Nina Arueira, uma heroína campista
Por Flávio Mussa Tavares
Maria da Conceição Arueira nasceu no dia 07 de janeiro de 1916 e viveu apenas 19 anos. Desde muito nova tinha pendores artísticos e ainda na infância foi cantora, atriz, artista plástica, poetisa e escritora. Especializou a sua veia literária e ainda adolescente escrevia artigos para o Monitor Campista. Certa vez foi desafiada por ilustres campistas e escrever um texto sobre Educação ali diante deles, sem nenhuma preparação prévia. Ela simplesmente surpreendeu o grupo, que se sentia prestes a desmascarar uma possível fraude. Suas habilidades não se resumiam à palavra escrita. Ela fazia discursos no antigo Teatro Central com ingresso pago. Alguém imagina o que é pagar para assistir a um discurso? Pois Nina Arueira lotava um teatro.
Essa jovem tinha ideais libertários e escrevia contra a opulência, contra a sanha cumulativa do mercantilismo, contra a hipocrisia aristocrática e tocava na ferida aberta da classe dominante de então. Estudante do Liceu de Humanidades, ao lado de meu pai, Clóvis Tavares, de quem enamorou-se, e do jovem Adão Pereira Nunes, conclamaram a classe estudantil e operária de Campos a lutar por seus direitos. Discursava com veemência e destemor, entusiasmando a muitos e incomodando a uns poucos.
Mas a jovem Nina não aceitou a hipótese materialista da vida. Passou a frequentar a casa do professor Virgílio de Paula e realizou um curso por correspondência na Royal Theosophical Society, de Londres. No Museu de Ciro, da Escola Jesus Cristo, temos o seu diploma, além de várias pinturas e esculturas que fez na infância. Escreveu sobre Deus e sobre o Amor transcendental, escreveu sobre a dignidade e a justiça, sobre a ternura e sobre a maternidade.
Nina sonhou em ser mãe. Imaginou um filho, deu-lhe um nome: Lill. Escolheu um pai para ele: Clóvis. Escrevia cartas para seu noivo e dava notícias do filhinho: “Lill está lhe enviando muitos beijos”. Fez recortes de revista de um marinheirinho e emoldurou-o. Lill já tinha uma face. Existiu sem nunca haver nascido. Mas Nina foi caluniada, foi traída e abandonada. Foi proibida de matricular-se em qualquer escola de Campos. Foi relegada ao ostracismo social. Nina adoeceu gravemente. O seu professor Virgílio de Paula recebeu-a em sua própria casa, mesmo sabendo que sua enfermidade era contagiosa. Ela ficou num isolamento doméstico. As únicas pessoas que lhe visitavam eram Virgílio, Clóvis, seu noivo e Adão, um acadêmico de medicina, seu companheiro de ideais.
No seu leito de morte, Nina pediu a Clóvis para dedicar sua vida aos órfãos e lhe disse que o ideal social-cristão está acima do ideal social materialista. Nina morreu, mas semeou a imortalidade no coração de um ex-ateu.
Publicado originalmente no grupo de WhatsApp deste blog e do programa Folha no Ar, da Folha FM 98,3