Ceramista Oziel como vice de Madeleine na aliança União/PSD?

 

Madeleine Dykeman, Oziel Batista Crespo Filho, Rodrigo Bacellar, Eduardo Paes, Caio Vianna, Bruno Vianna, Fred Machado e Maycon Cruz (Montagem: Eliabe de Souza, o Cássio Jr.)

 

Oziel Batista Crespo Filho, ceramista e ex-presidente do Sindicato dos Ceramistas de Campos, é hoje o nome mais cotado para ser candidato a vice-prefeito na chapa encabeçada pela delegada de Polícia Civil Madeleine Dykeman (União). Para tanto, ele deve se filiar ao PSD, de onde deve sair o candidato a vice da principal chapa dos Bacellar a prefeito de Campos.

Depois que o presidente campista da Alerj, Rodrigo Bacellar (União), fechou aliança (confira aqui) com o presidente estadual do PSD e prefeito do Rio, Eduardo Paes, a dobradinha União/PSD deve ser reproduzida em Campos contra a tentativa de reeleição do prefeito Wladimir Garotinho (PP). Com o apoio a este dado (confira aqui) pelo ex-deputado federal Caio Vianna, o PSD de Campos terá novo comando a partir desta segunda (1º): o ex-vereador Bruno Vianna na presidência. Que deve levar o também ex-vereador Maycon Cruz (sem partido) e o edil Fred Machado (Cidadania) à executiva municipal.

A ideia do ceramista Oziel como vice da delegada Madeleine tem lógica eleitoral. Como o potencial eleitoral de Madeleine seria, em tese, na 98ª Zona Eleitoral (ZE) de Campos, que reúne a área central da cidade na chamada “pedra”, é esperada de Oziel e sua categoria a penetração na 75ª ZE, maior do município, que vai da Penha ao Farol, passando por toda a Baixada Campista.

 

Caputi com vice do PT: Soninha, Chico ou Leleka?

 

Prefeita Carla Caputi terpa vice do PT, entre Soninha Pereira, Chico da Quixaba e Leleka Franco

 

Na salada de frutas das legendas nacionais à política municipal, dois martelos foram batidos: a prefeita sanjoanense Carla Caputi será candidata à reeleição pelo União — como foi adiantado aqui desde 5 de março — e o vice na sua chapa será do PT. Por conta disso, três candidatos a candidato(a) a vice ingressarão no partido: os vereadores Soninha Pereira e Chico da Quixaba, e Leleka Franco, chefe de gabinete da deputada estadual petista Carla Machado.

Soninha e Chico, que estão hoje no PP, irão para o PT. Um deles ser o vice na chapa de Caputi é a preferência dos seus colegas de Câmara Municipal. Que, assim, teriam um adversário a menos na disputa direta por uma cadeira no Legislativo sanjoanense. Outro nome cogitado a vice, a secretária municipal de Saúde Arleny Vadés Arias perdeu força. Por estar grávida e pelo fato de ser cubana, o que encontra resistência no tradicional bairrismo de SJB.

 

Pepenha — Das histórias de uma grande mulher por seu neto

 

Maria da Penha dos Santos Abreu (Foto: Dib’s)

 

Pepenha e seu neto mais velho, 11 de maio de 2015 (Foto: Arquivo pessoal)

Era uma manhã de sábado da primeira metade dos anos 1980. A avó materna chamou seu neto mais velho, ainda pré-adolescente, para acompanhá-la na vistoria das suas terras ocupadas de cana de açúcar, que herdara do pai. Ficavam no Carvão, seguindo da zona urbana à ainda rural às margens do Valão, o canal Campos/Macaé.

Do asfalto à estrada ainda de terra, ela guiava o seu Fusca. O neto observava pelo para brisas e a janela lateral a paisagem se alterar, com a pobreza humana se revelando mais dura nos homens, construções e meninos como ele, de pele mais retinta, enquanto avançavam. Como as nuvens escuras e baixas de chuva espraiadas pelo horizonte até o Imbé.

