Por Felipe Fernandes
Estrategista, conquistador, cônsul, imperador. Napoleão Bonaparte é uma das figuras históricas mais famosas, mas é como general que ele é constantemente lembrado, muito por suas estratégias e vitórias, que o fizeram posteriormente Imperador da França. O cinema é responsável por parte dessa fama. São vários os filmes que direta ou indiretamente abordam a vida de Napoleão, passando inclusive por uma lendária produção que Stanley Kubrick nunca conseguiu tirar do papel.
Agora, chega aos cinemas Napoleão, cinebiografia do líder francês, dirigido por Ridley Scott e que traz o vencedor do Oscar Joaquin Phoenix encarnando o protagonista, em um longa grandioso, que busca um olhar diferente para o personagem e abordar diversos segmentos de sua intensa e controversa história.
O roteiro de David Scarpa traz um recorte de Napoleão planejando sua ofensiva contra o cerco inglês em Toulon, vitória que lhe rendeu o título de general, até o fim de sua vida no exílio. Cronologicamente não é muito tempo, mas dada a intensidade de sua história, o roteiro tenta lidar com muita coisa, usando como foco principal a relação de Bonaparte com sua primeira esposa, Josephine.
Utilizando como base as cartas do protagonista para a Imperatriz, o longa busca construir o personagem por meio de sua intimidade com sua esposa, uma proposta até ousada, mas que não funciona. A química entre Joaquin Phoenix e Vanessa Kirby não existe e o longa dispensa muito de seu tempo em um romance conturbado, que não cativa e não agrega muito à história, deixando em segundo plano questões políticas e até mesmo militares, espaço onde Napoleão fez sua fama.
Quando não se utiliza de cartelas para estabelecer seu contexto e período histórico, uma escolha preguiçosa e pouco elegante, o filme faz uso de diálogos expositivos para estabelecer a questão temporal. Nesse sentido, o filme é realmente uma bagunça. A montagem é problemática, algumas cenas parecem jogadas e passam a sensação de terem sido cortadas ao meio. Essa sensação é muito forte nas cenas no Egito, um período muito mal explorado pelo filme.
Ridley Scott já anunciou uma versão de 4 horas que vai sair direto no streaming da Apple. Uma decisão recorrente na carreira do diretor, mas que ao ser anunciada na mesmo na época de seu lançamento nos cinemas, certamente vai prejudicar a bilheteria do próprio filme e principalmente, vai contra todo o movimento que Hollywood vêm fazendo para que o público retorne aos cinemas. Talvez essa “versão do diretor” corrija muito dos problemas de montagem do longa e consiga abordar melhor questões que ficaram em segundo plano no corte para os cinemas,
A fotografia do polonês Dariusz Wolski (parceiro habitual de Scott) traz várias cenas bem escuras e trabalha cores saturadas, tirando a vivacidade e criando um aspecto desgastado que é eficiente em ressaltar a miséria do período, mas se torna esteticamente pobre. O design de produção é muito rico, repleto de detalhes que reproduzem de forma impressionante a época retratada.
O filme retrata cinco batalhas, que englobam o período histórico abordado dentro da narrativa. As cenas, apesar de serem razoavelmente curtas (com exceção do clímax), são o ponto alto da produção. A primeira delas traz inclusive um Napoleão inseguro, nervoso, uma escolha interessante que humaniza o personagem e contrasta com a imagem prévia que o espectador têm de um comandante seguro e implacável. Ao contrário do restante do longa, as batalhas são intensas e surpreendentemente violentas. Com um bom ritmo e bem dirigidas, as sequências no campo de batalha acabam por se provar um pouco do que poderia ter sido o longa.
Napoleão de Ridley Scott é uma cinebiografia que peca por sua abordagem, não conseguindo construir um personagem complexo e interessante, fugindo dos principais temas da história do protagonista. Ao usar a relação do protagonista com a Imperatriz como base, o filme busca um olhar diferente sobre uma figura conhecida, uma decisão que faz sentido, mas que naufraga em sua condução.
Publicado hoje na Folha da Manhã.
Confira o trailer do filme: