“Com quase três anos de governo federal, o fracasso é total. Caberá ao próximo presidente recuperar a economia brasileira”. Ex-prefeito do Rio de Janeiro, onde hoje é vereador, Cesar Maia (DEM) deu seu diagnóstico como economista logo na abertura desta entrevista à Folha da Manhã, com respostas curtas, mas nem por isso menos contundentes. Como o agravamento da crise econômica no país, para ele não é o mercado que está desembarcando do governo Jair Bolsonaro (sem partido), mas “Bolsonaro que desembarcou do mercado”.
Pai do ex-presidente da Câmara Federal, o deputado licenciado Rodrigo Maia (sem partido), defendeu o fato do filho não ter aberto nenhum dos mais de 100 pedidos de impeachment presidencial: “sem chance de alcançar os 2/3 seria fortalecer Bolsonaro”. Sobre a eleição a governador do Rio em 2022, cargo que disputou e perdeu para Anthony Garotinho (hoje, sem partido) em 1998, Maia vê hoje “um quadro imprevisível”. Só aposta que a onda bolsonarista de 2018, que elegeu Wilson Witzel (PSC) governador, “não se repetirá agora”. Ele elogiou seu sucessor na prefeitura carioca, Eduardo Paes (PSD). Sobre o governo Wladimir Garotinho (PSD) em Campos, admitiu: “não estou acompanhando de perto”. Mas ressalvou: “talvez ele tenha se precipitado na aproximação pragmática com o governador” Cláudio Castro (PL).
Folha da Manhã – Economista, como vê e projeta o Brasil com volta da inflação, aumento dos juros, do dólar, da cesta básica, dos combustíveis e da energia elétrica, crise hídrica, 14,4 milhões de brasileiros desempregados, 35,6 milhões de outros na informalidade, prejuízos nas lavouras e pecuária de leite, fuga dos investidores internacionais, maior retração da produção industrial desde julho de 2015, queda das bolsas e do PIB?
Cesar Maia – A pergunta já traz a resposta. Com quase três anos de governo federal, o fracasso é total. Caberá ao próximo presidente recuperar a economia brasileira.
Folha – Como avalia a atuação de Paulo Guedes no ministério da Economia? À exceção da reforma da Previdência, cujo crédito se deve muito à atuação do seu filho e então presidente da Câmara Federal, Rodrigo Maia, o governo Jair Bolsonaro cumpriu a agenda liberal que usou para se eleger em 2018?
Maia – Conheci bem o Paulo Guedes, um importante economista liberal. Creio que, ao assumir o ministério da Economia, ele se encantou com a função. E passou a atuar de forma pragmática para se manter na cadeira. As crises econômica e fiscal que acompanharam o governo Dilma impuseram a reforma da Previdência. Sem elas, essa reforma não viria.
Folha – Com as ameaças de invasão ao STF e ao Congresso, nas convocações às manifestações de 7 de setembro, centenas de entidades dos setores produtivo e financeiro assumiram a defesa da democracia. O mercado desembarcou do governo Bolsonaro?
Maia – Melhor seria dizer que Bolsonaro desembarcou do mercado.
Folha – Como avalia as manifestações de 7 de setembro e 12 de setembro? Considera as primeiras uma tentativa frustrada de golpe, redundando no recuo do dia 9, na nota redigida pelo ex-presidente Michel Temer (MDB) e assinada por Bolsonaro? E quanto aos atos de domingo (12), contra o presidente, foram esvaziadas pelo boicote do PT e Psol?
Maia – Nunca se viu um golpe de estado com data marcada. Na verdade, foi um blefe. Mas serviu para mostrar a força das instituições construídas em 1988 pela Constituição. As manifestações antibolsonaristas foram proporcionais às expectativas de cada um dos segmentos. Quanto o refluxo do PT e do Psol, é uma clara demonstração disso.
Folha – Nome mais bem avaliado nas pesquisas entre as opções para tentar furar a polarização Lula/Bolsonaro nas eleições de 2022, Ciro Gomes (PDT) disse à Folha FM 98,3, no dia 10, que o PT não quer o impeachment do presidente, por apostar no segundo turno contra ele como sua melhor chance de voltar ao poder. Concorda?
Maia – A fragilidade da política brasileira nos ensina a não antecipar as eleições. No segundo semestre de 2022, se poderá avaliar com maior precisão esse quadro. A declaração de Ciro, de que Lula e o PT não quereriam o impeachment de Bolsonaro, responde à sua própria condição de candidato declarado a presidente no próximo ano.
Folha – Após as ameaças de Bolsonaro no 7 de setembro, Rodrigo Maia disse: “O presidente estourou a corda e não há retorno”. Licenciado como deputado para ser secretário no governo paulista de João Doria (PSDB), seu filho é criticado por não ter aberto nenhum dos mais de 100 pedidos de impeachment contra Bolsonaro. Ele errou ou acertou? E o sucessor dele, Arthur Lira (PP/AL)?
Maia – Iniciar um processo de impeachment sem chance de alcançar os 2/3 seria fortalecer Bolsonaro. No dia seguinte a oposição estaria fragilizada. A presidência da Câmara por Arthur Lira responde à base que lhe dá sustentação heterogênea.
Folha – E o quadro econômico do estado do Rio, que desde 2017 só paga suas contas graças ao regime de recuperação fiscal com a União? O que esperar da partilha dos royalties do petróleo, aprovada pelo Congresso em 2013 e, desde então, suspensa por uma decisão liminar monocrática do STF, da ministra Cármem Lúcia?
