.
Grato pela participação!
Aluysio
Se utilizar fake fosse caso de prisão o Bolsonario já estaria desde o início da campanha.