Desde que conheci Lúcia Miners e sua poesia, nos festivais e concursos literários pelos quais nos esbarramos desde os anos 1990, a feminilidade espontânea, o lirismo telúrico e a grande capacidade imagética dos seus versos, por vezes livres, no mais das vezes rimados, despertaram o desejo de me aprofundar na obra daquela senhora meio excêntrica, com cara de avó hippie saída de já hojinha de Woodstock. Há coisa de dois anos, cheguei a entrar em contato com ela, para combinarmos meu franqueamento aos seus poemas. Ela acabou não os mandando, eu não os cobrei e, como cantou o Chico, eis que chegou a roda viva e carregou nosso destino pra lá.
Assim que soube da sua morte, no último dia 8, em que completou exatos 78 anos, no Monsenhor Severino, onde ela morava por opção, passei a correr atrás de pessoas que pudessem ter ficado com parte da sua obra, aquela que sobrevive e sempre importa mais que o autor. Acabei chegando ao também poeta Antônio Roberto de Góes Cavalcanti, o Kapi, que tinha organizado e dirigido, em cima dos poemas de Lúcia, um Café Literário, nos tempos em que estes ainda existiam para quebrar a pasmaceira cultural desta cidade. E foi a mesma cidade, ora esvaziada de cultura e desde sempre cortada pelo Paraíba do Sul (o “Paraíba, meu sul” ou “Paraíba de mim” de Lúcia), cujos reflexos em água castanha vi correr no curso da alma dessa poeta de olhos azuis, a partir dos seus 21 trabalhos que me foram enviados pelo Kapi.
Sem nunca ter conversado com Lúcia sobre suas influências, algumas surgiram cristalinas, a partir da leitura da obra, aos olhos de um poeta chegado às paráfrases como eu. Não é, pois, o português Fernando Pessoa (1888/1935), seja o ortônimo do “Cancioneiro”, seja o heterônimo Alberto Caeiro de “O guardador de rebanhos”, que imprime o “sino” e o “rio” da sua aldeia como referências também à aldeia-planície de Lúcia? Se não vejamos…
De Pessoa-Pessoa:
“Ó sino da minha aldeia,
Dolente na tarde calma,
Cada tua badalada
Soa dentro da minha alma”
De Lúcia, em “Paraíba de mim (1)”, em versos ao ritmo dolosamente monocórdio das badaladas que repicam o nome do rio, pontuado ao final pelo gênero numa linda afirmação de mulher:
“E tocar seu nome como um sino,
Para quando você vier.
Pra quando você vier,
Vou guardar o tempo,
Vou dançar no tempo,
Vou prender o tempo
Como uma flor
Em meus cabelos”
Também dela, a analogia pessoana a esse “sino da aldeia” ecoa nos dois últimos versos de “Soneto dos muitos campos”, concluído com referência explícita e passarinheira ao “Cancioneiro”:
“E alvissareiro, canta o sino-catedral,
Canção que ensina aos pardais, cancioneiro.”
Do sino novamente afluído ao “rio da aldeia”, em “Paraíba, meu sul (2)”, Lúcia emerge como mãe d’água seu destino e sua crença:
“Paraíba, você é
Deste deserto meu poço,
Te encontrar é minha fé”
Em “Paraíba de mim (23)”, a paixão-mulher de pernas desavexadamente abertas ao rio-macho é mais uma vez assumida pela poeta:
“Luas se suicidam
Em suas águas
Minguantes, cheias
Paraíbas.
Há um rio em minha vida.
Há um rio
Que corre de mim
Para mim.
Cachorro!”
