Igor Franco — Unidos do Sete de Setembro

 

 

 

Campos, 7 de Setembro, Cepop.

No trajeto, uma intensa batalha travada no trânsito. A tentação de aderir à irregular fila dupla e passar à frente dos carros que aguardavam na mão convivia com a dificuldade em entender um bloqueio que colocava na mesma pista carros que iam ao desfile com os que fugiam para as praias. Quase uma hora depois, ao chegar próximo ao colosso de 80 milhões de reais(!!!!), vi vários flanelinhas uniformizados e preenchendo talões de duas vias comprados na gráfica da esquina. “São 10 reais. Estamos cobrando adiantado”. Paguei sem pestanejar, afinal, um polimento sairia mais caro. “Vamos ficar até o último carro”. Não mais o vi. Aliás, notei o plural: ele e os outros colegas deviam ter conseguido o direito de explorar o estacionamento em alguma concessão pública, pensei.

Caminhando para a entrada, ouço uma música aproximando-se rápido. Era um ônibus trazendo alguma delegação que desfilaria. Cantavam um hino cívico mais ou menos assim: “Ih, f**eu, a ***** apareceu”. Não entendi muito bem quem estava aparecendo, mas agora não importa. Tivesse eu ouvido o alerta daqueles jovens, o tema do texto seria outro.

Cheguei às arquibancadas. Um sol para cada um. O número de ambulantes anunciando seus produtos perdia por pouco para o número de potenciais consumidores. Para aqueles que, como eu, defendem que o pior da crise passou, observar aquela quantidade de vendedores foi um convite para repensar o otimismo.

Pus os olhos na pista. Dezenas de pessoas à paisana transitavam pelas laterais. Seria um corredor de dispersão? Percebi que não quando vi alguns carrinhos de picolé na avenida. Àquela altura, o Exército, a Polícia e os Bombeiros já haviam desfilado. Disputando espaço com transeuntes, ambulantes e diversas pessoas da (des)organização do evento, algumas delegações mal ocupavam meia pista. Bastantes minutos se passaram e o mais próximo possível de algo cívico foi o desfile de, aparentemente, representantes de alguma igreja evangélica. A expressão da religiosidade é, há algum tempo, a única tradição de um passado recente que ainda permeia o tecido social deste país, suspirava eu, saudoso dos tempos não vividos.

Ouvi a plateia agitar-se. Reparei, ainda longe, uma delegação de tamanho razoável. À frente, um rapaz dançava uma mistura de ritmos alegremente, mesmo sem música. Alternava passos de samba com reboladas frenéticas de funk. Alguns aplaudiam efusivamente. Outros, como eu, buscavam significado para aqueles quadradinhos de oito no 7 de Setembro. Concluí que aquilo só podia ser uma homenagem à música popular brasileira (não à MPB, que na verdade é música da elite, mas àquelas escutadas pelo povão mesmo). Já estava a postos para ajudar com um comprimido de Tramal dada a iminência de um mau jeito na coluna do dançarino quando me dei conta de que havia cometido um erro crasso de localização. Na pressa de chegar ao destino, peguei a entrada errada. Ao invés de ir para o Cepop, parei no Sambódromo!

**

PS: na semana da comemoração dos 195 anos de Independência, assistimos atônitos passivos à contagem manual dos R$ 51 milhões de reais do peemedebista Geddel Vieira Lima, descobertos em malas e caixas. Um dia depois, o ex-todo-poderoso ministro dos governos Dilma e Lula, Antônio Palocci, fez os brasileiros dormirem assombrados com a confirmação de cifras multibilionárias das propinas pagas pela Odebrecht ao eterno perseguido das elites, Luiz Inácio Lula da Silva. Tido como redentor dos pobres e dos oprimidos por “500 anos”, Lula é incensado por alguns intelectuais de miolo mole como marco zero da real independência brasileira. A ser verdade, a propina da Odebrecht está para ele como a famosa indenização paga pelo Brasil à Portugal e Inglaterra por sua própria independência. Essas bandas sempre tiveram vocações para o ridículo.

PS 2: aliás, dado o conteúdo das gravações desastradas de Joesley Batista e Ricardo Saud, é inevitável dizer que nossa vocação mesmo é a pornochanchada.

 

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Este post tem 3 comentários

  1. Mário

    Ótima explanação!

  2. Ferram

    Me parece (e morro de medo da constatação) que acostumamos a viver nessa desordem não só do 7 de setembro, mas também dos outros 364 dias do ano. A falta de educação deste país se tornou simbólica.

  3. Tania

    Que texto lúcido, ao mesmo tempo bem humorado e inteligente. Parabéns!!!

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