Após os 11 painéis promovidos pela Folha sobre a grave crise financeira de Campos (confira-os aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui), publicados de 18 de julho a 26 de setembro, ouvindo 34 representantes da sociedade civil organizada, entre especialistas de economia, finanças, ciência política, antropologia e sociologia, além de juristas, jornalistas, gestores universitários, empresários e sindicalistas, restou pouca dúvida racional. Muito mais importante que saber o vencedor das eleições a prefeito de novembro está a necessidade de resposta à principal questão aos mais de 507 mil campistas: com um orçamento para 2021 projetado entre R$ 1,5 bilhão e R$ 1,7 bilhão e gasto previsto de R$ 2 bilhões, entre os quais R$ 1,1 bilhão já comprometido só com folha de pagamento de servidor, como Campos pode fechar essa conta?
É uma pergunta difícil e complexa, feita e refeita pela Folha aos 11 candidatos a prefeito do município. E, com R$ 0,00 de Participação Especial (PE) de agosto, fato inédito desde que a receita petrolífera começou a ser paga em 2000, mais o julgamento da partilha dos royalties no Supremo Tribunal Federal (STF) marcado para 3 de dezembro, a pergunta fica ainda mais difícil e complexa. Mesmo que a resposta coubesse a uma chapa majoritária ao Executivo goitacá composta por Adam Smith a prefeito e John Maynard Keynes de vice — ou Karl Marx, a depender da torcida ideológica, no lugar de um dos dois cânones universais da economia.
Tão cego quanto quem finge não enxergar a gravidade problema, é não buscar alternativas. Na série de 11 painéis, entre as muitas diferenças de formação e visão que marca a sociedade civil e seus representantes qualificados em diversas áreas, pelos menos três opções foram consensuais: a implantação integral do pregão eletrônico nas compras do município, a parceria do poder público com o polo universitário e a retomada da vocação agropecuária. E na rodada de sabatinas do jornal Folha da Manhã e o programa Folha no Ar, da Folha FM 98,3, com os candidatos a prefeito, pelo menos até aqui, nenhum deixou de se comprometer com as três.
As possibilidades falam por si. Exigido pelo governo federal no repasse de verbas e integralmente adotado no município vizinho de Macaé, o pregão eletrônico é responsável pela economia de até 30% nas compras públicas. Por sua vez, a parceria com o polo universitário é evidenciada pelo prefeito Rafael Diniz (Cidadania), candidato à reeleição. Em entrevista nas páginas 2 e 3 desta edição, ele conta (confira aqui) a importância que essa união teve no enfrentamento contra a pandemia da Covid. Como poderia ser pela condução do deputado federal Wladimir Garotinho (PSD), também candidato a prefeito, na emenda de bancada (confira aqui) para retomar as obras do novo prédio da UFF-Campos. Ou pelo serviço prestado à democracia goitacá pelo Fórum Institucional de Dirigentes do Ensino Superior de Campos (Fidesc), que promoverá (confira aqui) em 5 de novembro, a 10 dias das urnas, seu debate entre os 11 candidatos a prefeito.
Já a importância da retomada da vocação agropecuária do município, seu eixo econômico do séc. 17 ao final do séc. 20, quando foi suplantada e abandonada pelo dinheiro fácil do petróleo, é colocada em números na matéria da página 11 desta edição. Nela, o empresário Renato Abreu, presidente do Grupo MPE, que atua na Sapucaia junto à Coagro, revelou (confira aqui) que a safra de cana 2019/2020, com duas usinas, vai movimentar R$ 500 milhões na economia local. É cerca de 1/3 do orçamento de 2021 para Campos. Cujo campo não se resume à cana, nem à agroindústria.