Aqui, a simulação da zanga da mulher do malandro Paraíba, despida do lirismo, talvez seja também uma referência ao Capibaribe do pernambucano João Cabral de Melo Neto (1920/99), desvelada logo ao começo do seu “O cão sem plumas”:
“A cidade é passada pelo rio
como uma rua
é passada por um cachorro”
Mas a possibilidade de Cabral em Lúcia, deságua novamente como certeza aldeã em Pessoa, agora como Caeiro:
“Mas o Tejo não é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia
Porque o Tejo não é o rio que corre pela minha aldeia”
Há várias outras possibilidades de influência na obra de Lúcia. O pantaneiro Manoel de Barros, com suas contiguidades verbais e seu surrealismo colhido do pé, direto da natureza, é outra certeza. Talvez o enfant terrible Arthur Rimbaud (1854/91) de “L’Éternité”(“Achada, é verdade?/ Quem? A Eternidade./ É o mar que se evade/ Com o sol à tarde”) tenha servido de base para a campista brincar de pular carniça sobre o francês, ao final do seu poema quase lisérgico “Terra, fogo, água e ar”:
“Bolas de cor e de luz, com os olhos, sigo,
Como sigo o mar e suas marolas”
De qualquer maneira, se não o fizeram em suas vidas, o poeta menino e a senhora poeta, “tão antiga quanto um jarro Ming”, bem que podem estar a fazê-lo agora…
Despudorada a dar de ombros à opinião alheia, como Rimbaud, Lúcia assumiu em seu “Sorry, baby!”:
“Eu não sou boa
E nem mesmo sou decente…
Minh’alma é bandalha e à toa…”
Já em outro poema, “Para o Dr. Eduardo Salícios”, ela sutilmente faz da previsão fatalista uma deixa à contradita, a molde de um dos seus principais instrumentos poéticos, a ironia:
“Foi ontem,
Quando eu morri
Pela última vez, que percebi:
Não valeu a pena
Ter vivido,
Acho…”
Pois basta ler sua obra, para se ter certeza oposta ao “achado” pela autora, respondida por dois dos versos mais conhecidos de Pessoa, a encabeçar a segunda estrofe do seu “Mar Português”, integrando o livro “Mensagem”, único que publicou em vida, um ano antes da sua morte:
“Valeu a pena? Tudo vale a pena
Se a alma não é pequena”
Bem verdade que, em relação a Lúcia, alguns dos seus poemas talvez demandassem maior lapidação. Todavia, nada que apequene o gigantismo da sua alma de poeta, expressa em sua sensibilidade à flor da pele, em seu inquestionável talento imagético e, maior virtude da vate campista, em sua universalidade tribal, melhor resumida pela célebre sentença atribuída ao prosista russo Leon Tolstói (1828/1910): “Quer ser universal, cante a sua aldeia”.
Assim, como Lúcia conclui seu “Meu bueno cantar, me bueno encantar (2)”, entre o rio Paraíba, o sino da Catedral, a Praça São Salvador e seus pardais, uma obra excede a vida ao ecoar “A nota em oboé de uma esperança”.
A mesma habilidade com que sempre operou nos bastidores, fiel há mais de 20 anos à liderança política de Anthony Garotinho, mas com polidez para não reproduzir o comportamento que fez o ex-governador colecionar tantos desafetos, o jornalista Mauro Silva demonstrou nesta entrevista, respondida na tarde da última sexta, mesmo dia em que Berenice Seara, colunista do Extra, anunciou que a prefeita Rosinha Garotinho desistiu de desistir da sua candidatura à reeleição, em outubro. Sabendo ou não disso, o fato é que Mauro afimou a mesma coisa. Como a entrevista foi feita por e-mail, sem a oportunidade de réplica ao entrevistador, aquelas que se fizeram necessárias acompanham, entre parênteses, algumas das respostas do presidente municipal do PT do B. Ele continua a apostar na inelegibilidade de Arnaldo Vianna, mesmo quando o julgamento do TSE foi favorável ao ex-prefeito. A análise, por óbvio, é oposta sobre as condições de elegibilidade de Rosinha, mesmo a despeito dos recursos às suas duas condenações, à espera de julgamento no TRE e TSE.
Folha da manhã – O PT do B está namorando com o prefeito carioca Eduardo Paes (PMDB), candidato à reeleição apoiado pelo governador Sérgio Cabral (PMDB), e descarta qualquer aproximação com a deputada estadual Clarissa (PR), que é vice na chapa encabeçada pelo federal Rodrigo Maia (DEM). Em Campos, o partido já foi Mocaiber (PSB) e hoje é Rosinha (PR). Afinal, o PT do B se aproxima do que cantou Raul Seixas: “Eu prefiro ser essa metamorfose ambulante”?
