Carlos Augusto de Alencar — Como as Democracias sobrevivem?

 

Cartaz do partido de extrema direita Alternativa para a Alemanha (AFD), que tem 20% de neonazistas entre seus filiados, pichado pelo movimento que gerou o “cordão sanitário” parlamentar antifacista (Foto: Kirill Kudryavtsev/AFP)

 

 

Carlos Augusto Souto de Alencar, professor de geografia, escritor e acadêmico de letras

Como as Democracias se defendem (ou sobrevivem)?

Por Carlos Augusto Souto de Alencar

 

Ao ler a análise intitulada “Com o avanço da extrema direita, o que esperar da Alemanha?”, assinada pelo jornalista Aluysio Abreu Barbosa e publicada no blog Opiniões, no último dia 24, me veio a reflexão. Há um livro chamado “Como as Democracias morrem”, muito importante para se entender o que ocorre no mundo atual, de autoria de Steven Levitsky e Daniel Ziblatt, lançado no Brasil pela editora Zahar. Talvez seja o caso de pensarmos como elas se defendem.

O sistema de governo é um dos fatores mais importantes para se avaliar as formas como as Democracias podem se proteger dos ataques que hoje partem, quase exclusivamente, de um movimento internacionalizado de extrema direita. E, como bem sabemos, os dois sistemas de governo existentes nas Democracias são, basicamente, o parlamentarismo e o presidencialismo.

O parlamentarismo parece funcionar melhor que o presidencialismo. Claro, os nazistas chegaram ao poder e a Alemanha já era parlamentarista. Porém, creio que, ao menos hoje, ele parece resistir bem com a tática dos “cordões sanitários”. Que, na Alemanha e na França, por exemplo, estão conseguindo isolar e conter os extremistas. Mesmo que as votações na extrema direita só cresçam a cada eleição. Mas quero acreditar que elas, em determinado momento, atinjam seu teto entre 30% e 35%.

O fato é que, no parlamentarismo, será preciso sempre negociar para se governar e isso parece conter o extremismo. Tanto que Giorgia Meloni, por mais que seja claramente extremista, não conseguiu implementar um regime ditatorial na Itália. Pode-se argumentar que isso é uma tática para fazer com que as pessoas se acostumem com o extremismo e aceitem um futuro governo radicalizado. Sugiro uma pesquisa sobre a chamada “Janela de Overton”, que descreve o conjunto de ideias suportadas pela população no discurso público.

Por outro lado, também se pode alegar que o poder desgasta. O que pode fazer com que, no futuro, os extremistas caiam na vala comum e percam a força de seu discurso. “O poder tende a corromper, e o poder absoluto corrompe absolutamente”, como preconizou o historiador britânico John Emerich Edward Dalberg-Acton, mais conhecido como Lord Acton, (1834/1902).

E o presidencialismo? Nessa hora eu olho para o Brasil e para os Estados Unidos. Como tivemos ditaduras em períodos lamentavelmente longos em nossa História, fizemos a Constituição de 1988 com instrumentos legais de proteção à Democracia. Os Estados Unidos, por não terem conhecido ditaduras, não têm dispositivos constitucionais semelhantes. Então acontece uma coisa interessante.

O Brasil defende bem a Democracia, com problemas, porém consegue, no que se refere ao arcabouço legal. Já os Estados Unidos têm uma Democracia avançada em várias outras esferas, mas peca justamente nesse item.

Se pensarmos em uma armadura completa, o Brasil usa um elmo que protege a cabeça enquanto o resto do corpo apanha sem proteção. Já os Estados Unidos têm a armadura quase completa. Mas falta proteger a cabeça.

O fato é que, no presidencialismo, é muito mais fácil implementar a tão danosa polarização, tão conveniente para os extremistas. Implementar o parlamentarismo no Brasil resolveria a questão? Bom, se os partidos fossem fortes, sim. O certo seria fortalecer os partidos primeiro. O problema é que implementar parlamentarismo, com partidos sem compromisso ideológico ou programático, seria abrir caminho para uma desestabilização que interessaria muito aos extremistas.