Chegaram à antiga fazenda do bisavô, à direita. Na qual um dos lotes repartidos entre os filhos pertencia à avó. Como esta já havia lhe ensinado, o neto desceu do carro e abriu a cancela de madeira, esperou ela passar com o Fusca, fechou a cancela e subiu de novo ao carro. No qual seguiam pelo latifúndio convertido por herança em um labirinto de minifúndios.

Quando, enfim, chegaram à terra paterna da avó materna, esperava um trabalhador preto, magro, rijo, de meia idade, com o qual ela já havia previamente marcado. Os dois desceram do carro e foram ao seu encontro. Cumprimentos trocados, passaram os três a caminhar entre as fileiras altas da cana que crescia e os baixios curtos que as separavam.

Enquanto caminhavam, a avó tratou com ele das coisas da terra e da cana, a maioria insondáveis ao neto. Quando ela acabou de passar suas instruções, o homem se despediu e seguiu seu caminho. Ainda em meio à cana, pré-adolescente como o neto, roncou a primeira trovoada, forte. Que fez com que ambos fossem buscar abrigo no Fusca.

À espera da chuva, dentro do carro parado, o neto lembrou à avó como esta ensinara a ele e ao irmão mais novo, crianças, a correr pelas calçadas das ruas em meio às tempestades. E do prazer que aquilo conferia. Mais que qualquer terra de cana, pela qual o neto nunca se interessou, aquele legado da avó de natureza e liberdade lhe seria sempre o mais caro.

Pela expressão da face e do corpo, a avó não precisou de palavras para externar orgulho. E a chuva começou a descer forte. Enquanto caía, em meio ao barulho dos pingos e aos vidros do Fusca que embaçavam, limpos com as costas das mãos por neto e avó, esta lhe indagou: “Está vendo como as canas e todas as outras plantas agradecem aos céus e a Deus pela chuva?”

O neto também dispensou palavras, balançando a cabeça verticalmente, para assentir. Aquela imagem traduzida à sua sensibilidade pela da avó não lhe abandonaria. Guardada dentro de si em um estojo, só foi de lá tirada década e meia depois, para compor os dois versos finais do poema “estiagem”: “depois da chuva?/a gratidão é verde depois da chuva”.

Sem combinar, na interpretação do grande e saudoso ator Yve Carvalho, aqueles dois versos, entremeados pelo balde cheio d’água derramado com as duas mãos sobre si, acabaram se tornando o ponto alto da peça “Pontal”. Que, dirigida pelo também saudoso Antonio Roberto Kapi, em um Pontal de Atafona depois levado pelo mar, marcaria o mágico verão de 2010.

Foi bem perto do Hotel Cassino. Que, nos anos 1940, teria como frequentadora uma bela jovem, miss de escola, muito antes de se tornar avó. Moradora da Baixada Campista, tinha um admirador rico e idoso que sonhava se casar com ela. Como era um dos poucos naquele tempo e lugar a possuir automóvel, aceitava a corte só para ir com ele ao Cassino de Atafona. Onde deixava o velho babão sentado numa cadeira para dançar com os rapazes da sua idade.

Em entrecorte de uma narrativa não linear, como acontece na tempestade de memórias quando uma avó tão marcante nos deixa após 102 anos sempre à frente do seu tempo, ela foi operar o coração em São Paulo. Era julho de 2001. O período foi marcante porque seu neto mais velho, que fez questão de acompanhá-la, estava em um bar na Avenida Paulista quando se deu o apagão nacional de energia no final do governo Fernando Henrique.

Após o êxito da cirurgia, quando o neto foi estar com a avó no quarto de hospital, católica apostólica romana fervorosa, ela disse que se entregara ao seu amado Jesus. E que, antes e depois de apagar com a anestesia, as únicas imagens que passavam em sua cabeça eram as da Paixão do Cristo. Vinte e três anos depois, o neto não viu coincidência quando foi informado pela tia que a avó fez a passagem na Sexta-Feira da Paixão.

Como uma avó lecionou em sua vida centenária e plena, sim, a gratidão é verde depois da chuva!