Mauro Silva – O PT do B está coligado com o PR em 50 cidades do Estado, que é o nosso maior aliado. O presidente do partido, Vinicius Cordeiro, deixou claro que o maior compromisso do PT do B estadual é com o projeto do Garotinho para 2014. Mes-mo que em algumas cidades o PT do B tenha outras parcerias, nós estamos fazendo valer a regra de autonomia plena dos diretórios municipais. Por exemplo, em cinco municípios, entre eles Niterói, Búzios e Nova Iguaçu, estamos apoiando o PDT, que são parcerias antigas do partido. Em Parati, estamos coligados com o PT, onde temos dois vereadores de mandato. Com relação à chapa no Rio, o PT do B não fez parte do governo César Maia. Apesar da presença de Clarissa na chapa como vice, o fato dela ser encabeçada pelo deputado Rodrigo Maia criou embaraços que não puderam ser transpostos pela direção estadual do partido.
Folha – Além de você, o PT do B conta com dois outros ex-secretários e potenciais puxadores de voto na nominata ao Legislativo, Eduardo Crespo e Cecília Bainha. O vereador Jorginho Pé no Chão já desistiu da reeleição, mas como está a situação de Chico da Rádio? Quantos vereadores o partido espera eleger?
Mauro – Como você mesmo disse, o PT do B tem fortes nomes que serão confirmados por nossa convenção. O radialista Chico da Rádio está firme e é pré-candidato. Temos uma nominata forte que pode fazer de dois a três vereadores.
Folha – Logo após o vereador Marcos Bacellar (PDT) anunciar que não vai concorrer à reeleição, para apoiar um pré-candidato governista, o líder da situação Jorge Magal (PR) disse que o colega de oposição seria bem vindo ao grupo político de Garotinho. E você, o que acha?
Mauro – Eu acho que o vereador Marcos Bacellar já teve a oportunidade de participar do grupo quando eu assumi o partido e o convidei para permanecer no PT do B, que está na base de apoio a Rosinha. Acho que ele refletiu melhor, viu o belo trabalho que está sendo realizado pela Rosinha e resolveu apoiar um candidato da base governista. Já que ele não é candidato, acho que ele tomou uma medida acertada.
Folha – Independente da resposta, se era para ter Bacellar no grupo de Garotinho, não seria mais fácil se você o tivesse mantido no PT do B? Tentou fazer isso? Como e por quê?
Mauro – Sim, seria mais fácil se ele quisesse. Como já disse (sabendo previamente da existência das duas perguntas), o convidei para ficar, e acho que agora ele refletiu melhor e resolveu mudar de idéia. Como disse, apoiar um candidato da base da prefeita Rosinha é o reconhecimento do trabalho que ela vem realizando.
Folha – O pré-candidato governista que Bacellar abriu mão da sua reeleição para apoiar Diego Dias (PSB). Ele foi assessor parlamentar do vereador, antes de se casar com uma das herdeiras da Nova Rio, empresa prestadora de serviços públicos. Diz-se que Diego está disposto a jogar pesado, não só para se eleger vereador, como para depois chegar à presidência da Câmara. Em nossa última entrevista, você também assumiu esse objetivo. Como dois corpos não ocupam o mesmo espaço, ao mesmo tempo, sobretudo quando pertencem ao mesmo grupo político, de que maneira isso será equacionado?
Mauro – Primeiro, é preciso vencer as eleições. É muito cedo para essa discussão (sete meses ainda mais cedo, na entrevista publicada na Fo-lha em 27 de novembro do ano passado, respondendo à esta mesma questão, Mauro disse: “Para quem me conhece, sabe que meus sonhos vão além de uma cadeira na Câmara Municipal de Campos”). A Câmara vai ter 25 vereadores e todos podem pleitear a presidência. No momento, eu quero mostrar a importância da continuidade do governo Rosinha, apresentar minhas ideias, me colocar à disposição para ajudá-la na Câmara, no próximo mandato.
Folha – Assim como com você, a Diego é atribuída habilidade nas operações de bastidores. Caso vocês dois se elejam, o que poderá ser o diferencial à pretensão comum de presidir a Câmara: a votação de cada um em outubro? E Magal, também não estaria nessa briga?
Mauro – As eleições da mesa diretora não ocupam minha agenda neste momento e é muito cedo para fazer qualquer análise (Em 27 de novembro, sobre a relação entre votação e presidência da Câmara, Mauro analisou: “E digo mais, Aluysio, nem sempre o mais votado é o escolhido para presidir a Câmara, mas o que tem mais habilidade em agregar e harmonizar o Legislativo”).
Folha – Também em nossa última entrevista, você apostou na reconciliação entre os irmãos Anthony Garotinho (PR) e Nelson Nahim (PPL). Continua a fazê-lo? No debate proposto por ambos, quem está com a família e quem está com a quadrilha nessa história?
