Eleição para reitor da Uenf: o primado da política e da ética da responsabilidade
Por Roberto Dutra
Eleição para reitor é o auge da democracia interna em uma universidade. É o momento político por excelência. Na Uenf, duas chapas disputam o segundo turno da eleição para a reitoria: Raúl e Rosana (chapa 10) contra Carlão e Juraci (chapa 11). Neste texto defendo o primado do caráter político da eleição e do cargo de reitor e o voto na chapa 10, de Raúl e Rosana.
Costuma-se atribuir ao ambiente universitário certa incompetência em lidar com o jogo político real que se desenvolve fora da universidade, especialmente na tarefa de construir imagem pública vigorosa da instituição como recurso de poder para os desafios políticos de defender a universidade pública em ambiente fortemente hostil, como o atual, marcado pela realização assustadora de graves ameaças ao ensino, à pesquisa e extensão. Ao reitor cabe um papel primariamente político: fortalecer, ramificar e instrumentalizar os vínculos da universidade com a sociedade como recurso de poder para construção e defesa da vida científica, pedagógica e extensionista da universidade pública. A relação com o governo do estado do Rio de Janeiro é a arena mais importante em que este papel precisa ser desempenhado, mas as relações com o público da região e com os governos local e central também importam bastante.
Todos os candidatos a reitor da Uenf, incluindo os da chapa que não foi para o segundo turno, prestam contribuições inestimáveis à nossa preciosa universidade. Ajudaram a construí-la com árduo e competente trabalho cotidiano. Academicamente, existem diferenças que podem ser ressaltadas, mas todos são professores altamente envolvidos com os problemas centrais da universidade. A disposição de professores tão positivamente reconhecidos por seus colegas em assumir a arriscada e pessoalmente sacrificante condução política da universidade deve explicar, em parte, o altíssimo comparecimento eleitoral no primeiro turno. Tenho profundo respeito e admiração por quem se arrisca e se sacrifica na política. E isso vale também para a universidade. Na universidade, existem cargos que são tipicamente de gestão científica, na qual a competência política depende diretamente da liderança científica. É o caso, evidentemente, da gestão da pós-graduação.
Mas não é o caso do cargo de reitor. O posto é primariamente de condução política. A liderança científica em si não garante as competências necessárias para a tarefa de construir e defender politicamente a universidade pública. Precisamos de bons políticos para este cargo. E acredito que o professor Raúl, um cubano apaixonado pelo diálogo e pela empatia, é a melhor opção para a condução política da Uenf nos próximos anos, que prometem exigir doses redobradas de habilidade política. O professor Raúl reúne, na minha visão, bem mais que o outro respeitável candidato, a combinação entre convicção e responsabilidade que, segundo Max Weber, caracteriza a profissão política em sua efetividade de realizar causas coletivas. Raúl pratica bem o que Weber chama de “ética da responsabilidade”, a única forma de ética capaz de ser politicamente efetiva, diferenciando-a da “ética da convicção”. Enquanto a “ética da convicção” orienta a ação exclusivamente pelo valor moral (como as causas coletivas) atribuído ao agir, a “ética da responsabilidade” combina adesão a valores com a avaliação e a responsabilidade pelas consequências previstas e não previstas da ação. Porta bem a “ética da responsabilidade” aquele político que chama para si a construção dos meios políticos — recursos de poder — necessários para realizar ou defender o bem comum, como nossa preciosa e ameaçada Uenf. No uso desta “ética” própria da política, o diálogo e a construção da empatia, na medida em que viabilizam apoio na sociedade e na esfera política, são requisitos fundamentais e não contradizem, de nenhum modo, a capacidade de enfrentamento. É somente ampliando o leque de forças sociais e política que apoiam a Uenf que se pode obter recurso de poder e capacidade de conflito.
Para isso não é preciso abrir mão de valores e causas coletivas, mas apenas não tomar a dimensão moral como referência absoluta para o fazer político, sobretudo para alianças e compromissos com quem pensa diferente. O absolutismo de valores trai a realização dos próprios valores, pois ignora as consequências da ação. É preciso que o reitor consiga dialogar com setores muito diversos da sociedade e da administração pública, como, por exemplo, a Política Militar, com quem o professor Raúl demonstrou, na atual gestão da Uenf, muita capacidade de construção política, desarmando a interação de preconceitos ideológicos politicamente improdutivos.
Não se trata de valores absolutos como “continuidade” ou “mudança”. E nem da diferença entre quem defende ou não a universidade pública de excelência e inclusiva. Os dois candidatos são defensores incontestes da universidade pública nestes moldes. A escolha é sobre quem possui maior capacidade política de realizar esta tarefa, e é por este motivo que voto na chapa 10.
Publicado hoje (12) na Folha da Manhã