 

Pepenha no seu exercício inquebrantável de fé católica romana (Foto: Dib’s)

 

a avó e a montanha

(a pepenha e márcia)

 

na ligação com a tia

a avó gritava ao fundo

evocava mãe, pai e irmã

mortos de sangue vivo

 

“era uma mulher tão forte!”

desfiou a filha o rosário

“batia bola comigo!”

tabelou o neto de chofre

 

matriarca em regresso

raiz ao fruto em pirraça

menina e moleque comia

banana verde de cacho

 

na fazenda do colégio

nasceu onde campos nascera

sombra do solar jesuíta

mulher da baixada da égua

 

adolescente, foi miss

plantava o pretendente

velho sentado no cassino

para dançar com rapazes

 

casou com joão abreu

que hoje é nome de rua

meia dezena pariu

carregava 50 quilos de açúcar

 

nas torrentes urbanas

foi das avós o contrário

soltava crianças na rua

para correr, ser o raio

 

herdou terra cajuca

semeou no neto, viúva

que não brota verde igual

à gratidão pela chuva

 

ao mesmo neto, doente

contrabandeou ao hospital

seus rissoles de carne

sacio da fome de cura

 

católica ainda em latim

operou coração em são paulo

e viu em vitrais no carmim

a paixão e as chagas do cristo

 

pensava nisso o neto

ao falar com a tia

sem justiça, errado ou certo

só esta pedra fria

 

olhou à serra do imbé

suas digitais africanas

tempo descarna montanha

espirra vida humana

 

atafona, 28/03/22

Pesquisa Factum — Prefeita de Silva Jardim favorita à reeleição

 

Prefeita Maira de Jaime tem grande vantagem à reeleição sobre os adversários Juninho Peruca e André Lacerda (Montagem: Eliabe de Souza, o Cássio Jr.)

 

Prefeita de Silva Jardim, na Região dos Lagos, Maira de Jaime é favorita à reeleição em 6 de outubro, daqui a exatos 6 meses e 9 dias. Foi o que apontou pesquisa do instituto Factum, feita com 377 eleitores do município entre 21 e 23 de março, cuja consulta estimulada (com apresentação dos nomes dos candidatos) deu a ela 51,2% de intenções de voto, seguida por Juninho Peruca (20,2%) e André Lacerda (5%).

 

(Infográfico: Eliabe de Souza, o Cássio Jr.)

 

LIDERANÇA CRISTALIZADA — A consulta espontânea, na qual o eleitor fala de memória em quem votará, evidencia como a vantagem da prefeita à reeleição está cristalizada: Maira teve 32,1%, com 9% de Peruca e 2,1% de Lacerda. Com margem de erro de 5 pontos para mais ou menos, a pesquisa Factum foi registrada no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sob o número RJ 03597/2024.

 

(Infográfico: Eliabe de Souza, o Cássio Jr.)

 

INTENÇÃO DE VOTO = APROVAÇÃO DE GOVERNO — A liderança com folga da prefeita de Silva Jardim nas intenções de voto advém diretamente da aprovação ao seu governo. Que é considerado ótimo (19,9%) e bom (37,1%) por 57% da população, enquanto 25% acham regular, ruim para 6,1% e péssimo para 9,8%, com 2,1% que não responderam.

 

(Infográfico: Eliabe de Souza, o Cássio Jr.)

 

Em outra métrica da pesquisa Factum, a boa avaliação popular do governo Maira de Jaime foi ainda mais ampla. Perguntados “O(A) Sr.(a) aprova ou desaprova a forma que a prefeita Maira de Jaime administra o município de Silva Jardim?”, 75,1% disseram aprovar, 22,8% não aprovaram, com 2,1% que não souberam responder.

 

(Infográfico: Eliabe de Souza, o Cássio Jr.)

 

REJEIÇÃO — Índice fundamental ao segundo turno, a rejeição dos pré-candidatos importa menos numa eleição de turno único, como é em Silva Jardim e todos os municípios brasileiros com menos de 200 mil eleitores. Ainda assim, mesmo com o desgaste natural de já governar, Maira teve 20,1% de eleitores que não votariam nela de jeito nenhum.

Em empate técnico, a prefeita ficou numericamente atrás da rejeição de Juninho Peruca, líder da rejeição com 23,9%. André Lacerda teve 10,1% de eleitores que não votariam nele de jeito nenhum a prefeito de Silva Jardim, com 45,9% que não souberam responder.

