Edmundo Siqueira — Primeiros acordes da eleição de Campos

 

 

Edmundo Siqueira, jornalista e servidor federal

Os primeiros acordes da campanha: Campos dos Goytacazes e o espetáculo eleitoral

Por Edmundo Siqueira

 

Campos dos Goytacazes, com suas ruas recapeadas, água barrenta e fuligem, se prepara para viver um novo e dúbio ciclo: de esperanças e desilusões. A cidade, que já foi o palco de tantas batalhas políticas, viverá, agora com candidatos já postos oficialmente, mais uma temporada de promessas, sorrisos forçados e apertos de mão calculados. Mas também é um genuíno e excelente momento de refletir sobre a cidade.

Vivemos um cenário eleitoral diferente há algum tempo. As redes sociais deram amplitude aos políticos, e se transformaram em um diário oficioso de quem pretende ocupar ou já ocupa cargos públicos. Ali falam aos seus eleitores, muitas vezes sem qualquer mediação, e recebem comentários de apoiadores e críticos a cada postagem. O que antes era feito de forma mais fria, agora é em tempo real e permite interação.

As primeiras movimentações nos bastidores em Campos, principalmente a partir do início das convenções, indicam que este será um processo eleitoral daqueles. Pacificação, rompimento, ofensas, relação conflituosa entre poderes, denuncismo e conflito de gerações políticas e exposição de atritos familiares. Não faltam elementos para fazer crer que a eleição não será ao som de música clássica, ou de um balé coreografado. Se mostra mais para uma roda punk.

Os marqueteiros — hoje também chamados de “adms” das páginas dos candidatos em rede social — verdadeiros alquimistas da imagem pública, já começam a moldar personagens que se encaixem no gosto popular – ora heróis, ora mártires, dependendo da ocasião. Ensaiam suas falas, revisitam slogans desgastados, e muitas vezes caem em velhas promessas. Outras, com palavras novas, esperando que a plateia acredite que agora vai ser diferente.

E, no meio disso tudo, o povo de Campos dos Goytacazes, como um espectador fiel e resiliente, assiste a mais uma temporada, a mais uma peça de um espetáculo democrático que por vezes exige paciência e uma dose de antiácido. Os candidatos, em seus lugares políticos, e com a coreografia bem ensaiada, vão dançar de acordo com a música.

Mas em Campos, nada é simples. Cada eleição é uma ópera barroca, cheia de reviravoltas, traições, ofensas e, claro, momentos de brilho e de confrontação benéfica de ideias. O primeiro ato já começou, e quem conhece a peça sabe que o enredo pode mudar a qualquer momento. Os aplausos, no entanto, ficam para depois, talvez para o fim, quando o último voto for contado, e o futuro, mais uma vez, estiver nas mãos de quem ainda acredita.

Mas, por trás desse teatro político, há uma realidade que não pode ser ignorada. A cidade, com suas desigualdades e problemas estruturais, espera mais do que promessas vazias. A histórica dependência do petróleo e outras questões de fundo, como transporte e infraestrutura, são latentes. E o eleitorado, embora acostumado com o ciclo eleitoral, espera mais de todos os candidatos e candidatas E é em conversas discretas entre vizinhos e amigos que o verdadeiro termômetro da eleição se revela.

Nesse espetáculo, o enredo nunca é linear. Há sempre uma surpresa à espreita, um momento inesperado que pode virar a maré. Afinal, por mais que tudo pareça repetido, por mais que o passado e a história imponham algumas questões, o futuro, aqui, ainda tem o poder de surpreender. Mas sempre lembrando a frase icônica de um velho político, o ex-vice-presidente do Brasil Marco Maciel: “tudo pode acontecer, inclusive nada”.

 

Publicado hoje na Folha da Manhã.

 

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