Maia – A falência do estado do Rio criou um beco sem saída. Fato superado. Agora é planejar e executar bem e evitar a contaminação eleitoral. Não há nem ambiente nem apoio majoritário para alterar a partilha dos royalties nesta Legislatura.
Folha – Como viu a venda da Cedae, um dos últimos ativos fluminenses, que rendeu mais de R$ 22 bilhões? São R$ 7,688 bilhões distribuídos pelos 28 municípios que aderiram ao plano de concessão de saneamento, e R$ 14,478 bilhões ao Governo do Estado. Como e onde investir? E qual a sua avaliação do governo Cláudio Castro?
Maia – A execução dos bilhões que virão precisa ser bem planejada. A confusão com o período eleitoral deve prejudicar. Todo o processo de preparação das ações, licitações, indicam que mais da metade desses recursos só poderá ser efetivada no próximo governo. Senti a falta de recursos para ciência e tecnologia, portanto, a falta de uma visão estratégica.
Folha – E a disputa ao Palácio Guanabara em 2022? Como avalia as chances entre os nomes postos: Castro, os deputados federais Marcelo Freixo (PSB) e Paulo Ganime (Novo), o ex-prefeito de Niterói Rodrigo Neves (PDT) e o presidente nacional da OAB, Felipe Santa Cruz? Crê na candidatura do vice-presidente, general Hamilton Mourão (PRTB)?
Maia – As pesquisas divulgadas mostram um quadro imprevisível. Ainda são metade dos eleitores sem escolha efetiva. Há que se esperar pelo menos a janela de março, que vai movimentar os partidos. Impossível fazer uma análise neste momento, enquanto o quadro de candidatos não estiver definido.
Folha – Também à Folha FM, o prefeito do Rio, Eduardo Paes, garantiu que não será candidato a governador em 2022. E gostou da analogia de que, na disputa por seu apoio, ele será a “noiva preferida” dessa eleição. O que foi confirmado, também à Folha, por Castro, Neves, Ganime e até Freixo. Vereador carioca, como vê a nova gestão Paes, que começou como seu subprefeito da Barra, e o papel dele na eleição a governador?
Maia – O prefeito Eduardo Paes está indo bem. Ter seu caixa reforçado bem antes da sua reeleição vai ajudar. Poderá pensar com rigor a aplicação desses recursos. Acho que Paes não se envolverá diretamente na campanha de governador. Creio que vai priorizar fazer boas bancadas de apoio legislativo.
Folha – O senhor não se elegeu ao Senado em 2018, mesmo com duas vagas, preenchidas na onda bolsonarista por Flávio (hoje, Republicanos) e Arolde Oliveira (PSD), falecido por Covid em 2020. Foi a mesma onda que elegeu Wilson Witzel governador, até o impeachment de 30 de abril. Com o recuo dessa onda, e até Castro agora querendo fugir da pecha de “bolsonarista”, o que a ressaca deixou ao RJ?
Maia – Mesmo com o apoio dos Bolsonaro ao Arolde, perdi por uma diferença mínima. A hora não era a melhor. O quadro eleitoral é muito diferente agora, a começar pela avaliação popular do presidente. No estado do Rio, essa onda não existe neste momento. A onda de 2018 não se repetirá agora.
Folha – À distância, como vê o governo Wladimir Garotinho em Campos?
Maia – Confesso que não tenho acompanhado de perto a gestão do prefeito de Campos. Mas talvez ele tenha se precipitado na aproximação pragmática com o governador.
Folha – Em série de 11 painéis publicados pela Folha entre julho e setembro de 2020 (confira aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui e aqui), ouvindo 34 representantes diversos da sociedade civil organizada sobre a crise financeira de Campos, três alternativas foram consensuais: resgate da vocação agropecuária do município, parceria deste com o polo universitário da cidade e adoção integral do pregão eletrônico nas compras públicas. Como as avalia?
Maia – Seria fundamental que o polo universitário de Campos ganhasse destaque com recursos e autonomia. O futuro está na ciência e tecnologia. O quadro é completamente diferente agora, inclusive o agronegócio.
Folha – Filiado ao PCB e preso pela ditadura militar em 1964, o senhor foi exilado político no Chile em 1968, onde se formou em economia, casou e teve filhos. Voltou ao Brasil em 1973 e à política com Leonel Brizola, no início dos anos 1980, como seu secretário estadual de Fazenda. Foi deputado federal constituinte e se reelegeu, antes de mudar ideologicamente com a queda do “socialismo real” e da União Soviética em 1991. E se elegeu três vezes prefeito do Rio, realizando governos considerados liberais. Personagem da Nova República, com suas idas e vindas, como reage a quem diz que ela morreu?
Maia – Agradeço por listar com precisão minha biografia. Com a experiência acumulada creio que tenho muito a ajudar o meu estado. Talvez o maior sucesso que tive foi como secretário estadual de Fazenda, que me deu uma ampla visão estadual.
Esse era um dos políticos que eu tinha grande admiração, mas ele fez igual a Garotinho cuspiu no prato que comeu, os dois foram ingratos com o saudoso Leonel de Moura Brizola.
Um parlamentar que eu admiro é o nosso deputado estadual Noel de Carvalho, hoje é o corregedor na câmara que substituiu o deputado Rodrigo Barcelar