Desenvolvimento em 9 pontos ao Norte e Noroeste

 

 

 

Arthur Soffiati, historiador e professor da UFF-Campos

O futuro da região

Por Arthur Soffiati

Os tempos mudaram. A economia de marcado cresceu à base de minerais fósseis carbônicos, como carvão mineral, petróleo e gás natural. O otimismo foi grande. O mundo todo foi arrastado pelo capitalismo, de municípios a países. Mas, aos poucos, foram se avolumando problemas. Durante quase dois séculos, empresários, governantes e a população em geral mostraram-se alheios aos problemas derivados desse tipo de desenvolvimento, seja negando-os, ignorando-os ou minimizando-os. A ficha demorou a cair. Ainda não caiu. Ela ficou encalacrada na fenda.

A grande matéria publicada na Folha, sábado passado (23), com título geral de “Campos, região e o petróleo. EUA, Europa e Brasil-2022”, entrevistou lideranças políticas, empresariais, sindicais e universitárias. As questões levantadas giram sobre a ainda dependência de Campos em relação ao petróleo, o retorno à agricultura, a pobreza de grande parte da população, que sai pior da pandemia do que quando entrou. No geral, restam ainda otimismo e ufanismo que devem ser vistos com reservas.

Levanto alguns pontos que poderiam ser comuns a todos os municípios do Norte-Noroeste Fluminense, visando um outro desenvolvimento ao sair da crise sanitária:

1 – Aplicação de recursos em fundo financeiro: entrando recursos dos royalties ou das participações especiais, pergunto se não seria adequado contar com um grupo de especialistas para indicar os caminhos para seu rendimento antes de serem aplicados. Desperdiçamos recursos financeiros derivados da exploração petrolífera. Cabe agora mais responsabilidade com eles. Além do mais, sugere-se que tais recursos sejam aplicados em atividades que busquem zerar as emissões de carbono que o geraram;

2 – Plano de longo prazo: o presidente da Câmara de Campos sente falta de um plano de longo prazo. As pessoas ajuizadas também. Estamos no quinto ou sexto plano diretor do município. Nenhum foi levado a sério pelos governantes. Cada prefeito que entra diz que seguirá o seu plano de governo, que dura apenas quatro anos. Sugestão para a Câmara: rever o Plano Diretor de 2008. Ele foi revisto em 2019 e encaminhado à Câmara completamente desalinhavado. Coloquemos os pingos nos is e pensemos num plano regional;

3 – Distribuição de renda: levantou-se também a questão da pobreza da maior parte da população do município. Ela afeta a região. Em Macaé, vive-se a extrema riqueza ao lado da extrema pobreza. Um plano social de geração de emprego, saúde preventiva, educação e transporte, pelo menos, vem se fazendo necessário há muito tempo. Não há de ser a Azul, ligando Campos ao mundo por linha aérea, que há de resolver esses problemas;

4 – Energias renováveis: os entrevistados tocaram nas formas novas e limpas de gerar energia, mas concordaram que o petróleo ainda dominará a economia por muito tempo. Não sei se tal concordância expressa otimismo ou resignação. Entendo que petróleo, carvão e gás não serão descartados tão cedo. Vejo que nenhum país produtor dessas fontes de energia renunciará a elas antes que se esgotem. Quando chegar esse momento, a atmosfera estará saturada de CO2. A máquina capitalista estacionará. As mudanças precisam ser feitas agora. Segundo um atlas antigo sobre o potencial eólico do Brasil, editado pela PUC-Rio em 1988, a combinação da planície com o mar, no Norte Fluminense, apresenta uma reserva apreciável de ventos. Pode-se dizer o mesmo sobre o potencial solar e marinho. Todas essas três fontes não são aproveitadas ou são minimamente aproveitadas;

5 – Agricultura familiar: fala-se muito na recuperação da agropecuária regional depois do fim do otimismo causado pelos royalties. O ufanismo e o otimismo têm sido postura constante entre empresários e políticos. Nada de realismo. Podemos recorrer ao pessimismo quando convém. Os ruralistas choram bastante quando lhes interessa. O poder público dos municípios faria bem se estimulasse a agropecuária de pequeno porte voltada para a produção de alimentos. Ninguém vive de caldo de cana;

6 – Reflorestamento: bato nessa tecla há 40 anos. O som saído do piano sempre pareceu desafinado aos poderosos. Sem reflorestamento de pontos críticos, não se pode pensar em recuperação da agricultura;

7 – Proteção de lagoas: não se pode também pensar na recuperação agropecuária sem água. Florestas e água, eis o segredo de um bom desenvolvimento. Além de proteger as lagoas que restaram, cabe pensar em recuperar o que for possível em termos de água, além de se evitar a poluição;

8 – Estímulo à pesca: a atividade pesqueira foi a primeira fonte de recursos alimentares e econômicos da região. Ela entrou em declínio com a agropecuária, que tem uma dívida secular com a pesca;

9 – Integração regional: já houve tentativa de integrar a região. Tenta-se novamente. Ela vingará dessa vez? Como disse Aurelio Peccei no seu último livro, deixo essas palavras para o futuro na condição de ativista sênior.

 

Publicado no Folha1.

 

Região além dos prefeitos e do exemplo negativo de SJB

 

Municípios no processo de metropolização da região fluminense da Bacia de Campos

 

William Passos, geógrafo

Protagonismo dos municípios sem prefeiturização

Por William Passos

 

Durante o debate sobre o Fundo Soberano do Estado do Rio de Janeiro, realizado na sexra (29), no Centro de Convenções Oscar Niemeyer, da Uenf, o economista Alcimar Chagas, professor daquela universidade, destacou que o Fundo Soberano em si, sem o protagonismo dos municípios, será insuficiente. A solução, neste caso, passaria pela qualificação do corpo técnico das prefeituras da região. Na ocasião, o professor Alcimar citou o caso de São João da Barra, que não conseguiu converter em investimentos o superávit de 38% de suas receitas realizadas de janeiro a agosto de 2021.

Inquestionavelmente, o esforço estadual de desenvolvimento deve ser combinado com uma “maior participação efetiva dos municípios”. Contudo, essa maior participação efetiva não deve ser confundida com prefeiturização. Primeiro porque o conjunto geográfico entre São João da Barra e Arraial do Cabo está se metropolizando. Segundo porque, do ponto de vista da Geografia, a divisão entre os municípios demarca limites artificiais, que não existem na prática. Cada vez mais, o espaço vivido dos habitantes da Bacia de Campos é a região, e não suas cidades.

