Felipe Fernandes — O assassino e seu método

 

 

 

 

Felipe Fernandes, filmmaker publicitário e crítico de cinema

O assassino e seu método

Por Felipe Fernandes

 

Após realizar um projeto bem pessoal, a cinebiografia do roteirista Herman J Mankiewicz, em um roteiro escrito por seu pai que nunca havia saído do papel, o diretor e roteirista David Fincher retorna ao gênero que o consagrou. Para narrar a história de um assassino metódico e calculista que precisa lidar com as consequências após um serviço que termina de uma maneira inesperada.

Baseado na HQ francesa homônima escrita por Alexis Nolan (conhecido como Matz) e desenhada por Luc Jacamon, “O Assassino” é um exercício narrativo que traz uma abordagem bem crua sobre o universo dos assassinos. E traz o olhar muito particular do protagonista como fio condutor.

Praticamente todas as falas do protagonista (que não tem um nome oficial) são narrações, que ora funcionam como o protagonista falando consigo mesmo, reforçando todo o seu método. E em alguns momentos parecem explicar o funcionamento de sua profissão e daquele universo. Como se ele falasse para o expectador, uma característica que remete diretamente à natureza em quadrinhos da obra original, que traz uma certa sensação de intimidade.

Metódico, frio e calculista, o ritmo do longa acompanha seu narrador, que já na primeira e longa sequência explica os pormenores da profissão, apresentando detalhes que enriquecem a imersão no tipo de trabalho. Ao mesmo tempo que mostram como o personagem lida internamente com todo o processo. E como o como seu método vai sendo afetado de acordo com os acontecimentos.

O roteiro escrito por Andrew Kevin Walker (em sua segunda parceria com Fincher, ele escreveu o roteiro de “Seven”) é bem simples e dividido em capítulos, com cada um deles se passando em um local diferente e englobando uma parte da jornada do assassino. Um artifício que funciona dentro da proposta, já que cada momento tem um alvo e um objetivo diferente.

Com suas cores frias, uma direção de arte clean, sem personalidade e o rosto inexpressivo do protagonista, o longa desconstrói qualquer sentido de espetacularização ou charme, com uma abordagem sóbria, que torna tudo muito crível. Com momentos pontuais de violência. que em muitos momentos ocorrem de forma inesperada e por isso carregam um peso maior, o longa provoca uma sensação de perigo constante.

Merece destaque a atuação de Michael Fassbender, que conduz uma narração em um tom praticamente único, mas sempre frio, sem demonstrar qualquer tipo de emoção. Ao mesmo tempo, ele realiza um trabalho corporal muito interessante, que convence da segurança do protagonista em sua profissão, com movimentos precisos e uma postura segura, que são fundamentais na construção do personagem.

Em seu segundo longa em parceria com a Netflix, Fincher constrói um thriller que funciona como um estudo de personagem em sua jornada de vingança. Não é uma história muito original, mas a forma como Fincher narra a história engrandece a narrativa, construindo um longa diferente dentro do gênero, ao desconstruir as convenções para se aprofundar em seu protagonista, seu método e suas convicções.

 

Publicado hoje na Folha da Manhã.

 

Confira abaixo o trailer do fime:

 

 

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