Isso deveria ter sido feito lá, na promulgação da Constituição de 1988, de forte teor parlamentarista. Só que no plebiscito de 1993, entre presidencialismo e parlamentarismo, o primeiro venceu por larga margem de voto popular. No futuro, o tema pode ser revisitado, quando o risco à Democracia tiver diminuído. Isso, claro, se diminuir — quero acreditar nisso.

O que se faz hoje, não pelos motivos certos, é diminuir o poder do Executivo e aumentar o do Legislativo. Não só para aumentar o controle deste sobre verbas públicas, mas, também, para enfrentar o Judiciário. Que teve seu poder aumentado, pela própria omissão do Legislativo. Por este, ironicamente, se preocupar muito mais com o controle orçamentário do que com sua função precípua que é, vejam só, legislar.

Existem críticas à atuação do Poder Judiciário, algumas até bem embasadas, outras apenas manifestações de ódio com base apenas em fanatismo. Mas não se pode negar que, ao defender a Constituição Cidadã, o Judiciário tem sido fundamental à manutenção da Democracia no Brasil. E que, por isso, é alvo de ataques incessantes de extremistas, principalmente nos meios digitais. Onde, por falta de regulação que deveria vir, vejam só, do Legislativo, prosperam crimes e ilegalidades. Que, no mundo real, gerariam prisões e outras punições.

Na verdade, se pensarmos mais a fundo, quem está se defendendo é a própria Constituição Cidadã. Através do Judiciário e das demais instituições e indivíduos que a prezam e que reconhecem seu caráter humanista.

A verdade é que só os pouco informados ou os que praticam desonestidade intelectual negam: a luta do mundo hoje não é sobre direita e esquerda. E os parlamentares europeus, em geral, parecem ter percebido isso claramente. A luta hoje é entre os que defendem a Democracia e os que defendem ditaduras.

Se assim não fosse, como explicar que países governados por “comunistas” estejam associados geopoliticamente a países governados por oligarcas e por outros governados de forma teocrática. Todos estes contra países governados por conservadores, liberais ou progressistas que são democráticos?

“A Democracia é o pior dos regimes, excetuando-se todos os outros”. É a definição de um grande defensor da Democracia mundial, Sir Winston Churchill (1874/1965). Sim, ele era de direita…

 

Chances de “Ainda Estou Aqui” ao Oscar no Folha no Ar desta 6ª

 

(Arte: Eliabe de Souza, o Cássio Jr.)

 

O cineasta e produtor Fernando Sousa, a cinéfila e médica Bárbara Gazineu e o crítico de cinema e estudante de Letras Lucas Barbosa são os convidados para o Folha no Ar desta sexta (28), último antes da noite de entrega das estatuetas do Oscar neste domingo (2) de carnaval. Eles falarão sobre o projeto do Festival Internacional de Cinema de Campos (confira aqui) programado para agosto e a possibilidade (confira aqui) da criação de um curso de cinema na Uenf, que constava do projeto inicial da universidade.

Fernando, Bárbara e Lucas também analisarão, entre torcida e perspectiva real, as chances do longa brasileiro “Ainda Estou Aqui”, de Walter Salles, para o Oscar de filme e filme internacional, além de Fernanda Torres como atriz principal. Como os demais principais prêmios do maior festival de cinema de Hollywood.

Quem quiser participar ao vivo do Folha no Ar desta sexta pode fazê-lo com comentários em tempo real, no streaming do programa. Seu link será disponibilizado alguns minutos antes do início, nos domínios da Folha FM 98,3 no Facebook e no YouTube.

 

Com avanço da extrema direita, o que esperar da Alemanha?

 

Jornalista e ex-colega do curso de jornalismo na Fafic, a Silvana Venâncio, de Bom Jesus do Itabapoana, me pediu uma análise das eleições parlamentares ontem (23) da Alemanha, locomotiva econômica (patinando sobre os próprios trilhos em dois anos de recessão) da União Europeia. O que só me arrisquei a fazer após trocar algumas impressões com o campista Roberto Dutra, sociólogo e professor da Uenf que cursa pós-doutorado na Alemanha, país onde já tinha residido. E domina seu idioma, política, economia e cultura.