 

(Infográfico: Eliabe de Souza, o Cássio Jr.)

 

William Passos, geógrafo com especialização doutoral em estatística pelo IGBE

ANÁLISE DO ESPECIALISTA — “Com amostragem de 377 eleitores de todos os bairros do município, a pesquisa da Factum foi realizada sob parâmetros de alta qualidade técnica. Considerando os 19.677 eleitores aptos a votar, caso a eleição fosse entre os dias 21, 22 e 23 de março de 2024, a prefeita Maira de Jaime estaria reeleita. A preferência do eleitorado de Silva Jardim é explicada pela avaliação da atual gestão municipal, considerada ótima por 19,9% e boa por 37,1% do eleitorado. Na soma, 57% da população votante considera a gestão Maira de Jaime ótima ou boa. Tanto no cenário espontâneo quanto no estimulado, a atual prefeita supera os concorrentes Juninho Peruca e André Lacerda para além da margem de erro”, concluiu o geógrafo William Passos, com especialização doutoral em estatística no IBGE.

 

Quem deu votos em São João da Barra a quem matou Marielle?

 

São João da Barra, Marielle Franco e os irmãos Domingos e Chiquinho Brazão (Montagem: Eliabe de Souza, o Cássio Jr.)

 

O “milagre” da multiplicação dos votos do ex-deputado estadual Domingos Brazão e do seu irmão e (ainda) deputado federal Chiquinho Brazão (União) às margens do Paraíba do Sul, não se operou só em Campos — como a coluna Ponto Final de ontem (23) revelou aqui. Mas, seguindo o curso do rio, também se repetiu no município vizinho de São João da Barra (SJB).

Os irmãos Brazão foram presos pela Polícia Federal no domingo (24). Como mandantes da execução a tiros da ex-vereadora carioca Marielle Franco (Psol) e do seu motorista, Anderson Torres, em 14 de março de 2018, seis anos antes.

Ambos cariocas, Domingos e, depois, Chiquinho Brazão, vieram de votações naturalmente irrisórias de candidatos de fora, para operarem o “milagre” da multiplicação de votos a partir de 2006. O que leva à pergunta já feita em Campos: quem deu votos em São João da Barra a quem matou Marielle?

Domingos Brazão foi eleito cinco vezes consecutivas deputado estadual, antes de ser premiado em 2015 com o cargo de conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio de Janeiro (TCE-RJ). Em 1998, dos 27.287 votos que elegeram Domingos pela primeira vez à Alerj, apenas 1 foi de SJB.

Em 2002, a proporção seguiu naturalmente: dos 68.300 votos que o reelegeram à Alerj, apenas dois foram de SJB. Até que, em 2006, como em Campos e às margens do mesmo Paraíba, o “milagre” da multiplicação de votos a Domingos Brazão também se operou rio acima: dos seus 73.263 votos, 58 foram de SJB.

Os “milagreiros” cresceriam a multiplicação de votos aos Brazão em São João da Barra. Em 2010, dos 91.774 votos de Domingos, 72 foram de SJB. Em 2014, sua última eleição à Alerj, dos seus 70.314 votos, 270 foram de SJB.

 

(Infográfico: Eliabe de Souza, o Cássio Jr.)

 

De deputado estadual a federal, de Domingos a Chiquinho Brazão, o “milagre” seria ainda maior em São João. Em 2018, dos 25.817 votos que levaram Chiquinho pela primeira vez à Câmara Federal, 494 foram de SJB. Em 2002, dos 77.367 votos que o reelegeram, nada menos que 930 foram de SJB.

Foi o “milagre” dos “milagres” ao clã miliciano da Zona Oeste da cidade do Rio operado na foz do rio Paraíba.

 

Mariana e Christiano pré-candidatos à presidência da OAB Campos

 

Mariana Lontra Costa e Christiano Fagundes são pré-candidatos à presidência da OAB Campos, cuja eleição ocorre em novembro (Montagem: Eliabe de Souza, o Cássio Jr.)

