Do riso e do colo de Dani

Daniela Duncan (Foto: Facebook)

No início da noite de ontem, o amigo comum Pedro Vianna me ligou para dizer que Daniela Duncan tinha morrido, vítima de infarto, em Grussaí, de onde foi levada à Santa Casa de São João da Barra, à qual já chegou sem vida. Ela tinha apenas 45 anos, completos no último dia 2 de janeiro, e deixa a filha Bárbara, de 18 anos, fruto do seu primeiro casamento com Horácio Duncan, e viúvo Edlucio Paes. Era professora de educação física, vocação profissional da sua família materna desde o avô, e lecionava no Centro Escola Riachuelo e no Externato Brasil, como informou aqui o Christiano Abreu Barbosa, ao noticiar sua morte, sentida por toda uma geração de classe média que foi adolescente e jovem nas décadas de 80 e 90 do século passado. Quando éramos mais conhecidos pelos apelidos com os quais nos tratávamos.

Dani Coxuda era irmã de Marcelo Duncan, o Colorau, que depois também seguiria a tradição familiar, ao se formar e lecionar como professor de educação física. Mas naquela época, muito antes do termo “empoderamento” se tornar moda às mulheres que se afirmam entre homens, Dani já convivia, conversava e bebia de igual para igual com qualquer um da galera. Fosse seu irmão, seu então namorado Grilinho (Leonardo Rosa), Pedro Maluco, Ovo (Christiano), Gordinho (Marcelo Cordeiro), Aranha (Paulo Vitor Cortes Lopes), Otacílio (Luiz Rodrigo Cortes Lopes), Fred Calcinha (Frederico Rangel), Pancinha (Vinícius Teixeira), Sili (Luiz Otávio Moreira) e a “Lenda Viva”, como se autointitulava Rodrigo Rosa, irmão de Grilinho e de Flávia Rosa, outra mulher que habitava em igualdade de termos aquela nossa juventude masculina de província. Outros, como César Boynard, Gustavo Emílio e eu, tínhamos a vantagem de ter como apelidos apenas o diminutivo dos nossos nomes de batismo.

Conheci Dani entre o final dos anos 80 e início dos 90, na casa que seu pais, tia Iêda e Márcio, tinham em Grussaí. Era um carnaval e Dani comandava as meninas que nos maquiavam para sair no bloco de piranhas. Alta e vigorosa, então atleta de vôlei, tinha presença física imponente, com corpo e atitude de mulher desde a adolescência. Sempre de alto astral, sua característica mais marcante talvez fosse aquele riso largo, fácil e cheio de dentes. Que, creio, não será esquecido por ninguém que teve a chance de conviver com ela. Desde a ligação ontem de Pedro, várias são as histórias, caras e de parto dolorido, que brotaram na lembrança sobre Dani. Mas existe uma, capital, da qual talvez só nós dois saibamos.

Era o verão de 1992, quando meus pais tinham alugado uma casa em Grussaí. Jogávamos frescobol, quando minha inabilidade de vida inteira para esse esporte fez com que isolasse a bola de borracha com a raquete de madeira em cima do telhado da garagem. Subi no muro para pegá-la, escorreguei e caí de uma altura de três metros, arrebentando a fronte interna do meu crânio ao bater com força no chão de cimento, ainda que não tivesse produzido nem um galo na parte externa. Meu irmão e minha mãe tinham saído com o saudoso Fernandinho Gomes, para comprar cerveja. Fred Calcinha, com muita presença de espírito, pela qual devo a vida, arrumou um carro, para me levar ao Hospital Ferreira Machado.

Por todo caminho pela BR 356, até chegar ao HFM, fui deitado no banco de trás do carro, com a cabeça no colo de Dani, que me fazia cafuné e tentava me acalmar com palavras de carinho. Em meus lapsos de consciência, como ocorre com pancadas na cabeça, lembro de ter aberto os olhos uma vez, enxergando o rosto de preocupação amiga e solidária de Dani, enquanto, pelo vidro do carro, passava o Solar dos Airizes. Depois der operado por Makhoul Moussallem na Santa Casa de Misericórdia de Campos, e de ter alta do hospital, voltando à mesma casa alugada de Grussaí, descobri que a galera tinha pegado a tal bolinha de frescobol, pintado nela com esmalte uma cara de mau, apelidando-a de “Chucky, o Brinquedo Assassino”. Não perderam o amigo, nem a piada. Mas o fato é que, ainda sem poder sair de casa em meu processo de recuperação, Dani todo dia ia me ver.

Sobrevivi aos 29 anos seguintes àquele episódio. No qual, não tenho dúvida, o carinho de Dani foi tão fundamental em minha briga para continuar vivo, como foram a presença de espírito de Fred e a habilidade de Makhoul como neurocirurgião. Mesmo estando em Atafona, bem perto da Grussaí onde Dani ontem passou mal e morreu, não pude estar ao seu lado, como ela esteve do meu naquela mesma praia, quase três décadas atrás. E por isso lhe pedirei desculpas pessoalmente, de preferência com uma gelada, se existirem vida e cerveja depois daqui.

Até lá, guardo a risada aberta e o colo de Dani, no qual apoiei a cabeça e a vida, dentro de mim.

 

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Este post tem 2 comentários

  1. Ana Paula

    Essa era a nossa amada Dani!!

  2. Rosi Santos

    Aluisinho, as histórias com Dani são muitas e o carinho c ela tb. Como acredito em vida pós morte, que não existe é apenas uma passagem, sei que ela foi na frente para conhecer o espaço e enfeitar td com a alegria que trazia na alma. Que Deus possa confortar os familiares e amigos pq a forte presença dela vai ficar entre nós p sempre.

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