José Alberto Rio Fernandes, professor catedrático da Universidade do Porto e um dos maiores geógrafos de Portugal, costuma utilizar a expressão “cidade multimunicipal” para explicar que, do ponto de vista da Geografia, as cidades, na prática, são formadas por um conjunto de municípios vizinhos compondo um espaço unificado onde as pessoas se deslocam para trabalhar, estudar, fazer compras e se divertirem. No caso da Bacia de Campos, o IBGE considera Campos dos Goytacazes e São João da Barra uma única cidade, e escreve a palavra Cidade com C maiúsculo para destacar que se trata da “Cidade (ampliada) de Campos dos Goytacazes/RJ”. Nesta Cidade, onde os limites entre Campos e São João da Barra se juntam e onde convivem mais de 551 mil habitantes, estão presentes tanto a maior cidade do interior do estado do Rio de Janeiro quanto o Porto do Açu, o segundo maior porto do Brasil em movimentação de cargas, atrás somente do Porto de Santos.

Ainda segundo o IBGE, no território da Bacia de Campos estariam presentes ainda a “Cidade de Macaé-Rio das Ostras/RJ”, formada por estes dois municípios mais Carapebus, Casimiro de Abreu e Conceição de Macabu, totalizando 512 mil habitantes, e ainda a “Cidade de Cabo Frio/RJ”, formada por este município mais Armação dos Búzios, Arraial do Cabo e São Pedro da Aldeia, que somam cerca de 408 mil habitantes.

É por isso que o maior protagonismo dos municípios não pode ser impulsionado pela prefeiturização, mas necessita da coordenação conjunta e da ação consorciada dos diferentes municípios. Dada a ausência de limites intermunicipais, na prática, os problemas de um município afetam habitantes também de outros municípios, exigindo a criação de consórcios metropolitanos não apenas para o transporte público intermunicipal, mas também para a saúde, o saneamento básico, a proteção ambiental, o turismo, entre outros setores, que poderiam estar articulados a uma ação consorciada maior, que poderia ser uma Câmara ou uma Agência Metropolitana.

Isso é algo perfeitamente permitido por lei e aplicado em outras regiões do Brasil, com experiências bastante bem sucedidas, inclusive em metropolizações de interior, a exemplo daquela da Região Metropolitana do Vale do Aço e sua Agência Metropolitana. Além controlar e ordenar o crescimento urbano, inibindo a especulação imobiliária e a explosão da construção de habitações irregulares, problemas típicos do avanço da metropolização, a Agência da Região Metropolitana do interior de Minas Gerais vem promovendo a integração física e tarifária do transporte público intermunicipal dentro do território metropolitano e ainda desenvolvendo um programa arrojado de atração de investimentos e criação de novos negócios na região, que contribuiu para que a geração de empregos formais no Vale do Aço — Ipatinga, Timóteo, Coronel Fabriciano, Santana do Paraíso e seu Colar Metropolitano —, proporcionalmente, fosse superior àquela de Minas Gerais no mês de setembro, de acordo com o Caged, do ministério da Economia.

É diante deste cenário que eu insisto, completando a opinião do economista Alcimar Chagas, que o esforço estadual fluminense de desenvolvimento, embora deva ser combinado com uma maior participação efetiva dos municípios, em particular da Bacia de Campos, não pode ter este maior protagonismo municipal confundido com prefeiturização.

 

Fundo Soberano e seu papel no desenvolvimento da região

 

Uenf promoveu debate do Fundo Soberano, com a presença do presidente da Alerj, deputado André Ceciliano, na última sexta (Foto: Genilson Peçanha/Folha da Manhã)

 

 

Alcimar das Chagas Ribeiro, economista, professor da Uenf e diretor do Núcleo de Pesquisa Econômica do Estado do Rio de Janeiro (Nuperj)

O debate sobre o Fundo Soberano e seu papel no desenvolvimento do Estado do Rio den Janeiro

Por Alcimar Ribeiro das Chagas

 

A Universidade Estadual do Norte Fluminense (Uenf) recebeu na última sexta-feira, 29 de outubro, a caravana da Alerj para discutir o Fundo Soberano Estadual. Sob a coordenação do presidente André Ceciliano (PT) e com a participação de importantes lideranças acadêmicas, empresariais, sindicais e políticas da região, se desenvolveu um amplo debate sobre os problemas econômicos do estado e suas regiões, os condicionantes do Fundo Soberano e carências específicas de diversos municípios. Essa ação reflete um traço diferenciado da gestão do presidente André Ceciliano na instituição. Fica evidente o compromisso e o esforço de aproximação com o conhecimento cientifico, confirmado aliás, na presença do competente economista Mauro Osório na assessoria do Legislativo.

A presente ação, entretanto, gerou uma enorme motivação para uma reflexão mais aprofundada sobre desenvolvimento econômico no estado. Eu diria que inicialmente três pontos são fundamentais para iniciar essa reflexão: o primeiro, diz respeito à necessidade de pensar o processo sistemicamente; o segundo, diz respeito à necessidade de entender a heterogeneidade entre os municípios, e o terceiro ponto, a necessidade de reconhecer a fragilidade técnica dos mesmos para pensar desenvolvimento.

Pensar sistemicamente o processo de desenvolvimento exige considerar o território em seu conjunto e não somente a região metropolitana. Nesse aspecto é preciso combinar a visão territorial física e relacional. Sabemos que os recursos materiais e imateriais tem localização própria, mas esses espaços precisam se integrar para resolver problemas inibidores da competitividade: escala, gestão, investimento, tecnologia, custos elevados, etc.

Dessa forma, podemos pensar a organização da agroindústria a partir da integração territorial em cadeia, nas rotas agroturísticas no interior, assim como, nas rotas turísticas no litoral. Modelos dessa natureza exige ação coletiva, onde o processo de governança se estrutura a partir da interação entre o conhecimento científico, o trabalho produtivo, ações governamentais e participação das instituições não governamentais.

Sobre o segundo ponto, heterogeneidade entre os municípios, é importante essa percepção, já que as características diferenciadas em termos de recursos naturais e financeiros sobressaem. Por exemplo, a Bacia petrolífera de Campos potencializa os orçamentos dos munícipios produtores de petróleo localizados na região Norte Fluminense e na região Litorânea. As mesmas regiões apresentam vantagens para o turismo em função de suas praias, enquanto a região Noroeste Fluminense apresenta um perfil agropecuário com vantagem comparativa para turismo rural.

O terceiro ponto de reconhecimento da fragilidade técnica dos municípios é vital para pensar desenvolvimento econômico. Nesse aspecto a Uenf é estratégica para as regiões Norte, Noroeste e dos Lagos, disponibilizando todo o seu potencial de conhecimento em diferentes áreas.

A fragilidade referida fica evidente na avaliação da gestão fiscal e na dinâmica econômica desses municípios. Verifica-se muita dificuldade na alocação dos recursos em investimento. Com isso, os municípios apresentam uma estrutura de gastos em custeio muito elevada e um substancial déficit social: baixo padrão de saneamento básico, desemprego, pobreza, condições criticas nas estradas vicinais e isolamento da área rural. Outra marca perigosa é a extrema dependência orçamentária as transferências constitucionais.

