A semana que viu a Seleção Brasileira avançar à segunda fase da Copa do Mundo após três partidas pouco convincentes teve ainda menos emoção no campo político. Numa atípica calmaria em Brasília, com o decadente governo Temer evitando os holofotes por novos vexames e o Congresso em ritmo (ainda mais) lento, o STF não decepcionou e ajudou a aprofundar a crise de confiança nas instituições brasileiras, ao determinar a soltura de José Dirceu (PT) e João Cláudio Genu (PP). Além disso, a já famosa Segunda Turma também trancou uma ação contra Fernando Capez (PSDB-SP) e anulou operação que mirou a senadora petista Gleisi Hoffman.
As redes sociais, porém, pareceram dar mais importância à repercussão da entrevista da pré-candidata comunista Manuela D’Ávila ao programa Roda Viva. No dia seguinte à exibição do mesmo, a reclamação dos simpatizantes da política a respeito de excessivas interrupções foi reverberada em diversos portais e não tardou para que uma nova palavra mágica da esquerda progressista mundial desembarcasse com força em terras tupiniquins: mansplaining, junção da palavra man (homem) com a palavra explaining (explicação). Para quem não entendeu, é o nome dado ao hábito de interrupção de uma mulher por um interlocutor que pensa saber mais que ela sobre determinado assunto.
Defensores da comunista divulgaram o número de 62 interrupções por seus entrevistadores. Segundo a Folha de São Paulo, Manuela D’Ávila foi interrompida 40 vezes durante a entrevista. Em comparação, o mesmo jornal apurou que Ciro Gomes havia sido interrompido 8 vezes, Guilherme Boulos 9 vezes e Marina Silva, também mulher, apenas 3 vezes.
Há evidência empírica antiga e recente de que a conduta de interromper mulheres ao longo de um discurso, é, realmente, uma prática disseminada e corriqueira. Porém, os mesmos estudos mostram que também as mulheres interrompem outras mulheres com mais frequência, desidratando a teoria de que se trata de um problema de machismo. A explicação para o fenômeno foi tentada por um artigo que correlaciona o vocabulário utilizado com mais frequência por mulheres, com palavras menos assertivas que as utilizadas por homens, como causa para a postura deselegante. Segundo os pesquisadores, ao denotar menos confiança através de palavras genéricas, as mulheres ficariam mais vulneráveis à interpelações e contraposições intempestivas. Tal característica foi recentemente lembrado numa entrevista concedida pelo psicólogo canadense Jordan B. Peterson à apresentadora Cathy Newman, em vídeo que viralizou na rede e fez de Peterson o inimigo número 1 das feministas canadenses, americanas e europeias. Aliás, dado o comportamento da entrevistadora no episódio, não poderia haver reclamação se um termo como womansplaining surgisse.
Noves fora as evidências científicas, não me parece contra-intuitivo pensar na disseminação dessa prática. Situações de tensão e conflito (seja numa reunião executiva, seja na deliberação de um grupo de políticos, por exemplo) são historicamente dominadas por homens. A presença de mulheres – que é altamente positiva e desejável – em tais ambientes tende a gerar estranheza e um comportamento defensivo por parte da força que se sente ameaçada. A postura, além de deselegante e pretensiosa, também não é contra-intuitiva. Entretanto, nada disso ocorreu no programa Roda Viva, que tive a oportunidade de assistir ao vivo.
É importante registrar que a própria Manuela não apontou nada de anormal ao longo da edição. Ao longo de mais de uma hora de perguntas e respostas, as interrupções se davam na maioria das vezes dentro do contexto da discussão. Em muitas ocasiões, a candidata simplesmente tergiversava sobre os questionamentos, como quando questionada sobre o desastre humanitário recente na Venezuela. Manuela também se recusou a censurar Stálin e outros sanguinários líderes comunistas, trazendo uma justificativa infame ao comportamento genocida do soviético. Em outras ocasiões, a defesa apaixonada do ex-presidente presidiário, com afirmações do tipo “todos sabem que não há prova” causaram desconforto e imediato repúdio dos entrevistadores.
O mansplaining pode ser, de fato, algo real. Porém, o que mais faltou no Roda Vivo de segunda passada foi a Manusplaining: a necessidade de Manu explicar como conciliar a suposta defesa de uma esquerda moderna com a defesa apaixonada de ditadores e criminosos parceiros de ideologia.