Mauro – Defendo o diálogo sempre em todas as instâncias. Tenho esperança na reconciliação, mas este é um assunto pessoal e muito delicado, deve ser tratado em família.
Folha – Numa série de reportagens, publicadas pela Folha na quarta e quinta-feira, foi abordado o fato de que, enquanto enfrenta uma oposição dividida em Campos, nos municípios vizinhos de Quissamã e São João da Barra, Garotinho consegue unir a oposição. Preconizada desde o chinês Sun Tzu, em seu “A arte da guerra”, unir aliados e dividir inimigos é uma estratégia tão antiga, quanto eficiente. Que outras lições políticas você aprendeu no convívio de mais de 20 anos com Garotinho?
Mauro – O Garotinho faz a diferença. Tanto na situação quanto na oposição. Ele tem uma capacidade ímpar de articulação política. Aprendi e aprendo muito nesses 20 anos de convivência com o Garotinho e com a Rosinha, que para mim devem servir como exemplo para Campos. Garotinho é um dos sete políticos no Brasil que ultrapassou a marca de mais de 15 milhões de votos para presidente. Garotinho foi governador do Estado e elegeu Rosinha no primeiro turno. Vejo no Garotinho a determinação como uma de suas principais qualidades.
Folha – Além de Sun Tzu e seu releitor italiano, Nicolau Maquiavel, outro pensador político que Garotinho gosta de citar é Joseph Goebbels, ministro da propaganda nazista, sobretudo sua frase mais famosa: “Uma mentira, repetida mil vezes, se torna verdade”. Foi este o caso, por exemplo, quando o deputado insistiu na versão de que Arnaldo Vianna (PDT) tinha sido considerado inelegível pelo TSE, em decisão do último dia 24, enquanto a própria assessoria do Tribunal assegurou exatamente o contrário?
Mauro – Garotinho não está mentindo (segundo a assessoria do TSE, sim, está), ele defende a tese dos advogados que o assessoram de que Arnaldo está inelegível, tanto que Arnaldo não pôde assumir como suplente de deputado. E não sei qual é a interpretação da assessoria do Tribunal para este fato.
Folha – Ainda que Arnaldo seja declarado inelegível, tendência que o presidente do TRE, Luiz Zveiter, já adiantou para todos os incluídos na lista enviada pelo TCE por contas rejeitadas, essa insistência em tirar o ex-prefeito do páreo não pode parecer, sobretudo ao eleitor mais esclarecido, medo de enfrentá-lo nas urnas?
Mauro – Arnaldo concorreu sem registro em 2008 e os seus votos não foram contados. Em 2010 foi a mesma coisa. Como você bem disse sobre o presidente do TRE, é bom deixar claro que quem está insistindo que Arnaldo permaneça inelegível não somos nós, mas a Justiça, pelos erros cometidos por ele.
Folha – E quanto aos problemas jurídicos da prefeita Rosinha Garotinho (PR), que tem os recursos a duas condenações de inelegibilidade aguardando julgamento, numa Ação de Impugnação de Mandato Eleitoral (Aime), no TSE, e numa Ação de Investigação Judicial Eleitoral (Aije), no TRE?
Mauro – A Rosinha deu apenas uma entrevista de rádio em 2008 quando nem era ainda candidata e foi punida por isso de forma desmedida. A Dilma estava em campanha para presidente quando Lula pediu voto para ela em um palanque oficial e os dois pagaram só multas. Rosinha reverteu (com base em liminares, mas ainda esperando julgamento) em instâncias superiores decisões desfavoráveis a respeito dessas sanções.
Folha – Em relação à Aije, não houve por parte do jurídico da prefeita outra repetição da máxima de Goebbels, quando o advogado Jonas Lopes de Carvalho Neto afirmou, no blog do procurador municipal Francisco de Assis Pessanha Filho que “a Aije, o TSE já anulou e mandou descer ao TRE”? Por que omitir a verdade: que a defesa de Rosinha alegou supressão de instância no TSE, trazendo a Aije de volta à 100ª Zona Eleitoral de Campos, onde no lugar de “anulada”, ela gerou outra condenação, cujo recurso aguarda julgamento no mesmo TRE que já havia condenado a prefeita?