Nesse contexto, os municípios não conseguem resolver essa situação isoladamente, por mais que o estado os atenda pontualmente com recursos financeiros. Conforme já indicado no primeiro ponto é necessário um olhar sistêmico, o recurso financeiro é apenas um elemento que precisa ser combinado com outros recursos.

Nesse caso, a nossa visão é de que o Fundo Soberano é fundamental e representa um elemento no processo de reestruturação produtiva, cuja estratégia precisa considerar a visão mesoeconômica, ação coletiva, conhecimento científico, comprometimento governamental, cooperação e governança, para atender o seu objetivo de desenvolvimento econômico do estado e das regiões fluminenses.

 

Publicado no site da Nuperj.

 

MP, Lira, Lava Jato, Bolsonaro, Lula, Moro, STF, CPI e 2022

 

No último dia 20, os procuradores e promotores de Justiça do Brasil venceram o primeiro round por sua autonomia de investigação. A Proposta de Emenda Constitucional para impor ingerência política ao Ministério Público não obteve os 3/5 da Câmara Federal, necessários à aprovação. Foi a primeira derrota política do deputado federal Arthur Lira (PP/AL), desde que ele se elegeu presidente da Casa, em 1º de fevereiro deste ano. Com ele, perdeu junto a aliança entre o bolsonarismo, o Centrão que lhe dá sustentação e um PT escaldado após ser apeado do poder sob acusações de corrupção em seus 13 anos de exercício. Para analisar os muitos aspectos da questão, a Folha ouviu, em ordem alfabética, Cláudio Henrique da Cruz Viana, procurador de Justiça e presidente da Associação do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (Amperj); Hamilton Garcia, cientista político e professor da Uenf; e Sana Gimenes, especialista em Direito Público, doutora em Sociologia Política, e professora do Uniflu e da Candido Mendes. Com posições por vezes distintas entre roteiro e atores, como deve ser no palco da democracia, os três também falaram sobre a operação Lava Jato, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), o ex-presidente Lula (PT), o ex-juiz federal Sergio Moro, o Supremo Tribunal Federal (STF), a Procuradoria Geral da República (PGR), a CPI da Covid no Senado, as eleições de 2022 e o ex-governador Anthony Garotinho (sem partido).

 

Cláudio Henrique da Cruz Viana, Hamilton Garcia e Sana Gimenes (Montagem: Eliabe de Souza, o Cássio Jr.)

 

Folha da Manhã – No último dia 20, foi derrotada na Câmara Federal a PEC 05. Entre outras coisas, ela propunha mudanças na estrutura do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). No qual queria o aumento de três para cinco os representantes indicados pelo Congresso, considerado uma tentativa de intervenção política no MP. Como você viu?

Cláudio Henrique da Cruz Viana – A PEC 05 é uma clara tentativa de enfraquecimento do MP, com aumento do controle político sobre a instituição. O desenho constitucional do MP, feito na Carta de 1988, é de um órgão autônomo, tendo seus membros garantias para exercer com independência a fiscalização do cumprimento da lei. Sem essas garantias, não há como cumprir a missão constitucional. Precisamos lutar para que as instituições sejam fortes e cada qual cumpra seu papel. Serve tanto para o MP quanto para o Judiciário, Legislativo e Executivo. É muito preocupante uma instituição buscar o enfraquecimento ou avançar sobre outra.

Hamilton Garcia – É claramente uma tentativa de domesticar o MP, como aliás o atual procurador-geral da República vem fazendo por dentro, com o apoio explícito da maioria do Senado. O que se vê neste caso é a Câmara se somando a este esforço antirrepublicano. Não é segredo para ninguém que setores importantes da classe política brasileira passaram a temer a independência do MP, sobretudo depois dos resultados obtidos na operação Lava Jato, que reverteu para a Petrobras e o erário bilhões de reais desviados dela. O que foi ao encontro do anseio de amplos setores sociais cansados de pagar a conta da corrupção institucionalizada.

Sana Gimenes – Após os desvios e excessos da operação Lava Jato, só para citar o caso mais emblemático, já não há mais dúvidas de que é preciso aperfeiçoar o sistema de controle externo do Ministério Público. Contudo, isso não pode significar a retirada da autonomia e da independência funcional do órgão. Nesse sentido, há dispositivos na PEC que indicam sim uma intervenção política. E que me parecem até mais graves do que o aumento de representantes indicados pelo Congresso Nacional em si.

 

Folha – A falta de um código de ética aos membros do MP foi um flanco aberto utilizado pelos que queriam aprovar a PEC 05. Os 3.295 procuradores e promotores que assinaram o abaixo-assinado contra sua aprovação no Congresso não deveriam aprender a lição e sanar a questão? Por que isso até hoje não foi feito?

Cláudio Henrique – A Conamp, associação que agrega as associações do MP dos estados, o Conselho Nacional de Procuradores-Gerais e demais associações que representam o MP entregaram uma proposta ao procurador-geral da República para que seja feita uma compilação do que já existe, com mais acréscimos, e se consolide um código de ética nacional. Os membros do MP não são contrários à ideia. A maior dificuldade até hoje é que cada lei estadual tem normas próprias disciplinando os MPs dos estados, o que exige um trabalho técnico para que se evitem inconstitucionalidades e lacunas.

Hamilton – Trata-se de outro anseio republicano frustrado no Brasil: o da limitação do poder de veto das corporações públicas em relação a seus privilégios. O problema atinge em cheio os bacharéis de Direito, historicamente detentores dos principais cargos no Estado desde a República Velha. O que, inclusive, vem motivando o ressentimento militar, com status, influência e remuneração menores que a burocracia civil, até hoje. A ausência de tal código é apenas um dos aspectos a serem enfrentados. Mas, infelizmente, o Congresso o faz mais por vingança do que por consciência da necessidade.

Sana – Não só deveriam como, agora, a proposta já está sendo elaborada, pois se tornou um dos poucos consensos possíveis entre os parlamentares favoráveis à PEC e as entidades de classe ligadas ao MP. Acredito que, até então, a opinião geral dentro MP era a de que um código de ética só repetiria o que já existe na legislação, não trazendo mudanças importantes. Na prática, porém, não se pode negar que um código de ética tem um peso simbólico e que a sua não existência aponta para um posicionamento corporativista, já que dificulta, por exemplo, a sistematização das normas disciplinares para os diferentes braços do MP.

 

Folha – O texto da PEC derrotado foi um substitutivo do deputado relator Paulo Magalhães (PSD-BA), que teve como autor o deputado Paulo Teixeira (PT-SP). Uniu o Centrão, que dá sustentação ao governo Bolsonaro, com o PT. Antagonistas políticos, o bolsonarismo e o lulopetismo são aliados para tentar minar o combate contra a corrupção?

Cláudio Henrique – Votaram a favor da PEC parlamentares das mais diversas vertentes, assim como também votaram contra o projeto deputados de diferentes identificações partidárias. Se for comparada essa votação com outras relacionadas ao combate à corrupção, como na Lei de Improbidade, a variação fica maior ainda. E as razões para votar contra e a favor acabam sendo muito distintas. Por isso, não é possível dizer que quem votou contra ou a favor da PEC seja, por si só, contra ou a favor de uma pauta pró-corrupção.

