Tomamos no Cunha — Todos nós!

Há algum tempo considero Elio Gaspari, entre os vivos, o maior jornalista do Brasil — e capaz de brigar de igual para igual com qualquer um dos mortos. Seu leitor assíduo há pelo menos 10 anos, às quartas e domingos, em O Globo, por indicação do também grande jornalista (e amigo, ou confrade, como ele gosta de dizer) Ricardo André Vasconcelos, li e me embasbaquei com sua quadrilogia “A Ditadura Envergonhada”, “A Ditadura Escancarada”, “A Ditadura Derrotada”, “A Ditadura Encurralada”.

Independente dos adjetivos, creio que ninguém poderá compreender o que foi a Ditadura Militar no Brasil, entre 1964 e 1985, na qual nasci e me tornei adolescente, sem ler essa impressionante reportagem com fôlego de maratonista, cujo ritmo é mantido página a página, tendo como grande virtude a fluidez da impressionante quantidade de informação. Particularmente, naquilo que consegue passar ao leitor, enquanto o seduz pela qualidade do prosista, Gaspari, que nasceu na Itália, me lembra o francês Fernand Braudel (1902/85), a quem julgo pela junção das mesmas duas qualidades o maior historiador moderno.

Mas é no Brasil de hoje que estamos e, pela crise na qual o país está mergulhado muito acima do pescoço, é do Brasil de hoje que devemos falar. Li só agora há pouco o artigo publicado hoje, aqui, em O Globo, pelo Elio Gaspari, tratando do sequestro do governo, da oposição e, tanto pior, meu e seu, leitor, por uma figura como Eduardo Cunha (PMDB), ex-aliado íntimo e hoje adversário maior (no tamanho, não na oposição) do nosso secretário municipal de Governo Anthony Garotinho (PR). Talvez sequer se enxergue as cordas que nos amarram, já ao ponto de cortar a circulação do sangue, sem ler o passo a passo detalhado do plano dessa canalha que nos sequestra, desvelado no brilhante artigo que este “Opiniões” se sente no dever de reproduzir abaixo:

 

 

Tomei no Cunha
(Arte do Blog do Noblat)

 

 

Jornalista e escritor Elio Gaspari
Jornalista e escritor Elio Gaspari

Cunha sequestrou o governo e a oposição

Por Elio Gaspari

 

O Planalto acha que precisa de Eduardo Cunha para segurar o impeachment, e a oposição acha que precisa dele para consegui-lo. Já o doutor acha que o Planalto e meia dúzia de notáveis de Brasília podem livrá-lo dos efeitos da Lava-Jato. É engano.

De acordo com a documentação bancária conhecida, desde o dia 23 de abril de 2014 Eduardo Cunha sabe que a Lava-Jato chegaria a ele. Foi quando fechou sua conta Orion no banco suíço Julius Baer, onde ficavam os cofrinhos de Renato Duque, Jorge Zelada e Paulo Roberto Costa.

A Lava-Jato tinha um mês de existência e já haviam sido presos Alberto Youssef e Paulo Roberto Costa. No dia 20 de maio, no mesmo banco, Cunha fechou a conta Triumph, aberta em 2007. Nenhuma delas era facilmente identificável a partir de seu nome. Tanto era assim que deixou outras duas em atividade.

Em 2011 a Orion recebera um depósito de 1,3 milhão de francos suíços saídos de uma conta Acona, do BSI. Ela pertencia ao engenheiro João Augusto Henriques, um ex-diretor da BR Distribuidora que quase chegara a diretor Internacional da Petrobras, mas indicara o doutor Zelada para o lugar.

Em novembro do ano passado a conta Acona foi bloqueada a pedido do governo brasileiro. Nessa época poucas pessoas falavam de Henriques. O governo, a Petrobras e Cunha preferiram esquecer o que ele dissera ao repórter Diego Escosteguy em 2013: “Do que eu ganhasse (nos contratos intermediados com a Petrobras), eu tinha de dar para o partido (PMDB). Era o combinado, um percentual que depende do negócio”.

A notícia do bloqueio da conta de Henriques no BSI chegou a Cunha, que se inquietou. Descobriu que a iniciativa partira de autoridades brasileiras. Calado, o Ministério Público estava atrás do poderoso Henriques.

Cunha foi eleito presidente da Câmara em fevereiro, entrou atirando e anunciou que convocaria os 39 ministros da doutora Dilma para sabatinas. Onze dias depois, colocou em votação e viu aprovada a imposição do orçamento impositivo. Surgira a expressão “pauta-bomba”.

Em março o doutor entrou na Lista do Janot e passou a ser investigado pelo Supremo Tribunal. Uma semana depois, outra bomba: a Câmara aprovou uma mudança no cálculo do salário-mínimo.

No dia 17 de abril o banco Julius Baer fechou as duas outras contas ativas (Netherton e Kopek), que Cunha talvez tenha suposto serem inalcançáveis. Bomba de novo: menos de um mês depois a Câmara aprovou mudanças no cálculo do fator previdenciário.

