Folha 40 anos — Aloysio Balbi

 

Jornalista Aloysio Balbi

O jornal fica

Por Aloysio Balbi(*)

 

Aluysio Cardoso Barbosa, dizia que as pessoas passam e o jornal fica. Ele passou. A rigor, a frase é para consumo doméstico, destinada aos jornalistas, estabelecendo uma linha de hierarquia, onde o jornal é mais importante. Ele precisava dizer isso, tanto quanto os jornalistas necessitavam ouvir. Jornalistas são na maioria das vezes vaidosos, competitivos e para alguns até arrogantes — combo de adjetivos nada bons, que deve ser compensados principalmente com ética.

Trabalhei na Folha da Manhã durante 32 anos ininterruptos.  Tive muitos, mas no curso destas três décadas, o meu melhor companheiro de redação foi o jornalista Aluysio Cardoso Barbosa. Nossas afinidades não se limitavam ao nome ou à cor dos olhos. Poderia ter aprendido mais, porém, o pouco que sei muito veio dele. O melhor retrato falado de Aluysio é o que ele escreveu. Tinha um arco de argumentos e quando disparava uma flecha em forma de texto atingia o alvo certeiramente.

Chamava-me pelo sobrenome: Balbi. Obviamente, sabia o meu primeiro nome. Ao término de um dia de trabalho, no final da década de 80, ele me chama a sua sala e me pergunta meu nome completo. Revelei que entre o Aloysio e o Balbi havia um anônimo “Barros de Gonzaga” que ficara confinado nos documentos de identidade.

Não sabia o objetivo da pergunta. No dia seguinte, quando cheguei ao jornal, me fez outra, querendo saber se já tinha lido a edição daquele dia. Disse que sim, quando na verdade apenas havia passeado com os olhos sobre a primeira página. Ele me disse para ler o jornal todo, de ponta a ponta.

Levei mais de uma hora lendo tudo sem entender nada. A única coisa de deixara de ler era algo que nunca mudava no jornal: o expediente. E ele carinhosamente coloca o expediente a um palmo do meu nariz e vi meu nome misturado com os Barbosa na condição de editor-geral.

Durou uma meia dúzia de anos. O jornal iria dar um passo importante, ganhando cores em suas páginas. Isso requeria uma experiência que eu não tinha. Era necessário contratar um jornalista do Rio ou de São Paulo para essa missão. Os Barbosa me deram a deferência de escolher meu substituto. Quatro grandes jornalistas foram avaliados e ficou aquele que escolhi, depois substituído por Aluysio Abreu Barbosa. Isso para mim foi tão importante quanto ter sido editor-geral.

A partir de então passei a dividir com Aluysio Barbosa a responsabilidade pela opinião do jornal. Bem, foram 32 anos.

Saí recentemente pela mesma porta que entrei: a da frente. Sinto saudades e acho que deixei algumas, mas como dizia Aluysio Barbosa: os jornalistas passam e o jornal fica.

 

(*) Jornalista e ex-editor-geral da Folha

 

Publicado hoje (07) na Folha da Manhã

 

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