Hamilton – A ofensiva contra o MP, procuradores e juízes envolvidos na Lava Jato é uma ação concertada dos homens de poder, ameaçados em seu direito discricionário sobre a aplicação do Tesouro Público em benefício de interesses privados dos mais variados, inclusive os ligados à escandalosa dívida pública. O que, diga-se de passagem, é uma tradição das velhas nobrezas absolutistas que permanece fortíssima entre nós, não obstante não termos sequer uma cabeça para decapitar à guisa de solução.

Sana – Passado o furor punitivista da Lava Jato contra o PT e seu principal símbolo, Lula, para além de qualquer juízo de valor sobre suas condutas, as consequências dos abusos cometidos recairiam sobre todos. Não dá para desestabilizar a ordem jurídica de um Estado Democrático de Direito como foi feito e achar possível preservar esse mesmo Estado para determinados grupos em momento posterior. As tentativas de conter os abusos obviamente não vão mais encontrar divergências ideológicas ou partidárias. Acredito que os quadros corruptos da política agora se aproveitam dessa celeuma instaurada para buscar a impunidade.

 

Folha – A PEC 05 teve maioria de 297 votos favoráveis e 182 contrários, sem conseguir o mínimo de 3/5, ou 308 votos à sua aprovação. Desde que assumiu a presidência da Câmara Federal, foi a primeira derrota de Arthur Lira, que defendia abertamente a aprovação. Neste sentido, foi emblemática no sistema republicano de freios e contrapesos?

Cláudio Henrique – As instituições no Brasil, apesar de algumas tormentas, têm funcionado bem. E, como já afirmei antes, isso é fundamental para preservação do Estado Democrático de Direito. Não precisam concordar em tudo. Aliás, as divergências podem ser muito positivas, mantendo-se o diálogo e o respeito com as opiniões divergentes.

Hamilton – Uma derrota meramente conjuntural; nada que um rearranjo formal não possa resolver. Na verdade, foi uma tremenda demonstração de força do neopatrimonialismo, que é a realpolitik da burguesia no poder, que comporta, com alguns ajustes, ideologias e políticas que vão da direita à esquerda, passando pelo centro, visando manter o Estado como uma reserva ativa de recursos, em espécie ou em meios, à disposição de seus operadores diretos e dos interesses econômicos, naturalmente com algumas concessões aos setores marginalizados. Essas elites, constantemente “renovadas” por eleições periódicas, via cooptação, mantêm forte controle sobre o Estado e, assim, sobre o voto.

Sana – De certo modo sim, pois evitou-se uma possível ingerência danosa por parte do Poder Legislativo sobre a atuação no MP, ao passo que também se pressionou o próprio MP para uma revisão crítica de sua atuação. Nesse sentido, é curioso notar que inúmeros representantes do órgão outrora entusiastas da Lava Jato, ou das propostas de mudanças legislativas que concederiam poderes excessivos ao Parquet, diante da perspectiva de aprovação da PEC, passaram a reconhecer alguns abusos do próprio órgão em diferentes cenários.

 

Folha – Em 7 de outubro de 2020, quatro dias após ser flagrado em abraço caloroso com o então presidente do STF, ministro Dias Toffoli, Bolsonaro declarou: “É um orgulho, é uma satisfação que eu tenho, dizer (…) que eu não quero acabar com a Lava Jato. Eu acabei com a Lava Jato, porque não tem mais corrupção no governo”. Como você encarou?

Cláudio Henrique – As imperfeições são próprias dos seres humanos e das instituições. Por isso, todos os Poderes precisam de controle e aperfeiçoamento. Basta olhar a História da humanidade. Precisamos ter consciência disso, mantendo a atenção e o propósito de combater os desvios. O setor público, que se rege pelos princípios da legalidade, moralidade e eficiência, dentre outros, tem um dever ainda maior de ter sistemas de controle.

Hamilton – Bolsonaro é um político que não tem medo de falar abertamente sobre o que acredita ser a verdade; o que vem lhe criando enorme rejeição. Na perspectiva dele, rachadinha e outras práticas parasitárias e oportunistas não constituem corrupção, mas o método democrático “brasileiro” de se fazer política. Afinal, para uma parte expressiva de nossa população, o chamado “interesse público” não passa de uma abstração intelectual. Como diria Weber (sociólogo alemão), nós somos uma nação plebeia cuja tradição aristocrática nunca se constituiu em modelo ético para a construção da nacionalidade.

Sana – Como mais uma bravata encenada pelo presidente da República para sedimentar a realidade paralela onde ele e seu séquito fiel parecem viver. A despeito desse cinismo do Executivo que, por óbvio, tem ciência dos seus atos e, muito provavelmente, de tudo que se passa ao seu redor, creio que seus defensores, no fundo, apenas respondem de forma afetiva a tudo isso. E entendem que, em não sendo corrupção associada à esquerda, está tudo bem.  As denúncias de corrupção sobre o governo Bolsonaro e sua própria família já apareceram e estão sendo investigadas todos os dias, mas essas pessoas entendem como um mal menor.

 

Folha – Inegável que a Lava Jato teve como ícone o ex-juiz federal Sergio Moro. Assim como a perda de apoio popular que ele e a operação tiveram com a liberação de uma delação do ex-ministro Antonio Palocci, não aceita no julgamento da ação penal, a seis dias do primeiro turno presidencial de 2018; por ter aceitado ser ministro do principal beneficiado; pelas revelações da Vaza Jato; por ter saído do governo Bolsonaro atirando; e por ter sua atuação na condenação do ex-presidente Lula julgada parcial pelo STF. Não foram erros demais?

Cláudio Henrique – Todo julgamento precisa ter um certo distanciamento, imparcialidade e conhecimento da matéria a ser julgada, ouvindo-se todos os envolvidos no fato. Isso serve para chegar a qualquer conclusão na vida. Inclusive para que se faça o “julgamento” da Lava Jato.  Foram muitos os processos e ainda há vários em curso, questões complexas, que demandam profundidade de análise. O ponto de reflexão é: o juiz que julgava essas ações poderia ter saído de sua função para assumir um cargo político? No Direito, há uma máxima que diz que o juiz, como a mulher de César, não basta ser imparcial, precisa mostrar que é.

Hamilton – Ele sem dúvida cometeu erros: o mais grave deles foi emprestar sua autoridade a um político da categoria de Bolsonaro, na crença de que o apoio social à Lava Jato estava consolidado na sociedade, o que está longe de ser verdade. Mas, penso, o maior ônus que ele carrega, no momento, diz respeito aos seus acertos: o de desempenhar suas funções com empenho e honestidade, sem calcular as consequências que poderiam advir do afrontamento de práticas e cultura tão arraigados no Brasil.