Na expectativa da eleição germânica do último domingo e seus desafios, num mundo em que o equilíbrio ocidental do pós-II Guerra tem sido entortado pelo presidente dos EUA, Donald Trump, Roberto já havia publicado, em seu blog no Folha1 e na edição de sábado (22) da Folha da Manhã, o artigo “Pra onde vai a Alemanha?”. Cuja leitura, aqui e aqui, recomendo.

Encerrado o pleito e contabilizados seus votos, dentro do sistema parlamentar em que a Alemanha é referência ao mundo, vamos, por partes, a alguns pontos. Com lições didáticas à revisão aos dogmas de fé de “esquerda” ou “direita” nesta nossa zona periférica do “Extremo Ocidente” — como o ex-presidente do Brasil Fernando Henrique Cardoso, outro sociólogo, classificou um dia a América do Sul.

 

Bundestag, Parlamento da Alemanha

 

1 – O chanceler da Alemanha egresso das urnas será o conservador Friedrich Merz. Líder da aliança União Democrata Cristã (CDU) e União Social Cristã (CSU), que cresceu 4,4 pontos da eleição anterior de 2021 para fazer em 2025 28,60% dos votos, ou 208 das 630 cadeiras que compõem o Bundestag, Parlamento alemão. No qual Merz terá que compor com outros partidos para formar maioria. Até que o faça, Ofaf Scholz deve se manter interinamente no poder, abreviado com a eleição de ontem após perder a maioria.

 

2 – Com a má avaliação à gestão Scholz, seu Partido Social Democrata (SPD) perdeu 9,3 pontos entre 2021 e 2025. E conquistou no domingo 16,40% dos votos, ou 120 cadeiras, passando de 1ª à 3ª força do Bundestag. É a maior derrota socialdemocrata da história eleitoral alemã. Ainda assim, o SPD deve ser o fiel da balança para o CDU de Merz conseguir maioria.

 

3 – Isolado pelo chamado “cordão sanitário” dos partidos convencionais nas alianças parlamentares, o Alternativa para a Alemanha (AfD) cresceu impressionantes 10,4 pontos entre as eleições de 2021 e 2025. Literalmente, dobrou de tamanho e, com 20,8% dos votos populares, fez 152 cadeiras no Bundestag, onde terá a 2ª maior bancada. É o mais perto que a extrema direita chegou do poder na Alemanha em quase 93 anos. Desde que as eleições parlamentares de julho de 1932 deram ao Partido Nacional-Socialista (Nazista, na corruptela) de Adolf Hitler a maior bancada do Reichstag (Bundestag, a partir de 1945), com 230 cadeiras. Em 2025, o Departamento Federal de Proteção da Constituição (BfV), serviço de inteligência doméstica da Alemanha, estima que 20% dos membros da AfD são neonazistas.

 

4 – É consensual entre historiadores e militares que foi o esforço combinado dos EUA e da antiga União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS, cuja grande herdeira atual é a Rússia), em duas frentes, que derrotou por esgotamento a Alemanha Nazista na II Guerra Mundial (1939/1945). Oitenta anos depois, as coisas parecem ter se invertido na eleição de ontem. Na qual a AfD contou com o apoio declarado dos EUA de Donald Trump — do seu vice, J.D. Vance, e do dublê de bilionário sul-africano e seu chefe do Departamento de Eficiência Governamental, Elon Musk — e da Rússia de Vladimir Putin.

 

5 – As aparentes ironias do destino a erodir estereótipos entre esquerda e direita não param no apoio dos EUA e da Rússia de hoje a quem se uniram para derrotar na II Guerra. Se a eleição de domingo fosse só na antiga Alemanha Oriental, ditadura comunista tutelada pela URSS que durou de 1949 até a reunificação do país em 1990, após a queda do Muro de Berlim em 1989, a AfD sairia vencedora das urnas de 2025. Foram os eleitores da capital Berlim e, sobretudo, da antiga (e capitalista) Alemanha Ocidental que ontem impediram a vitória eleitoral da extrema direita.