Em agosto o juiz Sérgio Moro aceitou uma denúncia do Ministério Público contra Henriques. Bomba: a Câmara aprovou a proposta de emenda constitucional que vincula os salários de advogados públicos e policiais aos vencimentos dos ministros do Supremo Tribunal.

Em setembro, como era de se prever, Henriques foi preso. Desde o bloqueio da conta Acona isso era pedra cantada.

Todas as bombas aprovadas pela Câmara, bem como aquelas que estão guardadas no paiol, podem ser defendidas em discussões pontuais. O problema é que, no conjunto, simplesmente destroem as finanças do país. Custam R$ 284 bilhões ao longo dos próximos anos.

O governo e a oposição acham que podem fazer acordos com Eduardo Cunha. Deixando-se de lado o fato que um acerto serviria para derrubar a doutora Dilma e o outro para preservá-la, o que há de mais intrigante nessas operações é que nem Cunha, nem a oposição e, muito menos, o Planalto, controlam o Ministério Público e a Lava-Jato. Se controlassem, ela já teria acabado há muitos meses. Trata-se de um caso de contaminação voluntária de reputações, algumas até boas.

Uma alma danada vem chamando o presidente da Câmara de “Al Pacino”. Fica a dúvida do que isso significa. Na vida real ele é um grande profissional, com um Oscar no papel de Serpico, um corajoso policial honesto. Esteve também em filmes como “Um Dia de Cão” (baseado numa história verdadeira) e “O Poderoso Chefão”.

 

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Este post tem 6 comentários

  1. Leniéverson

    Olá, Caro Aluysio, eu li o que você escreveu e já tinha antes o texto do Elio Gaspari. Talvez, o que eu vá dizer seja fora do senso comum dito pela imprensa de forma geral. Quem olha as rotineiras notícias sobre o Eduardo Cunha considera o presidente da Câmara um mal maior do Brasil. É claro que é bobagem. O que é certo e sério, que, na Lava-Jato foram denunciados a Gleisi Hoffman, o Renan Calheiros, o Fernando Collor e mais uma patuleia de petistas ou de partidos da base aliada. Porque só com o Cunha as investigações estão sendo fortes e aceleradas? Bom, não precisa nem dizer que desconfio do que, nas entrelinhas, você sempre negou: a existência de uma linha bolivariana no Brasil e o aparelhamento das instituições – que para mim, existe aqui com força.
    Não considero Cunha ou qualquer político inocente e santo, só acho que está havendo um tratamento desigual aos envolvidos na operação Lava-Jato para beneficiar o PT.

  2. Clouseau

    É, Aluysio, na pretensão de existir no debate, com a pretensão delirante de também fazê-lo com próprio Elio Gaspari, o meganha esquizofrênico tem muito que evoluir para um dia atingir Eremildo. Isso em intelecto, porque em moral, o Idiota criado pelo Gaspari dá de mil. Não lembro quem já comentou aqui, mas concordo: pelo tamanho da obsessão que a repugnante figura (o meganha esquizofrênico, não o pobre Idiota Eremildo) alimenta pelo autor deste blog, das duas uma, ou ele queria ser você, ou sua puta. Na dúvida, a certeza: se for a segunda opção, mesmo ainda mais xumbrega que a Dilma, Lula e Cunha cafetinam.

  3. MARCOS MOREIRA

    para quem é contra a ditadura,nós já vivemos nela,sobre a hipocrisia de usar ,apenas a palavra, não o Estado de direito,se não votar,não participa de concurso,não viaja ao exterior,não recebi beneficios sociais, etc..,etc,,,só esqueceram de dizer que o titulo de eleitor,não é uma moeda de troca,mais um documento de cidadania

  4. MARCOS MOREIRA

    é vive a DEMOCRACIA

  5. Paulo Henrique

    O Leniéverson esqueceu de alguns nomes que necessitam de um maior rigor nas investigações como:Aluízio Nunes e Aécio do PSDB; Agripino do DEM entre outros.

  6. Peter Sellers

    Para quem tem Dilma por musa, convenhamos, Closeau, a condição moral e física de “figura repugnante” é pleonasmo. No mais, se d´vida houver, basta Aluysio reeditar, para além dos comentários, a série “recordar é viver”. Afinal, desde outubro de 2010, é bem conhecida na blogosfera goitacá a patética aplicação local daquilo que o brasileiro Pezão, o lutador de MMA, não o governador do Rio, sentenciou após surrar o holandês Alistair Overeem: “Batendo é um leão, apanhando, é um gatinho”.
    Por enquanto, só como prova, se o autor do blog permite o plágio, indico a memória sempre oportuna do eterno Titã Arnaldo Antunes:

    http://www.fmanha.com.br/blogs/opinioes/2010/10/06/invejoso/

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