Prefeito de Campos entre apostas e promessas a eleitor com Alzheimer

 

(iStock – Getty Images)

 

 

Com muitas pesquisas, mas poucas registradas, não há critério estatístico para se avaliar a corrida pela Prefeitura de Campos. Mas se a eleição de 15 de novembro fosse hoje, salvo o imponderável, não há aposta desapaixonada que indique Wladimir Garotinho (PSD) fora do segundo turno de 29 de novembro. Segundo essas mesmas apostas, de quem conhece os bastidores da política goitacá, a briga mais acirrada hoje seria pela segunda vaga. Que estaria sendo disputada por Caio Vianna (PDT), ainda com vantagem, mas encurtada pela força da campanha de Dr. Bruno Calil (SD), comandada (confira aqui) pelo deputado estadual Rodrigo Bacellar (SD).

 

Wladimir Garotinho, Caio Vianna, Bruno Calil e Rafael Diniz (Montagem: Eliabe de Souza, o Cássio Jr.)

 

As casas de aposta não desprezam a força da máquina municipal, a despeito da grande rejeição pelo desgaste de um governo em grave crise financeira — que é o principal problema de Campos (confira a série sobre o tema aqui, aqui, aquiaquiaqui, aquiaqui, aqui, aquiaqui e aqui) e independe do resultado das urnas. Mas, até elas, não se deve subestimar o carisma, a empatia e a capacidade oratória de Rafael, que talvez só tenha libertado essas virtudes da “prisão” do Cesec muito tarde. Como não pode ser desprezada a possibilidade de Tadeu Tô Contigo (Republicanos) ganhar impulso, caso seu “voto de cabresto” da Igreja Universal ganhe o apoio explícito e “laico” dos filhos de Jair Bolsonaro (sem partido) abrigados na legenda de Edir Macedo.

 

Tadeu terá o apoio do senador Flávio Bolsonaro e do vereador carioca Carlos Bolsonaro em sua campanha? (Montagem: Eliabe de Souza, o Cássio Jr.)

 

Claro, sem pesquisas registradas, tudo são meras apostas, com o valor de qualquer outra antes da definição do páreo na linha de chegada. Até a decisão soberana do eleitor daqui a 29 dias, todos os 11 candidatos a prefeito têm, em tese, as mesmas chances. Muito embora, a menos de um mês do pleito, caiba observar que o chavão “eleição é na urna” é geralmente entoado por quem sabe não ter chance de vitória.

 

 

Além das apostas, há as reações dos candidatos que parecem confirmá-las. Assim, o desafio feito em vídeo na quarta (14) por Rafael a Wladimir, para um debate entre os dois, respondido com um desafio para os dois saírem juntos à rua, pode revelar duas coisas. A primeira, a certeza do prefeito de que o atual representante do clã que derrotou em 2016 é o concorrente mais forte na disputa de quatro anos depois para sucedê-lo. A segunda, relacionada à primeira, é que Rafael sabe não estar bem na corrida. E teria essa consciência refletida na tentativa de polarizar com que sabe liderá-la, como sua única saída.

 

(Print do Twitter)

 

A tática aparentemente deu resultados. No blog Opiniões, hospedado no portal Folha1, a postagem dos desafios trocados entre Rafael e Wladimir (confira aqui) teve 609 likes. Já a postagem seguinte, com as manifestações dos demais candidatos a prefeito — à exceção de Bruno Calil, que preferiu não se posicionar — colheu (confira aqui) apenas 29 curtidas. Nesta última, com todas as ressalvas de ordem prática que se faça aos dogmas identitários, pareceram corretas as únicas duas mulheres candidatas ao pleito:

 

Natália Soares, Odisséia Carvalho e Roberto Henriques (Montagem: Eliabe de Souza, o Cássio Jr.)

 

— Essa “briguinha” entre os dois, na busca de polarizar e ganhar holofotes, tão só demonstra como o ego e a sociabilidade masculina são destrutivas e até mesmo infantis — sentenciou Natália Soares (Psol).

— É um comportamento extremamente infantil, no meu entender. Os dois precisam é apresentar propostas à população. Esse tipo de comportamento parece coisa de escola — classificou Odisséia Carvalho (PT).

Ainda assim, pareceu estar errado o outro candidato a prefeito da esquerda dividida pelo governo de um município majoritariamente bolsonarista nas eleições presidenciais de 2018:

— A população não está nada interessada nessa briga entre Wladimir e Rafael Diniz — disse o experiente Roberto Henrique (PCdoB), em oposição ao interesse de fato gerado na população.

 

(Logo: Guto Leite)

 

Talvez equivocado sobre os desafios e sua capacidade de envolvimento no mundo virtual, Roberto Henriques, no entanto, está absolutamente correto sobre o mundo real. Nele, tolo é quem supõe que os danos provocados ao governo Rafael — a despeito dos seus próprios erros — pela crise financeira de Campos, não possam vitimar de maneira ainda mais grave qualquer outro prefeito que assumir o município em 1º de janeiro de 2021, incluído Wladimir. Em sua sabatina do último dia 8 no programa Folha no Ar, da Folha FM 98,3, Henriques disse:

— Eu sou favorável e vamos retornar os programas sociais (Passagem Social e Cheque Cidadão). Mas a gente tem que ser sincero em dizer: a curto e curtíssimo prazos, é impossível. A pessoa que fala isso é um demagogo — disse o candidato a prefeito do Partido Comunista do Brasil.

