O Psol de Campos, cuja candidatura a prefeita de Campos da professora Natália Soares foi considerada a revelação das últimas eleições municipais, enviou um artigo ao blog. Que cobra planejamento urbano e participação popular nas decisões relativas à cidade e seus espaços públicos. E faz críticas ao desperdício dos royalties e ao clã político dos Garotinho, que hoje tem Wladimir (PSD) à frente da Prefeitura de Campos. Assim como à gestão passada do ex-prefeito Rafael Diniz (Cidadania) e ao governo federal do presidente Jair Bolsonaro (sem partido).
Confira abaixo:
O Psol Campos pelo direito à cidade
Desde a década de 1960, quando o desenrolar da luta de classes levou a eclosão de uma série de revoltas e movimentos populares pela ampliação dos direitos civis, entrou em pauta uma nova demanda até então pouco difundida: o direito à cidade. Toda a ebulição desse contexto de época acabou captada pela sensibilidade e leitura afiada do filósofo marxista Henry Lefebvre, que em sua obra clássica de 1968, exatamente sob o nome “O direito a cidade”, acabou por influenciar todas as gerações seguintes de geógrafos, urbanistas e estudiosos do tema.
Aquela cidade fordista de então, que funcionava como uma “máquina de morar”, extensão das fábricas e do ambiente de trabalho, espaço desenhado estrategicamente pelo capital para ser trânsito e nunca de permanência, ser desencontro, um ambiente mercantilizado e alienante, se tornou insuportável para a classe trabalhadora. Se a sociedade urbana-industrial fez das cidades o confinamento de onde não escapamos, que ao menos tenhamos o direito de incidir sobre como ela deve ser. Trata-se de um direito coletivo e não individual, mas que afeta a todos, ainda que de forma desigual.
Reivindicando essa tradição, queremos um planejamento urbano que seja funcional no que diz respeito ao básico (mobilidade, habitação e saneamento por exemplo), mas que, simultaneamente, rompa com a colonialidade e o desenvolvimentismo que despreza nossas diferentes formas de produzir o espaço, nossas vivências comunitárias, nossas culturas. Desejamos mais autogestão, mais participação popular e não que tecnocratas decidam de cima pra baixo como devem ser nossos bairros, nossas ruas, praças, festas e lugares de convívio. Queremos mais espaços abertos, áreas verdes e menos concreto, menos verticalização, menos poluição visual. Lutamos por cidades mais sustentáveis e ecológicas. Pela acessibilidade e a superação do capacitismo. Por cidades menos patriarcais, que sejam pensadas por mulheres e para as mulheres, que tenham segurança, que enfrentem o assédio em transportes e espaços públicos, seja com ônibus femininos ou vagões separados por gênero, que tenham mais equipamentos públicos, fraldários, locais seguros e higienizados para mães poderem amamentar seus filhos.
Esses são apenas alguns dos elementos que o direito à cidade nos ajuda a refletir. Exatamente pela defesa desse direito coletivo questionamos a privatização do Parque Alberto Sampaio pela Prefeitura de Wladimir Garotinho. No âmbito do direito à cidade os parques e as praças possuem centralidade, são locais de encontro, de convergência das diferenças, de estreitamento de laços da classe trabalhadora. Não podemos aceitar que em uma cidade tão carente desses espaços de convívio, um parque perca seu sentido público, inclusivo e se transforme em potencial ponto de violência simbólica e dissidência entre o povo. Se ali existem problemas para o efetivo cumprimento de sua função na cidade, que esses problemas sejam resolvidos e não que se abra mão dele em sentido privado.
Os Garotinhos têm se caracterizado por destruir ou apagar símbolos de nossa história, de nossas conquistas, a cada gestão. Ou quem não lembra de ter sido no governo Garotinho que “Zumbi dos Palmares” perdeu o status de fundação? Desconsiderando o fato de Campos ser uma das últimas a abolir a escravidão, o que traz graves prejuízos para nosso povo negro. A herança política trazida pelo Wladimir não está apenas na gestão que mergulha a cidade na miséria, mas também no apagamento de símbolos e patrimônios de nossa própria história.
A ampla formulação marxista sobre o problema urbano constitui ferramenta importante para nossas interpretações das mazelas de Campos dos Goytacazes. Sabemos como se desenvolveu a cidade do capital, desde as denúncias de Engels, ainda no século XIX, com o clássico livro “A situação da Classe Trabalhadora na Inglaterra”, até Milton Santos, em “A urbanização brasileira”, tudo isso está exposto. Seja em Campos ou em qualquer lugar, se reproduz no espaço as condições concretas da luta de classes em cada época. Isso fica claríssimo no caso da ocupação Novo Horizonte. Como uma cidade com tantos terrenos vazios e imóveis abandonados pode ter tanta gente sem casa? Nossa luta não é para que os ocupantes fiquem em casas que não são suas, mas reivindicamos junto a eles que tenham o direito de habitar e, por isso, cobramos políticas sociais ao Estado. Os instrumentos previstos no “Estatuto da Cidade” de 2001, que autorizam aplicação de IPTU progressivo até culminar em desapropriação, vem sendo pouco acionados por decisão política. Ora, sabemos muito bem que a classe dominante campista é especuladora de terras e imóveis, sempre foi, desde o baronato da cana e continua a ser com seus herdeiros diretos e indiretos. Não somos ingênuos, quem domina o território, detém o poder.
O povo quer viver e decidir sobre as políticas que impactam suas vidas. O município de Campos se negou e ainda se nega a olhar para os pequenos. Por isso, citamos também a luta de 21 anos nas terras da usina Cambaíba e ressaltamos a resistência popular que ao lutar expõe as desigualdades e contradições de um sistema que privilegia os poderosos e exclui os pobres. Terras essas onde corpos de opositores da Ditadura Militar foram queimados, terras onde trabalho análogo à escravidão deram a tônica e fizeram aumentar poderio daqueles que exploram o povo. Quem acumula terra, acumula dinheiro. O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST) defende um preceito constitucional de que as terras devam ser produtivas, terra é para fazer brotar a própria vida. Assim, o maior movimento social da América Latina, que durante a pandemia doou milhares de toneladas de alimentos aos brasileiros, defende a agricultura familiar, comida saudável, a agroecologia e a relação de forma sustentável com o meio ambiente, uma nova cidade sob novos pilares.
Por isso, desde o início, para nós socialistas, que enxergamos a sociedade pela lente da luta de classes, apoiar a maior ocupação urbana da história do município e a ocupação de Cambaíba era não apenas uma necessidade, mas um dever. Em relação a primeira entramos com o suporte jurídico, com campanhas de arrecadação financeira para a cozinha comunitária, com a formação política, com divulgação nas redes sociais. Estamos orgulhosos do nosso trabalho junto a essas pessoas e conscientes do porque ele incomoda tanto a burguesia e as oligarquias políticas da cidade. Ressaltamos, inclusive, que não fomos nós que acirramos a luta de classes aqui em Campos, mas sim o empobrecimento acelerado decorrente das sucessivas eleições de governos nefastos que a burguesia campista vem apoiando em peso desde 2016, especialmente o de Rafael Diniz e Jair Bolsonaro. Pra não falar daqueles que antes queimaram todos os fartos recursos dos royalties que circularam aqui. É justa a revolta do povo! Nós, do Psol-Campos, desejamos apenas estar à altura desse tempo e das demandas de todos os oprimidos que vejam em nosso partido um instrumento para auxiliar na transformação de sua realidade. Estamos na luta e nela permaneceremos.
Viva o poder popular!