Racismo põe Campos mais uma vez no noticiário do Brasil

 

Advogado José Francisco Abud, Fórum de Campos e a juíza da 3ª Vara Cível, Helenice Martins (Montagem: Eliabe de Souza, o Cássio Jr.)

 

 

Racismo de Campos ao Brasil

Na quinta (20), infelizmente, mais uma vez Campos virou (confira aqui) notícia em todo o Brasil por motivo torpe. Em petição do advogado José Francisco Barbosa Abud (OAB/RJ 225313), seus ataques de caráter abertamente racista contra a juíza Helenice Rangel Gonzaga Martins, titular da 3ª vara Cível da comarca, provocaram revolta nacional.

 

OAB quer exclusão de advogado

“A Magistrada afrodescendente com resquícios de senzala e recalque ou memória celular dos açoites” foram algumas das palavras endereçadas pelo advogado à juíza. Foi tão inadmissível, que a própria Ordem dos Advogados do Brasil do Estado do Rio de Janeiro (OAB-RJ), conhecida por seu espírito de corpo, ontem (21) pediu (confira aqui) a exclusão do causídico dos seus quadros.

 

“Moralmente inidôneo”

“A exclusão representa a cassação do registro profissional do advogado. De acordo com o parecer da Corregedoria, o profissional citado praticou conduta incompatível com a advocacia, tornou-se moralmente inidôneo para o exercício da advocacia e praticou crime infamante, que gerou comoção na sociedade”, explicou ontem a assessoria da OAB-RJ.

 

MPRJ e 134ª DP investigam

Também ontem, a assessoria do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPRJ) informou “que a representação relativa ao caso de possível prática de racismo por um advogado contra uma juíza foi recebida e encaminhada à Promotoria de Justiça de Investigação Penal”. Enquanto a Polícia Civil confirmou que abriu inquérito na 134ª DP.

 

TJ-RJ: “afronta à dignidade humana”

Um dia antes, na quinta (20) em que a notícia foi divulgada em Campos e no Brasil, o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJ-RJ) foi o primeiro a emitir nota oficial sobre o caso: “Além de atingir diretamente a honra pessoal e profissional da magistrada, representa uma grave afronta à dignidade humana e ao exercício democrático da função jurisdicional”.

 

OAB-Campos: “retrocesso”

Antes da OAB-RJ acionar ontem sua Corregedoria, a OAB-Campos também abandonou na quinta qualquer espírito de corpo em defesa do espírito humano: “As condutas racistas, machistas e quaisquer outras formas de violência são contrárias aos valores da profissão(…) Não podemos admitir tamanho retrocesso em nosso tempo”.

 

Amaerj: “inaceitável”

Ainda na tarde de quinta, a Associação dos Magistrados do Estado do Rio de Janeiro (Amaerj) também divulgou nota oficial: “o advogado apresentou conduta discriminatória e desrespeitosa, com o uso de palavras de baixo calão, racistas e injuriosas. Esse caso é inaceitável. Racismo é crime e deve ser combatido por toda a sociedade”.

 

Direitos da Mulher

Ontem, antes de a OAB-RJ divulgar que acionou sua Corregedoria para a exclusão do causídico, o Centro Especializado de Atendimento à Mulher (Ceam) Mercedes Baptista e a subsecretaria da Mulher de Campos também divulgaram nota. Em que manifestaram juntos o seu repúdio.

 

“Direitos fundamentais”

“O racismo não pode ser tolerado em nenhuma esfera da sociedade, especialmente no sistema de justiça, que deve ser um espaço de equidade, respeito e compromisso com os direitos fundamentais”, pregaram as instituições municipais dedicadas aos Direitos da Mulher.

 

Karma de Campos?

Além da resposta institucional, os ataques racistas do advogado contra a juíza foram também o assunto em todas as rodas de conversas em Campos, desde que o caso explodiu na quinta. Quando se tornou quase inevitável a lembrança do suposto karma — relativo à lei de causa e efeito das fés budista, hinduísta e espírita — da cidade com o seu passado escravocrata.

 

Referências estapafúrdias

A petição com os ataques racistas traz também uma salada de frutas de referências estapafúrdias: “Déspota infiltrado por facção criminosa denominada PCC no Supremo Tribunal Federal (stf); indivíduo que servirá apenas como uma cobaia da Empresa NEURALINK como nos experimentos do Sr. Josef Mengele”, escreveu também o advogado.

 

Com sua empresa Nerurolink citada por advogado de Campos em petição de cunho racista contra juíza, o sul-africano Elon Musk imita a saudação nazista na posse de Donald Trump como presidente dos EUA, em 21 de janeiro, a quem serve como chefe do departamento de “Eficiência Governamental”

 

Josef Menguele, o “Anjo da Morte” do campo de concentração nazista de Auschwitz

Moraes, Musk e Mengele

A salada de frutas lembrou o pomar das teorias da conspiração das bolhas políticas da extrema direita. Em aparentes referências ao ministro do STF Alexandre de Moraes e a Elon Musk, dono da empresa Neuralink. Como na referência direta a Mengele, médico e carrasco nazista do campo de concentração de Auschwitz, na Polônia ocupada pela Alemanha na II Guerra.

 

Desumanização

Os nazistas só puderam assassinar 6 milhões de judeus em campos de concentração e extermínio porque conseguiram desumanizar, aos olhos do povo alemão, suas vítimas. Como feito com os pretos nos 388 anos de escravidão no Brasil. Ou por quem, ainda hoje, é capaz de supor que pretos, índios, pardos, pobres, nordestinos e/ou homossexuais são sub-humanos.

 

Tentou bestializar juíza

Uma das formas mais cruéis de racismo, usada pelos nazistas com os judeus e os europeus com os africanos, é a bestialização: tirar a natureza humana para animalizar. Como o advogado tentou com a juíza: “Excelentíssima em tendências reprimidas(…) de uma infância devassada por parentes próximos que perpetuam abusos mais do que comuns a primatas ou primitivos”.

 

Publicado hoje na Folha da Manhã.

 

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