Trump ocifializa candidatura à reeleição nos EUA, 1ª a usar a Casa Branca como palco

 

Trump discursa ao oficializar sua candidatura à reeleição a presidente dos EUA, primeira em 220 anos a usar a Casa Branca como palco de comicio eleitoral (Foto: Foto: Evan Vucci – AP)

 

Acabou nesta madrugada brasileira o longo discurso em que Donald Trump aceitou a indicação do Partido Republicano para tentar a reeleição a presidente dos EUA, nas urnas de 3 de novembro. Foi o primeiro em que a Casa Branca foi utilizada como palco de campanha, o que jamais tinha sido feito por nenhum presidente candidato à reeleição, desde que a sede do Poder Executivo estadunidense foi construída, em 1800.

Atrás nas pesquisas e nas casas de apostas, Trump, como era esperado, radicalizou seu discurso. Que foi várias vezes dirigido nominalmente contra o seu adversário Joe Biden. A quem chamou de “cavalo de Tróia do socialismo”, mesmo que Biden seja um político moderado que derrotou o socialista Bernie Sanders nas primárias democratas, e de “fraco”.

Trump atacou também governadores democratas por adotarem a quarentena contra a Covid, que já tirou mais de 180 mil vidas humanas nos EUA. Número que o líder do país campeão mundial de mortes pela pandemia não citou. Mas, sem usar máscara, disse que seu governo é “aliado da ciência” diante da aglomeração de 2 mil entusiasmados militantes que gritavam “four more years” (“mais quatro anos”), a grande maioria também sem máscaras.

Além dos governadores democratas, o presidente dos EUA atacou os prefeitos do partido de oposição. Que, segundo ele, não pedem ajuda federal contra os protestos gerados pelo assassinato do George Floyd, negro sufocado até a morte por um policial branco em 25 de maio. E que foram reacendidos depois que o também negro Jacob Blake levou seis tiros pelas costas no último domingo (23), diante dos seus três filhos pequenos, disparados por outro policial branco.

Trump classificou os manifestantes, jovens em sua maioria, de “anarquistas”, tentando ligá-los a Biden e aos democratas. Mas não citou outro jovem, Kyle Rittenhouse, de 17 anos, que matou dois manifestantes na terça (25) a tiros de fuzil, e tinha postado um vídeo em que aparecia na primeira fila de um comício do presidente. Este reforçou o tempo inteiro o discurso da “lei e da ordem”, que teve êxito em 1972, quando os EUA também estavam tomados por protestos pelos direitos civis, e outro presidente republicano, Richard Nixon, foi reeleito. Ainda que tenha sido obrigado a renunciar em 1974, para não sofrer o impeachment, pelas complicações do caso Watergate, em que espiões a mando da Casa Branca foram presos enquanto plantavam escutas no comitê democrata. Tanto o vídeo trumpista do jovem assassino de hoje, quanto o Watergate dos anos 1970, foram revelados pelo jornal Washington Post.

Além dos jovens que levaram os protestos do “Black Lives Matter” (“Vidas Negras Importam”) dos EUA ao mundo, outro alvo preferencial de Trump, em supostas ligações com Biden, foi a China de Xi Jinping. Com quem prometeu endurecer ainda mais a guerra comercial. Ele voltou a chamar o Sars-Cov-2 de “vírus chinês”, posição xenófoba que adotou antes da pandemia chegar aos EUA. A associação da China com o presidenciável democrata foi feita várias vezes: “A agenda de Joe Biden é ‘made in China’. A minha é ‘made in the USA’”. Já sobre a Rússia de Vladimir Putin, que Biden atacou pela interferência na campanha presidencial de 2016 com produção e difusão de fake news, o republicano favorecido por elas não disse uma palavra.

Trump também fez muitas promessas. Prometeu diminuir os impostos, que Biden prometeu (confira aqui) cobrar das grandes fortunas para garantir seguridade social à população, e o preço dos remédios. Prometeu também uma vacina “segura e eficaz” contra a Covid ainda este ano, após sua campanha da cloroquina ter nos EUA o mesmo efeito inócuo que no Brasil de Bolsonaro. Não prometeu o sol, mas prometeu literalmente a Lua, garantindo que colocará a primeira mulher para pisar no satélite terrestre em um eventual próximo mandato. E prometeu até fincar a bandeira do seu país no solo de Marte. Além de prometer concluir na Terra seu controvertido muro na fronteira com o México: “O muro vai logo ser concluído, e está andando acima de nossas expectativas mais selvagens”. Mas não citou que seu estrategista da campanha vitoriosa de 2016, Steve Bannon, mentor internacional do clã Bolsonaro, foi preso no último dia 20 por desvio de recursos para a polêmica obra.

Trump também homenageou duas famílias de negros mortos, presentes no seu discurso. E chegou a afirmar: “Fiz mais pela comunidade negra em três anos do que Joe Biden fez em 47 anos (de carreira política), e, quando eu for reeleito, o melhor ainda estará por vir”. Em 2016, o presidente teve apenas 6% dos votos dos negros. E as promessas de conclusão do muro com o México e de endurecer ainda mais as regras de imigração não devem ajudá-lo com outra minoria crescente do eleitorado dos EUA: os hispano-americanos. Em contrapartida, fez várias menções religiosas e pró-Israel, para assegurar o voto dos evangélicos maioria religiosa de lá. O dos judeus, nos EUA, sempre foi majoritariamente democrata,

Ao insistir em um comício com a presença física dos seus apoiadores, Trump pode ter contrariado as orientações sanitárias do seu próprio governo. Mas deu calor à sua campanha. E isso pode dar um contraste favorável ao presidente, em comparação com o distanciamento — politicamente correto, mas politicamente arriscado — da campanha democrata. O republicano mentiu várias vezes em seu discurso, como sempre faz. Ao que seus entusiastas parecem indiferentes. Mas talvez precise ir além deles. Em um país politicamente tão polarizado quanto o Brasil, mas sem voto obrigatório, é na busca do eleitor não trumpista, mas também não democrata, que o pleito deve ser decidido.

Trump e Biden parecem ter razão em um raro ponto comum dos seus discursos: será uma eleição histórica. Pelo uso da Casa Branca como palco de comício, pela primeira vez em seus 220 anos de existência, a campanha já é.

 

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