Sana – Sim, foram erros demais, apontados desde o começo do processo em Curitiba por inúmeros juristas comprometidos com o devido processo penal e o respeito à Constituição. O clamor midiático e ideológico sobre o caso fez com que esses alertas fossem ignorados por muitos. Recordo que apontei em um debate sobre a Lava Jato mediado por você, no Uniflu, que um dos resultados da Lava Jato seria o descrédito de seus atores e, consequentemente, das instituições que eles representavam. Isso porque ninguém poderia imaginar àquela época que o surgimento da Vaza Jato tornaria essa previsão tão fundamentada.

 

Página 2 da edição de hoje da Folha da Manhã

 

Folha – Por outro lado, como vê o fato da condenação de Lula por Moro no caso do tríplex do Guarujá, que levou o ex-presidente à prisão por 580 dias, tenha sido confirmada por unanimidade no TRF-4, por unanimidade na 5ª Turma do STJ e pela maioria do plenário do STF, para depois cair neste. Independente do juízo jurídico e político, isso não desmoraliza o Judiciário do Brasil aos olhos do mundo e da sua própria população? Por quê?

Cláudio Henrique – Justiça demorada é justiça denegada. O STF demorou demais a se posicionar. Não sei se a responsabilidade é só do STF. Temos um sistema recursal de muitas instâncias, com muitas possibilidades. O número de processos é cada vez maior. Muitas questões pouco relevantes são encaminhas ao STF, que deveria ser um tribunal exclusivamente constitucional. Os processos demoram demais para que se tenha uma conclusão, gerando muitas vezes um sentimento de injustiça.

Hamilton – O STF, assim como o Congresso Nacional e o próprio Executivo, são os vértices do poder corrompido de nosso absolutismo anacrônico, que a população tentou derrotar, ingenuamente, deixando de votar nas figuras mais representativas desse universo de poder. Ao mesmo tempo, partiu do STF, a partir do julgamento do Mensalão, a tentativa de reforma do sistema, que jamais poderá se dar no terreno exclusivo da Justiça. Faltou, em seu socorro, os políticos, intelectuais e cidadãos, capazes de animar lutas por mudanças efetivas no sistema político-eleitoral de sustentação do poder, em estado avançado de putrefação.

Sana – Com certeza desmoraliza, em especial, o STF que não tomou as medidas adequadas quando podia para frear os disparates da operação. E esses problemas já eram evidentes, para além de qualquer juízo de valor pessoal que se possa ter sobre Lula e seus aliados, ressalto mais uma vez. Em um Estado Democrático de Direito, o Poder Judiciário não pode jogar para a plateia. E também não deve ter uma atuação excessivamente política. Quando essas coisas ocorrem, a credibilidade e o respeito ao órgão ficam ameaçados.

 

Folha – Em análise de 2004 sobre a operação Mãos Limpas na Itália dos anos 1990, “Considerações sobre a Mani Pulite”, Moro deu o roteiro do que faria com a Lava Jato, a partir de 2014. Na Itália, o resultado da Mãos Limpas foi a eleição do polêmico Silvio Berlusconi como primeiro-ministro. No Brasil, o resultado político da Lava Jato foi Bolsonaro. Vê paralelos? Como evitar que o combate à corrupção gere o sentimento popular da antipolítica que leva políticos populistas ao poder?

Cláudio Henrique – Há quem faça esse paralelo. Acredito que precisaremos de mais tempo e distanciamento histórico para que se chegue a uma conclusão. Fato é que a política é uma necessidade. Não vivemos sem ela. Temos que nos afastar sempre de qualquer movimento ou tentativa de enfraquecimento da política.

Hamilton – O único jeito de evitar tais efeitos é formarmos uma ampla coalizão de cidadãos e elites, de variados quadrantes ideológicos, capazes de pressionar o poder e mobilizar a população mais consciente para destruir tal sistema anacrônico, erigindo em seu lugar um verdadeiro sistema representativo, mais inclinado aos temas do progresso e do bem-estar da população, como o fizeram os países ocidentais desde a Revolução Puritana de 1640 (na Inglaterra, que gerou seu único e curto período republicano, depois implantado nos EUA).

Sana – O paralelo é válido, embora na Itália a amplitude da operação tenha sido muito maior no espectro político-partidário alcançado. O combate à corrupção precisa ser feito, mas não a qualquer custo e por qualquer meio. E não se deve fomentar o descrédito por todo o sistema político, pois é isso que dá margem ao surgimento de outsiders, ou insiders oportunistas como Bolsonaro, que deturpam o debate quando, na verdade, têm as mesmas práticas pouco republicanas que criticam. É preciso também destacar que o mercado é tão corrupto quanto o governo. A questão é sociológica, não um traço específico da política tradicional brasileira.

 

Folha – O STF sob a presidência do ministro Luiz Fux, e o TSE, sob presidência do ministro Luís Roberto Barroso, impuseram os limites do estado democrático de direito aos arroubos autoritários do governo Bolsonaro, como nas tentativas desastradas de golpe no 7 de setembro e no voto impresso. Não falta a atuação institucional também do procurador-geral da República, Augusto Aras, conduzido ao cargo pelo capitão fora da lista tríplice do MP?

Cláudio Henrique – O processo de escolha do procurador-geral da República, pelo presidente da República dentre os membros do MP Federal, sem necessidade de lista interna formada pelos integrantes da carreira, dá margem a esse tipo de questionamento. Se agir dessa ou daquela maneira seria porque tem identidade política com o presidente. Precisamos pensar em aprimorar esse processo de escolha. O PGR é o representante do Ministério Público na maior Corte do país. Tem uma responsabilidade institucional enorme.

Hamilton – Barroso é um dos raros e verdadeiros intelectuais públicos do país, um verdadeiro herói do povo brasileiro, mas o povo não faz disso a menor ideia. Por outro lado, ele não tem a capilaridade política ou a ambiguidade ética necessária para falar aos setores hegemônicos. Por isso é visto como uma ameaça equiparável, ou até pior pela posição hierárquica, àquela representada por Moro e Dallagnol. Ele não tem como dirigir qualquer operação “por cima” visando uma reforma radical do sistema. Como pode fazer, por exemplo, Gilmar Mendes, em prol da entrega de alguns anéis para a manutenção dos dedos gordos dominantes.

Sana – Me parece evidente que sim. Do próprio processo de escolha de Augusto Aras, às suas posições assumidas, tudo nesse PGR é motivo para desmerecer o nobre órgão que ele representa. Contudo, é interessante lembrar que, em caso de omissão da PGR no que se refere aos supostos crimes comuns cometidos pelo presidente, suas próprias vítimas poderiam iniciar o processo, por meio de ação penal privada subsidiária da pública. Mas me parece que a estratégia de Aras será simplesmente abrir os inquéritos correspondentes para ganhar tempo. Tal como ocorreu com Moro, o canto da sereia pode ser a promessa de uma cadeira no STF.

