Queixa-crime da juíza atacada
Atacada de forma racista (confira aqui, aqui e aqui) pelo advogado José Francisco Barbosa Abud, em petição a ela como titular da 3ª Vara Cível de Campos, a juíza Helenice Rangel Gonzaga Martins entrou (confira aqui) com uma queixa-crime por injúria no 1º Juizado Especial Criminal de Campos. Na qual foi representada por quatro advogados da Associação de Magistrados do Estado do Rio de Janeiro (Amaerj).
Resquícios escravocratas
Por conta de uma ação de anulação de testamento, tendo como um dos herdeiros a mãe do advogado, este fez ataques de cunho racista à juíza em sua petição à 3ª Vara Cível. Entre eles, classificou sua titular como “Magistrada afrodescendente com resquícios de senzala e recalque ou memória celular dos açoites”.
“Burocrata prevaricadora”
Embora cite essa e outras ofensas de claro teor racista feitas na petição, a queixa-crime da juíza, porém, se focou em um e-mail enviado em 30 de outubro de 2024, entre os mais de 20 que o advogado enviou à 3ª Vara Cível. No qual chamou a juíza de “burocrata prevaricadora”.
Pena de até 4 anos
A queixa-crime da juíza de Campos pediu enquadramento do advogado ofensor por injúria no Art. 140 do Código Penal, com pena de 1 a 3 anos de prisão. Que, pelo Art. 141, pode crescer em 1/3 por ser injúria contra funcionário público. Mas as ofensas, sobretudo em seu caráter racial, poderão ser alvo de novas ações.
Por que só injúria?
“Causou estranheza que a queixa-crime da juíza tenha tratado só da ofensa do e-mail, mais branda, do que as outras tantas da petição. Mas há razão técnica. Chamar a juíza de ‘burocrata prevaricadora’ é um crime de ação penal privada. É a própria vítima que tem que ajuizar a ação penal”, explicou o advogado criminalista Felipe Drumond, no Folha no Ar de ontem (25).
Racismo é com Ministério Público
“Já em relação aos outros crimes relacionados a racismo têm que ser alvo de ação penal pública incondicionada. Ou seja: quem processa o acusado, o autor das afirmações, é o Ministério Público. É por isso que a queixa-crime da juíza menciona as ofensas racistas, mas não pede a condenação do advogado por essas ofensas”, distinguiu Felipe.
O que virá depois?
“A queixa-crime da juíza tratou só da injúria. Aguarda-se a conclusão do inquérito policial (na 134ª DP) e, muito certamente, a propositura da denúncia pelo Ministério Público desses crimes de racismo”, projetou o criminalista o que deve vir como complemento da reação jurídica pelas ofensas do advogado à juíza.
“Defender a lei, não praticar crimes”
Outra convidada do Folha no Ar de ontem, a advogada Pryscila Marins também analisou o caso: “É difícil de entender essas palavras que foram colocadas dentro de um documento público, de um processo. Enquanto advogado, se torna muito pior. Não é esse o papel da advocacia. Nós estamos aqui para defender a lei, não para praticar crimes”.
Resposta rápida da OAB Campos e RJ
“Eu acho que a OAB está de parabéns, tanto da parte da dra. Mariana (Lontra Costa, presidente da OAB-Campos) quanto da dra. (Ana) Tereza (Basílio, presidente da OAB-RJ), porque deram uma resposta rápida (o repúdio aos ataques racistas do advogado e parecer da Corregedoria do órgão para cassar seu registro profissional)”, destacou Pryscila.
Publicado hoje na Folha da Manhã.