Grande vencedor do Oscar de 2023: nada com coisa nenhuma

Este blog tem um grupo de WhatsApp, que divide com o programa Folha no Ar, da Folha FM 98,3. Em tese, teria como objeto sugestões de pauta. Mas acaba servindo mais a debates, de política a futebol. Dos quais todo brasileiro se julga especialista, sobretudo em tempo de eleição e Copa do Mundo, ineditamente reunidas no segundo semestre de 2022. Mesmo quando a visão sobre ambos os temas é estreita e estrita aos antolhos da paixão. Cujo hábito acrítico segue em 2023, a denunciar pelo zurro a condição de muar.

Recentemente, no começo de abril, por sugestão da moderação, o grupo também se abriu a dica e sugestão de filmes. Uma das suas integrantes, a médica Vera Marques, lembrou que já estava disponível na plataforma e streaming Prime Video, da Amazon, o vencedor do Oscar de melhor filme, entregue em 12 de março: “Tudo ao mesmo lugar ao mesmo tempo”, de Daniel Kwan e Daniel Scheinert. A dupla também levou as estatuetas de melhor direção e roteiro original, no total dos sete Oscar que seu longa de ficção amealhou.

Garantia de bom filme, certo? A se considerar o que Hollywood tem se tornado nestas primeiras décadas do terceiro milênio, errado!

No grupo, a jornalista Lívia Nunes fez uma análise curta e polida de “Tudo em todo o lugar ao mesmo tempos”. Do qual destacou seu ritmo “frenético” e o bom trabalho da sua protagonista: a malaia-chinesa Michelle Yeoh. Que realmente está muito bem ao interpretar a dona de lavanderia frustrada Evelyn Quan Wang.  E dignificaria o Oscar de melhor atriz que recebeu. Caso a categoria não tivesse um vício de origem: a poderosa atuação da australiana Margot Robbie, em “Babilônia”, de Damien Chazelle, sequer foi indicada.

Outra jornalista, a Silvana Venâncio resumiu no grupo a ópera do grande vencedor do Oscar de 2023: “assisti e não curti muito”. E pediu a minha opinião. Que, após também assistir, segue abaixo:

 

Não teria chegado ao fim das 2h19 de “Tudo em todo lugar ao mesmo tempo” se não tivesse vencido o Oscar de melhor filme. Na minha opinião, absolutamente imerecido. Filme chato e pretensioso, não convence como comédia, drama ou ficção científica. E Lívia Nunes está certa: seu “frenetismo” é bem estadunidense. De asiático, só a origem do seus principiais intérpretes. Que atuam em inglês, mesmo esteriotipadamente ruim.

Na questão dos universos paralelos, a série Matrix, das irmãs Wachowski, sobretudo o original, de 1999 (disponível na Prime Video e na HBO Max), é bem superior. Nas circunvoluções sobre o próprio umbigo de toada surreal, lembra muito outro filme chatérrimo e pretensioso daquele mesmo ano de 1999: “Quero ser John Malkovich”, de Spike Jonze, disponível na Prime Video.

Neste ano (e universo) de 2023, títulos como “Nada de novo no front”, de Edward Berger, disponível na Netflix; “Elvis”, de Baz Luhrmann, disponível na HBO Max; e “Triângulo da tristeza”, de Ruben Östlund, disponível na Prime Video — entre os que vi e também concorriam a melhor filme —  são ao meu juízo infinitamente superiores.

Todo o blá-blá-blá por vezes ininteligível do multiverso de “Tudo em todo o lugar ao mesmo tempo” é só pano de fundo para a aceitação da filha lésbica pela mãe, diante do avô conservador. Poderia, lógico, render um grande filme. Mas a obra é parnasiana: o politicamente correto pelo politicamente correto.

O libelo pacifista de “Nada de novo no front”, o multiculturalismo interracial de “Elvis” e o matriarcado da parte final e ilhéu de “Triângulo da tristeza” também são “politicamente corretos”. Mas são, para além disso, bons filmes. “Tudo em todo o lugar ao mesmo tempo” é filho de nada com coisa nenhuma.

O sucesso na premiação do “Tudo em todo o lugar ao mesmo tempo” é fruto do niilismo politicamente correto na qual Hollywood está aprisionada há alguns anos. E que, pelo mesmo motivo que nada tem a ver com cinema, já deu o Oscar de melhor filme a outras produções muito abaixo da média, como “Moonlight: sob a luz do luar” (2016), de Barry Jenkins; e “A forma da água” (2018), de Guilhermo Del Toro.

A China de verdade, de Xi Jinping como líder mais longevo desde Mao Tsé-Tung, sem uma única mulher no poder desde a Revolução Comunista de 1949, deve rir de orelha a orelha do que o polo cultural do seu maior adversário econômico e geopolítico premia como “melhor”. E, por trás da ficção de uma China estereotipada na tela de cinema, dá passos cada vez mais largos para superar os EUA na tal da vida real.

 

Confira abaixo os trailers de “Tudo em todo o lugar ao mesmo tempo”, assim como de três obras bem melhores que concorreram com ele ao Oscar de melhor filme em 2023, “Nada de novo no front”, “Elvis” e “Triângulo da tristeza”:

 

 

 

 

 

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