 

Folha – Como viu a aprovação do relatório final da CPI da Covid do Senado, que pediu o indiciamento de Bolsonaro pela prática de nove crimes, além dos seus três filhos parlamentares, 74 outras pessoas e duas empresas? Como crê que a PGR vai lidar com as evidências e testemunhos que apontam crimes de responsabilidade do presidente? Vê chance de ele ser julgado e condenado na Corte Penal Internacional de Haia?

Cláudio Henrique – Não conheço detalhadamente o relatório da CPI. Pelo que li na imprensa, são muitos indiciados e imputações. Penso que será preciso uma análise aprofundada de toda documentação. É possível que em alguns aspectos sejam necessárias complementações. Por isso, qualquer opinião seria mera suposição.

Hamilton – A CPI fez seu trabalho, não obstante as contradições de como relator uma figura como Renan Calheiros (MDB/AL), ou mal tocar nas estripulias das oligarquias estaduais/municipais em meio ao caos semeado por Bolsonaro. O problema é o que acontecerá depois. A ideia de deixar o presidente da República sangrar até a derrota eleitoral pode até ser um bom cálculo político, mas é um péssimo cálculo estratégico para a democracia. Mas ao preço da não punição dos maus governantes e da manutenção de instituições caríssimas de controle que não fiscalizam os poderosos em seus malfeitos.

Sana – O relatório da CPI contempla a gravidade dos fatos praticados por Bolsonaro e seus aliados. São três frentes de responsabilização do presidente: as acusações de crime comum são encaminhadas à PGR. As de crime de responsabilidade vão para a Câmara dos Deputados. E acusações de crimes contra a humanidade, ao Tribunal Penal Internacional (TPI). Na Câmara, a parceria com Lira e as benesses ao Centrão deverão blindar o presidente. Já a PGR, mesmo com a lamentável vinculação política, Aras terá que dar algum encaminhamento ao caso. Quanto ao TPI, são poucas as denúncias recebidas que de fato geram investigações.

 

Folha – Como vê a possibilidade de Moro concorrer pelo Podemos a presidente em 2022? E a polarização, em todas as pesquisas, da eleição presidencial entre os dois antagonistas do ex-juiz: Lula e Bolsonaro? E, em paralelo ao petista, a possibilidade do ex-governador Anthony Garotinho (sem partido) também se candidatar em 2022, após ser condenado na Chequinho e ser preso cinco vezes, também contando as operações Caixa d’Água e Secretus Dommus? 

Cláudio Henrique – Todo radicalismo é muito ruim, em qualquer aspecto da vida, inclusive na política. Somente o diálogo pode construir os consensos necessários ao fortalecimento da democracia. A candidatura do ex-juiz Sergio Moro já vem sendo cogitado há tempo, não chega a ser uma surpresa. Quanto à elegibilidade ou inelegibilidade do ex-governador Garotinho, desconheço se tecnicamente há ou não os requisitos necessários.

Hamilton – Moro tem credenciais éticas para postular o cargo, mas parece, até aqui, carecer da habilidade política para enfrentar nossa má formação nacional. O que exigiria uma capacidade de convencimento e formulação de saídas, em meio ao descrédito geral e a um DNA macunaímico que quase clama por lideranças prestidigitadoras, como Bolsonaro, Lula e Garotinho. Contra tais magos, figuras racionais como Moro, Ciro Gomes (PDT), Mandetta (DEM) e Eduardo Leite (PSDB), só teriam chances se unidos pela consciência recíproca da gravidade da crise, ou selecionados pela consciência das parcelas sãs de nossa sociedade.

Sana – A despeito de já ter afirmado categoricamente que não entraria para a carreira político-partidária, esse parece ser o caminho que o ex-juiz Sergio Moro quer trilhar. Talvez ele ainda esteja seduzido pela fantasia do poder, ou pela vaidade de sua elevada autoestima. Mas não creio que ele possa simbolizar uma terceira via para superar a polarização Lula X Bolsonaro. Quanto ao ex-governador Garotinho, a comparação me parece descabida porque ele permanece inelegível e não há indício de que tenha sofrido abusos ou perseguições ideológicas em suas condenações judiciais. A Chequinho é um exemplo que demonstra isso claramente.

 

Página 3 da edição de hoje da Folha da Manhã

 

Dr. Geraldo Gusmão em homenagem pelos filhos

 

 

Parabéns ao nosso pai, nosso grande amor!

Por Beatriz Maria, Bernadette, Ana Teresa e Artur Gusmão

 

Dr. Geraldo Gusmão

Hoje nosso coração está em festa! É tempo de celebrar e agradecer ao Senhor a vida do nosso pai que completa 90 anos!

Em 31/10/1931 nascia nesta cidade Geraldo Arthur Gusmão Rodrigues, filho de Zita Gusmão Rodrigues e João Higino Rodrigues. Aqui cresceu sob os cuidados e o colo amoroso da sua tia avó materna, D. Josefa Gusmão. Sua infância foi também marcada pela formação religiosa, que teve início na Catedral de São Salvador, onde atuou como coroinha junto ao saudoso Pe. Rosário. Nascia aí uma história de fé, entrega e amor aos ensinamentos do Pai.

Papai iniciou sua escolaridade nos colégios da cidade, tendo sido marcante na sua vida a passagem pelo Liceu de Humanidades de Campos, onde cursou o antigo ginasial e o curso clássico. Tamanha identificação fez dele um liceísta apaixonado, carregado de memórias e saudade, sempre cantando os versos do Hino do Liceu: “Liceísta sempre avante pela glória do Liceu… Que evocamos com orgulho, ó Liceu, Liceu, Liceu!”

Com a maioridade, mudou-se para o Rio de Janeiro onde foi servir ao Exército, em 1950. Em seguida passou a residir em Niterói, a fim de cursar Medicina na Universidade Federal Fluminense. Niterói foi palco não só da sua formação profissional, mas também do encontro com o grande amor da sua vida, Ariema Barbeitas Gusmão. Ali começava a nossa história.

Com o término dos cursos, ele formado em Medicina e ela em Letras, retornaram a Campos onde se casaram em 1958 na Capela Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, sob o manto protetor de Maria. Foi mamãe quem possibilitou a construção do maior sonho da sua vida: nossa família. Somos cinco filhos frutos de um imenso amor, de uma profunda fé e retidão em todos os passos e escolhas feitas por eles ao longo da vida.

Como médico traumato-ortopedista trabalhou em diversos hospitais: Hospital Ferreira Machado, Santa Casa de Misericórdia de Campos, Sandu, Plantadores de Cana e Beneficência Portuguesa, sempre comprometido com a vida humana.

Ao se aposentar realizou o sonho de voltar ao Liceu novamente como aluno nos cursos de Francês, Inglês e Espanhol. Essa paixão por aprender preenche os seus dias até hoje, se dedicando com afinco às palavras cruzadas, leitura de livros, jornais e do Evangelho. Nesse período ele também aproveitou para intensificar as suas caminhadas pela cidade, percorrendo as pontes que cruzam o rio Paraíba.

