Cada minuto passado desde às 18:45 do último sábado é histórico. Pela primeira vez na história desse país, um ex-presidente foi preso por um crime comum. Após dois dias entocado no Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo, agremiação que o projetou nacionalmente, pressionado pelo ultimato da Polícia Federal, Lula resolveu encerrar o teatro que encenava desde a última quinta-feira, quando foi pego de surpresa pelo mandado de prisão expedido pelo juiz Sérgio Moro. No Brasil, o cumprimento da lei por vezes é surpreendente, o que explica boa parte de nossa tragédia.
Contra a oferta por parte da Justiça de uma entrega digna e discreta, Lula atacou com os principais ingredientes de sua trajetória política: mentiras, vitimismo e farsa, envelopadas num degradante espetáculo a céu aberto. Em reunião com seus acólitos, decidiu desafiar a justiça e desrespeitar o prazo de apresentação fixado na sentença: sacou da cartola uma celebração religiosa em razão da data de aniversário da falecida esposa, em mais um episódio de vilipêndio à memória de Dona Marisa — real proprietária do triplex, segundo seu próprio marido.
Do alto do palanque, um Lula cada vez mais rouco e mais raivoso repetia o cansativo discurso: estava sendo preso por suas supostas qualidades, por seus supostos feitos em favor do povo e a mando de supostos capangas da elite brasileira. A menos que haja outra elite que não seja a de empreiteiros e empresários que se refestelaram durante anos com a corrupção do governo federal e estatais comandados pelo PT e aliados, trata-se da mesma mentira repisada ad nauseam desde antes da chegada ao poder.
À exortação ao enfrentamento através de manifestações violentas (bloqueios e ocupações) sucedeu uma patética tentativa de emular o histórico discurso de Martin Luther King Jr. (“eu sonhei que…”) e encarnar o papel de messias (o mártir que se entrega aos algozes pelo bem dos seus). O fracasso foi tão retumbante que sequer para o papel de Barrabás Lula pode se prestar. No roteiro original, o criminoso conseguia a liberdade, enquanto o ex-presidente dorme no colchão de pedra há dois dias.
Marcaram presença na missa negra apenas os suspeitos de sempre: membros do partido e aliados, artistas bajuladores, sedizentes intelectuais, padres de passeata e a claque mal remunerada de sempre — que desde quinta-feira se aglomerava ao redor do prédio. Suposto motivo da celebração, também mal se ouviu falar de Dona Marisa, invocada apenas para ter seu cadáver utilizado, mais uma vez, como escudo por Lula.
Convidado e ansiosamente aguardado, o povo, de fato, não apareceu, preferindo tocar sua vida em casa, no trabalho, fazendo um churrasquinho de sábado e acompanhando a pantomina em tempo real pela TV. Mesmo seus apoiadores nas redes sociais, que até quarta-feira passada torciam por um “libera geral” no STF preferiram fazer uma defesa indireta do corrupto, travestida de cobrança pela punição de outros políticos. A tese oficial para o livramento de Lula, uma terrível comoção social, foi cancelada por falta de quórum.
Ao fim e ao cabo, o ocaso lulista é cada vez mais cristalino. Tendo transformado o partido em um apêndice de sua existência, impedido de disputar as eleições, longe de conseguir aglutinar a esquerda ao redor de um nome que possa se viabilizar nas próximas eleições e acuado por várias outras denúncias cujas chances de condenação são, talvez, maiores que as do caso do triplex, parece não existir saída para o corrupto condenado.
A festa acabou. Você, que zomba dos outros, está sem discurso. O povo sumiu. A luz apagou. E agora, Lula?