 

Os advogados Mariana Lontra Costa e Christiano Fagundes são os pré-candidatos, respectivamente, da situação e oposição à presidência da OAB Campos. Ainda sem data definida, é certo que a eleição ocorrerá em novembro, mês seguinte ao pleito de prefeito e vereador de Campos de 6 outubro. O calendário e regras eleitorais serão divulgados em agosto.

Atual secretária geral da OAB Campos, na gestão Filipe Estefan, Mariana atua como advogada na área cível e Direito das Famílias. Ex-vice-presidente da gestão anterior de Cristiano Miller na OAB goitacá, Christiano atua em Direito Trabalhista, que leciona na Faculdade de Direito de Campos (FDC) do Uniflu, e nas universidades Cândido Mendes e Universo.

 

Ronaldo Junior e os 70 anos do modernismo na poesia goitacá

 

Revista “Horizonte 22” marcou o lançamento do modernismo na poesia de Campos, há 70 anos (Foto: Reprodução)

 

Ronaldo Junior, poeta e presidente da Academia Campista de Letras (ACL) 

70 ANOS DO MODERNISMO CAMPISTA

Por Ronaldo Junior

 

Nesta quarta-feira, 27 de março, comemoramos um marco histórico da nossa literatura: 70 anos do Clube de Poesia de Campos, instituição fundada em março de 1954 por um “pequeno grupo de pessoas”, como diz Genaro de Vasconcelos, secretário do Clube, ao apresentar o primeiro número da Revista Horizonte 22, publicada no final daquele ano.

Esse pequeno grupo tinha como membros Mário Newton Filho (Presidente), Lourdes Borges Judice (Vice-presidente), Genaro de Vasconcelos (Secretário Geral), Marly Santos de Oliveira, A. Barcellos Sobral, Joadelívio de Paula Codeço, Vilmar Ferreira Rangel, Adolfo Schweitzer, Bruno Gargiulo e Oswaldo Peixoto Martins.

Ao fundar o Clube com o intuito de debater, produzir e divulgar a poesia moderna, os poetas acabaram por criar um movimento num município marcado pela tradição literária, pelo verso métrico, pelas formas fixas e por um passadismo literário que, naquela altura, estava coberto por poeira.

Passados mais de 30 anos do principal marco do Modernismo no Brasil — a Semana de 1922 —, Campos ainda professava ideais poéticos que remetiam ao século XIX, os quais possuem valor cultural e beleza, mas certamente estavam descolados de seu tempo.

Como se pode ver no “Programa”, texto de Mário Newton Filho sobre o Clube de Poesia de Campos, já não cabia mais uma poesia automática “no intervalo de duas guerras”. Era preciso que a literatura refletisse o espírito da época, com debates sociais engajados e críticos.

Apesar de tardio, esse movimento repercute até os dias de hoje. Vilmar Rangel, membro fundador do Clube de Poesia de Campos, nos prova isso com sua poesia repleta de beleza, mas incapaz de deixar de lado o mundo real.

Os poetas campistas contemporâneos, sucessores do grupo de 1954, devem muito aos poetas que reviraram a nossa literatura e questionaram hábitos, pensamentos e criações.

O ápice do Clube de Poesia de Campos, sem dúvidas, foi a Revista Horizonte 22, que teve seis edições entre os anos de 1954 e 1956. A primeira publicação é datada de novembro de 1954 e, como você pode imaginar, pode ser encontrada na biblioteca do Doutor Welligton Paes.

Há cerca de cinco anos, quando a revista estava em exposição no Museu Histórico de Campos, tive a oportunidade de fotografar as páginas dos seis exemplares e organizar em arquivos digitais para que mais pessoas tivessem acesso. O código QR para acessar essas publicações pode ser encontrado no final deste texto.

Ao passar as páginas da revista, antes mesmo de ler os textos, você poderá observar que a diagramação e as artes do Diretor Artístico Oswaldo Peixoto Martins já demonstram a proposta editorial da revista. A assimetria com que os textos foram organizados e as ilustrações marcadas por curvas e traços que não buscam qualquer perfeição formal são uma expressão visual da literatura produzida por aquele grupo.