Cada caminhada na planície Goitacá, sobretudo nas manhãs de sol e céu azul, enchem os seus dias de emoção, ânimo e luz! Encontrá-lo caminhando é sempre uma alegria contagiante! Tamanha paixão por Campos, revivida em pequenos passeios, o faz recitar outros versos, aqueles do hino da nossa cidade: “Campos intrépida Formosa, terra feita de luz e madrigais”, além de lembrar histórias que nunca saíram do seu coração.

Papai é um eterno apaixonado pela natureza. Seu encanto pela lua e suas fases, pelas estrelas que brilham e saltam na imensidão da noite, o tornam uma pessoa simples, desprendida, tomado pela esperança. Olhando para ele, a gente pensa que a felicidade está logo ali, ao alcance da mão.

Difícil em meio a tantas lições que ele nos dá diariamente, falar apenas de algumas. Mas talvez uma das maiores seja o exercício permanente da sua fé em Deus. Parece que quanto mais surgem os imprevistos e dificuldades da vida, maior é a sua fé! Guiado pelo Salmo 22, do Bom Pastor, ele segue firme, amparando todos nós.

Um outro presente que guardamos em nós é o seu amor por mamãe, um amor cuidadoso, companheiro, eterno e cheio de encanto pela mulher admirável que ela sempre foi. E ainda o seu amor pela família, por nós, seus filhos e netos, um amor sempre carregado de preocupação, comprometido com a nossa felicidade, respeitoso com as nossas escolhas e atento às nossas necessidades, mesmo depois que crescemos e nos tornamos pais.

Papai chega aos 90 anos com uma autonomia admirável, uma memória cristalina e com o mesmo encanto pela vida, que tanto nos apaixona, apesar das perdas imensuráveis vividas ao longo desses anos. Ao celebrar 90 anos ele continua sendo um exemplo e uma força incomparáveis nas nossas vidas!

Hoje nós escolhemos um verso da canção “Oração pela Família”, para o seu aniversário: “Que seus filhos vejam a força que brota do amor”. Sua história de vida, papai, traduz essa força que brota do amor. Nós, seus filhos, netos, genros e noras, somos testemunhas deste amor. Não há no mundo presente como esse! Seu amor e a sua oração nos acompanham e nos inspiram todos os dias!

Para o senhor, a nossa admiração sem tamanho, a nossa gratidão mais profunda e o nosso eterno amor!

Dos seus filhos,

Geraldo José (in memorian), Beatriz Maria, Bernadette, Ana Teresa e Artur.

 

Publicado hoje na Folha da Manhã.

 

Acordo Alerj/Uenf/Campos pela reforma do Arquivo

 

Presidente da Alerj, André Ceciliano; reitor da Uenf, Raul Palacio; e o prefeito de Campos, Wladimir Garotinho, em parceria pela restauração do Arquivo Público de Campos (Montagem: Eliabe de Souza, o Cássio Jr.)

A Alerj, via Uenf, vai bancar a restauração do prédio secular do Arquivo Público Municipal de Campos, assim como a digitalização do seu arquivo. Foi o que informou ao blog nesta tarde o prefeito de Campos, Wladimir Garotinho (PSD), em acordo firmado com o presidente da Alerj, deputado André Ceciliano (PT). Em visita desde ontem a Campos, ele deu na manhã de hoje uma entrevista exclusiva ao programa Folha no Ar, da Folha FM 98,3.

O valor do acordo será de R$ 20 milhões, resultado da economia da Alerj, que será repassado na forma de recursos duodécimos à Uenf. Que executará junto à Prefeitura a reforma do Arquivo. O projeto é fruto da parceria do município com a Sociedade Artística Brasileira (Sabra). E já se encontra sob análise do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). Pelo qual é tombado o prédio erguido pelos jesuítas no século XVII, que abriga o Arquivo.

Na próxima semana, junto com Ceciliano, o deputado estadual Bruno Dauaire (PSC), aliado político de Wladimir, vai levar a proposta do convênio entre Alerj, Uenf e Prefeitura de Campos, para a aprovação da Mesa Diretora do Legislativo fluminense. A reforma do Arquivo é um pleito antigo, considerado fundamental pelo setor cultural goitacá.

— Sem dúvida alguma, é uma bela iniciativa. Mais uma vez, a Uenf participando como indutora e realizadora de ações coletivas, de projetos de interesse da sociedade. De qualquer forma, preciso conversar com o prefeito sobre a metodologia para a execução do projeto — explicou o professor Raul Palacio, reitor da Uenf.

Rafaela Machado, diretora do Arquivo Público de Campos

— A notícia desse acordo entre a Alerj, a Uenf e a Prefeitura Campos pela viabilização financeira da reforma do Arquivo chega para concretizar e efetivar os projetos que o Arquivo vem desde o início do ano trabalhando em conjunto com a Sociedade Artística Brasileira. Essa é a concretização de anos de trabalho e de luta pública empenhada pelo Solar e pelo Arquivo. É o reconhecimento da importância do Arquivo e do Solar para a nossa história regional e para a cultura fluminense. Registro de público meus agradecimentos ao prefeito Wladimir Garotinho, ao deputado André Ceciliano e ao reitor da Uenf, Raul Palacio, pela demonstração de interesse e apoio nessa causa e pelo real comprometimento com o Arquivo e com o Solar — comemorou a historiadora Rafaela Machado, diretora do Arquivo.

Edmundo Siqueira, blogueiro do Folha1 que tem se dedicado à luta pelo Arquivo Público de Campos

— O Arquivo Público de Campos tem um valor inestimável, não apenas para Campos, mas como guardião de memória e história de toda região. É sem dúvida o equipamento cultural mais importante que temos, pelo seu acervo, seus serviços prestados e por estar instalado em uma construção tão simbólica e representativa. Nesses 20 anos de existência, o Arquivo enfrentou muitas dificuldades. E, mesmo negligenciado em alguns momentos, soube resistir, principalmente por contar com uma equipe tão qualificada e apaixonada. Parabéns ao prefeito Wladimir por ter a sensibilidade de reconhecer a importância desse patrimônio, desse essencial equipamento cultural, que pode fazer ainda muito mais, inclusive com a recente indicação legislativa para criação do Fundo do Arquivo. Parabéns a todos que contribuíram com essa história até aqui. E agradeço também ao deputado André Ceciliano pela oportunidade de continuarmos essa bela construção de identidade de toda região — disse o servidor federal Edmundo Siqueira, que tem se dedicado à luta pela preservação do Arquivo Público como blogueiro do Folha1.

 

Presidente da Alerj, Ceciliano no Folha no Ar desta 6ª

 

(Arte: Eliabe de Souza, o Cássio Jr.)

