Folha 40 anos — João Luiz Faria Netto

 

Jornalista e advogado João Luiz Faria Netto

Um pequeno grande sonho

Por João Luiz Faria Netto(*)

 

Não era um ano qualquer aquele setenta e oito que anunciava o início do fim de um período duro para quem via a realidade das redações de jornal e que, do lado de fora, enganava, falso brilhante, com a alegria da classe média filha do milagre, que nunca existiu. Nenhum nem outra. De fato o ano que iniciava mostrando as primeiras dificuldades de um Estado que nascia pela fusão de coisas muito diferentes em termos sociais e econômicos e que o bom senso — de quem ainda conseguia mantê-lo — recomendava o caminho de volta, o olhar para dentro como forma de manter o que tinha sido e criar o novo. Foi o caminho de Aluysio Cardoso Barbosa e Diva Abreu Barbosa, o jornalista e a professora, que ousaram saber voltar, com um projeto gestado nas redações de um grande jornal com o olhar nunca perdido das coisas dos Campos de Goytacazes.

O ano foi surpreendente, com três papas, um campeonato mundial perdido para os argentinos — sempre eles! — uma tragédia de místicos nas Guianas, outra feita de fogo na destruição do MAM no Rio, o primeiro bebê de proveta e a morte de um cantor de multidões.  As ruas, depois do recesso forçado voltaram a cantar a liberdade e, para o bem e para o mal, surgia nas ruas do ABC paulista um operário chamado Lula.

A Folha da Manhã nasceu no tempo certo.  Campos e a região Norte Fluminense (não havia, ainda, na geografia fluminense, a invenção de sub-regiões, anúncio de multiplicação do número de municípios, no jogo político desimportante) eram o objeto permanente do trabalho de algumas das pessoas que amavam a terra descrita por José Cândido de Carvalho, começando por aqueles que acreditavam em estudos técnicos e fizeram da Fundação Norte Fluminense um centro de pesquisa social com objetivo claro de transformações. Cito alguns, com saudades, como Rubens Venâncio, Renato Faria e Nilo Siqueira. Sem esquecer, é claro, um usineiro, Evaldo Inojosa.

Vale lembrar:  jornalismo era matéria da cultura de Campos, das primeiras cidades brasileiras a ter o seu jornal.  Os tempos, no entanto, não eram dos melhores, porque as impressoras offset, modernizando a impressão e deixando na história as rotativas estavam sob ameaça da mídia eletrônica, com os telhados brasileiros sendo tomados pelas antenas de televisão e os pregoeiros dizendo que o jornalismo impresso estava morrendo. Era falso pregão, como se comprovou, e se mostra ainda agora, quando o papel do jornal — e as versões de internet —  rebatem a morte do meio com o combate pertinaz às fakes news.

A dupla que retornou estava certa. A aldeia global exigia mais atenção para o fato local, mais emoção na narrativa, maior apuro no detalhe e responsabilidade editorial. Parece receita para hoje. E é.  Eu vi nascer, um dia, o primeiro esboço do jornal, traçado pelo velho diagramador que faz parte da história da imprensa brasileira: Valdir Figueiredo, cujo humor deixava a noite de fechamento mais alegre.  O resto é história de quarenta anos bem vividos e bem administrados.

Posso dizer: um dia conheci um sonhador que deseja voltar para escrever as notícias de sua terra e tinha uma âncora que segurou os seus pés no chão às vezes quente do calor natal. Deu certo.  Um pequeno grande sonho que continua sendo sonhado.

 

(*) Jornalista, advogado e ex-editor de Aluysio Cardoso Barbosa no Jornal do Brasil

 

Publicado hoje (07) na Folha da Manhã

 

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