Mauro – A prefeita Rosinha está elegível e não há nenhum impedimento para que ela concorra à reeleição. Ela está quite com a Justiça Eleitoral, com certidões favoráveis do TRE-RJ, seu nome não consta da lista de ficha suja do Tribunal de Contas do Estado, e nem tem pendências no Tribunal de Contas da União.
Folha – Até que ponto essa incerteza jurídica pode ter motivado o anúncio da desistência de Rosinha? Até onde você sabe, ela será ou não candidata?
Mauro – Para Rosinha, não há qualquer incerteza jurídica (haverá enquanto não forem julgados seus recursos no TRE e no TSE), não há nada que a impeça de ser candidata e ela nunca afirmou que não disputaria a reeleição. Campos precisa de todos nós e principalmente dela, por isso tenho a convicção, falo por mim, de que ela será candidata. É bom lembrar que o governo tem mais de 80% de aprovação (na verdade, segundo a última pesquisa, do Precisão, divulgada em 30 de novembro, tem um pouco menos: 79%) pelo trabalho que a Rosinha tem realizado.
Folha – A partir do anúncio da desistência de Rosinha, vários nomes do grupo foram cogitados para assumir a candidatura majoritária. Entre eles, surgiram com mais força o de Geraldo Pudim (PR), o de Chicão de Oliveira (PP) e o seu. Quem reuniria maiores condições para encabeçar esse plano B? Estaria preparado para assumi-lo?
Mauro – É compreensível que em um momento desses haja várias especulações. A vida é feita de desafios e acho que todos os citados teriam condições de cumprir essa missão, mas isso não vem ao caso agora. Para o nosso grupo não existe plano B. Rosinha vai ser a nossa candidata.
Folha – Como, ao que tudo indica, Rosinha tem reconsiderado a desistência, por que anunciá-la para depois voltar atrás? Falando em termos de estratégia eleitoral e midiática, não foi um erro evitável?
Mauro – Rosinha nunca anunciou que não seria candidata à reeleição. O que houve foi uma especulação, uma conversa em família que se tornou pública. Rosinha além de prefeita é mãe, dona de casa, e desenvolve um trabalho com as crianças de sua igreja. É natural que, em algum momento, possa ter ficado dividida, mas não em dúvida.
Folha – Durante todos esses quase quatro anos de governo, foi nítido o trabalho da Comunicação capitaneada por você, no sentido de blindar a prefeita do debate administrativo e político que envolvesse qualquer polêmica. Por que agir diferente nesse anúncio agora de abandonar a sucessão?
Mauro – A Comunicação não blindou a prefeita dos debates políticos e administrativos, pelo contrário, sempre trabalhamos para facilitar o trabalho da imprensa, divulgar todas as ações de governo e garantir à população acesso à informação. Mostrar tudo que está sendo realizado pela Prefeitura.
Folha – A oposição sempre bate nos gastos do governo Rosinha com a Comunicação. Ao todo o governo deve aplicar R$ 45 milhões em quatro anos. Foi muito ou está dentro da normalidade? Por quê?
Mauro – Hoje, além das secretarias municipais, todas as ações de divulgação da Prefeitura são realizadas pela Comunicação, incluindo as fun-dações, as empresas e a administração indireta. O investimento da Comunicação, para dar publicidade a todos os atos de governo, campanhas educativas, não chega a um 1% do Orçamento anual. Pelas médias anuais investidas até a minha saída da secretaria a projeção é de que em quatro anos de governo sejam investidos R$ 45 milhões. Tudo é feito através de licitação e está dentro da legalidade. As empresas privadas, por exemplo, investem 5% de suas receitas em comunicação.
Liberado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), no último dia 24, para concorrer à eleição majoritária de Campos em outubro, o ex-prefeito Arnaldo Vianna (PDT) foi incluído numa lista, exatamente uma semana depois, enviada pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE) para o Tribunal Regional Eleitoral (TRE), composta de administradores públicos com contas rejeitadas. Se o presidente do TCE foi uma indicação pessoal e polêmica do ex-governador Anthony Garotinho (PR), desafeto assumido de Arnaldo, o presidente do TRE já adiantou a tendência de tornar inelegíveis todos os citados na lista. Ainda assim, Vianna acredita que conseguirá se candidatar, embora admita não estar fechado à possibilidade de apoiar outros nomes da oposição. Ele não poupa críticas ao casal Garotinho, que disse viver “no mundo da fantasia, como em uma peça de teatro”. Mesmo com ressalvas ao anúncio de que a prefeita desistiu de tentar se reeleger, Arnaldo aposta: “com Rosinha ou sem Rosinha, vamos ver que esse favoritismo (dos governistas) é uma grande ilusão”.