 

6 – A inversão dos estereótipos vai além. No lugar de um artista plástico frustrado por ter sido rejeitado duas vezes na Academia de Belas Artes de Viena, que declarou guerra ao modernismo e considerava as mulheres alemães como úteros de produção à raça ariana, como foi Hitler, a AfD é comandada por uma analista de investimentos com PhD em economia na China: Alice Weidel, neta de um juiz nazista. Apesar de o seu partido celebrar a família tradicional, ser radicalmente contra a imigração e nacionalista, Weidel é lésbica assumida e casada com uma imigrante do Sri Lanka, produtora de cinema. Com quem tem dois filhos e vive a maior parte do tempo na Suíça.

 

7 – Os desafios do novo governo Merz, assim que for formado, não serão poucos.“Os temas principais serão imigração, decadência econômica do modelo fordista exportador de máquinas e segurança externa, com o realinhamento geopolítico (na aliança entre os EUA de Trump e a Rússia de Putin para isolar a Europa e tentar resolver a Guerra da Ucrânia em termos favoráveis ao país invasor). É muita coisa para um governo fazer. Pior ainda seria o cenário se o governo começasse e não acabasse, como foi o caso agora de Scholz. Eu diria que (o futuro governo Merz) é a última chance que o establishment político alemão, CDU e SPD, tem. Governar de uma maneira surpreendente, assumir riscos que nunca foram necessários desde o pós-II Guerra, para frear o crescimento da extrema direita, da AfD, à condição de 1º partido”, ponderou Roberto Dutra após o resultado das urnas alemãs.

 

8 – Merz sucederá a Scholz, provavelmente com seu apoio parlamentar e que, por sua vez, sucedeu a Angela Merkel, após esta comandar a Alemanha por 16 anos. Socialdemocrata do SPD, Scholz está à esquerda de Merkel e Merz, que disputaram o poder no conservador CDU e na sucessão da liderança de Helmut Khol, chanceler da Alemanha em sua reunificação. Foi a vitória interna no controle do partido, de Merkel sobre Merz, que afastou este temporariamente da vida política em 2009, até regressar em 2021. Advogado com experiência na iniciativa privada, não na administração pública, é mais conservador que Merkel. Tanto no controle da imigração quanto no abandono da energia nuclear por um país que ficou mais dependente do gás da Rússia.

 

9 – Ontem, antes mesmo dos resultados finais da eleição, o virtual novo comandante da Alemanha falou grosso ao responder à ameaça dos EUA de Trump deixarem a Europa e a Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) entregues à própria sorte com a Rússia de Putin: “Minha prioridade absoluta será fortalecer a Europa o mais rápido possível para que, passo a passo, possamos realmente alcançar a independência dos EUA. Pelo menos desde as declarações de Donald Trump na semana passada, está claro que os americanos, ou pelo menos parte deles, neste governo, são amplamente indiferentes ao destino da Europa”.

 

10 – Conhecido também em português, há um provérbio alemão que diz: “Leichter gesagt als getan” (“Falar é uma coisa, fazer é outra”). A ver.

 

Denúncia contra Bolsonaro pela PGR em contraditório

 

O jornalismo tem algo em comum com a democracia: só se faz com contraditório. Temporariamente afastado do jornalismo, abri ontem (19) uma exceção sazonal. Para tentar analisar, em seus aspectos jurídicos, éticos, políticos e eleitorais reunidos em 6 pontos, a denúncia da Procuradoria-Geral da República contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outros 33 suspeitos de envolvimento na suposta tentativa de golpe de Estado no Brasil.

Neste blog e nas redes sociais, o texto gerou (confira aqui, aqui e aqui) bom engajamento e comentários. Alguns, de simples manifestação descerebrada e passional de torcida. Que caracteriza a esquizofrenia da bipolaridade política brasileira e tanto aproxima o que de pior há no bolsonarismo e no lulopetismo. Outros, no entanto, de acréscimo dialético ao debate, sobretudo quando em contraditório.

Abaixo, em nome do bom debate sobre um tema grave, complexo e que ainda renderá bastante nos próximos meses, algumas dessas opiniões. Emitidas pela professora e ex-vereadora Odisséia Carvalho, presidente do PT de Campos; pelo advogado, ex-prefeito e ex-presidente da Câmara Municipal de Campos, Nelson Nahim; e pelo jornalista Sebastião Carlos Freitas, ex-editor-geral da Folha da Manhã:

 

Ex-presidente Jair Bolsonaro, procurador-geral Paulo Gonet, ministro Alexandre de Moraes, presidente Lula e o Supremo Tribunal Federal (Montagem: Eliabe de Souza, o Cássio Jr.)