Para quem sabe fazer contas, o principal problema de Campos é econômico, não eleitoral. Mas, se fosse, pode se enganar quem julga que o poder político real do município estará com quem for eleito prefeito, ou em 15 de novembro, ou, mais provavelmente, no dia 29 do mesmo mês. Na primeira data, com a nova Câmara Municipal e os dois candidatos do segundo turno ao Executivo definidos, o cacife maior poderá estar nas mãos de quem optou por não disputar nenhum cargo eletivo em 2020.
Eleito deputado estadual em 2018, Rodrigo Bacellar (SD) trabalha com a maior estrutura de campanha na Campos de dois anos depois. Tentará eleger até sete vereadores por sua coligação. Entre eles, o edil Igor Pereira (SD) é aposta para estar entre os mais votados, o que o cacifaria à disputa pela presidência da Casa do Povo. Além disso, Rodrigo pretende fazer outros dois vereadores, entre os candidatos ligados a outras chapas majoritárias que já pularam ao seu barco. Lógico, é preciso combinar antes com o eleitor. Mas a força na disputa pelos cabos eleitorais impressiona. Ainda que às vezes negativamente, como foi o caso da aglomeração de gente e carros no lançamento da candidatura de Bruno Calil (SD) a prefeito, na casa de shows Multiplace, no último dia 15, que gerou (confira aqui) reação do Ministério Público Eleitoral.
A despeito da falta de pesquisas e seus critérios estatísticos, como de debates para discussão e enfretamento de ideias, em uma eleição atípica com pandemia e muitos candidatos a prefeito, se o encontro entre eleitor e urna fosse hoje, um segundo turno entre Wladimir e Caio Vianna (PDT) não pagaria muito nas casas de aposta. Mas o pleito é daqui a 36 dias. Até lá, são observadas com atenção as corridas por fora de Rafael, que conseguiu recuperar parcialmente sua força na “pedra” (98ª), mas enfrenta grande rejeição na periferia; e de Bruno, ainda fraco na “pedra”, mas forte na sua 76ª natal e na 75ª, base eleitoral de Igor — como do candidato a vereador Nildo Cardoso (PSL), aliado de Caio. O que não impede nenhum dos outros sete candidatos a prefeito de surpreender. Sobretudo se o clã Bolsonaro colocar sua mão sobre a candidatura de Tadeu Tô Contigo (Republicanos).
No que ninguém aposta, salvo algo fora das condições normais de temperatura e pressão, é um segundo turno sem Wladimir. Se isso se confirmar e Rodrigo eleger algo próximo da bancada que trabalha com a “alavanca no canto” para fazer, sua força nesse hipotético segundo turno pode independer do adversário do filho do casal de ex-governadores. Se for Bruno, o filho do ex-vereador Marcos Bacellar (SD) investirá no tradicional “todos contra os Garotinho”. Mas se for Caio, Rafael ou qualquer outro, a situação pode ser ainda mais cômoda: Rodrigo se transformaria na “noiva mais bonita” para 29 de novembro.
Qualquer que seja o resultado final das urnas a prefeito, a grave situação financeira que este encontrará dará pouca ou nenhuma oportunidade para “voo solo”. Se o apoio do presidente da Alerj, deputado André Ceciliano (PT), as boas relações com o governador interino Cláudio Castro (PSC), mais o conhecimento dos bastidores do Tribunal de Contas do Estado (TCE), for acrescido de uma bancada expressiva na Câmara de Campos — o que, até 15 de novembro, não passa de uma aposta —, Rodrigo teria contra ele apenas a delação (confira aqui) do ex-secretário estadual de Saúde, Edmar Santos. Que já derrubou o governador Wilson Witzel (PSC).
Noves fora o imponderável, o vencedor das eleições de 2020 em Campos talvez não precise disputá-las. A despeito da pouca idade, é um hábil operador da “velha política”, a única que há desde a República de Roma e à qual Bolsonaro sempre pertenceu — e se submeteu para poder governar. Do Planalto Central à planície goitacá, a ver.
Publicado hoje (10) na Folha da Manhã