Folha da Manhã – Nas eleições de 2008, para prefeito, e de 2010, à Câmara Federal, embora tenha levado as campanhas até o fim, seus votos acabaram não computados. Mesmo que consiga o registro da candidatura, por que o eleitor que optar por você pode esperar, dessa vez, ter seu voto reconhecido?
Arnaldo Vianna – O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) já deixou claro que estou elegível e posso disputar o pleito deste ano. Como já mostramos ao TSE, vamos explicar ao TRE que existem equívocos e que não há qualquer tipo de impedimento. E o desespero no grupo governista é que, dessa vez, quem vive situação complicada é a prefeita, que está no poder só por uma liminar, não foi julgada e pode ser barrada pela Justiça.
Folha – O presidente do TRE, desembargador Luiz Zveiter, já antecipou a tendência de considerar inelegíveis todos os nomes da lista encaminhada no último dia 31, pelo TCE. Por que acreditar que, com seis contas reprovadas, você possa ser uma exceção?
Arnaldo – Como o meu advogado já explicou, há mais de 20 anos o TSE entende que atraso na prestação de contas, se não há irregularidade insanável, não há inelegibilidade. É apenas o grupo governista e seus mais de 30 advogados que tentam espalhar boatos sobre a minha situação. Quem se informar nos próprios tribunais vai descobrir que, para o desespero de alguns, estou elegível.
Folha – Não vê nada de estranho no presidente do TRE antecipar a decisão sobre uma lista que, por sua vez, foi também antecipada pelo presidente do TCE?
Arnaldo – Prefiro acreditar que não há qualquer tipo de manobra. Confio no Justiça e tenho certeza de que vamos mostrar no Rio o que já provamos em Brasília.
Folha – Especificamente sobre o presidente do TCE, Jonas Lopes de Carvalho Júnior, que encaminhou a lista ao TRE, outro ex-prefeito de Campos nela incluído, Sérgio Mendes (PPS), disse: “O alvo, todos sabem, é Arnaldo Vianna. Ou alguém acredita que é coincidência que o TCE tenha feito e enviado essa lista, apenas uma semana depois do TSE ter liberado a candidatura de Arnaldo a prefeito de Campos?”. Concorda?
Arnaldo – O presidente do TCE é um grande amigo do deputado Garotinho. Isso é um fato. Mas como disse antes, prefiro acreditar que não existe qualquer tipo de manobra para me prejudicar.
Folha – Sérgio Mendes também questionou a motivação política de Jonas Lopes no envio da lista, já que ele chegou ao TCE numa indicação pessoal do então governador Garotinho, que foi à época questionada na mídia e na Justiça. E você?
Arnaldo – Lembro que na época a Alerj colaborou para a posse relâmpago ao aprovar uma emenda à Constituição do Estado. A mudança conferiu ao então governador Garotinho o direito de indicar três dos sete conselheiros do TCE. Antes, só podia nomear dois. A alteração foi considerada flagrantemente inconstitucional pelo presidente da OAB. São fatos que geraram muita polêmica naquela época.
Folha – Em entrevista publicada na Folha do último domingo, o presidente do PR em Campos, Wladimir Garotinho, insistiu em repetir o discurso do pai, dizendo que sua vitória por 5 a 1 no TSE tinha sido uma derrota, no sentido de decretar sua inelegibilidade. Como esta versão foi exatamente o contrário do informado pela própria assessoria do TSE, de que maneira reagir a essa tentativa de inversão?
Arnaldo – Eles são especialistas em desinformação. Querem levar o debate para esse campo das fofoquinhas e das especulações. Eles fogem de um debate sério com uma comparação entre o período em que governei, com cerca de R$ 2 bilhões em seis anos, e o atual governo, que teve cerca de R$ 8 bilhões em quatro anos. E o que estamos vendo em nossa cidade? Faltam remédios e itens básicos nos postos de saúde, médicos estão insatisfeitos, professores desmotivados, educação com péssimos resultados e servidores desrespeitados e revoltados com o reajuste de 5,1%. Tive um orçamento quatro vezes menor e encerrei o mandato com mais de 90% de aprovação. Por isso o grupo da prefeita inventa notícias para tentar me tirar da eleição.