 

Odisséia Carvalho, professora, ex-vereadora e presidente do PT de Campos

Odisséia Carvalho — “O procurador-geral da República, Paulo Gonet, denunciou Bolsonaro e mais 33 aliados ao Supremo Tribunal Federal (STF) na noite de terça-feira (18), pelos crimes de organização criminosa, abolição violenta do Estado Democrático de Direito e golpe de Estado. Essa denúncia histórica leva o Partido dos Trabalhadores a fazer, mais uma vez, a defesa enfática da democracia, do Estado Democrático de Direito e a colocar um ponto final em qualquer tentativa de anistia aos golpistas.

A denúncia apresentada por Gonet mostra com muita habilidade como o golpe começou a ser tramado desde 2021, quando Bolsonaro ameaça não reconhecer os resultados eleitorais de 2022 e usa o desfile de 7 de setembro para atacar o STF. Além do já conhecido plano que envolveria o assassinato de Alexandre de Moraes, Geraldo Alckmin e do presidente Lula.

O nosso país não pode ser refém do golpismo que já desrespeitou resultados eleitorais tantas vezes ao longo da nossa história. Esse é um passo importante e didático para todos aqueles que ousarem desafiar a democracia brasileira. Sem anistia! Cadeia já!”

 

Nelson Nahim, advogado, ex-prefeito e ex-presidente da Câmara Municipal de Campos

Nelson Nahim — ”Como advogado e político não tenho dúvida que se o Bolsonaro quisesse de fato dar um golpe de Estado teria feito com a caneta na mão enquanto estava presidente. E mais, os atos de 8 de janeiro (de 2023) não podem ser considerados como tentativa de golpe contra o Estado de Direito; mas sim uma baderna, por sinal muito mal feita.

Condenar pessoas a 17 anos de prisão com esse argumento, aí, sim, fere de morte a nossa combalida democracia e tudo que estudei na nossa Faculdade de Direito de Campos 42 anos atrás”.

 

Sebastião Carlos Freitas, jornalista e ex-editor-geral da Folha da Manhã

Sebastião Carlos Freitas — “Infelizmente, nosso Brasil continua sendo de poucos.

Brigas pelo poder, povo sendo usado e nada de positivo.

Triste ver um Congresso tão ruim, parcialidade no Judiciário e Executivo na mão de deputados que fazem bem somente para seus próprios bolsos.

Acredito que este momento passa também pela educação sucateada de um país onde governantes querem o povo cada vez com menos conhecimentos, para assim não serem contestados diante de suas ações absurdas.

Qual o número de brasileiros deve saber o que é orçamento secreto?

Como lulista, eu talvez deveria estar feliz em saber que o golpista, aquele mesmo que debochou de pessoas que morriam de Covid. Mas o momento do Brasil não é de felicidade.

Como Kakay (advogado aliado de Lula que divulgou carta pública com críticas ao isolamento do presidente e ao seu atual governo), também não posso fechar os olhos para o momento vivido pelo governo Lula, mas ver políticos como o senador Cleitinho (Azevedo, REP) e o deputado Nikolas (Ferreira, PL), conterrâneos de minha querida Minas Gerais, representando o povo no Congresso Nacional, é algo que me envergonha como mineiro!”

 

O que dá para dizer de Bolsonaro denunciado pelo PGR

 

Passei boa parte da madrugada lendo as 272 páginas da denúncia da Procuradoria-Geral da República contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outros 33 suspeitos de envolvimento na tentativa de golpe de Estado no Brasil, a partir da vitória eleitoral apertada de Lula (PT) no 2º turno presidencial de 2022. Como passei parte da manhã e início da tarde de hoje conversando sobre ela com juristas independentes e capacitados.