Naquela ocasião, em novembro de 1954, a revista Horizonte 22 — nomeada, como se pode ver, em referência ao grupo Modernista de 1922 — causou um barulho tão significativo que gerou uma publicação em resposta: a revista Paralelo 38, publicada em edição única no mesmo mês de novembro de 1954, com proposta de contrapor o grupo Modernista e marcar posição quanto à tradição poética do município.

Tal qual ocorreu nacionalmente, o Modernismo Campista encontrou resistência entre os nossos poetas. Isso fica demonstrado na publicação da Paralelo 38, mas também na tradição — ainda hoje lembrada — dos Salões Campistas de Trovas, por exemplo. Atualmente, como é próprio da literatura contemporânea, os diferentes estilos dialogam entre si, existindo espaço para a tradição e para a vanguarda, expressões da nossa cultura e da criação literária local.

Fato é que a poesia moderna em Campos tem sua história contada a partir do Clube de Poesia de Campos, grupo que primeiro idealizou uma publicação declaradamente modernista no município e abriu caminho para outros grandes movimentos da segunda metade do século XX na nossa literatura, os quais reverberam e influenciam escritores e escritoras ainda hoje.

Este ensaio, que compila relatos e informações extraídas da revista Horizonte 22, é uma homenagem ao grupo de poetas que deixou uma mensagem ainda hoje atual: “o mundo moderno necessita de poesia”.

Abaixo, na íntegra, você pode ler o texto de apresentação do Clube de Poesia de Campos escrito por seu presidente, Mário Newton Filho, no primeiro número da Revista Horizonte 22:

 

 

 

PROGRAMA

Não somos apenas sonhadores, mas, também, práticos e objetivos. O mundo moderno necessita de poesia. Não se sabe até que ponto irá a insânia dos que querem brutalizar o ambiente, através do furor guerreiro e da valorização da estupidez. O homem atual se perde entre a lascívia, a cobiça e o pavor da bomba de hidrogênio. Tem-se a impressão de que são loucos furiosos os que governam o mundo.

 Poesia é realidade. Não a triste realidade dêsse primeiro plano de ódios e desavenças, mas outra, elevada e transcendente, e se situa nos altiplanos do espírito.

 Poesia é mistério, cujo véu se entreabre, e deixa ver, ao que por ela é tocado, uma nova região de beleza e harmonia, muito além da palavra escrita e do próprio pensamento comum.

 A poesia não tem fronteiras; possuem-nas as nossas inteligências limitadas. Os poetas modernos descobriram esta verdade.

 A poesia é una e indivisível: essência e palavra, inteligência e sensibilidade, na sua fórma apreensível. O modo de expressão é peculiar a cada época; o de hoje, convencionou-se chamá-lo de moderno, e não se póde desmerecer, nem repudiar, em sã consciência, sob pena de retroagirmos, aquilo que está integrado no espírito de nosso tempo.

 Sob o prisma dêsse conceito, fundou-se nesta cidade, o CLUBE DE POESIA DE CAMPOS, que se propõe a divulgar a bôa poesia e dedicar-se ao debate e á pesquisa de seus assuntos estéticos. Não é uma entidade onde se cultiva o jacobinismo artístico e literário; nem suas portas se acham fechadas aos valores da inteligência que queiram se integrar nesta ação sensibilizante e civilizadora.

 O mundo moderno necessita de poesia. Não se deve admitir que o homem, dia a dia, se transforme no autômato sem instantes de devaneio; no joguête de ódios e paixões desvairadas; na máquina pura e simples de comer, dormir e ganhar dinheiro, no intervalo de duas guerras.

 O CLUBE DE POESIA DE CAMPOS é apenas um pequeno reduto da resistência contra essa degradação da pessôa humana. Não possúi ação nem côr política; nem tem programas de salvação pública. Eis alguns de seus objetivos:

     1 – Divulgar a bôa poesia, antiga ou moderna;

     2 – debater, pesquisar e transmitir ao povo os problemas estéticos da poesia;

     3 – editar, nesta cidade, uma revista especializada no assunto, de alto teôr artístico e literário, tanto quanto possível;

     4 – realizar conferências locais de livre entrada, e um ou mais Congressos Fluminenses de Poesia;

     5 – manter intercâmbio com entidades congêneres ou pessoas interessadas na arte poética;

     6 – manter “Cursos de Poesia”, bibliotéca e arquivos sôbre Poesia;

     7 – editar, de uma só vez ou em séries, a “Antologia de Poetas Modernos de Campos”;

     8 – criar, por todos os meios, nesta cidade, um clima propício ao estudo do fenômeno poético, bem como á sua manifestação, através do incentivo aos valores novos.

