Ocinei Trindade — Quando não há nada para dizer, somos obrigados

Ocinei 25-10-16

 

 

 

Passa da meia-noite. Os prazos da vida se impõem. Não quero escrever, nem pensar, mas neste ofício fica difícil. Todo dia a vida nos exige algo, e muitas vezes não queremos atender. Hoje, me sinto assim. Entretanto, há o compromisso de entregar o texto para esta coluna quinzenal. É uma falta de inspiração misturada ao cansaço. E quem não se sente cansado nestes dias conturbados? Queria escrever um texto maravilhoso, inesquecível, longo do jeito que mais me agrada. Só que hoje acho que vai ser diferente. Tentarei obedecer ao limite, não falar mal de Garotinho, Lula e afins.

Nas últimas duas semanas tanta coisa aconteceu. Situações que me renderiam páginas e páginas, mas o que fazer quando não há ânimo para contar? Estou escrevendo uma dissertação de mestrado sobre transliteratura na rede social Facebook, uma pesquisa que me exige ler muitos livros, absorver ideias de tantos autores, escritores, músicos, compositores, cineastas, atores. Não sei se esta coluna caberia discorrer sobre este tema, e se o leitor vai achar interessante. Poderia falar sobre o Bob Dylan e seu Nobel literário que tem a ver com minha investigação acadêmica, mas o mundo todo já falou.

Estou desenvolvendo ou aprimorando meu conceito de ciberraiz no campo da leitura e da escrita no ambiente virtual em rede, mas não sei se é uma boa hora para academicismo. Poderia falar sobre a crise que atinge a Universidade Estadual do Norte Fluminense onde estudo no programa de cognição e linguagem, mas não sei se o leitor vai se agradar. Falar da crise econômica do estado do Rio de Janeiro e da disputa de Freixo e Crivella para a prefeitura carioca poderia até ser interessante, além da prisão de Eduardo Cunha ao especular se ele vai delatar ou não o PMDB, o Michel Temer e seus pares, mas não sei se vale a pena também dizer sobre isso. O policial federal hipster e bonitão na prisão de Cunha também deixou de ser novidade, mas quem sabe, falo um dia dele.

Cogitei de falar de cirurgia plástica ou dessas intervenções que pessoas andam fazendo como se fosse algo natural e necessário, mas desisti. Assisti no Youtube vários vídeos da cantora Rosemary, dona de uma voz e talento incríveis, mas que aos 68 anos de idade (segundo o dedo-duro do Wikipedia) resolveu paralisar o rosto com essas aplicações que me apavoram. Também demovi da ideia, melhor não tocar nesse assunto. Navegando pela Internet, a Rosemary me levou ao programa do Ronnie Von na TV Gazeta, que me levou a uma entrevista com a diva Bibi Ferreira que passou dos 90 anos e está cantando Frank Sinatra em um concerto. Poderia contar sobre o show de Bibi que assisti em Campos, no Trianon, mas achei que seria melhor deixar para outra ocasião (foi lindo aquele espetáculo, mas eu pessoalmente estava em uma infelicidade de irritar crentes e ateus).

Talvez, a solidão me inspirasse escrever. É um tema que sempre me desperta, assim como a morte, o sexo, o cinema, as paixões. Todavia, queria um texto curto, enxuto, e estas questões me fariam querer dedicar muitas linhas e isto levaria tempo. Ah, o tempo também é uma inspiração, desde o Eclesiastes a Shakespeare com suas reflexões, porém hoje não sei se dá tempo meditar sobre as coisas que o tempo apressado e voraz anda fazendo conosco. Dizem que ele é sábio.

Outro assunto que eu deveria mencionar é sobre a reforma pretendida pelo governo federal para a educação no ensino médio, do que venho revendo nas escolas estaduais que eu tenho frequentado para estagiar em um curso de licenciatura em letras, porém hoje não será possível. Estive em um interessante congresso latino-americano de humanidades na Uenf, onde conheci o casal de peruanos Elena Martinez Puma e Elmer Rivera, doutores e pesquisadores adoráveis com quem penso trabalhar, mas não é hora disto. A Uenf também sediou nova mostra de ciência e tecnologia, onde conheci uma jongueira de Campos, Dona Noinha, que discorreu sobre cultura africana, umbanda e racismo em um momento maravilhoso, mas deixarei para outro momento.

Nestes últimos dias, perdi duas pessoas que encontrei em diferentes momentos da vida. Valdeli Simões, um amigo querido de Macaé, poderia dispensar muitas páginas sobre ele e sua família, mas hoje não será possível. Assim como não poderei falar muito sobre a morte do Senhor Hernon, pai do meu querido amigo Hernon, que morreu no Dia do Poeta, último 20 de outubro. A reunião da família e dos amigos no funeral me renderia uma crônica ou poesia póstuma, uma homenagem reflexiva, mas a vida tem disto, inspira e expira até mesmo quando se pretende escrever. Não consigo fazer muito hoje. E amanhã? Caminhemos.

Talvez, eu devesse seguir o conselho da jornalista Jane Nunes para que eu enxugue mais os meus textos, pois a maioria das pessoas não se anima ler tanto. Teimoso, ainda não consegui. Até abri uma conta no Twitter e depois abandonei, pois para mim, a vida não cabe bem em 140 caracteres, mas às vezes a vida nos deixa sem palavras, sem uma sequer. Contudo, hoje, farei um esforço ao finalizar este texto com a condição twitterista:

Inspiração é algo muito particular. É uma partícula divina,quem sabe. Quisera ser Deus e escrever algo tocante e revolucionasse vidas. Amor?

 

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