A favela vista de baixo
os caibros desdobram-se ribanceira acima
aquário de palitos de fósforo acesos
ilumina à distância a vaga-lume
os ladrilhos sonhados, sonho sem peso
por essas ruas nunca ladrilhadas
escorre um córrego de cimento fresco
que às terras planas semeia de arranha-céus
emerge o muro intangível de arabesco
do mesmo cimento sobe a poeira
enevoa e oblitera um olhar mais amplo
e de baixo a fluorescência fosca
se interrompe em clarões de relâmpago
e se de uma caixa se desenham casebres
de seu palito risca e explode o prisma
lançada chama ao barril da pólvora
fabricada sem pressa a suor e cinzas
as cinzas o vento da tarde leva
adentram intrusas varandas e quintais
sopra um vapor seco, invisível
de um mundo distante impresso em jornais
lá embaixo, longe das lamúrias
onde o eco se cala no vácuo
e as manilhas grafitadas entopem
nada que desce chega de fato
e quando chega, lá não fica
e se fica, se ignora
a cinza se desfaz, esvanece
e o vento jamais a leva de volta
pois o vento que desce, não sobe
ascende só uma brisa que apaga
o fósforo aceso da vida
resta o blecaute e mais nada