 

Folha Letras da edição de hoje da Folha da Manhã

 

Felipe Fernandes — Holocausto por “Zona de Interesse”

 

 

Felipe Fernandes, filmmaker publicitário e crítico de cinema

Banalização da violência e a experiência cinematográfica

Por Felipe Fernandes

 

Passado o título, a tela se mantém escura e a assombrosa trilha de Mica Levi toma o espectador, até que pequenos sons naturais surgem, nos levando a imagem de uma família à beira de um lago. Toda essa abertura sintetiza muito da proposta do longa, o som assustador em mistura com o cotidiano de uma família alemã.

Baseado no livro de Martin Amis, o filme dramatiza a história real da família Hoss, cujo patriarca é o comandante de Auschwitz e vive uma vida confortável com sua família na casa dos sonhos “construída” pela matriarca Hedwig, tudo separado por muros com o campo de extermínio nazista. Um espaço que divide o cotidiano de uma família com os maiores horrores da humanidade.

É sempre complexo narrar uma história do Holocausto sobre a ótica nazista. Glazer compreende essa problemática e filma a família sempre com planos abertos e a câmera distante. Mantendo sempre um distanciamento do espectador para os personagens, sem nunca construir nenhum tipo de empatia ou envolvimento com os personagens.

Nesse sentido, o roteiro do próprio Glazer explicita muito da forma como os nazistas entendiam aquela situação. A cena em que Hedwig apresenta seu jardim para a mãe é emblemática. O fato de pessoas normais serem responsáveis por um dos momentos mais terríveis da humanidade, torna tudo ainda mais assustador.

O longa mistura histórias reais para construir sua narrativa. A menina que durante a noite deixava comida no campo e surge quase como um fantasma nas lentes das câmeras termais, existiu de fato. Assim como a música da partitura na cena do piano, uma das mais bonitas do longa, que foi composta por um sobrevivente. Dentro da narrativa, funciona para reforçar não só a resistência dos judeus, quanto para mostrar como a música é universal e não precisa de compreensão para ser sentida.

Construída como uma única grande locação, a casa foi construída por inteiro. Glazer busca reproduzir aquela dinâmica em todos os detalhes. Reconstruindo a casa de forma minuciosa, usando como base as fotos reais, o design de produção busca uma fidelidade extremamente necessária para a experiência que o longa busca causar.

Poucas vezes o som foi tão indispensável narrativamente quanto nesse longa. Acompanhamos o cotidiano da família, enquanto ao fundo se ouve constantes sons de tiros, explosões e gritos, tudo tratado como parte da natureza sonora daquele lugar.

Glazer não mostra o interior do campo em nenhum momento, deixando que o som trabalhe como uma sugestão, com o próprio espectador completando visualmente o que acontece, uma forma extremamente eficaz e assustadora de trabalhar com a experiência pessoal de cada um, fazendo do espectador parte da experiência cinematográfica.

O terceiro ato traz uma mudança inesperada que funciona como uma grande provocação, questionando se de alguma forma todos nós também não banalizamos não só os atos terríveis que aconteceram no passado, mas os atos presentes, enquanto nos trancamos dentro de nossos próprios muros.

“Zona de interesse” é uma experiência cinematográfica, que fala da banalização da violência, enquanto nos leva por uma história absurda e através da sugestão do som e de algumas poucas imagens, nos faz vivenciar sentimentos terríveis sobre um dos momentos mais assustadores da humanidade. É um daqueles filmes que saem contigo da sala de cinema e ressoam em você.

 

Publicado na Folha da Manhã.

 

Confira aqui outra crítica do filme, pelo jornalista Edmundo Siqueira, e abaixo o trailer do filme: