Campos lidera protagonismo?
“Há algo de novo no ar (…) uma transformação profunda e que veio para ficar (…) a metropolização do nosso interior. E o interior do Rio de Janeiro não existe sem Campos!”. Foi como o geógrafo William Passos, consultor especializado em estatística e desenvolvimento regional, concluiu seu artigo sobre metropolização da região da Bacia de Campos. O texto foi publicado no último domingo (3) no blog Opiniões, no Folha1. A confirmá-lo, ontem o mesmo blog anunciou que a Azul já vende passagens aéreas, para Lisboa, capital de Portugal, saindo de Campos e Macaé. Que, pela primeira vez, terão voos comerciais e regulares com a Europa.
Fruto do polo universitário
Campista, o jovem acadêmico tem se dedicado ao estudo da região da Bacia de Campos em sua tese de doutorado no Ippur/UFRJ. Antes, William fez graduação no antigo Cefet, atual IFF, e mestrado na Uenf. É fruto do polo universitário de Campos. Cuja parceria com o poder público e a sociedade civil é apontada como saída ao município e à região. Declarações e visitas recentes de políticos estaduais foram identificados como sinal da metropolização do Norte e Noroeste Fluminense, e parte da Região dos Lagos. A três políticos regionais a coluna indagou: liderado por Campos, o destino da região é de protagonismo estadual?
Clarissa Garotinho
“Precisamos que isso se reverta também em melhores condições para a população. É aí que Campos dos Goytacazes pode exercer seu papel histórico de centralidade. Um meio de fazer isso é liderando consórcios que planejem ações conjuntas para problemas comuns do Norte e Noroeste Fluminense. Hoje, já temos um processo de conturbação (área urbana contínua formada pelo crescimento de cidades diferentes), em que cidades estão atravessando as fronteiras umas das outras. A tendência é que esse movimento se intensifique. Campos tem que ser protagonista nesse processo”, pregou a deputada federal Clarissa Garotinho (Pros).
Fábio Ribeiro
Do grupo político dos Garotinho e presidente da Câmara Municipal de Campos, o vereador Fábio Ribeiro (PSD) também preside o Parlamento Inter-Regional do Norte e Noroeste Fluminense. Ele lembrou que “os 22 municípios do Norte e Noroeste são distantes da capital, mais próximos do Espírito Santo e Minas Gerais, com alíquotas de ICMS menores nestes dois estados vizinhos do que no Rio de Janeiro. Isso, ao longo de 50 anos, afetou muito o desenvolvimento dessas duas regiões. Porque qualquer investidor que fizesse um estudo de viabilidade econômica iria preferir andar mais 60 km e estar em solo capixaba ou mineiro”.
Parlamento Inter-Regional
“A análise do William é oportuna, pois nesse cenário regional, Campos se destaca, por sua história e por ter hoje mais de 400 mil eleitores. O secretário estadual de Governo (Rodrigo Bacellar, SD) é de Campos. E uma das maiores aliadas do governador Cláudio Castro (PL) está em Campos, que é a família Garotinho. Há a influência da família Bacellar, mas há também o peso político, em todo o estado, dos Garotinho; que é inegável. A tendência é, sim, do fortalecimento do interior. E é por conta disso que nós criamos Parlamento Inter-Regional, porque nós temos problemas e interesses em comum”, concluiu Fábio Ribeiro.
Christino Áureo
Deputado federal como Clarissa, Christino Áureo (PP) é de Macaé. E carrega a experiência de ter sido secretário estadual em várias pastas, incluindo Agricultura e Desenvolvimento Econômico. “Chamo a nossa região, que se estende do Espírito Santo até a zona metropolitana do Grande Rio, de orla petroleira. Ela talvez gere um processo de conurbação como no Sul Fluminense, entre Volta Redonda, Barra Mansa, Barra do Piraí, que se uniram fisicamente. Porque, no Norte, nossas distâncias são um pouco maiores. Mas essa orla petroleira tem em Campos a sua expressão máxima, sendo naturalmente sua capital e seu epicentro”.
Caiu a ficha?
“Campos tem que dizer: ‘nós já somos a capital geopolítica, unificamos serviço, conhecimento universitário’. A hora em que a classe política e empresarial de Campos entender que já exerce naturalmente essa liderança, para disputarmos juntos recursos na Federação, como é que aloca recursos das emendas, a questão da BR 101, da ferrovia EF-118, o resto fica mais fácil. Eu sou de Macaé, muito ligado ao meu município, mas que reconheço essa condição. Acho que o artigo do William vai na direção correta. A gente só não pode cair na cantilena de quem só em época eleitoral e pré-eleitoral vem a Campos dar esse valor”, ressalvou Christino.
Soffiati questiona
Em comentário ao artigo de William no blog Opiniões, quem também se manifestou foi o historiador Arthur Soffiati, professor da UFF-Campos: “Políticos representativos do estado ressaltam a importância de Campos, chegando mesmo a defender, como no caso de Eduardo Paes (PSD), duas capitais para o estado do Rio de Janeiro. Uma continuaria a ser a cidade do Rio. A outra seria Campos. O colégio eleitoral de Campos deve ser considerado e as eleições para presidente, governador, senador, deputados federais e estaduais estão próximas. Haverá sinceridade nas palavras desses políticos ou apenas bajulação?”, questionou.
Publicado hoje na Folha da Manhã.
O que haverá de novo que justifique esse entusiasmo? A agroindústria sucroalcooleira não tem mais a força apresentada no século XX, embora mostre tíbios sinais de recuperação. A era dos royalties passou e pouco deixou no aspecto estrutural. Macaé transformou-se em polo econômico mais dinâmico que Campos, quando, em 1855, ocupava lugar de porto de Campos. A produção de petróleo na bacia de Campos está em declínio. O complexo industrial-portuário do Açu fechou-se para a região. Talvez esteja mais aberto para o mundo. Já houve voos regulares de Campos para São Paulo. O entusiasmo criado pelo anúncio da Azul pode acabar mesmo antes de começar. Uma empresa quer ganhos. Macaé e Campos justificarão voos da Azul para Lisboa e vice-versa? Numa perspectiva história, Campos já viveu momentos áureos. Já se disse muito que esses momentos gloriosos chegaram para ficar, mas passaram. É sempre bom ter cautela e relativizar.