No domingo passado, não publiquei nenhum poema no blog. Por contraditório que possa parecer, a poesia foi o motivo. Envolvido na noite de sábado com o Sarau de Natal em Atafona, junto de outros poetas já publicados aqui, como a Adriana Medeiros, o Martinho Santafé, o Artur Gomes e o Adriano Moura, mais o devido enterro dos ossos no dia seguinte, não tive tempo para manter no blog essa sua tradição dominical “de há séculos” — como versejaria o português Fernando Pessoa (1888/1935) pela pena do seu heterônimo Álvaro de Campos.
Num domingo ainda mais ao passado, em 22 de novembro, dia do inesquecível show do Pearl Jam no Maracanã, postei um texto extenso em prosa, em preâmbulo à poesia do sírio Adonis, nascido Ali Ahmad Said. A partir da contextualização da vida e obra daquele considerado o maior poeta moderno da língua árabe, o texto se alongou na tentativa de entender a Guerra Civil na Síria e seus reflexos diretos na morte do menino Aylan Kurdi (aqui), em 2 de setembro, e nos atentados dos facínoras do Exército Islâmico (EI) em Paris (aqui), em 13 de novembro.
No meio de tanta besteira dita e escrita sobre os dois lamentáveis fatos, por gente que ignora completamente história e presente da Civilização Islâmica, a tentativa talvez não tenha sido das piores. Se você ainda não leu, pode fazer juízo por conta própria aqui. Mas, independente do resultado, o fato é que a abertura em prosa ficou muito maior do que o curto poema “Canções para a morte”. Não por outro motivo, na reprodução da postagem do blog na democracia irrefreável das redes sociais, a Claudia Caetano observou aqui: “Ficou um gosto de quero mais”.
Assim, na desculpa pelo hiato do último domingo, sobretudo a você, leitor, que já se acostumou a buscar e encontrar poesia aqui neste dia da semana mais dado à contemplação, o blog mata duas dívidas. Em versos nascidos da água que nasceu em Adonis, traduzidos pelo também poeta Michel Sleiman, o pagamento se replica abaixo:
Árvore do Oriente
Me fiz espelho
refleti tudo
mudei em teu fogo a cerimônia da água e da vegetação
mudei voz e apelo,
passei a te ver em dois
tu e esta pérola que nada em meus olhos
eu e a água nos fizemos amantes
nasço em nome da água
nasce em mim a água
eu
e a água
nos replicamos.
Sim, meu querido Aluysinho, alguém disse, acho até que fui eu, provavelmente me apropriando de algum Poeta ou Escritor, pois é público e notório que sou um corsário,m que pilha e saqueia, aqui, ali e acolá, versos, ideias, pensamentos de outrens, por entender que aos Poetas, principalmente, no momento em que publicizam suas poesias, podemos, temos o direito, de delas nos sentirmos donos sim. O mesmo digo em relação aos teus posts, eles são nossos, no momento em que são publicados… Eu serei magnânimo, eu te perdoarei pela omissão passada, por entender que também, à Poesia, temos que dar um descanso, mínimo, é claro, mas que isso, esse descanso, não vire hábito, pois estou, estamos, ouso pluralizar, viciados em tê-la aqui, neste espaço. Fraterno e forte abraço.
Caro Provisano,
Já escrevi mais de uma vez que um poema só pertence ao autor enquanto este autora. Uso nisto a jurisprudência de Fernando Pessoa: “Sentir, sinta quem lê!”. E, se vale para a poesia, tanto mais à prosa que se presta a abrir-lhe as portas.
Abç e grato pela chance da concordância!
Aluysio
P.S. Tomada sua analogia que faz dos leitores do blog “viciados” em poesia, a ausência do último domingo não foi por descanso dela, mas overdose… rs
Esta é a vantagem da boa espera, a boa surpresa que sempre supera a expectativa. Agora, encomendar o livro, urgentemente, obrigado!
Caro Savio,
Ecomende, sim, o livro de Adonis pela Companhia das Letras. É um presente que, por merecimento, dará a si mesmo. E, se me permite, só reforço as outras indicações feitas anteriormente, para vc e qualquer um que pretenda conhecer melhor a cultura islâmica: 1) “Uma história dos povos árabes”, de Albert Hourani (1915/93); 2)“O canto da unidade: Em torno da poética de Rumi”, na compilação crítica de Marco Luchesi e Faustino Teixeira; e 3) “Falsafa — A filosofia entre os árabes”, de Miguel Attie Filho.
Abç e grato pela generosidade de sempre!
Aluysio
Muito lindo .Amor puro
Cara Sandra,
Sim, o amor puro, como em Rumi (1207/1263), se replica na poesia de Adonis.
Abç e grato pela chance de estender a concordância!
Aluysio
Outro dia, vi a pérola brotar do mar de Atafona…e não tem como não replicar poesia de lua e dívidas…
Caro Ocinei,
Da pérola à lua, dos versos de Adonis à prosa do seu comentário, nenhuma dívida se replica.
Abç e grato pela chance da tréplica!
Aluysio
Obrigado. Sugestões já anotadas e em fase de pesquisa para compra.