É certo que muita água ainda passará sob a ponte. Mas, sobre as denúncias da PGR dos crimes de abolição violenta do Estado Democrático de Direito, golpe de Estado, formação de organização criminosa armada, dano qualificado sobre o patrimônio da União e deterioração de patrimônio tombado, o que dá para dizer desde já:

 

Ex-presidente Jair Bolsonaro, procurador-geral da República Paulo Gonet, ministro do STF Alexandre de Moraes e o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (Montagem: Eliabe de Souza, o Cássio Jr.)

 

 

1 – O procurador-geral da República, Paulo Gonet, fez uma costura eficiente entre os fatos a partir de julho de 2021, dentro da perspectiva de planejamento e execução da tentativa de golpe. Que veio sustentada em evidências aparentemente robustas, colhidas no inquérito da Polícia Federal e muito além da mera delação premiada do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro.

 

2 – Cumprido todo o processo legal, tudo até aqui parece indicar que Bolsonaro será julgado, condenado e, se não fugir do país, preso. Se o mesmo acontecer também com os generais Walter Braga Netto, Augusto Heleno, Paulo Sérgio Nogueira, Mário Fernandes, Estevam Theophilo e Nilton Diniz Rodrigues, além do almirante Almir Garnier, será algo inédito e didaticamente necessário aos golpistas que se sucedem, geração após geração, na mais alta cúpula militar do Brasil. Pelo menos desde 1889, no primeiro golpe de Estado no país promovido pelos militares, quando derrubaram o Império para inaugurar a República. E nela se arvoraram, numa pretensiosa exceção da nossa caserna à tripartição de Poderes preconizada por Montesquieu, em assumir o antigo Poder Moderador dos imperadores.

 

3 – Alvo de um plano de sequestro, assassinato e até exposição pública do seu corpo, no qual chegou a ter sua rotina pessoal campanada, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes não tem impessoalidade para ser relator do caso ou julgar Bolsonaro e seus supostos cúmplices. Em qualquer Estado Democrático de Direito do mundo, Moraes deveria se considerar impedido de julgar Bolsonaro. Como Sergio Moro deveria ter se declarado suspeito para julgar Lula. Os dois magistrados se transformaram em parte nos casos. E perderam qualquer capacidade de isenção para julgar. Essa corrupção passional do juízo tende a cobrar o mesmo preço: corromper a condenação.

 

4 – Lula vive o pior momento de aprovação popular dos seus três governos. Que é atestado pelas mesmas pesquisas que anteciparam sua eleição em 2022. Como o jornalista Elio Gaspari registrou hoje em sua coluna: “um conhecedor de Brasília e de Lula dizia: ‘ele não sabe governar com pouco dinheiro’. Na sexta veio o Datafolha com o tombo de sua popularidade. Em seguida, chegou o Ipec informando que 62% dos entrevistados preferem que ele não dispute a reeleição. A erosão da popularidade do governo deu-se até mesmo no segmento de seus eleitores. Desde os tempos da Lava Jato, Lula não tinha uma semana tão amarga”.

 

5 – O péssimo momento político de Lula, a menos de 1 ano e 8 meses das urnas presidenciais de 2026, é melhor definido até por aliados históricos. Como o advogado Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay. Que revelou em carta aberta: “o Lula do 3° mandato, por circunstâncias diversas, políticas e principalmente pessoais, é outro. Não faz política. Está isolado. Capturado. Não tem, ao seu lado, pessoas com capacidade de falar o que ele teria que ouvir. Não recebe mais os velhos amigos políticos e perdeu o que tinha de melhor: sua inigualável capacidade de seduzir, de ouvir, de olhar a cena política”.

 

6 – Lula foi condenado e preso em 2018 por uma Lava Jato com amplo apoio popular. Bolsonaro pode ser condenado e preso, ainda em 2025, por um STF com ampla reprovação popular. Noves fora as questões jurídicas e éticas, como a parcialidade autoevidente de Moraes e Moro, há a questão política: o espantalho do capitão pode só não bastar, como atirar pela culatra. A partir do entendimento popular de um conluio entre Judiciário e Executivo “progressistas” para contornar um Legislativo tão conservador quanto parte considerável do eleitorado. Sobretudo se a carestia dos alimentos, com um governo que prometeu picanha para entregar pé de galinha, não for revertida no carrinho de compras. A ver.