 

A partir das 7h da manhã desta sexta (29), quem fecha a semana do Folha no Ar, na Folha FM 98,3, é o deputado estadual e presidente da Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, André Ceciliano (PT). Ele integra a série de entrevistas que a rádio mais ouvida de Campos e região tem feito com vários protagonistas da política estadual e nacional.

Ceciliano falará sobre a proposta do Fundo Soberano Estadual dos Royalties, e sobre a atuação da Alerj na pandemia da Covid-19 e na venda da Cedae. Por fim, ele falará da sua pré-candidatura a senador, da sua sucessão no comando da Alerj e do casamento entre as eleições de 2022 a governador do RJ e presidente da República.

Quem quiser participar ao vivo do Folha no Ar desta sexta pode fazê-lo com comentários em tempo real, no streaming do programa. Seu link será disponibilizado alguns minutos antes do início, na página da Folha FM 98,3 no Facebook.

 

Às escuras e esburacada, procura-se governo em SJB

 

Registros de ruas escuras, esburacadas e alagadas em todo o município de SJB revelam quadro de abandono (Fotos: Facebook/Montagem: Eliabe de Souza, o Cássio Jr.)

 

Jorge Fernando Hissa, secretário de Obras de SJB

SJB tem explicações a dar

Na manhã de hoje, o convidado do Folha no Ar, na Folha FM 98,3, é o secretário de Obras de São João da Barra, Jorge Fernando Hissa. Como responsável pela pasta no governo Carla Machado (PP), ele terá muitas perguntas a responder da bancada do programa de rádio mais ouvida de Campos e região, composta pelo radialista Cláudio Nogueira e pelo Arnaldo Neto, que é sanjoanense, criado no balneário de Atafona. Não só na praia tradicionalmente frequentada também por campistas, o quadro de abandono de todo o município de SJB tem causado revolta em seus moradores. Inclusive naqueles que sempre foram carlistas.

 

Analiel Vianna, vereador governista de SJB

Município refém da escuridão e buracos

As reclamações sobre a iluminação pública e os buracos espalhados por todas as vias sanjoanenses são generalizadas. O quadro de abandono já é ecoado na Câmara Municipal de SJB, até entre os vereadores da situação. No último dia 19, o vereador governista Analiel Vianna (Cidadania) levou ao plenário do Legislativo um requerimento à secretaria municipal de Obras, para substituição de postes e refletores do campo de futebol do Açu. Em tom de desabafo, ele lembrou das constantes aprovações de excesso de arrecadação municipal, enquanto munícipes reclamam de ruas esburacadas e falta de iluminação.

 

Elísio Rodrigues, vereador governista de SJB

Cinco mil postes apagados

Naquela sessão da Câmara de SJB, o presidente governista da Casa, vereador Elísio Rodrigues (PL), contabilizou que o município já tem cerca de 5 mil postes apagados. Ele cobrou ação por parte da Prefeitura para a solução do problema, que também é de segurança pública. Elísio salientou, ainda, que a secretaria de Obras já prometeu três vezes que a falta de manutenção do serviço de iluminação pública seria solucionada, sem que nenhum prazo tenha sido cumprido. A Casa aprovou uma indicação assinada por todos os parlamentares, propondo ao Executivo a elaboração de um processo licitatório para terceirizar a iluminação pública.

 

Junior Monteiro, vereador governista de SJB

Contraste gritante

Cidade tradicional em sua polarização entre Congos e Chinês, “abelhas” e “marimbondos”, as cobranças ao governo Carla hoje são uma unanimidade em SJB. O vereador governista Analiel lembrou que as queixas não são mais de “figurinhas carimbadas”, ou “reclamões” das redes sociais. A situação chegou a tal ponto, que outro vereador governista, Junior Monteiro (Cidadania), relatou que moradores de Quixaba estavam arrecadando dinheiro para pagar um eletricista e buscar uma solução à iluminação pública. Isso no mesmo 5º distrito onde está instalado o Porto do Açu, no contraste gritante entre desenvolvimento e abandono.

 

Alan de Grussaí,vereador governista, e Danilo Barreto, candidato a vereador de SJB mais votado na “pedra”

Dinheiro não falta

Outro vereador governista, Alan de Grussaí (Cidadania) chegou a cobrar que o secretário de Obras Jorge Hissa entregue seu cargo, se não atender à população. Alan ressaltou que o município deve ter recorde de arrecadação. Com orçamento previsto de R$ 430 milhões para 2021, é esperado que ultrapasse os R$ 500 milhões. Candidato a vereador mais votado na “pedra” em 2020, embora não tenha sido eleito, o jovem administrador público Danilo Barreto (Patri), hoje diretor de Eficiência Governamental da Prefeitura de Brusque (SC), foi direto ao falar do seu município no Folha no Ar do último dia 21: “Não falta dinheiro, falta governo”.

 

Alcimar Chagas, economista, professor da Uenf e residente de SJB

Receita sem bem-estar

Professor da Uenf e residente em SJB, o economista Alcimar Chagas analisou a contradição: “São João contraria a tese de que uma maior receita orçamentária garante o bem-estar do cidadão. Neste ano, as receitas orçamentárias devem atingir R$11.842,85 por habitante, valor 3,63 maior que Campos. Mas o governo não tem compromisso com a população. O atendimento na saúde pública é precário. Os constantes alagamentos na área rural isolam os produtores. Na área urbana, os jovens não têm perspectiva. Empreendedores são inibidos e avança o desemprego. Isso numa cidade que tem o Porto do Açu e é produtora de petróleo”.

 

Hamilton Garcia, cientista político, professor da Uenf e residente de SJB

Descaso ambiental

Outro professor da Uenf e residente em Atafona, ontem o cientista político Hamilton Garcia denunciou que o abandono de SJB também é ambiental. Ele denunciou um bugre sem placa cujos ocupantes tiraram estacas de proteção para trafegar à beira-mar, mas nada foi feito: “O Projeto Tamar deixou de atuar nas praias de SJB por falta de colaboração municipal. Tenho conhecimento de fiscais ambientais que atuam sem apoio e são motivo de riso, por parte de colegas comissionados. Não vejo intencionalidade contra o meio-ambiente, mas de um descaso universal com a coisa pública, numa sociedade que valoriza o favor e o compadrio”.

 

Prefeita Carla Machado e deputado estadual Bruno Dauaire

Única obra que avança

Vereador governista de SJB, Elísio foi direto: “nossa prefeita e alguns secretários, não só o de Obras, não tratam o assunto da forma emergencial como deveriam”. No Folha no Ar de 28 de maio de 2020, quando o entrevistado foi o deputado estadual Bruno Dauaire (PSC), foi dito a ele que Carla Machado conquistaria seu quarto mandato como prefeita com 70% dos votos válidos. Em novembro, ela seria reeleita com 69,72%. Com a mesma independência na análise dos fatos, alvo da reprovação popular geral, Carla hoje teria sérias dificuldades para fazer seu sucessor. Em SJB, as únicas obras que avançam são no antigo bar da prefeita em Atafona.

 

Publicado hoje na Folha da Manhã