Folha – O fato do TSE ter concluído que suas contas reprovadas pelo TCU eram sanáveis, não configurando, portanto, em problemas para sua candidatura a prefeito em outubro, mas ao mesmo tempo lhe impedindo de tomar posse da cadeira de deputado federal do PDT, pode ter servido para essa interpretação confusa? Frustrou por não poder assumir a vaga aberta pela ida de Brizola Neto ao ministério do Trabalho?
Arnaldo – Seria importante assumir a cadeira em Brasília e retomar projetos importantes que iniciei em meu mandato anterior. Em 2007, antes desse debate sobre a redistribuição dos royalties, participei de um grupo que criou a Frente Parlamentar em Defesa dos Royalties. Hoje, infelizmente, não temos deputados de Campos que atuam em sintonia com os governos estadual e federal. Preferem uma política personalista que prejudica nossa cidade. Mas não fiquei frustrado. Sei que passamos por provações para depois assumir grandes missões.
Folha – O que achou do anúncio, primeiro no jornal O Diário, depois confirmado pela filha da prefeita, a deputada estadual Clarissa (PR), de que Rosinha desistiu de concorrer à própria reeleição?
Arnaldo – Esse casal vive no mundo da fantasia. Eles agem como se estivessem em uma peça de teatro. Ao invés de representar o povo eles acham melhor representar para o povo. Porém, temos que aprender a ver além desse teatrinho. Quem se lembra da greve de fome do “primeiro-damo”? Para fugir das acusações e não responder nada, ele optou por aquela cena de humor pastelão.
Folha – Quando do anúncio da sua inclusão na lista do TCE, você disse: “Eu já fui julgado e liberado pela Justiça Eleitoral. E Rosinha? Será que o fato de estarem tão preocupados comigo e com a oposição não significa que já estão contando que a prefeita não poderá concorrer?” Acredita que isso pode ter sido a causa do anúncio de abandono, já que Rosinha ainda tem recursos por duas condenações, numa Ação de Investigação Judicial Eleitoral (Aije) e numa Ação de Impugnação de Mandato Eleitoral (Aime), para serem julgados, respectivamente, no TRE e no TSE?
Arnaldo – Eles anunciaram a suposta desistência no jornal O Diário, que é uma espécie de caderninho de anotações do Garotinho. Aquilo tudo foi produzido com muito cuidado e não existe esse papo de que a notícia vazou. Por isso, precisamos aprender a enxergar além do teatrinho. E, enxergando além, conseguimos ver que o grupo da prefeita está muito preocupado com a Justiça e tenta criar esse fato para confundir a população e se fazer de vítima. Vale lembrar que na última cassação, a prefeita desrespeitou a Justiça e transformou a sede da Prefeitura em um acampamento cor de rosa.
Folha – Se já estavam mesmo contando com a impossibilidade de Rosinha se candidatar, por problemas com a Justiça Eleitoral, acha que isso pode ter sido a causa da insistência em decretar sua inelegibilidade, mesmo às custas da inversão de uma decisão ao seu favor no TSE? Numa corrida à Prefeitura de Campos, com você e sem Rosinha, o favoritismo para o grupo de Garotinho se mantém?
Arnaldo – Eles têm percebido que o meu nome está crescendo, até nas pesquisas do instituto que possui um contrato com o governo. Isso gera um certo desespero. Tenho me preparado para debater com a prefeita Rosinha, que como eu volto a dizer, teve um orçamento quatro vezes maior do que o da minha gestão. Na hora que a eleição começar, com Rosinha ou sem Rosinha, vamos ver que esse favoritismo é uma grande ilusão. Eles têm propagandas fantasiosas, pesquisas questionáveis e aplausos que custam muito caro. Eu tenho ao meu lado exatamente quem faz a diferença: o povo.
Folha – Se não for mesmo Rosinha, qual alternativa do PR seria mais difícil de ser batida? Pudim, Chicão, Mauro Silva, alguma outra? Por quê?