 

Impossibilidade de se retormar programas sociais como Passagem Social e Cheque Cidadão não é de desejo, mas aritmética (Montagem: Elaibe de Souza, o Cássio Jr.)

 

 

O limite da demagogia é imposto não por Roberto Henriques. Mas pela realidade financeira de um município com orçamento previsto para 2021 entre R$ 1,5 bilhão e R$ 1,7 bilhão, com R$ 2 bilhões estimados de despesas, sendo R$ 1,1 bilhão só com folha de pagamento de servidor. É questão de aritmética, não desejo. E o limite da começou a ser ultrapassado nas campanhas de Caio Vianna e Bruno Calil. O que confirma as apostas hoje se afunilando entre os dois na disputa por uma vaga ao segundo turno. Se nela um promete que Campos, em passe de mágica, se tornará uma Dinamarca a partir de 2021, o outro também promete o impossível.

Na série de sabatinas com os 11 candidatos a prefeito no Folha no Ar, Caio prometeu na terça (13) não apenas a Passagem Social e o Cheque Cidadão — exatamente como Rafael fez em 2016. Ao responder à pergunta de uma telespectadora, em comentário no streaming ao vivo do programa no Facebook, o pedetista prometeu até retomar o plano de saúde dos 14 mil servidores de Campos, suspenso pela então prefeita Rosinha Garotinho (hoje, Pros) desde 2015. Com que dinheiro? “Simples”! No mantra de campanha do candidato, é porque “Campos vai voltar a ser feliz”, como nos governos de Arnaldo Vianna (PDT), seu pai e principal cabo eleitoral.

 

(Foto: Petrobras)

 

Como a questão nunca é simples, em seus quatro últimos anos de governo, entre 2001 e 2004, Arnaldo arrecadou de royalties e participações especiais (PEs) a média/ano de R$ 972 milhões, em valores corrigidos pelo INPC. Em seus três primeiros anos de governo, entre 2017 e 2019, Rafael teve de royalties e PEs a média/ano de 569 milhões, corrigidos pelo mesmo INPC. Com quase metade das receitas petrolíferas de quase duas décadas atrás, geriu uma cidade bem maior em população, demandas, custo e tamanho da máquina pública. Que, em agosto de 2020, teve R$ 0,00 de PE, fato inédito desde que a receita começou a ser paga, em 2000. E na qual o atual prefeito é acusado de estelionato eleitoral por ter prometido em 2016, sem conseguir cumprir, os mesmos Cheque Cidadão e Passagem Social que Caio agora promete.

Embora tenha se mantido dentro do limite do possível no Folha no Ar de 5 de outubro, que abriu a rodada da sabatina com os prefeitáveis, Bruno Calil ontem (16) veiculou dois vídeos nas redes sociais. No primeiro, prometeu revogar a lei que suspende pagamento de gratificação ao servidor de licença por atestado médico. No segundo, prometeu que qualquer servidor nomeado DAS receberá 100% pela nova função, quando decisão do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJ-RJ) relativa ao município já definiu esse limite em 75%. A generosidade com o dinheiro público de Campos — que se já não é suficiente para cobrir as atuais despesas, muito menos para aumentá-las — obedece a outra contra: a dos votos dos 14 mil servidores, multiplicada no barato por três, pelo reflexo na receita das suas famílias.

 

 

Caio e Bruno são candidatos tão legítimos quanto qualquer outro. Mas, pelos motivos postos, suas promessas não são. Sobretudo quando acusam o prefeito, adversário nas urnas de 2020, de estelionato eleitoral por ter prometido coisas muito parecidas, quando não o mesmo, em 2016. E hoje paga o preço que a realidade, a despeito do desejo, se encarregou de cobrar. Ao eleitor que não sofre de Alzheimer, a emissão da fatura é adiantada.

 

Publicado hoje (17) na Folha da Manhã

 

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Este post tem 2 comentários

  1. Hermann Mota Rangel

    Sem derramar confetes, mas de parabéns, a coluna ao abordar de forma sensata e coerente, o discurso dos candidatos a prefeito, que enfrentarão seríssimos problemas , todavia infelizmente prometem ou iludem os eleitores com o impossível.

  2. marcelo monteiro silva

    Excelente matéria, os problemas da cidade se acumulam a anos, desde do membro do clã mais antigo assumiu o governo Municipal, foram derramados bilhões em dinheiro em Campos, e o reflexo disso é nada foi feito na cidade, as ruas, o comércio parece um cortiço, o povo cada vês mais pobre, para que os mesmos fiquem na mão dos políticos, Campos não tem industrias, não tem renda, e a população se ilude com as promessas, só lembrando que a décadas o clã, assumiu o governo e qual a foto de Campos hoje ?? Parece parada no tempo.

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