Por Arnaldo Neto
Interferências políticas geram o caos do serviço de saúde pública em Campos. Da afirmativa do diretor da Faculdade de Medicina de Campos, Nélio Artiles, publicada (aqui) no domingo passado, sobre a politização das Unidades Básicas de Saúde (UBSs) à grave denúncia do médico sanitarista e do trabalho Erik Schunk (aqui), sobre medicamentos usados por vereadores como moeda de troca junto à população, na edição de ontem, a série de reportagens da Folha da Manhã, com o objetivo apontar princípios para mudar o atual cenário da cidade, evidenciou que a raiz de todo mal no serviço de saúde pública está em entregar aos aliados, como forma de recompensa ou barganha, a administração de ofícios que deveriam ser técnicos para garantir o acesso pleno à serviços assegurados pela Constituição.
Usar do poder político em pontos administrativos não é algo que costuma terminar bem em lugar nenhum, muito menos no Brasil. Para os de memória curta, a Operação Lava Jato ainda está em curso e sua gênese — vejam só que coincidência — tem relação com os indicados por políticos para ocupar cargos técnicos naquela que já foi a empresa de maior orgulho do país, a Petrobras.
Não se faz omeletes sem quebrar os ovos. É necessário retirar da administração pública esse modelo de “sociedade institucional”, que a população campista aponta na gerência dos serviços de saúde, para que se venha a obter resultados futuros. O atual cenário nacional não é dos melhores, mas a esperança de grande parte dos brasileiros é que passada as turbulências da corrupção institucionalizada evidenciada pela Operação Lava-Jato, o Brasil se aprume no caminho do desenvolvimento e, condenados os culpados, possa se chegar um dia ao utópico “país melhor”.
Da mesma forma deve acontecer em Campos. Não dá para imaginar que a afirmativa do médico sanitarista ao dizer que “é muito comum que em salas de atendimento de vereadores tenham todos os medicamentos que faltam nos postos de saúde” passe despercebido, que não haja investigação. O administrador público tem que apurar a origem de tal denúncia, mostrar ao povo quem usa deste artifício e, no mínimo, limar da vida pública. Os 25 representantes da Casa do Povo, inclusive, devem esclarecer essa questão. Como as denúncias não citam nomes, são postos em igualdade todos aqueles que têm uma cadeira na Câmara de Campos. Ser acusado de reter medicamento para usar como troca para fins eleitoreiros não causa revolta numa Casa que tem três médicos na atual legislatura? O silêncio nesta questão é tão perturbador quanto à sensação que a denúncia pode ser verdadeira.
Seria audácia e egocentrismo sem limites do grupo que se perpetua no poder há quase três décadas creditar toda reclamação do cidadão quanto à qualidade da saúde pública apenas ao intuito de perseguição partidária. Quem precisa de um remédio na farmácia básica, passa a noite em uma fila para conseguir uma consulta no Sistema Único de Saúde (SUS), na maioria das vezes pouco se importa com quem detém o poder. Aliás, muitos ajudaram a eleger quem hoje tem a caneta na mão e acreditaram que teriam serviços melhores.
Além dos princípios, senhores, respostas! Não há perspectiva de melhora enquanto toda informação, inclusive com os erros administrativos, estiverem guardados a sete chaves, envoltos numa “caixa preta” para proteger os seus, em detrimento ao que deveria ser melhor para todos.
Publicado hoje na Folha da Manhã