Arnaldo – Se para a prefeita já é complicado falar sobre um governo que ela não conhece, imagine para outra pessoa. Como disse o presidente da Câmara, Nelson Nahim, o prefeito de Campos é Garotinho. Qualquer pessoa que tente assumir esse papel terá que atuar como um ventríloquo. Como eu disse, estou preparado para debater com qualquer representante deste grupo. Mas seria bom mesmo debater com o próprio Garotinho. Será que Garotinho teria coragem de disputar e eleição? Em 2008, ele se escondeu. Será que agora vai ter coragem de aparecer e constatar que possui uma rejeição enorme em sua cidade? Ele deveria parar de usar as pessoas e assumir que dá as cartas e controla cada ato da prefeita, dos secretários e vereadores.
Folha – Assim como a desistência de Rosinha, surpreendeu o abandono da tentativa de reeleição à Câmara do vereador Marcos Bacellar? Com a saída dele para apoiar uma candidatura da base de apoio a Rosinha, de Diego Dias, do PSB, até que ponto isso fortalece os governistas e enfraquece a oposição, sobretudo a candidatura de Ilsan, que agora ficará sem os votos de Bacellar na nominata do PDT?
Arnaldo – O vereador Bacellar tomou uma decisão e deve ter os seus motivos. Mas acredito que ele não ficará ao lado do governo. Sobre a nominata do PDT, posso dizer que apesar de todo o esforço do governo para enfraquecê-la, vamos fortes para a eleição.
Folha – Independente das consequências, o próprio Bacellar já admitiu que a principal causa da sua decisão é a dificuldade que todos os candidatos de oposição terão, diante da força da máquina eleitoral dos Garotinho. Isso não parece confirmar as previsões de Wladimir, dos governistas conseguirem fazer de 22 até todos os 25 vereadores?
Arnaldo – É lógico que a máquina tem muito peso na eleição. Mas essa história de fazer a Câmara toda é mais uma ilusão do mundo cor de rosa. Será que a população vai querer a Câmara transformada em uma Escolinha do Professor Garotinho?
Folha – Em agosto último, Garotinho conseguiu que fosse aprovado, por unanimidade, na Comissão de Fiscalização Financeira e Controle da Câmara Federal, o requerimento de informações sobre o processo contra você, que está da Procuradoria Geral da República, para apurar atos de corrupção e desvio de royalties do petróleo para contas no exterior, cujo valor seria de US$ 78 milhões. Você tem ou não contas no estrangeiro?
Arnaldo – Ainda como deputado, eu solicitei que a Câmara Federal fizesse uma ampla investigação. Essa investigação foi feita e tenho um documento comprovando que não existe conta alguma no exterior em meu nome. É mais uma invenção de um homem que perdeu a noção entre o real e o imaginário.
Folha – Você perdeu a eleição em 2008, mesmo com um mandato de deputado federal, com boa parte da máquina municipal simpática ao seu retorno, numa corrida em que se lançou como favorito. Como vencer agora, sem nenhum mandato e com a Prefeitura e o favoritismo na mão dos seus opositores?
Arnaldo – Aquela eleição foi atípica. Havia muita gente fazendo jogo duplo. Estavam ao meu lado e hoje estão no governo Rosinha. Além disso, passei por problemas de saúde. Dessa vez é diferente. Os amigos de verdade estão ao meu lado, estou com muita disposição e vamos mostrar que esse favoritismo é ilusório.
Folha – Consigam ou não se candidatar, o fato é que você e Rosinha, além de oriundos do mesmo grupo, têm enfrentado seguidos problemas com a Justiça, com ambos chegando a ser afastados da Prefeitura. Não chegou a hora, sobretudo na oposição aos Garotinho, de uma alternativa nova, da tão falada “terceira via”, na qual surgem Makhoul Moussalem (PT), Odete Rocha (PCdoB), Andral Tavares Filho (PV) e Erik Schunk (Psol)? Se não conseguir se candidatar, apoiaria um desses ou outro nome?
Arnaldo – A vida é um grande aprendizado. Fui vereador, vice-prefeito, deputado e tenho a marca de ter sido o prefeito mais votado da história de Campos. Já ganhei, já perdi, indiquei sucessores, errei, acertei, me decepcionei. Tenho experiência para atuar em um momento de transição em nossa região. Ao contrário do Garotinho eu sei ouvir as pessoas e não sou vaidoso ao ponto de não aceitar que essas novas lideranças atuem ao meu lado nesse processo de transformação. Eu quero que a cidade deixe de ser a cidade de uma família e volte a ser uma cidade de todas as famílias. E se alguém tiver chances de vencer e deseje fazer isso, com certeza estarei ao lado dessa pessoa.